sexta-feira, 26 de março de 2010

Reflexão do dia – Marcelo Coutinho

A dupla moral a que o Prêmio Nobel da Paz Oscar Arias faz referência, ao condenar a atitude do governo Lula de intransigência prévia no episódio das eleições hondurenhas e completa tolerância com as possíveis fraudes eleitorais no Irã, revela o torto retorno no Brasil da ideia-força lançada por Huntington há 40 anos, e de conteúdo igualmente conservador. Para a política externa brasileira interessaria agora o prolongamento dos governos anti-EUA ou antiocidentais, mesmo que a saída seja autoritária. Dentro desta nova base conceitual da política externa brasileira, que costumava centrar-se no direito e no respeito à soberania, as instituições representativas não são mais importantes do que as correlações de poder hemisféricas e globais.


(Marcelo Coutinho, professor de Relações Internacionais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), no artigo “Diplomacia à brasileira”, ontem, em o Globo)

Fio tênue:: Merval Pereira

DEU EM O GLOBO

A midiatização da política está levando não apenas a que as qualidades de um candidato sejam medidas mais pela sua capacidade de comunicação com o eleitor do que por suas propostas.

A política vivenciada como espetáculo faz com que um presidente como Lula transforme-se em um eterno candidato, mesmo quando já não pode mais se candidatar.

Se não sai dos palanques, se sua prioridade do último ano de mandato é eleger sua sucessora, a agenda governamental transforma-se em uma maratona de inaugurações, mesmo que as obras estejam inacabadas. Essa maneira de fazer política exclui o debate, afasta também a possibilidade de entendimentos com adversários para políticas de Estado.

A política transforma-se em uma permanente disputa corpo a corpo, nós contra eles, num espírito de pelada que não contribui para o desenvolvimento da cidadania.

O problema é que políticos como Lula querem tornar o que é eventual em permanente, negando a validade de uma das pilastras da democracia, a alternância de poder.

E ele não se contenta com pouco. Tem uma popularidade que causa inveja aos políticos de todas as partes do mundo, mas quer a unanimidade.

Quando outro dia mais uma vez queixou-se da imprensa, ele simplesmente disse que os jornalistas que o criticam deveriam olhar as pesquisas de opinião para constatarem que estão indo de encontro à opinião de 83% da população brasileira.

Este é um raciocínio perigoso para um chefe de governo que se diz um democrata convicto. É como se pensar diferente da maioria estivesse proibido, como na prática está proibido na Venezuela, país que segundo Lula tem democracia até demais.

Ontem, Guillermo Zuloaga, presidente da rede de TV venezuelana de oposição Globovisión, foi impedido de sair do país devido a uma denúncia de um deputado governista que o acusa de ter dado declarações desrespeitosas e ofensivas contra o chefe de Estado.

A prisão de Zuloaga se soma a do político oposicionista Oswaldo Álvarez Paz, preso após uma entrevista à mesma Globovisión, em que comentava uma investigação realizada na Espanha que liga a Venezuela a grupos que apoiam o narcotráfico, como as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), e o grupo separatista basco ETA.

Há nesses constantes embates entre governos, democráticos ou não, com a chamada mídia, questões distintas.

Uma é permanente em políticos, seja de que tendência for, que querem ver seus feitos glorificados.

O presidente Lula reclama que a imprensa tem predileção pela desgraça e não quer escrever a coisa certa e escreve a coisa errada. Nesse caso, escrever a coisa errada é criticar o governo em vez de elogiá-lo.

Mas essa reclamação até de notícia boa não é privilégio de Lula. O governador paulista José Serra tem essa fama entre os jornalistas, e ele veio em socorro a Lula repetir o discurso do presidente contra a imprensa.

Assim como Lula acha que a grande imprensa é dominada por uma conspiração contra seu governo, Serra também acha que a Ptpress domina a imprensa, e ontem se queixou de que não faz reportagens sobre suas realizações e obras.

Lula inaugurou duas mil casas e não saiu uma linha.

Serra inaugurou um centro de reabilitação para doentes mentais, e, segundo ele, ninguém da imprensa ligou.

O próprio presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, vem tendo uma confrontação quase permanente com o canal Fox, de propriedade do magnata da mídia Rupert Murdoch e de tendência conservadora.

Obama acusa a Fox de se dedicar totalmente a atacar seu governo, sem exibir nenhuma reportagem positiva sobre sua gestão.

São reações naturais de políticos que seguem a tradição de não separar notícia da propaganda. Tudo o que os governantes querem que seja publicado é propaganda.

O resto é notícia.

Outra questão mais séria é quando os governos tentam controlar a informação, cerceando a liberdade de expressão. O caso da Venezuela é o mais grave entre todos, pois o país ainda não é uma ditadura formalizada e tenta manter uma aparência de democracia.

Enquanto o governo brasileiro se contentar em criticar a mídia dia sim outro também, estará tensionando o ambiente democrático do país, e incentivando atitudes mais radicais contra os meios de comunicação por parte de seguidores menos equilibrados, ou daqueles que, dentro do governo, tentam impor limitações à liberdade de imprensa.

Esse é o limite que o governo tem que resguardar, se não consegue respeitar o direito à informação como um valor em si.

Mas as constantes tentativas de controle social dos meios de comunicação, surgidas desde o primeiro ano de governo com o Conselho Nacional de Jornalismo, e repetidas em diversas ocasiões desde então, demonstram que Lula é mais do que simplesmente um ranzinza em busca de elogios unânimes.

Ele não entende a liberdade de expressão como um valor democrático, como por exemplo, Thomas Jefferson, autor do seguinte depoimento: Se me coubesse decidir se deveríamos ter um governo sem jornais ou jornais sem um governo, não hesitaria um momento em preferir a última solução.

A necessidade de a imprensa ocupar um lugar antagônico ao governo foi percebida com clareza pelos fundadores dos Estados Unidos, e por isso tornaram a liberdade de imprensa a primeira garantia da Carta de Direitos.

Sem liberdade de imprensa, sabiam, as outras liberdades desmoronariam.

Porque o governo, devido à sua própria natureza, tende à opressão. E o governo, sem um cão de guarda, logo passa a oprimir o povo a que deve servir, explicou o famoso jornalista americano Jack Anderson.

Entre a reclamação dos governantes e a tentativa de controle da informação está o tênue fio que sustenta a democracia.

Propaganda enganosa:: Dora Kramer

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Cenografia eleitoral não é prerrogativa dos candidatos às eleições de outubro com estruturas dos Poderes Executivos à disposição. Elas são apenas mais evidentes. Os deputados federais usam a Câmara do mesmo jeito, com a vantagem de nem precisar deixar seus mandatos para isso e ainda ficar imunes a críticas.

É o crime perfeito. Ou haverá outra razão que não a proximidade da eleição para a Câmara dos Deputados incluir agora em sua pauta de votações propostas moralizadoras para as quais não deu a menor bola durante toda a legislatura?

Qual outro motivo faria a Câmara, que nenhuma providência tomou contra a farra das passagens aéreas, sugerir de repente, não mais que de repente, normas mais rígidas para o Conselho de Ética da Casa, um colegiado que outro dia mesmo se lixou para a opinião pública? Só a proximidade das eleições.

A questão dos chamados fichas-sujas é típica. A discussão foi levantada antes da eleição municipal de 2008. Não se conseguiu estabelecer nenhum impedimento nem mesmo que os candidatos, antes tão interessados em debater o assunto, levassem o tema a debate durante a campanha.

Passadas as eleições, em 2009 foi apresentada uma emenda popular com 1,6 milhão de assinaturas, que a Câmara simplesmente ignorou. Apenas neste ano foram realizadas audiências públicas e, mediante muita insistência e meia dúzia de deputados, o presidente Michel Temer concordou em marcar o início da votação para o dia 7 de abril.

Naquela data serão consultados os líderes dos partidos. Depois disso, haverá consultas às bancadas. Aí, então, votação em plenário. Tudo correndo nos conformes, o mês de abril, concluiu-se o processo. Em maio, a emenda vai para o Senado. Óbvio que um assunto dessa natureza não passará sem alterações.

Portanto, voltará à Câmara. Em junho, os partidos estarão ocupados com as convenções para escolha de candidatos a presidente, governadores, deputados e senadores. Em julho, recesso parlamentar e Copa do Mundo. Em agosto, começa a campanha e dificilmente alguém aparecerá em Brasília para votar coisa alguma.

