sábado, 24 de abril de 2010

Reflexão do dia – José Serra

Na política, fora próxima do PCB, nos anos 50, mas não parecia ter paciência para uma militância organizada. Por isso, me surpreendi quando ingressou no PT e se elegeu deputada, talvez na campanha mais barata já feita no Rio de Janeiro. Desistiu, porém, de concorrer a outro mandato e retomou sua vida de sempre.
Ao longo dos anos 80, com meu afastamento gradual da atividade acadêmica, nossos encontros foram se tornando mais raros. Mas carrego sempre comigo o afeto e a admiração por esta amiga tão inteligente, austera, excêntrica, doce e generosa.


(José Serra, no artigo Maria e eu, publicado, hoje, em O Globo, sobre os 80 anos de Maria Conceição Tavares)

Hora da verdade :: Marco Aurélio Nogueira

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Agora que os candidatos caíram na estrada, que a fritura de Ciro Gomes se consumou e a integração ativa de Aécio Neves à campanha tucana parece favas contadas, é hora de perguntar o que nos reservará a eleição presidencial.

Em termos de marketing eleitoral, há poucas margens para novidades. Pode-se esperar maior "judicialização" da área, dada a sofreguidão jurídica com que os comandos deverão se atacar reciprocamente. Muito esforço também será despendido para enquadrar os candidatos no padrão dos marqueteiros. Discursos arrumados, caras e bocas, frases de efeito, gestos simbólicos essenciais, concentração total para o momento da televisão - afinal, a imagem e a performance decidirão muita coisa. Ver-se-á quão à vontade os candidatos se sentirão e que constrangimentos terão ao se verem forçados a falar e fazer o que não gostariam. Também será repetitivo o jogo de maior ou menor truculência que se travará para demonstrar ao eleitor que os candidatos são distintos, ou seja, para fixar a identidade de cada um. Isso pelo menos no ringue principal, em que se defrontarão PT e PSDB. O plebiscito é um expediente estranho à democracia e empobrece qualquer eleição. Mas as circunstâncias acabaram por impô-lo. Ele tenderá a levar o embate para territórios menos importantes, a personalizá-lo um pouco mais e a fazer com que o nível do debate oscile para baixo.

Mas é preciso reconhecer desde logo que tanto Serra quanto Dilma têm procurado construir bases de respeito mútuo, ainda que com alguns escorregões, que também são inevitáveis. Teremos de ver como se comportarão quando a temperatura subir. Mas já é um bom começo constatar que conseguem se cumprimentar em público e referir-se um ao outro em tom elevado.

As campanhas invadirão o mundo virtual, as eleições serão "norte-americanas"? Tomara que sim, porque será uma forma de a política se aproximar do cotidiano. Porém, dada a natureza eminentemente anárquica das redes, pode-se esperar que o vale-tudo será pesado. Um passeio pelos ambientes do Twitter é revelador. Boatos, notícias plantadas ou amplificadas, movimentos mais ou menos sintonizados de desconstrução de imagens ou propostas, o céu como limite. Para enriquecer a democracia, campanhas eletrônicas requerem eleitores politicamente educados, preparados para ver além da fumaça e da neblina, ou seja, para ligar de modo coerente o que é despejado segundo lógicas hipertextuais. Não é só uma questão de saber se os eleitores estão conectados em tempo integral.

Os ativistas e coordenadores da área poderão exibir habilidades técnicas inusitadas, agir como feras internáuticas, mas pouco produzirão se não conseguirem agregar valor ético e político aos seus tweets e, por esse caminho, ajudarem a educar a cidadania, facilitando o debate substantivo. Este o ponto: Em que as campanhas emergentes contribuirão para oferecer aos brasileiros um esboço de seu futuro? Teremos uma disputa minimamente programática, em que ideias serão postas à mesa e servidas como iguarias? Ou teremos de nos contentar com coisas mais frugais, quem sabe com sobras de épocas mais fartas?

Sempre se pode esperar que a qualidade prevaleça sobre a quantidade, ainda que em condições difíceis. O País se defronta com uma agenda complicada, que requer concentração de energias, coesão política e compromissos claros. Os candidatos poderão contribuir muito se derem bons exemplos: se falarem com clareza de seus planos e metas, explicando aos cidadãos como multiplicarão os peixes, como farão para que todos ganhem e ninguém, pobre ou rico que seja, saia perdendo. A união do País talvez seja a chave que abrirá as portas do futuro: Como alcançá-la sem que as feridas causadas em inimigos e adversários sejam sangrentas demais a ponto de impedir a cicatrização? Isto também significa saber fazer escolhas: destacar o fundamental, por mais amargo que seja. Falar claramente, por exemplo, a respeito de Estado e de desenvolvimento, esses quase irmãos siameses da modernidade.

No caso do Estado, há indícios de que os candidatos apresentarão um desenho do que pretendem fazer com ele. Afinal, deixamos para trás a era FHC sem que a era Lula tenha recuperado o tema. Permanecemos na mesma, mas agora, em circunstâncias bem mais "estatais", não há como fugir do assunto. Para além do discurso fácil de que se necessita de mais "intervenção", de Estado "mais forte" e "ativo", o decisivo será estabelecer com clareza os parâmetros da atividade estatal reguladora, que é de fato a que importa e decide tudo nestes tempos de vida líquida. Não ganharemos se a discussão ficar estacionada no terreno fiscal-financeiro, atrelada ao custo do Estado ou a seu tamanho. Nem sequer bastará a contraposição mecânica de Estado e mercado, por mais que se saiba que temos aí uma das grandes tensões da vida contemporânea. Precisamos de uma ideia clara seja do Estado administrativo de que o País necessita, seja do Estado político - o que produz e garante a comunidade política - sem o qual a cidadania não pode avançar. Da combinação inteligente dessas duas faces do Estado (sem esquecer a face jurídica) nascerão as políticas sociais qualificadas para construir um país melhor.

O mesmo vale para o desenvolvimento. Encher a boca para dizer que precisamos fazer a economia crescer e gerar mais empregos é jogar para a plateia. Não acrescenta nada ao que se sabe e, para piorar, não esclarece o fundamental: Como desenvolver sem agredir a natureza, sem sufocar os pequenos produtores, sem massacrar os trabalhadores e sem reduzir a economia a um sistema de mercadorias desprovido de preocupação social? Não indica também que pacto ético-político-social dará sustentação a um projeto de desenvolvimento de novo tipo, que precisamente por ser de novo tipo será muito mais complexo e desafiador. Sem algo nessa direção, os eleitores ficarão a ver navios. E perderemos uma oportunidade.

É professor titular de teoria política da UNESP.

Baliza de conduta:: Dora Kramer

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

O parecer da Procuradoria-Geral da República recomendando ao Tribunal Superior Eleitoral a aplicação de "multa máxima" ao Sindicato dos Professores do Estado de São Paulo por considerar a greve de março "propaganda eleitoral antecipada negativa" contra o pré-candidato a Presidência da República pelo PSDB, José Serra, surpreendeu.

