quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Reflexão do dia – Roberto Freire

“(...)que ter Aécio e Serra em uma mesma chapa seria a melhor opção, não apenas por juntar candidatos dos dois maiores colégios eleitorais do país, mas por se tratar de dois governadores muito bem avaliados e lideranças expressivas nacionais. Aécio tem muita consciência do papel que tem que desempenhar nesta disputa eleitoral”.


(Roberto Freire, ontem, em Belo Horizonte )

Merval Pereira:: Como controlar?

DEU EM O GLOBO

DAVOS. Espantosamente em se tratando do Fórum Econômico Mundial não houve vozes dissonantes quanto à necessidade de uma nova regulamentação do sistema financeiro internacional, e o programa do governo Obama, que foi classificado de populista pelo mercado financeiro e por críticos liberais, recebeu o apoio do consultor Nouriel Roubini, tido como um dos poucos, talvez o único economista a prever a crise econômica que estourou em setembro de 2008.

Mas, para mostrar a dificuldade de se chegar a um consenso sobre uma regulamentação dos mercados financeiros, houve discussões durante todo o dia sobre a profundidade das novas medidas, e até que ponto uma regulamentação muito rigorosa não trará mais prejuízos que benefícios ao sistema financeiro internacional.

E m diversos painéis nesse primeiro dia de Fórum, houve um consenso de que a nova regulamentação deve garantir os interesses dos contribuintes e dos cidadãos de maneira geral, diante da possibilidade real de que dinheiro público venha a sustentar instituições financeiras, como aconteceu na recente crise financeira, para evitar que sua quebra afete o sistema como um todo.

No entanto Roubini alertou para o fato de que não é mais possível tolerar a existência de instituições financeiras que sejam “muito grandes para quebrar”, colocando em risco todo o sistema.

O contraponto foi feito pelo professor de Finanças da Universidade de Chicago Raghuram G. Rajan, que acrescentou que também não pode haver o caso de muitos pequenos bancos.

O que dividiu opiniões foram a profundidade e o rigor dessa nova regulamentação, e os objetivos dela. Embora considerada inevitável, a regulamentação do sistema financeiro, com motivações políticas e provocada pela raiva da opinião pública não será eficiente e, ao contrário, pode levar a novas crises.

Foi o que se viu no discurso do presidente da França, Nicolas Sarkozy, que na fala de abertura do Fórum pediu regulamentação “mais apertada” e limites para o pagamento de executivos financeiros, advertindo que “lucros excessivos” não serão mais tolerados quando não tiverem relação com a criação de empregos e bem-estar para a sociedade.

O painel de que participou Roubini chegou a uma conclusão que tem tudo a ver com a atuação dos políticos no atual momento da crise: o foco em questões periféricas, mas de apelo popular, como pagamentos de bônus para os executivos, pode desviar a atenção para as questões que realmente importam, como a transparência nas negociações e o risco de uma má gestão financeira.

Foi este, por exemplo, o ponto levantado pelo professor Rajan, que ressaltou que corremos o risco de atacar as questões mais visíveis em vez de fazer um trabalho de profundidade.

Uma das críticas feitas a uma regulamentação financeira com objetivos políticos foi a de que ela poderia levar a aumentar os custos do sistema de maneira geral.

Além do mais, a nova regulamentação não deveria atingir apenas os bancos, mas também as agências de risco e o sistemas não bancários de investimentos.

Sempre levando em conta que apenas a regulamentação não resolverá o problema sozinha, muito menos uma regulamentação que não tenha uma coordenação internacional.

Mesmo que seja considerado impossível um sistema regulatório único, as legislações nacionais terão que ter um mínimo de harmonia entre si para que as regras tenham eficácia.

Com relação ao alcance dessa regulação, o professor de Chicago advertiu que os países emergentes, que estão saindo da crise antes das economias maduras, não deveriam ser tolhidos por ela, pois deixariam de exercer o papel de motor da recuperação econômica.

No painel intitulado “A próxima crise global”, organizado pela rede de televisão CNBC, três fatores foram destacados como potencialmente geradores de uma futura crise, sendo o principal deles o descontrole do débito soberano dos países, considerado em uma votação como o mais provável detonador da próxima crise global.

Para combater a crise internacional, países da Europa e os Estados Unidos aumentaram suas dívidas entre 75% e 100%, e podem ter penhorado seu futuro em troca de uma solução de curto prazo, ressaltaram os debatedores.

Outras ameaças seriam o protecionismo, que prejudicaria o livre comércio e a globalização, e uma regulamentação excessiva do sistema financeiro.

Enquanto alguns economistas consideram que esse é um risco grande, o público colocou essa causa como a menos arriscada de todas, mostrando bem a distância entre a percepção das pessoas e o comportamento dos executivos financeiros.

No painel sobre “bolhas especulativas”, essa diferença ficou patente. Uma discussão fundamental, na qual não se chegou a um consenso, foi sobre a atuação de governos para prevenir novas bolhas ou esvaziálas enquanto não estão grande demais.

Enquanto a maioria concordava que medidas regulatórias como limitação de alavancagem e até mesmo controle de créditos são necessárias para evitar novas bolhas como a imobiliária, que levou à atual crise financeira, houve quem chamasse a atenção para o fato de que , em determinadas condições, bolhas especulativas podem ser encorajadas, ou pelo menos toleradas, como maneira de estimular ou revitalizar uma economia.

Fábio Ulhoa Coelho :: A busca de um rosto fundamentalista

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Certamente Lula não leu o decreto, que aprovou, do 3º Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3). Dilma, tampouco. Mas isso não tem nenhuma importância. Os dois sabiam muito bem do que tratava o documento. Estavam em busca de um rosto fundamentalista para o governo.