É de se perguntar: se a proposta estava no Congresso desde o ano passado por que dar andamento a ela em cima da hora? Só pode ser por estratégia. Porque não dá tempo. Porque ninguém quer aprovar, mas todos querem faturar as boas intenções.

O mesmo ocorre com as mudanças "rigorosas" nas regras do Conselho de Ética. Em 2009, a Câmara viveu o ano inteiro em crise, do começo ao fim. Nada fez a não ser celebrar o compadrio, desmoralizar o decoro, livrar todos os que estiveram implicados em complicações de natureza ética.

Às vésperas das eleições, faltando três meses para o início da campanha propriamente dita, é que suas excelências acharam por bem dar uma satisfação à opinião pública.

Deveriam ter pensado nisso antes e dedicado ao menos parte dos quatro anos de mandato aos bons combates. De preferência de interesse coletivo.

Agora é tarde. A sorte está lançada. Pode ser que seja tudo como dantes e a lassidão prevaleça. Ou pode ser que não, que desta vez quem se lixe seja a opinião pública, cansada de se deixar enganar.

Panaceia. O fato de o deputado Ciro Gomes não ser o inventor não o desqualifica como porta-voz da recorrente proposta de um governo de coalizão entre PT e PSDB. A intenção é das melhores. O problema é a suposição de que os dois partidos detenham o monopólio da decência e que nos outros grasse a safadeza, sem exceções.

A história atesta o oposto, e supor diferente é fazer aliança com o equívoco. Homens e mulheres de bem e do mal, óbvio, há em toda parte.

Basta ver como se imaginava que os civis uma vez assumindo o poder com a redemocratização, reorganizado institucionalmente o País mediante a Assembleia Nacional Constituinte tudo estaria resolvido.

Mal sabíamos que conquistávamos a democracia, mas era preciso saber o que fazer com ela.

Assim é com a relação governo-partidos-sociedade. Não basta juntar os que nos parecem mais distintos e achar que está tudo resolvido porque não está.

Maquiadores e mágicos::Roberto Freire

DEU NO BRASIL ECONÔMICO

Na próxima semana, o governo Lula lançará mais um PAC, o segundo e seu rosário promessas de obras que, só com discurso, buscarão enfrentar as precárias condições de nossa infra estrutura física.

Palavreado que deverá virar estradas, urbanização de assentamentos, saneamento, redes de abastecimento de água e tudo o mais que a platéia pedir ou a cada região necessitar. Afinal, são obras construídas ali, com palavras e, como elas, desfeitas com o vento.

Foi assim com o primeiro PAC. Pelos números divulgados pela própria Casa Civil, dos resultados desse programa já se percebe a mágica na gestão.

Segundo os dados da ONG Contas Abertas, a metodologia de divulgação dos números usada pela Casa Civil nas cerimônias de balanço oficial exclui as obras de saneamento e habitação desde o primeiro anúncio, apesar de estarem previstas no orçamento do programa.

Pelos dados disponíveis, sabemos que no Nordeste, todos os estados apresentam percentual de obras concluídas entre 4% e 11% em relação ao total de empreendimentos previstos para cada unidade federativa. O desempenho dos projetos concluídos na região atinge apenas 7% do total, excluindo os resultados do estado do Piauí.

No entanto, os dados oriundos da Casa Civil apontam que 40,3% das ações do PAC estão concluídas, considerando o montante de R$ 256,9 bilhões que foram aplicados em ações entregues até dezembro.

O problema é que quando confrontamos esses números com a realidade, o que temos é que apenas 11% do PAC I foram concluídos, e mais da metade sequer saiu do papel. Pura maquiagem. Verdadeira mágica!

O curioso desse monumental esforço de propaganda e campanha eleitoral fora do prazo legal é que, segundo levantamento do jornal O Estado de S. Paulo, em torno de 60% das obras inauguradas nem prontas estavam, e uma não dispunha sequer de licença ambiental.

Depois que a caravana do governo e de sua candidata passa, ocasião em que o presidente se autoelogia, pede voto, critica adversários, as emissoras de TV filmam, as de rádio e os jornais fazem entrevistas, o palanque é desmontado e tudo volta a ser como antes.

Sem perspectiva de conclusão, sem movimento de máquinas a trabalhar, a cidade e o estado esperam, esperam, esperam... Todo aquele palavrório nem sai do papel.

Às vezes, nem vai para o papel censurado que é por seus assessores de comunicação. Assim é um programa movido a promessas, tocado com o combustível da propaganda eleitoral. Assim fica fácil.

Em uma campanha eleitoral que já dura um ano e meio, afrontando a Justiça Eleitoral, o presidente e a ministra passam com falatório e querendo amealhar confiança, aplausos e votos pelo país e largam a conta para o sucessor.

Com esse PAC empacado o presidente Lula e sua candidata Dilma ainda pretendem engabelar o povo brasileiro com um novo pacote ou ajuntamento de obras. Não conseguiu fazer um, mas, promete dois. Um escárnio!

Roberto Freire é presidente do PPS

Horror à política:: Fernando de Barros e Silva

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

SÃO PAULO - Não é preciso ser muito esperto para perceber que a greve dos professores paulistas liderada pela Apeoesp tem motivações políticas. Mas também não é preciso conhecer muito a história para saber que já havia greves, "políticas" inclusive, antes de o PT existir. Além disso, a estigmatização da "greve política" parece constrangedora para quem ingressou na vida pública como presidente da UNE na época do golpe de 64.

A Apeoesp reúne, de fato, o que há de pior no espírito corporativo. A aversão dos grevistas a qualquer política pública e salarial baseada na meritocracia é escandalosa. E nada justifica que um docente rejeite ser avaliado de forma periódica.

Por outro lado, também é fato que a categoria, de 230 mil pessoas, ganha pouco (o salário inicial é de R$ 1.800,00) e não teve nos últimos anos nem direito à reposição da inflação. Existe, pois, uma demanda material, antes de ser "ideológica".

A verdade é que José Serra dispensa aos grevistas exatamente o mesmo tratamento de que julga ser vítima. Demoniza, desqualifica, não reconhece os professores como interlocutores e parte de conflitos próprios do jogo democrático. Recusa-se a conversar porque são petistas, porque estão a serviço da campanha adversária, porque são, enfim, uns "energúmenos" -como disse a um infeliz que protestava.

Se no país falta oposição a Lula, os tucanos de São Paulo, há 16 anos no poder, também ficaram muito mal acostumados. Deve ser fácil governar São Paulo tendo a Assembleia Legislativa a seus pés. Sempre que a política não se desenrola entre quatro paredes, com atores previsíveis, Serra se revela inábil. Sua intransigência, que pode sugerir uma virtude republicana, também é um sinal de pendores autoritários.

Em 2008, sua condução desastrosa da greve da Polícia Civil, recusando-se ao diálogo simplesmente porque acreditava ter razão, desembocou numa batalha campal com a PM a poucas quadras do Bandeirantes. Desde então, pode-se dizer que Serra não aprendeu nada.

Plenário do TSE pune Lula por campanha antecipada

DEU EM O GLOBO

Há uma semana, em outro caso, multa foi aplicada só por um ministro

O plenário do Tribunal Superior Eleitoral condenou o presidente Lula, por 4 a 3, a pagar multa de R$ 10 mil por campanha antecipada para a ministra Dilma Rousseff, pré-candidata do PT à Presidência. Para os ministros, Lula infringiu a lei eleitoral ao promover a candidata em evento num sindicato de São Paulo, em janeiro. O julgamento, que estava 4 a 2 a favor do presidente, sofreu reviravolta depois que o ministro Félix Fischer votou contra Lula. O presidente do TSE, Ayres Brito, mudou seu entendimento e também apoiou a condenação. Pela mesma razão, Lula já recebera multa de R$ 5 mil, aplicada só por um ministro. Mais cedo, numa inauguração em SP, o presidente havia dito que não podia citar a ministra. "Quem vai pagar a minha multa?", ironizou. Lula esteve com Dilma e José Serra (PSDB). O pré-candidato tucano, repetindo o presidente, criticou a imprensa.