Pelo ineditismo. Nunca a liderança de um movimento grevista havia assumido seu caráter político-eleitoral de maneira tão explícita, tampouco o Ministério Público tivera de tomar esse tipo de decisão.

O governo federal deve ter se surpreendido também. Houvesse avaliado a potencial gravidade do fato, Dilma Rousseff, pré-candidata do PT à Presidência da República, talvez não tivesse sido enfática na defesa do direito da direção da Apeoesp de paralisar as atividades do professorado para tentar "quebrar a espinha" do então governador de São Paulo às vésperas de deixar o posto.

Pois foi a esse ponto que a procuradoria se apegou. O movimento não contestou a administração estadual, "mas a suposta inaptidão de José Serra para ocupar o cargo de presidente".

Atenda ou não o TSE ao pedido, o que se tem posto na mesa é o rigor do Ministério Público.

Se acrescentarmos as duas multas já aplicadas pela Justiça Eleitoral ao presidente Luiz Inácio da Silva por propaganda eleitoral antecipada, teremos uma evidência de predisposição ao balizamento de condutas.

Avançando no raciocínio, isso pode significar que o governo talvez precise adaptar o modelo de campanha previamente desenhado.

O périplo da Presidência e ministros já sofreu adaptação depois das decisões do TSE. Houve recomendação para cuidado extremo com a lei.

Agora, com esse parecer sobre a greve da Apeoesp, movimentos sociais, sindicatos, organizações não-governamentais e todo o arsenal de entidades que de alguma maneira estavam prontas para representar o "nós" na guerra contra "eles" provavelmente necessite de uma reavaliação metodológica.

Não que se recolham e não se manifestem. Apenas que o façam dentro dos marcos legais. Pois o presidente Lula não é mais o protagonista, produtor e diretor do espetáculo. Há contraditório e a Justiça entrou em cena.

Cabeça no pé. A entrevista do deputado Ciro Gomes ao portal iG, dizendo que Lula "navega na maionese" se pensa que poderá ungir Dilma Rousseff presidente, virou a política de cabeça para baixo.

De litigantes juramentados, tucanos portaram-se como afeiçoados. Já os correligionários PT e PSB reagiram como se antagonistas de Ciro fossem desde a infância.

Mundo artístico. Atores, cantores, compositores costumavam ser atuantes na política. Houve embates inesquecíveis, alguns com vítimas. Até a campanha de 2002 os artistas participavam ativamente.

Na eleição de 2006, já à sombra do mensalão, a maioria se preservou e quem veio a público não fez bonito defendendo a tese das "mãos sujas" no afã de justificar o alinhamento ao PT o que, de resto, poderia ter sido feito com argumentos mais decentes.

Mas o enunciado é só para dizer que nessa campanha chega da área a primeira contribuição ao debate político.

Vem do músico Guttemberg Guarabyra ("Sá, Rodrix e Guarabyra"), que discorre sobre a popularidade do presidente Lula e a dianteira da oposição nas pesquisas.

"O que especialistas em análise de pesquisas ainda não observaram é que, como o governo Lula em larga medida está mais para um governo de continuidade, já que abandonou quase totalmente as antigas bandeiras do petismo para adotar uma configuração mais tucana, o eleitor do PSDB não tem como dizer que não aprova a atual maneira de Lula atuar."

"É o que explica a aparente contradição de metade dos eleitores que aprova o governo manifestar preferência eleitoral pela oposição. Ou seja, esses eleitores não deixaram de ser opositores. Apenas acham que a situação está governando de acordo com seus valores, mas vão votar em conformidade com os ideais em que sempre votaram."

Ciro apostou. E perdeu:: Fernando Rodrigues

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

BRASÍLIA - Haverá uma profusão de análises sobre o fim da pré-candidatura de Ciro Gomes a presidente da República. O cardápio era variado entre as avaliações já disponíveis ontem.

Foi humilhado por Lula, destratado pelo PSB, o PT destrói quem aparece à sua frente ou Ciro pecou pela ingenuidade.

O tempo dirá qual dessas ou de outras avaliações são verdadeiras ou apropriadas. Do ponto de vista dos fatos, deu-se algo muito simples. Ciro fez uma aposta. Sua previsão não deu certo, e ele perdeu.

A estratégia cirista era conhecida. Ele próprio a relatou em detalhes mais de uma vez acomodado à frente de uma das mesas de tampo de mármore branco nas quais é servido o intragável café de coador da Câmara dos Deputados. Anotei ponto a ponto sua explicação na tarde de 7 de outubro passado:

"O lugar marcado para mim é ficar em terceiro lugar na eleição e ser protagonista no segundo turno. Mas há uma fresta para eu ser o segundo. E uma fresta minúscula para eu ser o primeiro. O Serra vai recuar no ano que vem. Aí entra o Aécio, mas lá atrás nas pesquisas. Eu fico em primeiro lugar".

Em resumo, a aposta era dividida em três etapas: 1) o tucano José Serra ficaria com receio de perder e não seria candidato a presidente; 2) a petista Dilma Rousseff continuaria empacada abaixo de 20%; 3) Aécio Neves assumiria a vaga do PSDB ao Planalto, mas em patamar bem baixo nas pesquisas.

O passo seguinte seria Ciro conquistar o apoio do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Com medo de ser expelido do Planalto, o PT buscaria uma alternativa heterodoxa, dando apoio ao nome do PSB.

Enquanto pitonisa eleitoral, Ciro foi só um político. Suas previsões estavam todas erradas. Mas, como ele desejava ser presidente, talvez não tenha tido muita escolha. Precisava apostar e pensar alto. Apostou e perdeu. Simples assim.

Arrebentou:: Fernando de Barros e Silva

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

SÃO PAULO - Ciro Gomes implodiu a ponte que o conectava ao continente do lulismo. Sua reação ao estrangulamento de sua candidatura foi além do que esperavam os petistas. Fora da sucessão, Ciro abriu fogo pesado em várias frentes:

1. Questionou a onipotência de Lula ("Ele está se sentindo o Todo-Poderoso e acha que vai batizar Dilma presidente");

2. Colocou em dúvida a competência de Dilma Rousseff ("Dilma é melhor do que o Serra como pessoa. Mas o Serra é mais preparado, mais legítimo, mais capaz")

3. Apostou na vitória do tucano ("Minha sensação agora é que o Serra vai ganhar esta eleição");

4. Disse que Dilma e o PMDB não têm condições de enfrentar a crise econômica que se projeta no horizonte ("Em 2011 ou 2012, o Brasil vai enfrentar uma crise fiscal, uma crise cambial. Como o PT, apoiado pelo PMDB, vai conseguir enfrentar essa crise? Dilma não aguenta. Serra tem mais chances de conseguir").

São declarações publicadas pelo site noticioso iG, em reportagem de Eduardo Oinegue. Ontem, Ciro disse que havia conversado com o jornalista em "off", deixando claro que não concedia uma entrevista.