Estudiosos do fundamentalismo costumam traçar um paralelo com a utopia. Tanto os fundamentalistas quanto os utópicos querem mudar a sociedade. Mas, enquanto os utópicos projetam uma sociedade que não existe ("não existe ainda", dirão), os fundamentalistas se batem pela restauração de uma ordem social que já existiu. Os utópicos miram o futuro, os fundamentalistas, o passado.

O termo "fundamentalismo" está hoje fortemente associado ao islamismo. Algumas lideranças muçulmanas centram sua pregação na restauração da ordem que, de acordo com a leitura que fazem do Alcorão, era a propagada e implantada pelo Profeta. Mas a palavra foi inicialmente empregada na identificação de um movimento de protestantes nas primeiras décadas do século 20, no meio rural dos EUA. Também em razão da leitura que faziam da Bíblia, esses protestantes defendiam o retorno ao modo de viver dos antigos colonos.

Com esse significado de ânsia pela restauração de uma ordem social passada é que se pode falar em fundamentalistas de esquerda. Foi para eles que Lula e Dilma aprovaram o PNDH-3.

Os fundamentalistas de esquerda querem implantar, no Brasil do século 21, o poder soviético, isto é, o poder dos "conselhos populares" (soviets, em russo). A estratégia de Lenin para tornar vitoriosa a Revolução Russa consistiu em organizar conselhos populares, fortalecendo-os a ponto de se caracterizar uma dualidade de poderes. Durante certo tempo rivalizaram-se duas estruturas no Estado russo, fragilizado pela queda do czarismo: de um lado, assembleias um tanto inspiradas na democracia ocidental, de outro, os conselhos populares. Acabou prevalecendo a estrutura organizada pelos bolcheviques, mais forte que a da incipiente democracia russa, seguindo-se, então, a tomada do poder, a guerra civil e, finalmente, a criação da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, que existiu de 1922 até 1991.

Essa estratégia funcionou apenas na Rússia daquele tempo. Gramsci, nos anos 1930, advertia que na Europa, com sociedade civil e instituições estatais bem mais fortes, a estratégia leninista era inviável. Rosa de Luxemburgo, na Alemanha, alguns anos antes, havia ensaiado crítica semelhante.

Os fundamentalistas de esquerda não leem Gramsci. Imaginam espalhar conselhos populares Brasil afora, que, robustecidos, poderiam um dia se afirmar politicamente como instâncias mais representativas do que as legitimadas pela Constituição (Congresso Nacional, Poder Judiciário, Ministério Público, etc). Em seus delírios fundamentalistas, vislumbram uma dualidade de poderes capaz de abalar as instituições democráticas brasileiras e possibilitar a instauração da ditadura de partido único.

Na democracia, a conquista do poder resulta de um processo transparente e universal, isto é, de vitória nas eleições periódicas destinadas à identificação e afirmação da vontade da maioria do povo. No modelo soviético, ao contrário, tem poder quem dispõe de paciência e astúcia suficientes para suportar e manipular as enfadonhas reuniões dos ditos conselhos populares. São úteis, também, alguma habilidade com discursos inflamados, não necessariamente consistentes, e capacidade de articulações sorrateiras nos bastidores da organização partidária (de preferência, que abram as portas para a celebração de um convênio com o governo, por meio de uma ONG fajuta qualquer).

Na democracia, a alternância no poder é da essência do sistema. Periodicamente, de modo transparente e universal, renovam-se as lideranças. No modelo soviético, a alternância representa um grande problema e os rearranjos periódicos são sempre traumáticos. Se Trotski tivesse vencido Stalin, a História registraria o terror trotskista por trás de abomináveis processos de Moscou. Após a morte de Mao Tsé-tung, foi necessário julgar e executar sua viúva. Che Guevara provavelmente voltou à guerrilha por perceber que Cuba era uma ilha um tanto pequena para ele e os Castros.

Lula não foi eleito, nem reeleito, pelos fundamentalistas. Aliás, enquanto contava apenas com o apoio deles, amargou sucessivas derrotas nas eleições majoritárias. Logrou chegar à Presidência da República depois de ampliar o leque de sustentação política. É certo que até o escândalo do mensalão o mais importante sustentáculo do lulismo foram os fundamentalistas. Lula sobreviveu a esse escândalo graças, em parte, às demais forças políticas de sustentação do seu governo.

Um governo de muitos rostos, com os quais os fundamentalistas de esquerda têm dificuldade de se identificar.

Contudo, para levar adiante o plano de tornar plebiscitária a próxima eleição presidencial, Lula precisa impedir que os fundamentalistas acabem se empolgando em demasia com a candidatura Marina Silva. Para isso seu governo precisa exibir um rosto em que eles se reconheçam. A desastrada aprovação do PNDH-3 tinha só esse objetivo, assim como a vindoura Conferência de Cultura, em que a tese do controle social dos meios de comunicação certamente renascerá, ou mesmo a controvertida concessão de asilo ao preso Cesare Battisti.

Os democratas devem ficar atentos, sem dúvida, para que medidas eleitoreiras desse naipe não impliquem ameaças concretas às instituições. Até agora, contudo, Lula tem tido dificuldade em sua busca de um rosto fundamentalista para o governo, em razão da resistência vinda das demais forças políticas que o sustentam.