TSE impõe punição a Lula

Pela primeira vez, plenário aplica multa por campanha antecipada para Dilma

Isabel Braga

BRASÍLIA - Numa reviravolta durante a sessão de ontem, o plenário do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) condenou, pela primeira vez, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva por fazer campanha eleitoral antecipada para a pré-candidata do PT à Presidência, a ministra Dilma Rousseff. Por quatro votos a três, os ministros multaram Lula em R$ 10 mil por entenderem que o presidente infringiu a lei eleitoral e promoveu sua candidata em evento realizado em janeiro, num sindicato de São Paulo.

Os ministros não consideraram o pedido da oposição de também punir Dilma. Ainda ontem, Lula foi notificado oficialmente de outra condenação, tomada pelo relator Joelson Dias, que lhe aplicou multa de R$ 5 mil, também por promoção da candidatura Dilma, durante inauguração em Manguinhos, no Rio, em janeiro.

Até segunda-feira, Lula poderá recorrer ao plenário do TSE contra a multa imposta por Joelson Dias.

No caso da decisão de ontem, o apoio velado a Dilma teria ocorrido em discurso de Lula numa solenidade na sede do Sindicato dos Trabalhadores em Processamento de Dados de São Paulo, em 22 de janeiro: Então, eu penso que a cara do Brasil vai mudar muito. E quem vier depois de mim e eu, por questões legais, não posso dizer quem é; espero que vocês adivinhem, espero , quem vier depois de mim já vai encontrar um programa pronto, com dinheiro no Orçamento, porque eu estou fazendo o PAC 2, porque eu preciso colocar dinheiro no Orçamento para 2011, para que as pessoas comecem a trabalhar, disse Lula, na ocasião.

Na sessão anterior, no último dia 16, o relator do processo, ministro Henrique Neves, entendeu que não estava caracterizada conduta proibida. Seu voto foi acompanhado pelos ministros Ricardo Lewandowiski e Carmen Lúcia.

O ministro Félix Fischer pediu vista e, antes de encerrar o debate, o presidente do TSE, Carlos Ayres Britto, anunciou o voto com o relator.

Presidente do TSE muda seu voto

Ontem, na retomada do julgamento, Fischer comentou que a questão estava decidida, mas que, mesmo assim, gostaria de ler seu voto. Para ele, Lula não se limitou a citar, de forma simulada, a pré-candidata, mas também divulgou seu apoio a ela. E acrescentou que o discurso de Lula foi retransmitido pela emissora de TV do governo (EBC) e que, quando ele fez referência indireta a seu sucessor, a câmera da TV mostrou um close de Dilma.

Não lhes é facultado (aos titulares do mandato) incutir um candidato no imaginário do eleitor, ainda que de forma dissimulada. Ainda que esteja totalmente definido, eu votaria pela aplicação da multa.

Ayres Britto então pediu a palavra para explicar que o fato de o ato ter sido transmitido por emissora pública, com a referência subliminar a Dilma, modificou seu entendimento inicial: Vossa Excelência captou bem a essência. O ato foi coberto (pela TV). Se já vivemos a idade média, hoje vivemos a idade mídia. Que tem efeito multiplicador instantâneo, caracterizando o favorecimento de uma campanha.

O relator Henrique Neves tentou explicar sua posição, frisando que a jurisprudência do TSE, até o momento, era a de que não bastava citar o nome do candidato ou dizer que ele era seu candidato.

Se for simplesmente dizer que é a pré-candidata, todos os jornais estariam cometendo irregularidades. A jurisprudência tem sido a de que é preciso dizer que é (candidato) e que é o melhor. Por isso, neste caso, entendi que não havia propaganda antecipada justificou Neves.

Fischer rebateu, destacando que as declarações subliminares não são feitas por gente ingênua. O ministro Fernando Gonçalves acompanhou o voto.

E Arnaldo Versiani desempatou o julgamento a favor da multa a Lula.

Tucano critica bondades

DEU EM O GLOBO

BRASÍLIA. Coube ao líder do PSDB na Câmara, João Almeida (BA), ocupar a tribuna, ontem, para criticar a decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de afrouxar a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) para permitir que pequenos municípios, mesmo inadimplentes, continuem a receber verbas do programa Territórios da Cidadania.

Para o tucano, a medida é de interesse político eleitoral do PT porque atende municípios onde o partido cresceu nas últimas eleições.

A mensagem presidencial anunciando o envio do projeto de lei à Câmara foi publicada no Diário Oficial de ontem, mas o texto está sofrendo "ajustes" na Casa Civil. O PSDB reforçou os ataques por considerar a aprovação da LRF um dos êxitos do governo de Fernando Henrique Cardoso.

Trata-se, sim, do mecanismo para facilitar a transferência de recursos públicos para pequenos municípios, onde está o eleitorado mais vinculado ao seu governo e ao PT.

Então, vamos dar dinheiro, de qualquer jeito, a esses prefeitos para que possam fazer a campanha da candidata do PT. Essa é a leitura correta disse João Almeida.

Na eleição de 2006, quando o presidente Lula foi reeleito, derrotando o tucano Geraldo Alckmin, os dados do primeiro turno mostraram a força do petista nos municípios menores. O líder do DEM, deputado Paulo Bornhausen (SC), disse que a oposição tentará ficar contra a proposta, mesmo sabendo que a medida provocará pressões dos prefeitos sobre os partidos:

O economista Raul Veloso criticou a medida.

Para ele, há risco de exceções afetar as contas públicas.

Sou radical em relação à LRF. Onde passa um boi, passa boiada.

Qualquer rompimento da LRF, por mais bem intencionado, representa um problema, porque abre porta para os não bem-intencionados.

Mais ministros, e também mais cargos

DEU EM O GLOBO

Governo transforma secretarias em ministérios e abre espaço a indicações políticas

Jailton de Carvalho e Cristiane Jungblut

BRASÍLIA. A oposição acusou ontem o presidente Luiz Inácio Lula da Silva de criar, por medida provisória, 207 novos cargos no governo que podem ser preenchidos, em parte, com indicações políticas. A medida provisória 483 transforma as secretarias especiais de Direitos Humanos, de Promoção de Igualdade Racial, de Políticas para Mulheres e de Portos em ministérios.

Os cargos serão criados na estrutura dos ministérios da Saúde e da Integração Nacional e terão impacto de R$ 9 milhões por ano na folha de pagamento do governo federal.

O deputado Fernando Coruja (PPS-SC) disse que apresentará emenda para derrubar os artigos que criam novos cargos. Para ele, o governo abriu vagas para acomodar aliados.

Não pode o governo passar por cima da Constituição que exige concurso para permitir que a companheirada ocupe cargos a poucos meses da eleição disse Fernando Coruja.

Segundo ele, a transformação das secretarias em ministérios resultará na conversão de 481 funções comissionadas em 73 cargos DAS que só podem ser destinadas a concursados. Parte dos DAS podem ser preenchidos com indicações políticas. O deputado informa que a medida provisória cria 118 cargos no Ministério da Saúde e 16 no Ministério da Integração. Entre os novos cargos da Saúde, 12 são DAS 5 e 6, que podem ser preenchidos com indicações políticas.

O governo Lula tem 23 mil DAS e argumenta que 70% são preenchidos por servidores de carreira. Os DAS 5 e 6, mais altos, são de livre provimento.

O deputado Arnaldo Madeira (PSDB-SP) que acompanha a evolução dos gastos com pessoal disse que a criação de 134 cargos não se justifica.

Sem processo seletivo, é o chefe que contrata disse Madeira, lembrando que as MPs, pela Constituição, só devem ser editadas em casos de urgência.

O Ministério do Planejamento informou que os cargos criados na Saúde vão compor a estrutura da Secretaria de Assistência à Saúde Indígena assunto que estava a cargo da Fundação Nacional da Saúde (Funasa). A partir de agora, o ministério assume a responsabilidade.

Segundo o Ministério do Planejamento, a transformação de 481 funções técnicas em 69 DAS e 4 cargos de natureza especial significará só uma mudança de nomenclatura, sem despesas. O ministério sustenta que as substituições de funções comissionadas em DAS ou viceversa faz parte da rotina da administração federal e não resulta em despesas extras.

Alunos da UnB tentam invadir Presidência

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Manifestação para cobrar pagamento de adicional de 26,05% a servidores da universidade acabou em troca de empurrões e socos com PMs

Tânia Monteiro / BRASÍLIA

Professores, servidores e alunos da Universidade de Brasília (UnB), em greve desde o dia 9, enfrentaram seguranças da Presidência e policiais militares ontem, quando tentaram invadir o Centro Cultural do Banco do Brasil. O CCBB é onde funciona provisoriamente a sede do governo federal.