Pode-se tomar suas palavras como uma explosão a mais, outro destempero de alguém que os coleciona. Essa é a interpretação mais cômoda para os aliados de Dilma diante do evidente desconforto.

No surto de Ciro, porém, parece haver um recado político que vai além da sua agonia pessoal. O fio desencapado pode estar expondo os limites de um arranjo de poder que abriga interesses demais. Sua fala seria um aviso de que o amplo consórcio lulista passa a viver sob a ameaça de um curto-circuito. Um aviso de que o poder de Lula para manobrar a própria sucessão não é incontrastável, como não é ilimitada a tutela sobre os aliados.

Na boca de Ciro, a sugestão de que Dilma é "menos legítima, menos capaz, menos preparada" é um soco no estômago. Ela é música para os ouvidos do adversário do PT. Sim, Serra, aquele que "é mais feio por dentro do que por fora".

Um deputado como não mais se elegem:: Villas-Bôas Corrêa

DEU NO JORNAL DO BRASIL

A Câmara dos Deputados que freqüentei de 1948 até a mudança para Brasília, em 21 de abril de 1960, revelou o deputado Bilac Pinto, da brilhante bancada mineira da UDN. Quando a ditadura militar dos cinco generais-presidente começou com o golpe de 1° de abril de 1964, a Câmara era presidida pelo deputado Ranieri Mazzilli, do PSD de São Paulo, que exercia o cargo desde 1958 e estava com os seus dias contados.

O general-presidente Castello Branco vetou mais uma reeleição do pessedista, que derrotou o candidato governista, deputado e coronel da Brigada gaúcha, Perachi Barcelos.

Mas, com o facilitário da ditadura, o presidente Castello Branco reuniu os líderes das bancadas do Bloco Parlamentar Revolucionário e pediu que indicassem um nome para enfrentar Mazzilli. As ingênuas lideranças lembraram o nome do deputado pernambucano Nilo Coelho, que carimbava a sua fidelidade com os lautos almoços e jantares que oferecia ao general-presidente. O saciado general-presidente Castello Branco ignorou a indicação e, em tom de sondagem, deu o serviço, indagando como receberiam a indicação do deputado Bilac Pinto, que estava em Nova York como observador parlamentar da delegação brasileira junto à Organização das Nações Unidas. Nenhum dos líderes havia pensado no deputado mineiro, mas entenderam o recado e a ele aderiram com o maior entusiasmo.

O velho PSD manteve a candidatura do deputado Ranieri Mazzilli e a eleição foi disputada voto a voto, em clima tenso. O general-presidente Castello Branco telefonava para os deputados pedindo o voto e advertindo para os riscos de uma derrota, que poderia provocar o fechamento do Congresso. Bilac obteve 280 votos contra 167 de Mazzilli: a Câmara entendeu o recado.

Bilac Pinto assumiu o cargo e a maioria da Câmara pouco conhecia o sisudo e introvertido presidente. Em artigo de sucesso no Diário de Notícias do Rio, o escritor e cronista Osório Borba esboçou o perfil do presidente da Câmara comparando-o com o eucalipto que "cresce sozinho, seca em volta e não dá sombra". No livro O Congresso em Meio Século, o ex-Secretário Geral da Câmara, Paulo Martins de Oliveira, em depoimento ao jornalista Tarcísio Holanda, em poucas linhas resume o perfil do deputado Bilac Pinto; "era tímido, frio e distante. Tinha poucos amigos".

Mas, o depoimento do ex-Secretário Geral da Câmara é isento e veraz. Lembra que Bilac Pinto, desde antes da mudança da capital, em seu primeiro mandato, integrava a Banda de Música da UDN, formada pelos bacharéis como Milton Campos, Pedro Aleixo, Adaucto Lúcio Cardoso, Carlos Lacerda, Afonso Arinos, Aliomar Baleeiro, Oscar Dias Correia, Guilherme Machado. Reconhece com isenção que Bilac Pinto, apesar da sua timidez, exerceu a presidência da Câmara em sua plenitude.

Bilac Pinto presidia as sessões da Câmara, já em Brasília, durante a Ordem do Dia sem esconder o tédio pela discurseira medíocre dos oradores que mandavam recados aos seus eleitores. E não se candidatou à reeleição, sugerindo ao presidente Castello Branco o nome do deputado Adaucto Lúcio Cardoso, um mineiro eleito pela UDN do antigo Estado da Guanabara.

Liberado, Bilac Pinto decidiu realizar o sonho de passar uma temporada em Paris, onde deixara por prudência mineira, guardado um automóvel. Pretendia também fazer uma longa viagem marítima ao Oriente, quando foi surpreendido pelo convite do presidente Castello Branco para assumir a embaixada do Brasil na França. Conta o secretário Paulo Affonso que foi procurado por funcionário do gabinete do ministro das Relações Exteriores que desejava entregar ao novo embaixador brasileiro as passagens e as diárias para a viagem a Paris.

Paulo Afonso comunicou a Bilac Pinto que o funcionário do Itamarati queria ir à sua casa para combinar a data da viagem a Paris e entregar as passagens e as diárias. Bilac Pinto recusou, alegando que só se consideraria embaixador quando entregasse suas credenciais ao presidente Charles de Gaulle. E pagou as passagens dele e da esposa.

Duas linhas de um depoimento pessoal. Conheci o professor Bilac Pinto na Faculdade Nacional de Direito, como aluno e presidente do Centro Acadêmico Candido de Oliveira.

Depois como repórter político desde 1948, na Câmara. E em várias oportunidades do acaso a favor. E do catedrático e do deputado guardo a lembrança da cordialidade com que me tratou sempre, sem exceção.

Juventude e política:: Cesar Maia

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Desde os anos 80 a mobilização da juventude e a sua participação política vinham diminuindo. As mobilizações dos jovens em grandes manifestações nas ruas foi minguando.

Nas campanhas eleitorais, os debates acalorados, com "torcidas" dos candidatos extravasando os auditórios, quase desapareceram. Precipitadamente, analistas falavam de um processo de alienação, produto da sociedade de consumo.

Provavelmente, a causa de fundo não tenha sido nenhuma razão estrutural, mas as mudanças na própria atividade política. À medida que os extremos políticos convergiam para o centro, produto de uma certa desideologização após a queda do Muro de Berlim, as razões espontâneas de mobilização perderam impulso.

Uma razão central está no que muitos politólogos chamam de "partidocracia". Ao tempo em que ocorre a convergência ao centro, os partidos se fecham e se consideram eles mesmos detentores da representação popular a partir do voto da população. A "partidocracia" produziu claros desestímulos à participação dos jovens, que não viam os canais de participação, mobilidade e ascensão partidárias. Os parlamentos foram se burocratizando como desdobramento desse processo. E o efeito maior foi o desestímulo à participação dos jovens e a sua desmobilização.