Fábio Ulhoa Coelho, jurista, é professor da PUC-SP

As gafes da ministra em Recife

DEU EM O GLOBO

Na sua vez de discursar, Dilma cometeu uma série de gafes. Ela se referiu ao escritor Ariano Suassuna como nascido em Pernambuco e autor da frase “nós somos madeira que cupim não rói”. Ariano é paraibano; sua família foi para Pernambuco porque seu pai foi assassinado por questões políticas. E o autor da frase é do compositor Lourenço Barbosa, o Capiba.

Ela errou, também, o nome da cidade onde estava ao lado do presidente.

Chamou-a de Paulistas duas vezes. Na terceira, acertou, tirando os que estava sobrando. Referiu-se ao “prefeito Romildo”, de Olinda. Ele se chama Renildo Calheiros (PCdoB) e é irmão do senador Renan Calheiros (PMDB). Também cumprimentou Romero Jucá (PMDB-RR), como líder do partido no Senado.

Depois, corrigiu-se, afirmando que ele era líder do governo.

Aliados querem Aécio como vice

DEU NO ESTADO DE MINAS

Cúpula do DEM e do PPS conversa com governador e insiste para que ele reformule sua posição e componha chapa com Serra

Thiago Herdy

A cúpula dos dois principais aliados do PSDB na campanha presidencial de outubro voltou ontem a defender o nome de Aécio Neves (PSDB) como vice na candidatura de José Serra (PSDB) ao governo federal. O deputado federal Antônio Carlos Magalhães Neto (DEM-BA) e o presidente nacional do PPS, o ex-senador Roberto Freire (PE), estiveram com o governador mineiro para discutir a estratégia política da oposição para 2010. Apesar da negativa de Aécio em ser vice, voltaram a afirmar que ele seria o melhor nome para compor a chapa que tentará derrotar a candidata do presidente Lula, a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff.

“O nome do governador é inquestionável e é unanimidade, em todos os campos da oposição. Mas essa decisão não cabe ao DEM, nem ao PSDB, cabe ao governador Aécio Neves. Pessoalmente, eu gostaria muito que isso acontecesse. Agora, é evidente que nós temos que respeitar a opinião presente e a decisão futura do governador Aécio Neves”, disse o deputado ACM Neto, na saída de um almoço no Palácio das Mangabeiras, em Belo Horizonte. No encontro, os dois discutiram não apenas a candidatura de José Serra à Presidência, mas também a formação das chapas da oposição nos estados, inclusive Minas Gerais. O DEM integra a base aliada de Aécio desde o início do seu governo.

O dirigente democrata afirmou que, caso Aécio não reconsidere sua decisão, o DEM não abrirá mão da indicação do candidato a vice. “O Democratas procurará discutir com o PSDB, vai analisar nomes internamente”, disse ACM Neto, que evitou citar possíveis nomes da legenda ao cargo. “Vamos continuar torcendo para que, quem sabe, lá na frente, o governador reflua (retroceda) da sua decisão e aceite ser vice. Hoje ele não admite compor a chapa nacional. Mas isso não impede que a gente continue torcendo”, afirmou ACM Neto.

Três horas depois, no Palácio da Liberdade, o presidente do PPS, Roberto Freire, disse ter a mesma expectativa de ACM Neto. “Se eu pudesse seduzí-lo ou sensibilizá-lo, já o teria feito”, afirmou o dirigente pernambucano, antes de lembrar que, política é como nuvem, muda de formato a todo momento. “Não sei quem disse isso, Magalhães (Pinto) ou Tancredo (Neves). Eu preferia que fosse Tancredo.” Freire disse que ter Aécio e Serra em uma mesma chapa seria a melhor opção, não apenas por juntar candidatos dos dois maiores colégios eleitorais do país, mas por se tratar de “dois governadores muito bem avaliados e lideranças expressivas nacionais”. O presidente do PPS lembrou que esta decisão caberá mais a Aécio do que a qualquer pessoa. “Ele tem muita consciência do papel que tem que desempenhar nesta disputa eleitoral”, disse o dirigente, que hoje participa de um encontro do PPS em Minas Gerais, com a presença de Itamar Franco (PPS).

O ex-presidente mineiro reagiu anteontem a uma declaração de Freire, que havia dito que Itamar seria um plano B para o lugar de vice na chapa de Serra, caso Aécio mantivesse sua negativa. “Nunca fui, nem vou ser plano B de ninguém”, disse Itamar. Ontem, Freire mudou o tom de seu discurso e afirmou que caberá a Itamar escolher a sua posição em 2010. “O craque não fica subordinado ao técnico. Ele vai escolher qual será o seu papel, e será papel importante”, afirmou.

O vice de Serra

DEU EM O GLOBO
Panorama Político :: Ilimar Franco

Brasília - O presidente do PPS, Roberto Freire, está costurando a candidatura do ex-presidente Itamar Franco para vice na chapa do governador José Serra (PSDB). Ontem ele esteve com o governador Aécio Neves (MG). Nessas conversas, Freire sustenta que a presença de Itamar na chapa sinalizaria um compromisso com a ética. A tese é a de que Itamar Franco teria, ao contrário do DEM, autoridade para criticar mensalões e mensaleiros.

Serra diz que falta tempo para inaugurar suas obras

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Silvia Amorim

A pouco mais de dois meses do prazo para deixar o governo caso seja candidato à Presidência da República, o governador de São Paulo, José Serra, disse ontem que falta tempo em sua agenda para inaugurar todas as obras de sua gestão. A declaração foi feita durante a inauguração de uma escola técnica na capital e logo depois de Serra criticar indiretamente o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

"Tem gente que inaugura pedra fundamental. Aqui nós não conseguimos inaugurar nem as novas escolas técnicas", afirmou. "O Centro Paula Souza é uma autarquia do Estado na área do ensino técnico e tecnológico que faz muito. Aliás faz tanto que a gente não consegue inaugurar", repetiu.