Na confusão, houve troca de socos e empurra-empurra. A Polícia Militar conteve os manifestantes com cassetetes, machucando levemente duas pessoas.

A paralisação foi deflagrada porque o Ministério do Planejamento anunciou que vai suspender um adicional de 26,05% que professores e servidores da UnB tiveram incorporados aos seus salários por decisão judicial. O Ministério do Planejamento cortou o adicional por considerá-lo indevido.

Os manifestantes queriam falar com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Mas ele e a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, não estavam no CCBB porque cumpriam agenda em São Paulo.

"Queremos que o Ministério do Planejamento reabra as negociações e cumpra a decisão judicial que nos é favorável", disse Antonio Guedes, coordenador do Sindicato dos Trabalhadores da Fundação Universidade de Brasília, vinculado à CUT.

Representantes dos grevistas foram recebidos por assessores de Lula e da Secretaria-Geral, que asseguraram que trabalharão para abrir um canal de negociação com o Planejamento, mas não garantiram qualquer encontro com o presidente.

Determinações. Em nota, o Planejamento diz que não está impedindo o pagamento pela UnB, mas ressalva que a universidade não está cumprindo as determinações da Justiça, nem encaminhando os dados completos de pagamento a seu pessoal para ser processado pelo órgão. A nota acrescenta que, por determinação da ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), assim que a Universidade de Brasília ajustar os pagamentos da URP (que motivou a ação judicial), como determina a decisão do Supremo Tribunal Federal, o ministério editará folha suplementar para homologar o pagamento.

Presidente divide mesa com grevista que inquieta Serra

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Fausto Macedo

Nos domínios de Lula e do PT, Bebel Noronha, a sindicalista que inquieta o governo José Serra (PSDB) - há 19 dias ela conduz a greve dos professores - roubou a cena ontem no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC. Sob aplausos de 300 pessoas ela sentou-se à mesa com o presidente e a ministra Dilma Rousseff na abertura do 2º Congresso das Mulheres Metalúrgicas.

Ganhou elogios do presidente do sindicato, Sérgio Nobre, que a chamou de "nossa querida", e até camiseta roxa, igual à que Lula e Dilma ganharam. "Cumpro meu papel", disse ela depois. "Sou sindicalista, eleita pela base. Eu estou no lugar certo."

Governador paulista critica imprensa por 'leviandades'

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Silvia Amorim
Pré-candidato do PSDB à Presidência, o governador José Serra acusou ontem a imprensa de cometer "leviandades" e manter na "clandestinidade" ações da sua gestão. As queixas foram feitas um dia depois de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva dizer que jornais e TVs agem de "má-fé" e dão informações erradas sobre seu governo.

"Outro dia nós apresentamos resultado de pesquisa que permaneceu clandestina na imprensa, evidente, sobre o índice de satisfação de atendimento dos pacientes do SUS nos hospitais", reclamou o tucano, durante cerimônia de entrega de um centro de radioterapia no Instituto do Câncer, na capital paulista. "Eu só espero que não vão dizer que eu vim aqui inaugurar obra inacabada ou ressonância que não começou a funcionar."

O serviço de radioterapia ainda não está disponível. Segundo o diretor do Instituto do Câncer, Giovanni Guido Cerri, o atendimento começará em abril. O governador disse que vai voltar à unidade para fazer um check-up antes da campanha.

Serra acusou a imprensa paulista de ser leviana. "Eu fui inaugurar o centro de atendimento integrado à saúde mental prontinho (anteontem) e transmitiram ao mundo que fui entregar obra inacabada. Isso se chama leviandade e não escapa nenhum grande jornal de São Paulo."

Dilma, Serra e Lula: clima de campanha

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Serra e Dilma disputam feitos na saúde

José Maria Tomazela

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o governador de São Paulo, José Serra (PSDB), e a ministra da Casa Civil Dilma Rousseff, foram personagens de um embate político em torno do tema saúde, ontem , em evento no interior paulista.
Ao discursar, antes de Lula, Serra cobrou melhorias na área, apesar de considerar o Serviço Único de Saúde (SUS) o melhor da América Latina. "Temos de torná-lo cada vez melhor, com atendimento mais de primeira classe. Não podemos ter na saúde atendimento de primeira e de segunda classe."

Em resposta,o presidente disse que o SUS está se aperfeiçoando. "Tudo o que a gente tenta dar para todo mundo sai de pouca qualidade, mas o Serra tem razão, é o melhor plano de saúde da América Latina."

Dilma, ao discursar, criticou indiretamente a falta de adesão do governo paulista ao Sistema de Atendimento Móvel de Urgência (Samu). No Estado, o programa funciona graças a acordos com prefeituras. "O governo federal não consegue sozinho levar à frente essa política generosa que é implantar o Samu e dar cobertura a 100% dos brasileiros se não contar com parcerias com os prefeitos. Aqui em São Paulo, o governo federal participa também do custeio, ou seja, tira dinheiro do bolso e ajuda pagar os médicos, enfermeiros e a sustentar esse projeto que é o Samu."

As declarações foram dadas na solenidade de entrega de 650 ambulâncias do Samu, na empresa Rontan, em Tatuí, a 137 km de São Paulo - os veículos estavam prontos desde o final de fevereiro. Lula repetiu críticas à imprensa, alegando que, se não estivesse na entrega das ambulâncias, o evento não mereceria "nem uma notinha de rodapé". Aplaudido pelos dois mil trabalhadores da empresa, fez brincadeiras e se considerou "quase um portador de deficiência" por ter perdido um dedo mínimo em acidente de trabalho. "Fosse hoje, teriam implantado o dedo", disse, depois de criticar o elitismo da saúde no Brasil.

Lula não se referiu ao fato de o governo paulista não ter aderido ao Samu, mas destacou que havia desconfiança quando o programa foi criado, em 2004. Sem citar nomes, disse que a prefeitura do Rio, na época, não pôs para funcionar 80 ambulâncias que recebeu. "Só para ter ideia, nem o Bolsa-Família eles cadastraram, por achar que o governo federal não deveria chegar até os pobres do Rio de Janeiro." Lula disse que até julho voltará à cidade para entregar mais 1.650 ambulâncias. Disse ainda que o Samu deverá dispor de aviões e helicópteros.

Serra não considerou ter havido crítica a seu governo e disse que o governo estadual coopera como governo federal. "De nossa parte há uma iniciativa que complementa todo o sistema de saúde, que é o hospital e o atendimento de emergência. Nos últimos três anos fizemos dez hospitais novos em São Paulo."

Dilma encerrou seu discurso com referência ao slogan "a esperança venceu o medo", usado por Lula na campanha de 2002. "Nós podemos transformar (o País) e, sobretudo, nós vamos fazer isso, cercados por essa imensa força desse sentimento que é a esperança que mais uma vez vem vencendo o medo no Brasil", discursou a ministra.

Imposto do cheque
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse ontem que o próximo presidente terá de encontrar um substituto para a CPMF, "Não é possível fazer saúde neste país sem dinheiro, pois custa caro."

PONTOS-CHAVE

Embate

Durante entrega de 650 ambulâncias do Samu, ontem, em Tatuí (SP), tucanos e petistas travaram uma batalha de números e conquistas na área da saúde.

Frota

3,8 mil veículos: Dilma disse que até o fim do ano o País contará com mais que o dobro das atuais 1.488 ambulâncias do Samu.

Hospitais

Serra afirmou que seu governo complementa as ações do Samu, investindo na rede hospitalar. Segundo ele, nos últimos três anos foram feitos dez novos hospitais no Estado.

Dirceu pede que Lula estenda a mão

DEU NO CORREIO BRAZILIENSE

Ex-ministro, citado como um dos responsáveis pelo esquema de compra de parlamentares, enviou judicialmente oito perguntas ao presidente em busca de subsídios para sua defesa

Tiago Pariz

O ex-ministro José Dirceu (PT) quer a aprovação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em documento incluído no processo contra ele que corre no Supremo Tribunal Federal, o deputado cassado apresentou oito questões para Lula responder. Elas tratam dos papéis que Dirceu desempenhou na campanha presidencial de 2002, à frente da Casa Civil e internamente no Partido dos Trabalhadores.