Nos últimos anos, há uma nítida reversão desse quadro, desmentindo os que imaginavam que as causas eram estruturais e permanentes. Se uma parte dos jovens busca a participação política com expectativa de ascensão partidária e acesso a mandatos, a grande maioria busca a participação política para influenciar as decisões. A internet quebrou aquela obstrução. Mesmo que a maioria dos partidos não desenvolva canais de acesso a mandatos e a espaços políticos, o fato é que, em relação àqueles que querem participar da política, a internet implodiu as máquinas partidárias. O uso da internet é proporcionalmente maior entre os jovens, reforçando essa tendência. Esses descobrem que os edifícios partidários podem ser alcançados em qualquer andar, sem precisar mostrar carteirinha ao porteiro nem usar os seus elevadores.

A participação é livre, pode-se dizer o que se quer, multiplicar o que se pensa, formar redes numa multiplicidade de temas e numa frequência maior que os políticos com mandato, mobilizar a opinião pública.

Já vivemos num ambiente muito diferente, com ampla participação dos jovens, que, filiados ou não a partidos,opinam, pressionam e chegam à sociedade, independente da vontade e da autorização dos caciques de plantão. Com isso, a participação dos jovens voltou a dar dinamismo ao processo político.

Os partidos que entenderem isso estarão conectados ao futuro.

Gasto com propaganda sobe 48% no governo Lula

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

A propaganda do governo Lula chegou, no ano passado, a 7.047 veículos de comunicação de todo o País. O número é 1.312% superior ao de 2003, primeiro ano da administração, quando 499 veículos receberam verba para divulgar a publicidade oficial. De 2003 a 2009, a Presidência, os ministérios e as estatais gastaram cerca de R$ 7,7 bilhões com propaganda. Os gastos do ano passado, de R$ 1,17 bilhão, superaram em 48% os R$ 796,2 milhões investidos no primeiro ano de governo.

Gasto de Lula com publicidade sobe 48% em 6 anos

Desde 2003, início do governo, houve aumento de 1.300% no número de meios de comunicação com propaganda oficial

Rodrigo Rangel / BRASÍLIA

A propaganda do governo Luiz Inácio Lula da Silva chegou, no ano passado, a 7.047 veículos de comunicação de todo o País. O número é 1.312% superior ao de 2003, primeiro ano do governo Lula, quando 499 veículos receberam verba para divulgar a publicidade oficial.

De 2003 a 2009, a Presidência da República, ministérios e estatais gastaram R$ 7,7 bilhões com propaganda. Os gastos do ano passado, de R$ 1,17 bilhão, superaram em 48% os R$ 796,2 milhões investidos no primeiro ano de governo.

O aumento expressivo do número de órgãos em que a publicidade oficial é veiculada se deve a uma mudança de estratégia da comunicação do Palácio do Planalto: desde que Lula chegou ao governo, a ordem é regionalizar a propaganda e diversificar as maneiras de fazer o marketing governamental chegar à população. Os veículos que divulgaram publicidade federal em 2009 estão espalhados por 2.184 municípios, contra 182 em 2003.

Valor triplicado. Só com a publicidade institucional da Presidência da República, destinada a difundir a marca e os feitos do governo, foram gastos R$ 124 milhões no ano passado.

O volume é três vezes superior ao de 2003, mas não acompanha, proporcionalmente, a ampliação do número de veículos escolhidos para divulgar a propaganda federal. Isso significa que veículos de comunicação de abrangência nacional tiveram de dividir a verba que recebiam antes com órgãos regionais - alguns deles de pequeno porte, o que inclui rádios e jornais de interior sob controle de políticos de partidos aliados.

Televisão, jornal, rádio e revistas, nesta ordem, foram os meios que mais receberam recursos em 2009. Para emissoras de TV, foram destinados R$ 759,5 milhões, 64% do total. Jornais receberam R$ 115,4 milhões e rádios, R$ 104 milhões.

Maior crescimento. A internet aparece em quarto lugar em valores absolutos, mas é o veículo que registrou o maior crescimento no volume de verbas sob Lula: os gastos do governo com publicidade na rede mundial de computadores saltaram de R$ 11,4 milhões em 2003 para R$ 36, 3 milhões em 2009.

As despesas com propaganda em outdoor são as mais inconstantes nas planilhas da Secom. Curiosamente, de 2003 para cá, os picos de investimento nesse tipo de mídia se deram em 2004 e 2006, anos eleitorais.

Em 2006, quando o presidente Lula concorreu à reeleição, o governo gastou R$ 19,9 milhões com publicidade em outdoors - no ano anterior, 2005, a despesa fora de R$ 7,7 milhões e no ano seguinte, 2007, de R$ 3,4 milhões.

Sete anos. Em 2004, ano em que houve eleições municipais, há outro ponto fora da curva: as despesas chegaram a R$ 21 milhões. Somados, os gastos com publicidade oficial em outdoors nos anos eleitorais de 2004, 2006 e 2008 chegam a 60% da despesa total com esse tipo de mídia ao longo dos sete anos de governo Lula.

Ciro critica Lula, elogia Serra e diz que não fará campanha

DEU EM O GLOBO

Deputado afirma que tucano é ‘mais preparado e capaz’ do que petista

Às vésperas de ter sua pré-candidatura retirada por seu partido, o deputado Ciro Gomes (PSB) demonstrou toda sua insatisfação em duas entrevistas ontem, nas quais criticou o presidente Lula e o PT e chegou a dizer que o pré-candidato tucano José Serra – seu notório adversário – é “mais preparado” e “mais capaz” para ser presidente do que a petista Dilma Rousseff. Ao portal iG, afirmou que não vai declarar voto em Dilma. Depois, ao SBT, admitiu apenas que pretende apoiá-la. Em relação a Lula, Ciro disse que o presidente está “navegando na maionese” e se sentindo “todo-poderoso”. O Planalto já tenta diminuir os estragos, para evitar que aliados próximos a Ciro apoiem candidatos tucanos em seus estados, como no Ceará e em Minas.

Ciro mira em Lula, Dilma e PT

Deputado diz que ex-ministra "é melhor como pessoa, mas Serra é mais preparado"

Gerson Camarotti, Cristiane Jungblut e Maria Lima

BRASÍLIA - Com a posição majoritária do PSB pela retirada da candidatura presidencial do deputado e ex-ministro Ciro Gomes, para apoiar a petista Dilma Rousseff, o Palácio do Planalto iniciou uma operação para tentar diminuir o estrago da decisão e evitar que os votos do socialista acabem migrando para o pré-candidato tucano José Serra.

Ontem, Ciro disse que vai “espernear” até terça-feira, quando o PSB deve sacramentar a retirada de sua pré-candidatura. A preocupação aumentou ontem com duas entrevistas dadas por Ciro. Ao portal “iG”, ele criticou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e chegou a dizer que Serra é “mais preparado, mais legítimo, mais capaz” para administrar o país numa eventual crise cambial. Mais tarde, ao telejornal “SBT Brasil”, voltou a dizer que o tucano “é mais bem preparado do que a Dilma”, embora diga que prefere a petista “como pessoa”.