Há duas semanas, Lula esteve no Maranhão para lançar a pedra fundamental de uma refinaria da Petrobrás. No ano passado, o presidente participou de algumas cerimônias para lançar a pedra fundamental de universidades. O discurso de Serra ocorre ainda uma semana depois de Lula dizer que quer inaugurar o máximo de obras possível até abril.

O governador tem demonstrado em eventos públicos preocupação recorrente com o trabalho de publicidade de sua gestão. Ontem, ele queixou-se da divulgação sobre o trabalho do Centro Paula Souza. "Só tenho um problema, de natureza de comunicação, com o Centro Paula Souza. Muitas vezes quando se faz o anúncio dá a impressão que é de uma tia Paula, senhora benemérita e rica que constrói as escolas."

Na semana passada, ele foi irônico ao comentar as ações gerais de comunicação do governo. "Tucano é nota 100 em esconder a autoria das coisas. Nem todo mundo na política do Brasil é nota 100 nessa matéria, pelo contrário", disse, ao entregar kits de material escolar. Os únicos itens sem logotipo do governo eram borracha e apontador. Mochila, caderno, lápis, caneta e cola tinham o símbolo.

Os recursos destinados a propaganda por Serra têm crescido a cada ano. No ano passado, foram gastos 75% a mais do que em 2008 ? R$ 313 milhões contra R$ 178 milhões.

Apesar de reclamar da falta de tempo, o governador cobrou ontem a inauguração de, ao menos, uma das dez escolas de ensino técnico que começaram a funcionar em escolas municipais.

Por que Lula não se esquece?

DEU NO EX-BLOG DO CESAR MAIA

1. Nos últimos dois anos e meio, sempre que Lula vem ao Rio, faz algum tipo de agressão ao ex-prefeito. Algo aparentemente sem propósito para um presidente da república. Nos primeiros anos de seu governo, não havia "comício" que participava que não sacasse uma carta do ex-prefeito do Rio agradecendo ações do governo federal que ajudaram a cidade.

2. Esta carta, gentilmente, agradecia a compreensão da base aliada de Lula no Congresso na votação de um projeto de lei e na execução de outro que favoreceram muito o Rio. Quando falam em parceria, é importante lembrar que a melhor parceria é aquela institucional e permanente e não convênios eventuais que flutuam conforme o humor do chefe. Por obstrução dos líderes do PFL/DEM no Congresso, a lei da municipalização do salário educação foi aprovada. Isso dá definitivamente ao Rio 200 milhões de reais por ano. E em outra obstrução se conseguiu fazer cumprir a lei do acesso dos municípios aos depósitos judiciais, o que gerou um caixa instantâneo, no mesmo dia, para a prefeitura do Rio, de 250 milhões de reais.

3. Esse era o sentido da carta, o reconhecimento, pois a base do governo poderia não ter aceitado, embora naquele fim de dezembro se votassem leis federais de ajuste de receitas de interesse do governo federal. Lula lia a carta no palanque dando provas de que não discriminava ninguém. Mas por que mudou tanto nos últimos dois anos e meio? Elementar, meu caro Watson: "as malditas vaias", como seus assessores passaram a chamar as vaias que Lula recebeu na abertura do PAN-2007. Vaias monumentais. Vaias estrondosas. E na frente de autoridades mundiais e esportivas das Américas. E para que não maculasse a sua popularidade, colocou a culpa no prefeito do Rio, como se este pudesse mobilizar o Maracanã.

4. Daí para frente, cada vez que vem ao Rio, Lula encontra uma maneira, mesmo que mentindo, de atacar o ex-prefeito, que, aliás, já saiu do governo há um ano e um mês. Mas a memória das vaias é tão grande, doeu tanto, que Lula não se esquece e agride, como se aquele tivesse alguma responsabilidade. Bem, o dia em que vier ao Rio e não agredir mais é porque já se esqueceu das vaias. Pelo jeito ainda vai levar muito tempo para isso.

Jarbas como alvo do presidente

DEU NO JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Primeira visita do ano do presidente Lula começa com um ato que se transforma em palanque eleitoral, onde o principal alvo foi o senador peemedebista

Cecília Ramos

Sem a menor cerimônia, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva transformou, ontem, sua primeira passagem pelo Recife, este ano, em comício a favor das candidaturas da presidenciável do PT, a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, e do governador Eduardo Campos (PSB), que disputará a reeleição. Fazendo graça para uma plateia barulhenta que lotou um apertado salão na inauguração da Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Paulista, o presidente defendeu a “brabeza” da sua pupila como qualidade de “mulher séria”, aconselhou Eduardo a colocar “a tropa na rua” porque ele vem ajudar à reelegê-lo (veja na página 4) e dedicou boa parte do seu discurso de 22 minutos a um alvo: o senador Jarbas Vasconcelos (PMDB), um dos principais críticos de Lula no Congresso e possível adversário de Eduardo na eleição.

Detalhe que o próprio Lula fez uma auto-advertência de falso cuidado com a campanha antecipada no meio do seu discurso, ao mesmo tempo em que alfinetava Jarbas, que governou Pernambuco de 1999 a 2006. “Companheiro Eduardo, a gente não pode falar de eleição, mas você pode ficar sabendo: esse Estado não pode retroceder e voltar a um passado mesquinho”. Antes, já tinha sugerido que Jarbas é um dos políticos que tem “carimbado na testa prazo de vencimento” por possuir “cabeça atrasada”.