O mais importante é que José Dirceu quer que Lula corrobore a versão de que ele não participou de qualquer negociação financeira na campanha de 2002. E, no específico, quer ouvir do titular do Planalto que não tratou do acordo entre PT e PL (hoje PR). Segundo o ex-presidente da legenda, deputado Valdemar Costa Neto (SP), o negócio foi fechado em R$ 10 milhões.

O ex-ministro quer o aval do presidente para reforçar sua tese de que não teve qualquer envolvimento no escândalo do mensalão e não fez negociata político-financeira com partidos, com o PT ou com o publicitário Duda Mendonça, responsável pela campanha de 2002 e réu no caso do mensalão.

Dirceu também pede para Lula afirmar se ele, enquanto exerceu o cargo de ministro-chefe da Casa Civil, administrava questões internas do PT. Na pergunta de número quatro, questiona se o presidente pode afirmar se, como ministro, praticou algum ato indevido para beneficiar entidades privadas, especificamente no que se refere a crédito consignado.

Um auxiliar do presidente ouvido pelo Correio leu o documento e disse que Lula não responderia a todas as perguntas. Achou descabido questionar o presidente sobre assuntos internos do PT. Essa pergunta é para o Genoino, afirmou, citando o deputado José Genoino(1)

(PT-SP), também réu no mensalão, que na época era o presidente da legenda.

Núcleo base

Dirceu, Genoino e o ex-tesoureiro Delúbio Soares são apontados pelo Ministério Público como o núcleo político do mensalão. Delúbio é considerado o operador do esquema por ter distribuído o dinheiro aos partidos aliados. Antes da eleição, segundo as investigações, houve uma reunião entre PT e PL para discutir o apoio, que só teria sido fechado graças ao compromisso de repassar R$ 10 milhões. Em depoimento à CPI dos Correios, em 2005, Valdemar disse que o repasse foi negociado com Delúbio e isentou o presidente Lula de qualquer participação. Sequer citou Dirceu.
Depois, em entrevistas, o deputado do PL afirmou que Dirceu tratou pessoalmente do valor e disse que Lula soube do acordo financeiro. Se conseguir convencer o ministro Joaquim Barbosa de que essa negociata não teve o dedo do ex-ministro, a defesa do ex-ministro acredita que dará um passo importante para inocentá-lo.

Na avaliação do auxiliar do presidente, Dirceu deveria ter se limitado a três perguntas e não se alongar em questionamentos sobre se houve ilicitudes na votação das reformas(2)
da Previdência e Tributária, como feito nos questionamentos de números cinco e seis, ou se há problemas em um ministro receber representantes de empresas privadas ou financeiras. A defesa termina o questionário perguntando se Lula conhece algum fato que desabone a pessoa de José Dirceu de Oliveira e Silva. Essa questão também foi classificada como subjetiva e desnecessária pela fonte ouvida pela reportagem.

O presidente ainda não respondeu as questões formuladas e encaminhadas pelo Ministério Público há cerca de três meses. As perguntas de Dirceu, elaboradas por sua defesa, estão dentro do processo cujo relator é o ministro do Supremo Joaquim Barbosa. Isso não significa que o presidente figure como testemunha de algum dos réus, especialmente de Dirceu. O deputado cassado Roberto Jefferson (PTB), que denunciou o mensalão, tem se recusado a enviar os questionamentos por entender que Lula deveria responder como acusado. O julgamento sobre se o presidente vira réu ou não estava marcado para quinta-feira da semana passada, mas foi adiado. Há uma expectativa dessa análise ficar para a próxima semana. Ministros têm dito que dificilmente isso ocorrerá, sustentando que o próprio Ministério Público não incluiu Lula na denúncia.

Procurada, a assessoria de imprensa de Dirceu informou que ele prefere se manifestar sobre a ação penal somente perante o Supremo Tribunal Federal.

1 - Renúncia à Presidência

No processo do mensalão, José Genoino foi denunciado por corrupção. Ele é acusado de negociar o pagamento a parlamentares da base aliada do governo Lula em troca de apoio político em votações importantes para o Executivo. Como consequência das denúncias, renunciou à Presidência do partido. Tempos depois, elegeu-se deputado federal.

2 - Repasses e votações

Durante a CPI dos Correios, a oposição elaborou um gráfico que tentava coincidir os saques de agências bancárias em Brasília por deputados e assessores com votações importantes do governo, como as reformas da Previdência e Tributária. Os governistas rechaçam qualquer vinculação e negam que os repasses a partidos aliados tenham sido motivados pelas votações. O dinheiro serviu, na versão do PT, para saldar dívidas de campanha através de caixa dois.

Memória

Recompensa aos partidos fiéis

O acordo entre o PT e o PL só foi efetivado porque os petistas se comprometeram a repassar R$ 10 milhões aos cofres da legenda aliada, segundo a versão do então presidente da legenda e deputado Valdemar Costa Neto (PR-SP). Esse valor, de acordo com ele, jamais foi pago integralmente. Durante o governo, o tesoureiro do PT, Delúbio Soares, repassou em prestações um total de R$ 6,5 milhões, que Valdemar admite ter recebido. O Partido dos Trabalhadores também pagou ao PTB, de Roberto Jefferson, que reconheceu que embolsou R$ 4 milhões.

Segundo Delúbio, depois da vitória de Lula, o PT acumulou dívidas imensas e difíceis de serem quitadas. Foi quando teria aparecido um facilitador, o empresário Marcos Valério de Souza, que abriu as portas financeiras de bancos de conhecidos dele, pegando empréstimos em nome de suas agências de publicidade SMPB e DNA Propaganda e repassando ao partido aliado.

Nessa época, os envolvidos contam que o PT vivia em bonança; deputados e assessores se revezavam para sacar dinheiro, dívidas eram quitadas sem pestanejar. O complicador do esquema é a suspeita de fraude em fundos de pensão para desviar recursos ao esquema. O segundo problema é que dinheiro público teria irrigado os caixas do escândalo. O Banco do Brasil, que administra o fundo da Visanet, antecipou pagamento de R$ 23,3 milhões para a DNA Propaganda, de Marcos Valério, por um serviço que suspeita-se não ter sido realizado.

O Iuperj pede socorro:: Luiz Carlos Azedo

DEU NO CORREIO BRAZILIENSE

Brasília-DF - Alô, alô, governador Sérgio Cabral (PMDB). Nem só a perda dos royalties pode afundar o Rio de Janeiro. A falência de um dos seus centros de excelência acadêmica também empurra para baixo cariocas e fluminenses, pois é iminente o fechamento do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj), cujo programa de pós-graduação em ciência política e sociologia é um dos mais respeitados do país. A instituição está fechando as portas porque a tradicional Universidade Cândido Mendes, mantenedora do Iuperj, também anda mal das pernas

Nos últimos 40 anos, o Iuperj foi um bastião da resistência democrática e das ideias renovadoras da política e da vida social. Seus programas gratuitos de Ciência Política e Sociologia fomentaram teses de doutorado, dissertações de mestrado, diplomaram doutores estrangeiros e brasileiros. A instituição mantém 11 grupos de pesquisa cadastrados no CNPq. A maioria dos mestres que formou leciona em universidades (41% em instituições públicas e 23% em instituições privadas). Cerca de 1.230 intelectuais de todo o país pedem socorro para a instituição, num abaixo-assinado que pode ser subscrito no endereço www.iuperj.br/abaixoassinado.php

Defesa

O presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG), encaminhou um pedido de informações ao ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, sobre o impacto dos cortes no orçamento no programa de reaparelhamento das Forças Armadas.

Anistias. A 34ª Caravana da Anistia, ontem em São Paulo, anistiou mais oito ex-perseguidos políticos, que foram vítimas da chacina da Lapa ou participaram, na época da ditadura, da Guerrilha do Araguaia e do Partido Comunista do Brasil. Em nove anos, a Comissão de Anistia já apreciou 54mil processos.

Ficha-limpa

A Executiva do PDT-DF resolveu passar um pente-fino na chapa de candidatos às eleições do GDF. Aprovou por unanimidade uma resolução que exige ficha limpa de todos os candidatos a serem homologados pela legenda. Segundo o presidente do PDT, Ezequiel Nascimento, o partido não precisa esperar o Congresso aprovar a lei dos ficha-limpa para adotar esse procedimento.