A grande mágoa de Ciro com o processo, em especial com o presidente Lula, ficou explícita nos ataques que fez ontem. Ao “iG”, Ciro criticou Lula, dizendo que ele está “navegando na maionese” e afirmou que não pedirá votos para Dilma. “Não me peçam para ir à televisão declarar o meu voto, que eu não vou”, afirmou ao portal na internet. À noite, no SBT, chegou a negar que dera entrevista ao “iG”, mas, na saída da emissora, admitiu que tivera uma “uma conversa de amigos” com um jornalista do portal, que não esperava ver publicada. Na TV, voltou a criticar o presidente. Segundo Ciro, Lula “está errado” ao insistir numa polarização entre Dilma e Serra.

Eleitor cearense pode retaliar

O tom de Ciro aumentou a preocupação de Lula e do PT, e há um temor especial com o Ceará, onde o socialista liderava com folga as pesquisas de intenção de votos para presidente. Há a constatação de que Dilma poderia ser prejudicada por uma espécie de retaliação do eleitor cearense. Por isso, a estratégia governista é de reaproximar Lula e Ciro, assim que passar esse período inicial de grande mágoa — como Serra conseguiu fazer com o exgovernador Aécio Neves (PSDB-MG) para manter os votos de Minas.

De forma reservada, Lula avaliou ontem que, neste momento, não é possível fazer nada, mas está determinado a buscar a reconciliação, numa “conversa reservada e pessoal” com seu ex-ministro. A orientação de Lula ontem foi a de que se evitasse rebater as críticas de Ciro.

— Deixe passar a dor de cotovelo, deixa ele viajar, depois conversamos.

Não podemos torná-lo hostil — disse Lula, segundo relatos.

De manhã, na conversa reservada que teve no Palácio da Alvorada com o presidente do PSB, o governador Eduardo Campos (PE), e o vice, o exministro Roberto Amaral, Lula já demonstrava receio com a reação de Ciro, mesmo sem conhecer ainda as declarações dele ao portal. Amaral e Campos também foram vítimas dos ataques de Ciro. Segundo o deputado, os dois “não estão no nível que a História impõe a eles”.

No PT, a preocupação do comando da campanha de Dilma é reverter a avaliação de que o cenário sem Ciro é mais favorável a Serra — para evitar que essa impressão se alastre. Já há mobilização para evitar que aliados de Ciro, como o prefeito de Belo Horizonte, Márcio Lacerda, e o próprio governador Cid Gomes (PSB-CE), seu irmão, fiquem liberados para apoiar candidatos tucanos nos seus estados.

Lacerda, apoiado por Aécio Neves, poderia apoiar a candidatura à reeleição do governador Antonio Anastasia (PSDB-MG), enquanto Cid trabalha uma aliança branca pela reeleição do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) — dois palanques de Serra.

Após o encontro com Lula, na manhã de ontem no Palácio da Alvorada, Eduardo Campos minimizou os ataques de Ciro: — Essa é a opinião do Ciro, não é a minha. Vamos fazer esse debate com tranquilidade. Cada um é livre para colocar sua opinião.

O presidente do PSB, repetindo que a decisão de retirar a candidatura ainda não foi tomada — na verdade falta ser formalizada —, disse que o que for definido terça-feira pela Executiva do partido terá de ser aceito por todos.

— A decisão que tomaremos vai ser acompanhada por todo o partido, foi isso o pactuado. E isso foi pactuado com ele (Ciro) e com todos os companheiros.

Agora, é hora de ouvir a base do partido, como o Ciro pediu. Não tem saída honrosa, o que tem é um debate democrático — disse Campos. — Se a maioria não quiser, como vamos colocar uma candidatura? Nem quem é pré-candidato quer enfrentar uma situação dessas. O Ciro foi candidato duas vezes e sabe que é preciso ter apoio partidário unificado para isso.

“Vamos deixar passar, né?”

O governador afirmou que a decisão será do PSB, mas admitiu a influência de Lula no processo: — A decisão passa pelos militantes do PSB e não pelo presidente Lula, mas ele é o coordenador do processo de sucessão e sempre nos deu a direção.

O ministro de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, defendeu Dilma, ao ser perguntado sobre a declaração de Ciro — de que Serra administraria melhor uma crise econômica: — O presidente Lula não vai comentar a declaração do deputado Ciro. Mas acredito que a comparação entre Dilma e Serra será feita pela população brasileira. A maioria dos partidos demonstra desejo de estar ao lado da ministra Dilma.

A cúpula petista já esperava a reação de Ciro, mas os coordenadores da pré-campanha decidiram não alimentar a polêmica, esperando que ele esfrie a cabeça.

— Vamos deixar passar, né? Ele sossegar o facho. Já esperávamos que, na hora que a coisa ficasse definida, ele iria explodir. Mas isso passa, o Ciro é nosso companheiro, é do bem — afirmou o ex-prefeito de Belo Horizonte e coordenador da pré-campanha de Dilma, Fernando Pimentel.

Dilma não se manifestou. Já os tucanos comemoram mais esse contratempo na candidatura petista.

— Ele tem toda razão quando reconhece a liderança de Serra e a falta de experiência de Dilma — afirmou o presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra (PE).

Ciro: 'Minha sensação agora é que o Serra vai ganhar'

DEU EM O GLOBO

Ciro elogia tucano, diz que Lula "navega na maionese" e reclama das "ameaças" do PT para retirada da candidatura

SÃO PAULO. Em entrevista ao telejornal “SBT Brasil” e ao portal “iG”, o deputado Ciro Gomes (PSB-CE) acusou o PT e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva de cometer erros graves ao pressionar, com “ameaças”, pela retirada de sua pré-candidatura à Presidência, porque seria apoiador natural de Dilma Rousseff (PT) em um eventual segundo turno com José Serra (PSDB). Ciro elogiou Serra e disse que Lula está “navegando na maionese”.

AMEAÇAS DO PT: “É geral a informação, não sei que valor possa ter, de que o presidente Lula estaria, enfim, mais o PT, fazendo força em cima dos companheiros nos estados, ameaçando. Eu vi no Ceará, ameaçando coisas mesquinhas, inclusive se o partido não retirar minha candidatura. Por exemplo, o Zé Dirceu, ex-presidente do PT, esteve no Ceará, na casa do meu irmão, que é governador, dizendo muito delicadamente que, se eu fosse candidato a governador, o PT ia retirar o apoio dele. Esse eu já mandei pastar”.

EXPERIÊNCIA DE SERRA: “Todo mundo sabe que eu sou adversário do Serra desde sempre. Agora, o Serra é mais bem preparado do que a Dilma porque já foi governador, prefeito e ministro duas vezes. A Dilma já foi ministra duas vezes, então empata aqui. (Serra) já foi deputado, já disputou eleições, já ganhou, já perdeu. E ela nunca disputou eleição. Agora, ela é melhor pessoa que o Serra. Ele é muito solitário, autoritário”.