A referência mais clara que Lula fez ao seu desafeto foi declarar que “se Pernambuco tivesse tido no meu primeiro mandato (2003-2006) o Eduardo governando, Pernambuco estaria muito mais avançado do que está hoje”. Na época, o governador Jarbas cumpria seu segundo mandato – no primeiro (1999-2002), o presidente era o tucano Fernando Henrique Cardoso (PSDB-SP). E Lula completou: “E olha que eu dei mais dinheiro para o meu adversário que governava do que o presidente, aliado dele, deu para ele quando os dois governavam este País”. Lula disse ainda que ele e Eduardo precisam “fazer mais” para “recuperar os danos que a elite política deste Estado causou ao longo de tantas e tantas décadas”.

Como se tratava de um evento da saúde, presidente e governador trouxeram à tona, em seus discursos, o fim da CPMF, o “imposto do cheque”, que o governo não conseguiu prorrogar pois perdeu a votação no Senado, em 2007. A derrota governista implicou em corte de R$ 40 bilhões no orçamento de 2008. Lula culpou a oposição que queria, segundo ele, “prejudicar meu governo”. “O problema era de maldade (da oposição)”. Por meio de sua assessoria, Jarbas informou que não comentaria as declarações de Lula porque seu nome não foi citado e, portanto, ele não veste a carapuça. Mas lembrou que Eduardo votou contra a CPMF em 1999 e 2002.

A visita de Lula coincidiu com uma entrevista de Jarbas – publicada ontem nos jornais. O senador disse estar sendo agredido pelos adversários e que revidaria na mesma moeda. “Se ele (Lula), me chamar de babaca, dou o troco na hora”, disse Jarbas. Ontem, Eduardo, ao discursar no evento da UPA, não “passou recibo”, como se diz na política. Repetiu o de sempre: que seu governo é um sucesso, pois ele não perde tempo xingando ninguém.

Lula ignora TCU e dá verba para obras sob suspeita

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à lei orçamentária liberou pagamentos de R$ 13,1 bilhões para quatro obras da Petrobras que, segundo o TCU (Tribunal de Contas da União), apresentam irregularidades "graves", como preços acima dos de mercado e falhas nos projetos. Entre as obras que foram liberadas pelo veto de Lula está a refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, que deve receber R$ 6,1 bilhões.

Lula contraria TCU e libera verba para obras irregulares

Tribunal recomendou paralisação de quatro projetos da Petrobras por problemas "graves"

Pagamentos liberados pelo no Orçamento chegam a R$ 13,1 bi; presidente do TCU, Ubiratan Aguiar diz que corte "cumpriu sua parte"

Marta Salomon
Da Sucursal De Brasília

Veto do presidente Lula à lei orçamentária libera pagamentos de R$ 13,1 bilhões a quatro obras da Petrobras com irregularidades "graves" apontadas pelo TCU (Tribunal de Contas da União), como preços superiores aos de mercado, falta de detalhamento nos gastos e falhas nos projetos.

As obras que a lei orçamentária mandava paralisar são, por ordem de valor, a refinaria Abreu e Lima (PE), o Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro, a modernização da refinaria Presidente Getúlio Vargas (PR) e o terminal de Barra do Riacho (ES). Os pagamentos liberados no Orçamento deste ano variam de R$ 6,1 bilhões, caso da Abreu Lima, a R$ 184,3 milhões, o custo estimado para o porto de Barra do Riacho.

Outras 38 obras, inclusive do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), foram mantidas como irregulares Orçamento (que não podem receber recursos públicos em 2010).É a segunda vez na história que o presidente manda liberar verbas para obras consideradas irregulares pelo TCU, por meio de veto. Em 2005, Lula também vetou o bloqueio de dinheiro público para a construção da usina de Angra 3.

Na justificativa de veto divulgada ontem, Lula alega que a paralisação das obras da Petrobras representaria corte de 25 mil empregos e prejuízo mensal de R$ 268 milhões, por causa dos custos de desmobilização e degradação dos trabalhos já feitos. Lula afirma também que o atraso poderia impedir o abastecimento de óleo diesel com baixo teor de enxofre porque "parte dos contratos" apresenta "90% de execução", ou seja, estaria em fase adiantada.

O TCU contestou esse dado e diz que as obras da Abreu e Lima e do Comperj estão no início. Nos casos da Repar e do porto de Barra do Riacho, também existiriam contratos não iniciados ou longe do fim.

Dever cumprido

"Cumprimos a nossa parte", disse o presidente do TCU, Ubiratan Aguiar, que não vê a decisão como um "ataque" ao tribunal. Aguiar disse que cabe ao Congresso se manifestar sobre o veto à lei orçamentária. Ele lembrou que a Petrobras poderia ter evitado a inclusão das obras na lista com a apresentação de informações detalhadas sobre os projetos ao tribunal.

Por meio de nota, a Petrobras informou que não há irregularidades em contratos referentes às obras. Segundo a nota, "existem diferenças nos parâmetros utilizados pelo TCU e pela Petrobras, o que resultou em diferentes valores em alguns contratos destas obras". A estatal diz ainda que "colabora sistematicamente com os órgãos de controle e, quando há diferenças, procura esclarecê-las, o que vem sendo feito no caso destas quatro obras".

Para derrubar um veto presidencial são necessários os votos de dois terços dos deputados e senadores. Essa hipótese é considerada mais do que remota, apesar de o Congresso ter se recusado, em dezembro, a excluir as obras da Petrobras da "lista negra". Na ocasião, o lobby da estatal e do governo foi barrado por senadores na Comissão Mista de Orçamento.