Caneta

O governador José Maranhão (PMDB) está numa queda de braço com a Assembleia Legislativa da Paraíba, que resolveu convocar o secretário de administração, Antônio Fernandes Neto, para dar esclarecimentos sobre seis mil nomeações de funcionários. Maranhão passou o rodo nos nomeados por seu antecessor, o ex-governador Cássio Cunha Lima, que foi cassado por abuso de poder econômico nas eleições.

Os Alves

Não será surpresa uma reaproximação política entre o senador Garibaldi Alves (foto) e o líder da bancada do PMDB na Câmara, deputado Henrique Eduardo Alves (foto), nas eleições para o governo do Rio Grande do Norte. Aliado da governadora Wilma de Faria (PSB), Alves ficou à deriva com a doença do vice-governador Iberê Ferreira de Souza, que está com câncer e pode sair da disputa. Garibaldi apoia a candidata do DEM, senadora Rosalba Ciarlini (DEM), e faz dobradinha com o líder do DEM, José Agripino Maia, na disputa pelas vagas do Senado.

Liberou O polêmico projeto que libera o jogo no país será discutido por uma comissão geral na próxima terça-feira. O governo não quer se meter na enrascada e por isso não indicou ninguém para falar em seu nome, apesar dos pedidos que chegaram ao líder do governo na Câmara, deputado Cândido Vaccarezza. Na votação, o PT decidiu liberar a bancada.

Adidos A Polícia Federal negociou com o Ministério das Relações Exteriores a ampliação do número de adidos policiais no exterior. Na Europa, foram escolhidas as embaixadas brasileiras em Londres e Madri. Outros adidos serão destacados para a China, México e Japão. Os cargos são disputadíssimos.

Ofensiva A União Brasileira de Municípios (Ubam) está mobilizando prefeitos de todo o país.

A ideia é que eles pressionem os senadores em seus estados para que o Senado aprove o projeto de partilha dos dividendos dos royalties da camada pré-sal. A pressão aumenta porque os repasses do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) foram reduzidos em quase 50%.

Moita

Faltando pouco menos de uma semana para o prazo final de desincompatibilização, ainda pairam dúvidas sobre o futuro político de alguns integrantes do governo Lula. Um exemplo é o ministro Patrus Ananias, que ainda não definiu se entrega a pasta do Desenvolvimento Social.

Governo Chávez prende dono de TV oposicionista

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

O proprietário da TV Globovisión, única emissora de sinal aberto crítica ao governo da Venezuela, foi detido após responsabilizar o presidente Hugo Chávez pelo suposto cerceamento da liberdade de expressão no país. Guillermo Zuloaga, 67, foi preso quando se preparava para voar para território das Antilhas Holandesas,próximo do litoral venezuelano

Venezuela detém dono de TV crítica a Chávez

Guillermo Zuloaga, proprietário da Globovisión, é impedido de deixar país por "vilipendiar" presidente em evento de imprensa

Em audiência, juiz decide soltar empresário e reforça proibição de viagem; TV é a única de sinal aberto a fazer linha crítica ao governo
Da Redação

O proprietário da emissora Globovisión, crítica ao governo da Venezuela, foi detido ontem após criticar o presidente Hugo Chávez devido ao suposto cerceamento da liberdade de expressão em um evento da SIP (Sociedade Interamericana de Imprensa) no fim de semana. Ele foi solto à noite.

Guillermo Zuloaga foi detido por agentes da Inteligência militar do país em um aeroporto no Estado de Falcón (noroeste) quando se preparava para voar, em avião particular, para a ilha de Bonaire -território holandês perto da Venezuela.O Ministério Público alegou temor de que Zuloaga saísse do país para pedir à Justiça a sua prisão, com base em denúncia de um deputado governista que o acusou de "vilipendiar" o presidente venezuelano no evento da SIP, que ocorreu em Aruba.

No encontro, o dono da Globovisión disse que "não se pode falar de liberdade de expressão em um país quando o governo usa a força para calar a mídia", segundo um relato da imprensa oficial. "O presidente Chávez venceu as eleições e tem legitimidade em sua origem, mas tem se focado em ser o presidente de um grupo de venezuelanos e tentado dividir o país."

Segundo a procuradora-geral Luisa Ortega, "[deputados] consideraram que as declarações num fórum internacional contra o presidente da República foram ofensivas e desrespeitosas com o chefe de Estado".

"Eu não tinha intenção de deixar a Venezuela. Eu estava indo para Bonaire para a Semana Santa", disse Zuloaga após sua detenção, no aeroporto em Falcón, à sua própria emissora.

O empresário foi levado a Caracas e interrogado por mais de duas horas, sob risco de ser indiciado por delito que acarreta até cinco anos de prisão. O juiz decidiu colocá-lo em liberdade, mas emitiu nova medida cautelar que o proíbe de sair do país.

Em julho do ano passado, a Justiça venezuelana já proibira Zuloaga, 67, de deixar o país, sob acusações de fraude, e ordenara que ele se apresentasse aos tribunais a cada oito dias. A residência do empresário ainda foi alvo de buscas pela polícia.

O atrito entre Zuloaga e o governo tem origem na linha acidamente crítica ao presidente venezuelano. Em 2002, a Globovisión apoiou fracassado golpe contra Chávez, e, no começo deste ano, a saída do diretor-geral da TV gerou especulações sobre suposta decisão da emissora de atenuar sua oposição.

Dias depois, Alberto Ravell afirmou que havia sido forçado a deixar o cargo devido a pressões do governo. A emissora, a única de sinal aberto que mantém oposição a Chávez, no entanto, negou e disse que seguiria empregando linha crítica.

Repressão

A prisão do empresário ocorre apenas três dias depois da detenção do ex-governador do Estado de Zulia, Oswaldo Álvarez Paz, que afirmara em entrevista à Globovisión no começo deste mês que a Venezuela havia se transformado em um paraíso para o tráfico de drogas.

No mês passado, o governo rejeitou a volta ao ar da TV por assinatura RCTV, que manifestara disposição em se ajustar às novas normas baixadas por Caracas que haviam motivado sua saída do ar em dezembro. O sinal aberto da TV, também crítica ao presidente Chávez, não havia sido renovado em 2007.

As medidas alimentam suspeitas de um aumento no cerco a dissidentes e à imprensa em momento que o país passa por séria crise energética, que debilita a popularidade de Chávez.

Incidente nada diplomático

DEU EM O GLOBO

Demissão de funcionária do FMI leva governo colombiano a cobrar explicações de Brasília

Eliane Oliveira e Regina Alvarez
BRASÍLIA - O governo brasileiro optou pelo silêncio em relação ao episódio envolvendo a demissão, pelo diretor-executivo do Fundo Monetário Internacional (FMI), Paulo Nogueira Batista Junior, da representante da Colômbia, María Inés Agudelo, do cargo de diretora substituta. Irritado com a exoneração, o presidente colombiano, Álvaro Uribe, tentou, sem sucesso, conversar com seu colega Luiz Inácio Lula da Silva para fazer uma queixa formal. Mas Lula preferiu deixar o caso para o Ministério da Fazenda, pois quer evitar que esse incidente seja amplificado, prejudicando a posição do Brasil em outras demandas junto aos demais países emergentes.

A ideia é não deixar que a decisão polêmica tenha repercussões capazes de ofuscar as ambições do Brasil junto aos organismos multilaterais de crédito.

Por exemplo, ser um dos protagonistas das reuniões do Banco Mundial e do G-20 financeiro (grupo das 20 maiores economias do mundo), que acontecerão simultaneamente em Washington, de 21 a 26 de abril.

Sem Colômbia, grupo do Brasil perde peso

Fontes próximas ao Palácio do Planalto disseram que houve algumas tentativas de contato entre as assessorias (dos presidentes). Ao mesmo tempo, revelaram, o governo brasileiro recebeu e aceitou as justificativas de Paulo Nogueira sobre a demissão.

Segundo as explicações de Paulo Nogueira repassadas ao governo brasileiro, a decisão de afastar a representante colombiana, anunciada há pouco mais de um mês, foi tomada devido à incompatibilidade de María Inés com o trabalho que desenvolve no FMI e os projetos futuros para o organismo.

Paulo Nogueira teria, ainda, enviado vários comunicados ao governo colombiano relatando os problemas com a funcionária e pedindo a sua substituição, sem resposta.