PT X PSDB: “O Serra trata o adversário como um inimigo a ser destruído. Isso tá criando muito problema no Brasil. O PT desenvolveu esse mesmo cacoete. Então essa história de uma eleição, que, por cima da mesa, é toda elegante mas, por baixo da mesa, é dossiê para cá, dossiê para lá... Isso é um crime”.

SERRA FAVORECIDO: “O Serra quer que eu saia e não seja candidato. O PT quer que eu não seja candidato. Um dos dois está errado. É claro que é o PT, é óbvio. Porque, se eu for candidato e não tiver a ventura de ter a preferência do povo e ganhar a eleição, como eu pretendo, eu vou apoiar a Dilma, que é minha vizinha. Todo mundo sabe que eu não vou apoiar o Serra. Quem tá certo? Óbvio que é o Serra”.

LULA SEM HUMILDADE: “Tenho profundo carinho, respeito e amizade pelo presidente Lula, mas ele está errado. Está popularíssimo. Está no céu, merecidamente, porque faz um grande governo, beneficia o Brasil, beneficia o povo, mas não tem mais ninguém para dizer nada ao Lula. Ele está perdendo a humildade. Por que ele não pode tratar esses assuntos com franqueza? Por que não trata comigo, cara a cara, francamente?”

ERROS NA PRÉ-CAMPANHA DA DILMA: “Ela não tem nenhuma eleição na vida dela, nenhuma campanha. Os primeiros movimentos dela já me deixaram de cabelo arrepiado, os poucos que ainda tenho. Foi um erro atrás do outro. Acabou de ter esse trauma lá em Minas Gerais da retirada do Aécio e a Dilma desce lá e vai visitar o túmulo do Tancredo (Neves)? Aí a turma mete lá na testa dela, algo que não é culpa dela, que o PT negou-se a apoiar o Tancredo no colégio eleitoral. Aí ela sai e vai para o Ceará. Eu ainda sou candidato, caramba! (...) Erros básicos, crassos”.

CRISE À VISTA: “Em 2011 ou 2012, o Brasil vai enfrentar uma crise fiscal, uma crise cambial. Como estamos numa fase econômica e aparentemente boa, a discussão fica escondida. Mas precisa ser feita (a discussão)”.

SERRA: “Minha sensação agora é que o Serra vai ganhar esta eleição. Dilma é melhor do que o Serra como pessoa. Mas o Serra é mais preparado, mais legítimo, mais capaz. Mais capaz inclusive de trair o conservadorismo e enfrentar a crise que conheceremos em um ou dois anos.”

SEM APOIO A DILMA: “Não me peçam para ir à TV declarar o meu voto, que eu não vou. Sei lá. Vai ver viajo, vou virar intelectual.

Nunca antes...houve tanta falta de respeito::Eduardo Graeff


Acharam pouco a encenação junto ao túmulo de Tancredo Neves. Outra vez insistem no gesto debochado.

Anteontem, Dilma Rousseff voltou a carga. No seu blog oficial ela escreveu:

"Hoje se completam 25 anos da morte do presidente Tancredo Neves. Foi um grande brasileiro, que conduziu o país de volta à Democracia e ao Estado de Direito, com o sacrifício da própria vida. Nós, mineiros, sempre nos lembraremos dele pelo que disse no discurso de posse como governador de Minas Gerais, em 1983: 'O primeiro compromisso de Minas é com a Liberdade!'"

Nenhuma palavra sobre a oposição cega, mesquinha, que o PT fez a Tancredo quando ele precisava de apoio para livrar o Brasil da ditadura.

Haja memória seletiva!

Serra tem mais preparo que Dilma contra crise, diz Ciro

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Após a reunião com a cúpula do PSB que sacramentou o fim de sua candidatura à Presidência, para apoiar Dilma Rousseff (PT), Ciro Gomes disse ter a “sensação” de que José Serra (PSDB) vai ganhar a eleição. Em entrevista ao portal de internet Ig, Ciro afirmou que considera o tucano mais preparado que Dilma para enfrentar uma eventual crise cambial no futuro. Ele também fez críticas ao presidente Lula – que, para ele, “está navegando na maionese”, sentindo-se “o todo-poderoso” que “acha que vai batizar Dilma presidente”. O “pior”, afirmou Ciro, “é que ninguém chega para ele e diz ‘presidente, tenha calma’”. Ciro disse que não se envolverá na campanha: “Não me peçam para ir à TV declarar meu voto”. Em público, Lula não quis comentar as declarações de Ciro. “Estou mudo”, limitou-se a dizer. Mas Lula considerou o elogio a Serra uma traição e orientou Dilma a não entrar no bate-boca.

Isolado pelo PSB, Ciro ataca Lula e diz que Serra é mais preparado que Dilma

Deputado diz que pode encerrar vida política e critica o presidente nacional do partido e governador de Pernambuco, Eduardo Campos, e o vice-presidente da legenda, Roberto Amaral. Afirma que os dois "não estão no nível que a História impõe a eles"

Daniel Bramatti e Roldão Arruda

Após a reunião com a cúpula do PSB que sacramentou o fim de sua candidatura à Presidência, o deputado Ciro Gomes (CE) criticou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e disse que o tucano José Serra é mais preparado que a petista Dilma Rousseff para enfrentar uma eventual crise cambial no futuro.

"Lula está navegando na maionese", disse Ciro, na noite de quinta-feira, em entrevista ao portal de internet iG. "Ele (o presidente) está se sentindo o todo-poderoso e acha que vai batizar Dilma presidente da República. Pior: ninguém chega para ele e diz: "Presidente, tenha calma". No primeiro mandato eu cumpria esse papel de conselheiro, a Dilma, que é uma pessoa valorosa, fazia isso, o Márcio Thomaz Bastos (ex-ministro da Justiça) fazia isso. Agora ninguém faz."

Ontem à noite, Ciro voltou à carga. Em entrevista ao telejornal SBT Brasil, reclamou do fato de o presidente não ter discutido diretamente com ele a questão eleitoral. "Por que o presidente não trata esse assunto comigo, cara a cara, francamente?"

Também criticou José Dirceu por bombardear suas pretensões presidenciais. "O Zé Dirceu esteve no Ceará, na casa do meu irmão, que é governador, para dizer, de forma muito delicada, que o PT retiraria o apoio à candidatura dele (à reeleição) se eu fosse candidato a presidente."

No programa, ele também apontou o que vê como falhas na campanha de Dilma, como o fato de a petista desembarcar em Minas Gerais quando o Estado ainda se recuperava do trauma que foi a disputa entre Serra e Aécio Neves no PSDB. "A Dilma desce lá e vai visitar o túmulo do Tancredo. E aí a turma já mete na testa dela, e não é culpa dela, que o PT se recusou a apoiar Tancredo no Colégio Eleitoral." Na sequência, lembrou Ciro, a pré-candidata do PT seguiu para o Ceará sem falar com ele ou com o governador Cid Gomes.