O veto de Lula foi proposto pelo Ministério de Minas e Energia e teria contado com o apoio de governadores que abrigam as obras da Petrobras.

Com a sanção do Orçamento para 2010, decidiu aguardar até março para definir o limite de gastos públicos no ano eleitoral. Até lá, os órgãos públicos vão se basear uma programação "provisória" de gastos.

Habitação fica muito aquém do palanque

DEU EM O GLOBO

A promessa de construir 1 milhão de imóveis não saiu de onde começou: os palanques.

Embora tenha dobrado o crédito, a Caixa não atingiu a meta de 400 mil moradias financiadas no programa Minha Casa, Minha Vida em 2009. Foram 275 mil. Com isso, terá de triplicar o total de imóveis financiados para atingir a meta em 2010.

Caixa dobra crédito, mas fica longe da meta de moradias

Total em 2009 chega ao recorde de R$ 47 bi. CEF atingiu 275 mil dos 400 mil imóveis previstos no Minha Casa, Minha Vida

Karina Lignelli

SÃO PAULO. A Caixa Econômica Federal bateu no ano passado o recorde de financiamentos habitacionais no país, com R$ 47,05 bilhões em créditos para a compra da casa própria, que beneficiaram 896.762 famílias. Embora tenha dobrado o volume de crédito imobiliário, a Caixa não atingiu a meta estabelecida para o programa Minha Casa, Minha Vida, que previa encerrar 2009 com 400 mil moradias populares financiadas.

Do total de financiamentos do banco, R$ 14,1 bilhões foram destinados a moradias populares, o que representou a venda de 275.528 unidades.


Por isso, a Caixa tem o desafio de triplicar o número de unidades financiadas pelo Minha Casa, Minha Vida, para atingir a meta do governo federal de construir um milhão de moradias populares até o fim de 2010.

Segundo o vice-presidente da área de Governo da Caixa, Jorge Hereda, as metas não foram atingidas nos oito meses iniciais devido ao “processo de aprendizado” dos agentes envolvidos na liberação dos financiamentos.

— Mas a velocidade vem aumentando: só no último trimestre de 2009 foram contratadas 188 mil moradias. Será o programa habitacional com mais peso neste ano, inclusive nos feirões da casa própria. A meta é manter a média de contratação de 60 mil unidades/ mês, o que beneficiaria um milhão de famílias até dezembro — garantiu.

Caixa respondeu por 71% do crédito imobiliário em 2009

Até 31 de dezembro, de acordo com Hereda, o total de propostas apresentadas para todas as faixas de renda do programa federal chegou a 656.368, ou 66% da meta: — Por isso, esperamos atingir um milhão já em maio. A perspectiva é receber 30% de propostas acima disso. Ou seja, até julho chegaremos a 1,3 milhão de propostas e tentaremos viabilizar a maioria nos sete meses restantes para bater a meta.

Os R$ 47,05 bilhões liberados pela Caixa representaram 71% de todo o crédito imobiliário do mercado brasileiro no ano passado. E superaram as estimativas divulgadas em dezembro pela instituição, de R$ 41 bilhões em 2009. Os financiamentos com recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), para imóveis novos ou na planta, totalizaram R$ 9,4 bilhões, número 109% maior que 2008, com 144.309 unidades comercializadas — 31%, a mais que em 2008. Para os imóveis usados, os recursos aumentaram 36%, saltando de R$ 5,74 bilhões para R$ 7,84 bilhões. No total, os financiamentos pelo FGTS cresceram 65% no ano passado.

Sem projetar metas para a expansão do crédito habitacional neste ano, a Caixa informou apenas que em janeiro dispunha de R$ 50 bilhões em recursos disponíveis para a casa própria. O montante, contudo, pode ser revisto ao longo do ano — assim como em 2009, em que a provisão inicial para a área era de R$ 27 bilhões.

O vice-presidente da Caixa aposta que os recordes devem continuar sendo quebrados neste ano. Até o último dia 21, a Caixa havia registrado média diária de 145 mil acessos no simulador de financiamento disponível em seu site.

— É um bom número para janeiro, mês considerado fraco para o mercado. Só perde para os dois meses de início da operação do Minha Casa, Minha Vida, em abril e maio de 2009, quando foram registrados 201.311 e 164.328 acessos diários, respectivamente — explicou Hereda.

Eliane Cantanhêde:: Perdeu o bonde e pagou a conta

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

BRASÍLIA - O Brasil começou bem, mas perdeu o bonde na crise de Honduras. A reação brasileira ao golpe de junho de 2009 foi rápida e contundente, em defesa do princípio de que militares não podem catar presidentes eleitos democraticamente e jogar fora em outros países na calada da noite.

Da defesa de princípios à busca de protagonismo, porém, foi um pulo. Ou um salto no escuro. Admitida como verdadeira a versão de que Zelaya chegou sem pedir e sem avisar, o Brasil não tinha outra alternativa se não acolhê-lo na embaixada em Tegucigalpa. Mas deveria acolhê-lo na condição de asilado, como prevê a legislação internacional, e estabelecendo limites. Não fez uma nem outra.

O resultado é que o Brasil agarrou-se a Zelaya, assumiu um só lado da questão, isolou-se e bateu de frente com os EUA e parte da América Latina ao se recusar a tratar a eleição do novo presidente como saída da crise -aliás, a única.