Mas o governo colombiano ficou muito incomodado com a atitude de Paulo Nogueira e ameaça abandonar o grupo de nove países liderado pelo Brasil no Fundo. Isso reduziria, na prática, a influência e o poder de voto desse grupo junto ao organismo. O governo de Uribe protestou contra a decisão de Paulo Nogueira, enviando cartas para todos os diretores do FMI.

Para eleger um diretor no FMI, cada país precisa reunir, no mínimo, 2% dos votos do organismo. Sozinho, o Brasil tem 1,42% de representação e, por isso, precisa de aliados para ver aprovado qualquer nome que indique. Com a reforma do Fundo, o Brasil terá 1,7% dos votos, mas a mudança ainda está em tramitação no organismo.

A decisão de demitir María Inés desagradou não apenas à Colômbia como a outros representantes de governos no FMI. Primeiro, pelo ineditismo, já que decisões desse tipo sempre são precedidas de entendimentos políticos. Em segundo lugar, pela forma como aconteceu. Paulo Nogueira deu prazo de dois dias para a diretora substituta desocupar a sala e retirar seus pertences, o que foi visto como uma atitude drástica e antipática.

Uma fonte com acesso ao FMI disse que Nogueira é visto com certa reserva por alguns diretores do Fundo. E uma das razões seriam os artigos publicados pelo economista brasileiro, que relatariam discussões no âmbito do Fundo e sua postura independente.

Outro analista considera que o episódio com a representante colombiana é resultado da falta de experiência como gestor do representante do Brasil, que até então concentrava na vida acadêmica boa parte de sua biografia.

Para um analista, também com acesso ao FMI, Paulo Nogueira cometeu um erro estratégico ao demitir a representante colombiana, a partir de uma avaliação também errada sobre qual seria a reação de Bogotá.

Diretora demitida é muito ligada a Uribe

Quando chegou ao Fundo, Paulo Nogueira dispensou o representante da República Dominicana, sem que houvesse repercussão negativa. Mas esse representante fora indicado por um governo que não estava mais no poder.

Assim, o novo governo apenas providenciou a troca, sem protestar. O caso da Colômbia é diferente, já que a diretora demitida é bastante ligada ao presidente Álvaro Uribe e já foi vice ministra das Finanças daquele país.

Paulo Nogueira foi procurado pelo GLOBO mas não respondeu ao pedido para esclarecer o episódio. O Ministério da Fazenda afirmou que não vai se pronunciar sobre o tema.

A determinação do presidente Lula, porém, é de sua equipe reforçar a posição já adotada pelas nações emergentes de brigar por uma participação maior nas decisões tomadas pelos organismos multilaterais de crédito.

Os países em desenvolvimento querem que o Banco Mundial (Bird) anuncie a conclusão das reformas ainda no encontro de Washington. Também esperam a revisão do sistema de cotas do FMI em janeiro de 2011.

Colaborou Geralda Doca

Não vai dar para todo mundo:: Vinicius Torres Freire

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Sem fonte interna de ignição econômica, mundo rico quer turbinar comércio externo, mas receita não dá para todos

EM FEVEREIRO, a venda de casas novas nos EUA voltou a um nível recorde. De baixa. Está quase 80% abaixo do pico de vendas, em julho de 2005. Também em fevereiro, a venda de casas usadas caiu pelo terceiro mês seguido. O mercado de imóveis residenciais voltou aos níveis deprimidos do segundo trimestre de 2009.

Os entendidos dizem que as vendas de casas novas voltaram a cair no final de 2009 porque muita gente antecipou a compra. Terminaria em novembro um incentivo do governo para quem adquirisse seu primeiro imóvel. O incentivo foi estendido até abril deste ano. As taxas de juros ainda estão abaixo de 5% ao ano. Mas o consumidor não se animou.

Os juros devem subir um tanto depois de abril, quando o banco central dos EUA, o Fed, deixar de refinanciar quem oferece crédito imobiliário (o Fed então terá comprado cerca de US$ 1,25 trilhão em títulos lastreados em pagamentos de prestações imobiliárias, em hipotecas). Há cerca de 11,3 milhões de proprietários de casas que valem menos do que o custo do financiamento do imóvel. São os candidatos a dar calote. Há 5 milhões de famílias em processo de despejo. E daí?

Diz-se, dos EUA, que setores que respondem mais rápido à queda de juros costumam "puxar" a retomada do crescimento (como casas e carros). Numa recessão "normal", devida a uma alta de juros, são os primeiros a tombar. Com juros menores, seriam os primeiros a ressuscitar.

Decerto esta não foi uma recessão normal. Mas os juros americanos estão no chão. Assim como o patrimônio dos americanos, sua esperança de encontrar um emprego e, enfim, sua confiança na economia.

Os empregos podem voltar, dizem os analistas do mercado de trabalho americano. Caiu outra vez o número de demandantes de seguro-desemprego. Mesmo baixando, o número de desempregados dependentes desse auxílio ainda está num nível equivalente ao do pico de outras recessões, as ditas mais normais.

Uma fonte de dinamismo econômico que todos os países do mundo rico têm buscado é o comércio internacional -exportações maiores que importações-, ou ao menos um deficit comercial menor. Mas não vai dar para todo mundo.

Os EUA reclamam da China, que vende muito com sua mão de obra barata e sua moeda artificialmente desvalorizada, política que é mais ou menos adotada por toda a vizinhança chinesa, afora o Japão. Os EUA vão vender mais para quem?

Os americanos não podem esperar muito da Europa. Os superexportadores alemães querem continuar onde sempre estiveram, no pódio dos maiores saldos comerciais do mundo. O euro vem desabando diante do dólar, o que encarece relativamente os produtos americanos.

Em fevereiro, a Comissão Europeia estimou que a eurozona deve crescer apenas 0,7% em 2010.

No relatório não consta, claro, cenário em que países como Grécia ou Portugal acabam no vinagre. Mas boa parte da Europa terá de fazer arrocho fiscal (corte de gasto do governo) e, de par com tal aperto, pretende ajustar suas contas externas bem deficitárias (isto é, vão importar menos). E nós com isso? O cenário parece bem propício para um aumento rápido no nosso deficit comercial.

A fraqueza do Estado:: Celso Ming

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

O debate sobre o tamanho do Estado na economia brasileira sempre teve boa dose de falso conteúdo ideológico. As questões de fundo são bem mais pragmáticas.

A privatização, tal como aplicada no País no período entre 1993 e 2001, teve como principal motivador a baixa capitalização da empresa estatal brasileira. Ou seja, como o Tesouro não tem poupança suficiente para dar conta da expansão das empresas estatais, não adianta insistir; é preciso contar para isso cada vez mais com o setor privado, daqui e do exterior.

Também são razões de outra ordem que mobilizam grande parte das forças do governo Lula a defender o fortalecimento do Estado na economia: quanto mais estatais houver, mais empregos e postos propícios para o exercício do poder os políticos terão para seus amigos.

No momento, pelo menos três novidades mostram as dificuldades para levar adiante o projeto do Estado forte na economia brasileira.

A primeira delas é a capitalização da Petrobrás. A manobra da cessão onerosa, pela qual a União subscreverá em reservas de petróleo a sua parte no aumento de capital, é, por si só, uma poderosa engenharia financeira construída para contornar a falta de recursos do Tesouro. Mas, há dois dias, o presidente da Petrobrás, José Sergio Gabrielli, teve de admitir que o aumento de capital tem de ser feito, com ou sem a tal cessão onerosa, porque a Petrobrás tem pela frente, até 2014, um programa de investimentos de nada menos de US$ 220 bilhões a US$ 240 bilhões, dos quais US$ 49 bilhões só neste ano. Precisa urgentemente de sangue novo e não pode esperar demais pela aprovação das novas regras pelo Congresso, que podem não sair este ano. Gabrielli não explicou o que seria seu plano B, mas ficou uma vez mais claro que o banco de sangue do Tesouro não tem o que vai ser preciso para tocar seus projetos.

A segunda novidade é o que acontece com a pretendida subsidiária do BNDES que se destinaria a fornecer financiamentos aos exportadores brasileiros, mais ou menos nos moldes do Eximbank, dos Estados Unidos. Uma coisa é a ideia e as promessas aos exportadores e outra, bem diferente, o que se pode fazer. Já se sabe que o Tesouro não tem como subscrever o capital da nova instituição financeira. Por isso, em vez do jacarezão pretendido, o que sairá desse ovo será uma lagartixa de nada.