Em outra entrevista, para o programa É Notícia, da Rede TV, que vai ao ar amanhã à noite, ele disse ao apresentador Kennedy Alencar que se sente "sabotado e isolado" pelo PT. Ao se referir a Serra, chamou o tucano de "chato, autoritário e intransigente".

Fim de carreira. Na entrevista ao iG, concedida na noite de quinta-feira, o deputado e ex-ministro da Integração Nacional anunciou que pode encerrar sua carreira política e atacou o presidente nacional do PSB e governador de Pernambuco, Eduardo Campos, e o vice-presidente da legenda, Roberto Amaral. Disse que os dois "não estão no nível que a História impõe a eles".
Em sintonia com o Palácio do Planalto, Campos atuou como um dos promotores do esvaziamento da candidatura própria do PSB.

Adversário ferrenho de Serra, Ciro, segundo o iG, apontou o tucano como favorito para a sucessão de Lula. "Minha sensação agora é que o Serra vai ganhar esta eleição. Dilma é melhor do que o Serra como pessoa. Mas o Serra é mais preparado, mais legítimo, mais capaz. Mais capaz inclusive de trair o conservadorismo e enfrentar a crise que conheceremos em um ou dois anos."

Na TV, Ciro negou ter se manifestado ao iG com essas palavras, mas repetiu que o tucano é mais "preparado" que Dilma por já ter exercido diversos cargos públicos, como os de governador de São Paulo e prefeito da capital.

Confronto. Segundo o iG, o parlamentar descartou a possibilidade de entrar em choque com o presidente durante a campanha. "Acompanho o partido. Não vou confrontar o Lula. Não vou confrontar a Dilma."

Ciro, que foi ministro da Fazenda no governo Itamar Franco, previu ainda turbulências econômicas no futuro próximo. "Em 2011 ou 2012, o Brasil vai enfrentar uma crise fiscal, uma crise cambial. Como estamos numa fase econômica e aparentemente boa, a discussão fica escondida. Mas precisa ser feita." E acrescentou: "Como o PT, apoiado pelo PMDB, vai conseguir enfrentar esta crise? Dilma não aguenta. Serra tem mais chances de conseguir."

Ciro frustra o Planalto e irrita Lula com elogio a tucano

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Furioso, presidente orientou Dilma a não entrar no bate-boca para não jogar mais combustível na crise

Vera Rosa e Tânia Monteiro

De todas as estocadas do deputado Ciro Gomes (PSB-CE), a que mais surpreendeu e irritou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi o elogio feito pelo antigo aliado a José Serra, candidato do PSDB ao Palácio do Planalto. Furioso, Lula orientou Dilma Rousseff, concorrente do PT, a não entrar no bate-boca para não jogar mais combustível na crise.

Para Lula, o fato de Ciro ter dito que ele está "navegando na maionese" não passa de "bobagem", mas a declaração referente a Serra - definido pelo deputado como "mais preparado, mais legítimo e mais capaz" do que Dilma - foi recebida como traição.Em público, Lula não comentou a entrevista de Ciro ao portal iG.

"Estou mudo", disse ele, ao chegar ontem para a posse do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cezar Peluso. Longe dos holofotes, porém, não escondeu a contrariedade. No seu diagnóstico, Ciro quebrou o acordo de tudo fazer para ajudar Dilma.

O presidente qualificou a situação como "dolorosa". A auxiliares, afirmou que não havia chamado Ciro para uma conversa a sós, até hoje, porque aguardava um sinal do PSB. Na prática, não sabia o que fazer. A certa altura, chegou mesmo a achar que ele aceitaria ser candidato ao governo de São Paulo, com o apoio do PT. Era o script combinado.

Depois, quando Ciro começou a bater cada vez mais duro, Lula recebeu da cúpula do PSB a garantia de que a desistência do cearense da disputa presidencial seria "administrada". O ex-ministro, porém, fugiu do controle.

Lula gosta de Ciro. Queria oferecer a ele a coordenação da campanha de Dilma ou afagá-lo de outra forma, mas não poderia jamais lhe dar a vice na chapa petista, já prometida ao PMDB. Para o governo, era isso o que o ex-ministro realmente queria.

"Ciro fez declarações injustas porque nós o acolhemos e brigamos com vários petistas por causa dele, quando havia a hipótese de sua candidatura ao governo paulista", afirmou o líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP). "Mas ele é nosso aliado. Não temos de cutucá-lo."

O ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, também evitou a polêmica com Ciro. Cauteloso, Padilha disse que a comparação entre Dilma e Serra será feita pelos eleitores. "A campanha caminha para a polarização entre dois projetos e esperamos que o PSB esteja junto conosco", insistiu.

Na direção do PT, os recados de Ciro a Lula, a Dilma e ao PMDB provocaram extremo mal-estar, mas a ordem do Planalto, que também chegou lá, foi para não esticar a corda. "As declarações que Ciro fez sobre o presidente e Dilma foram equivocadas, mas precisamos compreender que a situação dele é delicada", amenizou o deputado Geraldo Magela (DF), secretário de Assuntos Institucionais do PT.

Ciro critica Lula e afirma que Serra é mais capaz que Dilma

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Alijado da disputa, deputado diz que presidente "está navegando na maionese"

Ex-ministro diz que PMDB é "ajuntamento de assaltantes" e que o deputado Michel Temer "é o chefe dessa turma de pouco escrúpulo"

Breno Costa

Após atacar, em entrevista ao portal iG, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a capacidade eleitoral da pré-candidata Dilma Rousseff (PT), o deputado federal Ciro Gomes (PSB) disse que suas declarações foram "furtadas", mas na prática ratificou as afirmações ao se manifestar sobre o assunto ao longo do dia.

Ciro disse que conversava informalmente com a reportagem do iG quando disse que "Lula está navegando na maionese" ao acreditar que vai conseguir eleger Dilma com facilidade e que José Serra (PSDB), seu desafeto político, é "mais preparado, mais legítimo, mais capaz" do que a petista.

À tarde, na gravação de uma entrevista para o programa "É Notícia", da Rede TV!, o deputado atacou a divulgação da entrevista, que foi colocada no ar ontem cedo. Ciro afirmou que foi "furtado", mas não contradisse o teor do material.

O iG diz que "as declarações foram extraídas de conversa mantida na noite de quinta-feira em telefonema às 23h35". Segundo o portal, "foram publicadas apenas declarações do deputado" e "várias afirmações feitas em reserva não foram nem serão publicadas".

As entrevistas foram concedidas após o PSB ter decidido que Ciro não será candidato a presidente. O partido marcou uma reunião para terça-feira, a qual formalizará a decisão.Na entrevista à Rede TV!, Ciro elogiou o caráter de Dilma, ao dizer que, "se há uma pessoa de valor no PT, por quem eu possa botar a mão no fogo, por amor ao país, decência, competência, talento, é a Dilma. Portanto, o Lula acertou em cheio. Mas por desgraça, porque ninguém é completo, ela nunca disputou nenhuma eleição".