Assim, o bonde hondurenho chegou ao destino com um projeto de união nacional, novo maquinista, Porfírio "Pepe" Lobo, e todos os passageiros que interessam: a Corte Suprema de Justiça, o Congresso, a mídia, a igreja, os EUA, boa parte da comunidade internacional e o mais fundamental, o povo, que votou no novo presidente em eleições cuja lisura não foi questionada nem por adversários.

Mas o governo brasileiro não embarcou. Ficou do lado de fora, sem ter o que fazer nem o que dizer, ao lado da turma da Alba (Aliança Bolivariana para as Américas), que orbita em torno de Hugo Chávez.

Zelaya ganhou quatro meses de casa, comida, telefone, palanque e holofotes de graça na embaixada brasileira, junto com a mulher, a parentada e centenas de amigos, militantes e agregados. E o Brasil, o que ganhou com isso? Ou melhor: e você, ganhou alguma coisa? Não. Só pagou a conta.

Jarbas de Holanda:: Do velho esquerdismo no Fórum Social ao prêmio de “estadista global” em Davos

A ambiguidade do comportamento e das relações do presidente Lula tem esta semana mais uma oportunidade de evidenciar-se por inteiro em dois eventos simultâneos, de forte significado simbólico. Ontem, ele estava em Porto Alegre, ao lado de João Pedro Stédile, do MST, e de outros radicais nativos, latino-americanos e da Via Campesina européia, participando do balanço dos dez anos do Fórum Social Mundial. Num contexto em que cobranças de atos e propostas mais esquerdistas ao Palácio do Planalto foram diluídas pela própria retórica do presidente e pelo respaldo por ele recebido de sindicalistas e de militantes e dirigentes do PT, tudo ao final traduzido em manifestações de apoio ao governo e de prévia hostilidade aos adversários “neoliberais” na disputa da presidência da República. Mas enquanto participava desse diálogo “bolivariano”, Lula já tinha provavelmente definido com sua assessoria o conteúdo do discurso que vai proferir no Fórum Econômico Mundial, que se realiza em
Davos, na Suíça, reunindo os representantes das elites políticas e empresariais do Primeiro Mundo, ao receber o primeiro prêmio – de “Estadista Global” – conferido por elas a um governante. Como reconhecimento ao papel dele no combate aos efeitos da crise financeira desencadeada em 2008 e para preservação e garantia da estabilidade e do horizonte de crescimento do país com base na iniciativa privada. O discurso de Lula em Davos – aonde chegará acompanhado do presidente do BC, Henrique Meirelles – procurará certamente vincular e subordinar o realismo da política macroeconômica à redistribuição de renda, de par
com a retomada da proposta de políticas globais contra a fome e a defesa, insistente, de protagonismo do Brasil no cenário internacional.

Externamente, essa ambigüidade tem sido beneficiada pela identificação (por parte de tais elites) do presidente brasileiro como o contraponto possível – insuficiente por suas atitudes conciliatórias, mas mesmo assim importante – ao radicalismo antimercado e autoritário desencadeado na América Latina pelo chavismo e seus petrodólares. Numa onda que se configurou como capaz de espraiar-se por muito países além dos já envolvidos nela (Bolívia, Equador e Nicarágua); que quase afogou Honduras por meio do fracassado golpe reeleitoral tentado por Zelaya; influente na Argentina e no Paraguai; e buscando submeter a Colômbia, em parceria com as Farc. Mas o peso da referida identificação tende a diminuir progressivamente em face da perspectiva de mudança de cenário na região - de esvaziamento dessa onda com o crescente descontrole econômico na matriz dela, a Venezuela, com a erosão do desbragado populismo dos Kirchners, na Argentina, e com a vitória do liberal Sebastião Piñera, no Chile (que propõe uma ampla articulação antichavista (do México ao Chile, passando pelo Peru e pela Colômbia e incluindo o Brasil).

Internamente, porém, segue prevalecente e sem problema ainda visível a capitalização política feita pelo presidente Lula do prestígio e do relacionamento qualificado de que desfruta junto
aos governos e aos círculos financeiros dos países mais desenvolvidos. As quais, num quadro de consistente retomada do crescimento e apesar de tendências e passos centralizadores e dirigistas de vários setores do governo, desdobram-se em muitos negócios próprios e em associações com o Estado também de grandes empresas nacionais. É o mix dessa capitalização e desse jogo microeconômico com a intensificação dos programas
assistencialistas, o aumento real do salário mínimo e o largo empreguismo na máquina estatal, é a soma desses ingredientes, por mais contraditória que ela seja, que propicia, de um lado bons indicadores econômicos de crescimento do PIB, de baixa inflação, de mais empregos e de reforço do crédito corporativo, e, de outro lado, a melhora dos indicadores sociais e do grau de satisfação e confiança da maioria do eleitorado, que propicia os elevados índices de popularidade do presidente.

Tais índices são tão fortes que deverão poupá-lo de ataques diretos na disputa sucessória, até daqueles que se empenhará em provocar agredindo os adversários. Mas poderão ser
insuficientes como resposta ao desafio básico que ele tem pela frente: assegurar alto grau de transferência dessa popularidade para a candidatura de Dilma Rousseff. Cuja fraqueza própria está gerando ou ampliando dois problemas: a tentativa de grupos petistas de vetar a indicação de Michel Temer como candidato do PMDB a vice e a excessiva ideologização da campanha dela através de propostas ultraquerdistas, como a de institucionalização das invasões de terra e a do “controle popular” dos meios de comunicação, com potencial de quebrar a latitude da pragmática ambigüidade do lulismo.

