domingo, 14 de novembro de 2010

Crise no Enem abala emocional de vestibulando

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Vítimas de erros do Enem, estudantes vivem dias de revolta e tensão

Clarissa Thomé / RIO, com evandro Fadel, Liège Albuquerque e Carmem Pompeu

Revolta, decepção, tensão e insegurança são alguns dos sentimentos vividos nos últimos dias por boa parte dos 3,3 milhões de estudantes que participaram do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), no final de semana passado. Em sua maioria adolescentes, eles se tornaram as maiores vítimas do imbróglio judicial em que a edição 2010 do Enem se transformou, por causa dos problemas nas provas de sábado.

A possibilidade de a disputa se arrastar na Justiça fez crescer a desilusão com o Enem - visto por muitos como a melhor chance de obter uma vaga numa universidade federal - e, ao mesmo tempo, deixou-os ainda mais inseguros por causa da pressão do calendário de vestibulares que tem início a partir deste final de semana.

O que está em jogo não é pouco. Das 84 universidades e instituições federais que usam a nota do Enem, 36 dependem exclusivamente do exame para selecionar seus alunos para 2011. Juntas, respondem por 48.458 cadeiras - ou 53% de todas as vagas oferecidas pela prova do Ministério da Educação (MEC).

A maioria dos candidatos a essas vagas mal teve tempo de refletir sobre a situação. No Rio de Janeiro, mais de 90 mil alunos fazem provas no feriado prolongado para as universidades federais mais procuradas do Estado - a Fluminense (UFF) e a do Rio de Janeiro (UFRJ). Para driblar a tensão provocada pelas falhas no exame e a incerteza se as instituições manteriam os planos de aproveitar as notas do Enem, escolas do Rio fizeram sessões de relaxamento, aulões de hidroginástica e até ioga.

"Os alunos já estavam preparados para as provas do ponto de vista do conteúdo; faltava o lado emocional. Essa indefinição fez o estresse dos estudantes aumentar", afirmou Mely Fonseca, diretora pedagógica do Colégio Santa Mônica, na Taquara, zona oeste. "Eu foquei toda a minha preparação no modelo de prova da UFRJ, que é inteiramente discursiva, porque já esperava essa bagunça", desabafa Brunna Rebelo, de 17 anos, que presta vestibular para Publicidade.

Centenas de estudantes extravasaram sua ira contra o MEC participando de ruidosos protestos nas ruas da capital fluminense durante a semana. O mesmo ocorreu em Minas Gerais, no Ceará e no Rio Grande do Sul.

Desconfiança. No Paraná, os estudantes iniciam hoje o vestibular da Universidade Federal do Paraná (UFPR), o mais concorrido do Estado, para o qual o Enem terá peso de 10%. Um deles é Matias Augusto Ramos Lima, que tenta Medicina e foi vítima dos problemas com o caderno amarelo do Enem. "Fui muito prejudicado e confesso que não estou seguro para fazer o vestibular", afirma.

A estudante Nina Thais Silva Monteiro, que tenta vaga em Engenharia Química, diz que não se sente prejudicada. "Mas estou frustrada; o que espero é que se defina logo essa situação."

Marjorie Podlecki, que disputa uma vaga em Psicologia, relata ter presenciado irregularidades na prova do dia 6 que refletem a perda de credibilidade do Enem. Ela própria confessa ter usado relógio na prova.

Sua amiga Mychelle Jung diz ter ouvido celulares tocando, além de muita conversa entre os fiscais. "O Enem teve um ano para se preparar e aconteceu o que aconteceu", ponderou ela, que pretende cursar Enfermagem e também recebeu o caderno amarelo com problemas.

Já Nina diz ter ido ao banheiro e encontrado duas estudantes conversando, sem a presença de fiscais. "Elas pararam quando cheguei, mas, quando viram que não era um fiscal, continuaram conversando", disse.

O estudante Paulo Bernardo Lindoso Lima disse ter ficado desmotivado com o exame por conta dos problemas nas provas em Manaus. No ano passado, ele publicou artigo num jornal local, assustado com a fragilidade da segurança do exame. Neste ano, nova decepção. "A facilidade para quem queria colar era absurda. Eu levei meu lanche num saco e poderia ter colocado ali uma calculadora e ninguém nem deu bola quando eu abri o pacote para comer."

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