O terceiro caso é o do Banco do Brasil. Para garantir sua participação no mercado interno de crédito e financiar a expansão externa - sem o que não conseguirá dar o salto qualitativo - vai ser necessário injetar capital. E, outra vez, o acionista maior, o Tesouro, não tem condições de subscrever sua parte. Isso vai obrigar o Banco do Brasil a lançar ações no exterior. É o capital estrangeiro, quem diria, se encarregando de dar ao Banco do Brasil a força que o Tesouro não será capaz.

A mesma situação se repete por aí. É a Eletrobrás tendo que se conter porque não pode contar com vitamina pública. É a Telebrás, ou a estatal que vai cuidar da banda larga, que se mostra incapaz de equacionar a questão do capital necessário para tocar o negócio.

E é, enfim, o setor público federal que vai deixando o Tesouro sem poder de fogo porque deu e continua dando prioridade para as despesas correntes em vez de cuidar de aumentar a poupança.

Confira

Mole demais - Ontem, o presidente do Banco Central Europeu, Jean-Claude Trichet, afinal revelou por que os dirigentes da União Europeia não querem que o Fundo Monetário Internacional (FMI) comande o resgate da Grécia. O FMI não consegue impor disciplina fiscal; qualquer país socorrido por seus financiamentos acaba passando a perna nas condicionalidades impostas.

Ata dos derrotados:: Míriam Leitão

DEU EM O GLOBO

Os juros vão subir na próxima reunião do Banco Central. A ata divulgada ontem diz que houve consenso sobre a necessidade de aumento. O texto não deixa claro por que eles não subiram, nesta que pode ter sido a última reunião comandada por Henrique Meirelles. A dúvida agora é sobre o ritmo do aperto. Ele poderia ser menor se o governo ajudasse cortando gastos.

A avaliação dos economistas que leram o documento foi a de que ele foi escrito pelos três derrotados na última reunião, porque, em vez de explicar a razão de não subir os juros, o texto diz o tempo todo que houve concordância sobre a necessidade de alta. Isso contradiz o resultado final da reunião: 5 a 3 a favor da manutenção.

Houve consenso entre os membros do Comitê quanto à necessidade de se implementar um ajuste na taxa básica de juros, de forma a conter o descompasso entre o ritmo de expansão da demanda doméstica e a capacidade produtiva da economia, bem como para reforçar a ancoragem das expectativas de inflação, diz o parágrafo 26.

Para Carlos Thadeu de Freitas, ex-diretor do Banco Central, atualmente na Confederação Nacional do Comércio (CNC), o texto é paradoxal e não justifica de forma convincente a manutenção dos juros em 8,75%: O texto diz que houve consenso para a elevação, mas também afirma que é preciso esperar mais um tempo. Mas um período de 45 dias (até a próxima reunião) não é praticamente nada diante de uma guinada na política monetária.

Depois de ler ata, o economista chefe da Ativa Corretora, Arthur Carvalho, acha que a decisão não foi técnica.
Claramente a decisão não foi técnica porque o texto contradiz o resultado da reunião. O Copom diz que o cenário de inflação em 2010 e 2011 está sensivelmente acima da meta.

Isso significa que o patamar atual de juros é incompatível com esse cenário. Tecnicamente, não há lógica para esperar pela alta da Selic afirmou.

A economista Monica de Bolle, da Galanto Consultoria, diz que a única explicação para se adiar o aumento dos juros seria uma possível saída de Henrique Meirelles da presidência do Banco Central: O Banco Central fala de consenso em subir juros, mas ao mesmo tempo diz que prefere esperar mais um pouco para ver os efeitos do aumento dos compulsórios.

Isso não é suficiente. A única explicação que vejo é uma possível saída do Meirelles e uma vontade de iniciar o ciclo com o novo diretor, legitimando seu compromisso em combater a inflação disse Mônica.

Esta também é a avaliação do professor Luiz Roberto Cunha, da PUC-Rio: Foi uma ata estranha. E sabendo-se que na próxima reunião é possível que ocorram mudanças na diretoria do Banco Central, isso traz uma certa preocupação.

Para José Júlio Senna, da MCM Consultores, a ata reforça a ideia de que o Banco Central só muda a política monetária depois de duas sinalizações explícitas ao mercado. Foi assim em 2007, quando parou de reduzir os juros; em 2008, quando elevou as taxas; e em 2009, quando voltou a cortar. Mesmo ficando dentro do padrão, ele faz reparos à forma do texto.

A ideia de sinalizar ao mercado o passo da política monetária tem o objetivo de dar mais transparência. Nesse sentido, o texto não é bem escrito porque não é compatível com essa intenção.

Ele conclui que é necessário subir juros, mas diz que é melhor esperar. Isso não faz sentido explicou.

No texto, o Banco Central diz que a economia brasileira deixou de estar em recuperação para entrar em processo de expansão. Dessa forma, a ocupação da capacidade ociosa já estaria no fim, e isso reforça as preocupações com a inflação.

O texto de ontem trouxe mais dúvidas sobre o ritmo de aperto da Selic, que hoje está em 8,75%. No mercado de juros futuros, a leitura era de que havia 50% de chances de um aperto de meio ponto na próxima reunião, e 50% de uma alta maior, de 0,75%.

A alta em abril está dada, o ritmo ainda está em aberto disse Luis Otávio Leal, do Banco ABC Brasil.

O BC também admite que está preocupado com a política fiscal e com a expansão da carteira de crédito dos bancos públicos. Duas influências que podem fazer com que os juros fiquem mais altos.

Há um claro descompasso entre as políticas fiscal e monetária. Além disso, a carteira de crédito dos bancos públicos responde menos à elevação da Selic porque há muito crédito subsidiado.

Tudo isso pode fazer com que o Banco Central seja obrigado a fazer um ajuste ainda maior nos juros, para compensar. Mais uma vez, a tarefa de combater a inflação recai exclusivamente sobre o Banco Central disse Monica de Bolle.

Na próxima semana, Henrique Meirelles terá que decidir se fica no Banco Central até o fim do mandato, ou se retoma sua carreira política.

Se ele sair, a pressão para o BC não aumentar os juros vai ficar mais forte dentro do governo. Quem assumir agora tem pouca margem de recuo depois desta ata. É subir ou ser acusado de tomar decisão por razões políticas.

Talvez esse curto-circuito é que tenha produzido uma ata assim meio estranha: que justifica a alta dos juros, mas a adia.

Morte e vida Severina (Auto de Natal Pernambucano) – parte 3:: João Cabral de Melo Neto

O RETIRANTE TEM MEDO DE SE EXTRAVIAR PORQUE SEU GUIA, O RIO CAPIBARIBE, CORTOU COM O VERÃO

— Antes de sair de casa
aprendi a ladainha
das vilas que vou passar
na minha longa descida.
Sei que há muitas vilas grandes,
cidades que elas são ditas;
sei que há simples arruados,
sei que há vilas pequeninas,
todas formando um rosário
cujas contas fossem vilas,
todas formando um rosário
de que a estrada fosse a linha.
Devo rezar tal rosário
até o mar onde termina,
saltando de conta em conta,
passando de vila em vila.
Vejo agora: não é fácil
seguir essa ladainha;
entre uma conta e outra conta,
entre uma a outra ave-maria,
há certas paragens brancas,
de planta e bicho vazias,
vazias até de donos,
e onde o pé se descaminha.
Não desejo emaranhar
o fio de minha linha
nem que se enrede no pelo
hirsuto desta caatinga.
Pensei que seguindo o rio
eu jamais me perderia:
ele é o caminho mais certo,
de todos o melhor guia.
Mas como segui-lo agora
que interrompeu a descida?
Vejo que o Capibaribe,
como os rios lá de cima,
é tão pobre que nem sempre
pode cumprir sua sina
e no verão também corta,
com pernas que não caminham.
Tenho de saber agora
qual a verdadeira via
entre essas que escancaradas
frente a mim se multiplicam.
Mas não vejo almas aqui,
nem almas mortas nem vivas;
ouço somente à distância
o que parece cantoria.
Será novena de santo,
será algum mês-de-Maria;
quem sabe até se uma festa
ou uma dança não seria?