Jarbas de Holanda é jornalista

Dia D em Honduras

DEU EM O GLOBO

Novo presidente, Porfirio Lobo, toma posse, e Manuel Zelaya deixa embaixada após 128 dias

Ana Lúcia Borges
Tegucigalpa e Rio

O impasse que há quase sete meses domina a cena política de Honduras — disparado pelo golpe de Estado que derrubou o então presidente Manuel Zelaya — chegou ao fim. Ontem, numa cerimônia marcada por segurança reforçada no Estádio Nacional, finalmente tomou posse o presidente Porfirio “Pepe” Lobo, eleito dia 29 de novembro. Duas horas após o novo dirigente ter recebido a faixa presidencial, outra novela se encerrou: Zelaya deixou a Embaixada do Brasil em Tegucigalpa por volta das 15h (19h de Brasília), onde passara os últimos 128 dias, sob forte escolta e driblando o assédio da imprensa. Numa caravana, o ex-presidente rumou para a base aérea da capital, onde embarcou para a República Dominicana num bimotor da Embraer. Antes de partir, entregou ao chefe da embaixada, Francisco Catunda, uma carta de agradecimento ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva pelo apoio durante a crise.

Encontro “cortês” antes da viagem

Eu seu primeiro discurso como presidente, Lobo apelou a uma “necessária e indispensável” reconciliação com a comunidade internacional.

Agradeceu ao presidente da Costa Rica, Óscar Arias, “por ter se interessado (...) numa solução justa e pacífica” para a crise; ao presidente da República Dominicana, Leonel Fernández, um dos protagonistas no acordo que facilitou a saída de Zelaya do país, ao lhe conceder salvo-conduto, e à Organização dos Estados Americanos (OEA), entidade de que Honduras foi suspensa após o golpe. Disse, ainda, que seu mandato durará quatro anos, “nem um dia a mais, nem um dia a menos”. Roberto Micheletti, que ocupava interinamente o cargo após o golpe, não assistiu à cerimônia de posse.

— Acabamos de sair da pior crise política de nossa história democrática, mas conseguimos evitar todos os grandes perigos que afrontavam nossa nação — disse Lobo.

Minutos após a posse, o novo presidente sancionou o decreto aprovado na véspera pelo Congresso, que concedeu anistia política tanto a Zelaya quanto aos integrantes do governo participantes no golpe que o derrubara. Depois da cerimônia, Lobo foi para a embaixada, onde se encontrou rapidamente com Zelaya e Leonel Fernández, e, em seguida, acompanhou-os à base aérea, informou Francisco Catunda, ao GLOBO, por telefone.

— Foi uma conversa rápida, de cerca de cinco minutos, e muito cortês.

Eles se cumprimentaram, Zelaya desejou êxito ao governo de Porfirio Lobo e agradeceu a sua iniciativa. Foi muito correto — disse Catunda, acrescentando que Zelaya tirou fotos com sua comitiva, e, depois, entregou uma carta de agradecimento endereçada a Lula e outra aos diplomatas Catunda e José Wilson Batista, que se revezaram nos últimos quatro meses na representação.

O último dos 128 dias na embaixada foi agitado, mas sem confusões.

Pouco antes do almoço, Zelaya recebeu assessores e familiares — como a mãe, Ortensia, que lhe levou uma sopa de galinha, e a sogra. Recebeu ainda um estilista, responsável por seu terno para a partida e pela roupa de sua mulher, Xiomara Castro, segundo o jornal “La Prensa”. As malas, prontas, foram dispostas no primeiro andar, para agilizar o processo.

E, a fim de facilitar a saída, o ex-presidente pedira que seus simpatizantes, que organizavam uma manifestação de despedida, desobstruíssem as vias de acesso à embaixada e se concentrassem nas proximidades da base aérea.

Ao deixar a representação, porém, Zelaya e seus acompanhantes na viagem à República Dominicana — sua mulher, a filha mais nova, também chamada Ortensia, e o assessor Rasel Tomé — conseguiram escapar da imprensa. Uma hora antes da partida, Ortensia, de 23 anos, disse ao GLOBO que a família “continuaria lutando”, mesmo fora do país: — Representamos a vontade do povo, continuaremos à luz das propostas feitas pela Frente de Resistência (Frente Nacional de Resistência Popular, movimento que exigia a volta do expresidente ao poder) e vamos continuar lutando.

Logo depois, deixaram a embaixada os outros seis zelayistas que ainda permaneciam no local — pessoal de apoio como segurança e limpeza. Segundo Catunda, o plano de Zelaya agora seria passar de 15 dias a um mês na República Dominicana e, depois, morar no México.

Ele pretenderia, ainda, incorporarse ao Parlacen (Parlamento Centroamericano) — presidentes dos países membros da entidade têm direito a um assento ao concluírem seu mandato. No entanto, a decisão de se a vaga será destinada a Zelaya ou a Micheletti, que estava interinamente à frente do país, caberá à Corte Centroamericana, com sede em Manágua.

— Zelaya é muito ambicioso politicamente — disse Catunda.

Colaborou: Ângela Góes dos Santos

Problema de imagem

DEU EM O GLOBO

OPINIÃO

COM A posse do presidente Lobo e a saída de Zelaya do país, anistiado parcialmente, chega ao fim a longa crise institucional em Honduras.

LOBO TEM pela frente o desafio de recuperar a confiança de parte da comunidade internacional e anular sanções impostas após o golpe contra Zelaya.

O Brasil sai com a imagem arranhada por ter sido um joguete da tentativa chavista de implantar em Honduras uma “república” bolivariana, ou seja, um regime populista autoritário.