As declarações sobre Dilma foram feitas pouco após Ciro atacar o PMDB, chamado por ele de "ajuntamento de assaltantes". Michel Temer, presidente do partido e o nome mais cotado para vice de Dilma, foi considerado por ele "chefe dessa turma de pouco escrúpulo".

No final da entrevista para a TV, Ciro também disparou contra Serra, a quem definiu como um "brasileiro bastante preparado, mas uma personalidade autoritária, tenebrosa. Com o poder na mão, me parece um perigo para o país".

Depois, à Folha, ao falar sobre os atributos eleitorais de Serra, reforçou o que havia sido publicado pelo iG, ao dizer que o tucano é "mais preparado, mais legítimo do que ela", por ter "estrada, serviços prestados, derrotas, vitórias e compromissos cumpridos".

Sobre as declarações contra Lula, Ciro disse que "não diria isso do presidente da República, a não ser numa conversa particular, em que você pode dizer qualquer coisa e o contexto não será desentendido".

Mas, em seguida, afirmou que o presidente "está completamente errado, pelo Brasil e pela causa", ao falar sobre a estratégia de polarização entre PT e PSDB, um dos fatores que levaram ao sacrifício de sua candidatura pelo PSB, aliado do governo Lula.

Afirmou até que a sua pré-candidatura foi uma decisão tomada com o aval do presidente. "Isso [tarefa de correr o país apresentando sua pré-candidatura] foi acertado na mesa do Lula", disse.

Na entrevista à RedeTV!, Ciro afirmou que "a grande mídia brasileira é completamente desequilibrada" em favor do PSDB e atacou a Folha. Disse que, apesar de considerar o jornal "o melhor do país", a Folha "é completamente Serra".

Governo decide não rebater críticas de Ciro

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Deputado foi "injusto" ao dizer que Lula "navega na maionese", afirma Cândido Vaccarezza, líder do governo na Câmara

Ataques surpreenderam até o PSB; Roberto Amaral, vice-presidente do partido, que esteve ontem com Lula, diz que vai falar com Ciro

Valdo Cruz
Maria Clara Cabral
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Após as críticas e alfinetadas do deputado Ciro Gomes (PSB-CE), classificadas por governistas de "injustas", o presidente Lula vai esperar a "poeira baixar" para, então, buscar atrair seu ex-ministro da Integração Nacional para a campanha de Dilma Rousseff.

Auxiliares de Lula consideraram que as críticas do deputado, que pleiteava ser candidato pelo PSB, estão no "preço" e já eram esperadas diante do processo de isolamento a que ele foi submetido. Ontem, a ordem no governo era não rebater Ciro no mesmo tom.

Agora, o presidente vai aguardar que o PSB anuncie oficialmente, na próxima terça-feira, a esperada decisão de apoiar a candidatura de Dilma e avaliar o melhor momento para convidar Ciro para uma conversa. Antes disso, está descartado qualquer encontro.

Na avaliação de governistas, o roteiro ideal seria Lula ter falado antes com o deputado, na busca de evitar que ele fizesse suas tradicionais críticas em tom agressivo contra o governo e a candidatura de Dilma. Só que ele evitou atender ligações de assessores de Lula que desejavam agendar o encontro. Para o líder do governo na Câmara, deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), Ciro foi "muito injusto com o PT e com Lula" ao dizer que o presidente "navega na maionese".

"Nós garantimos a ele a possibilidade de sair para o governo de São Paulo, ele não topou.

Mas nós não concordamos com a tese de sua candidatura para a Presidência. Ele que tem que arcar com a política dele", disse, para depois afirmar que não queria polemizar. "Acho que a gente não deve responder ao Ciro, ele tem um jeito próprio.

Agora posso dizer que o apoio é importante e continua sendo." O ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, afirmou que a comparação entre candidatos tem de ser feita pelo eleitor, numa referência ao fato de Ciro ter dito que o tucano José Serra é mais preparado do que a petista.

Questionado sobre o assunto, o presidente do PT, José Eduardo Dutra, limitou-se a cantarolar a música "Gota d"Água", de Chico Buarque, que fala em "pote de mágoa". Lula foi na mesma linha: "Estou mudo".

A atitude de Ciro pegou de surpresa os próprios dirigentes do PSB. Roberto Amaral, vice-presidente, disse que as declarações são "ruins" e que não têm amparo no partido.

Amaral afirmou ainda que no encontro com Ciro foi acertado que a legenda teria uma posição unitária. "Com certeza vou procurá-lo [Ciro]. Essa declaração é uma opinião dele.

Somos um partido democrático, quando tomamos uma decisão, ela é obedecida por todos os quadros. Com certeza é ruim, mas não é uma tragédia", disse.

Junto com o governador Eduardo Campos (PE), presidente do PSB, Amaral esteve ontem pela manhã com Lula. "Ele [Lula] nos disse que respeitaria qualquer que fosse nossa decisão", disse Amaral.

Campos preferiu não comentar as declarações.

Colaborou Ranier Bragon, da Sucursal de Brasília

Maria e eu :: José Serra

DEU EM O GLOBO

Conheci Maria da Conceição Tavares em 1966, no Chile.

Estava exilado e começando, tardiamente, a estudar economia. No Brasil, eu havia cursado quatro anos de engenharia.

Fiquei assombrado com ela. Eu a conhecia pelos relatos dos economistas cariocas Cláudio Salm e Francisco Biato, com quem dividia o apartamento na capital chilena. Falavam-me dela o Carlos Lessa, que estava na CepalIlpes, e o Aníbal Pinto, considerado seu mestre por ela — e meu também.

Como chefe do escritório da Cepal no Brasil, dom Aníbal, grande economista chileno, deu à Conceição a ideia e, por que não dizer, a orientação para um estudo que se tornou um clássico: “Auge e declínio do processo de substituição de importações no Brasil”. Um trabalho que eu já lera e virara pelo avesso. Aliás, nosso mestre foi também o inspirador de outro estudo clássico, “Quinze anos de política econômica no Brasil”, do Lessa.

Por que o assombro? Porque ela parecia um vulcão que expelia inteligência, criatividade, veemência, gritos.

Opinava sobre todos os temas e massacrava eventuais contestadores do que dizia, às vezes até com ameaças de beliscões. Massacres? Que nada, era só estilo.

Ela se mudou com seus dois filhos para o Chile, em 1968, e ficou até 1972, trabalhando na Cepal. Descobri logo que prestava muita atenção e sempre levava em conta, do seu jeito, aquilo que os outros diziam. Não era dogmática e mudava de ideia segundo a qualidade dos argumentos alheios ou as mudanças das realidades. Respeitava e elogiava quem lhe ensinara coisas, como era o caso, entre vários, do ex-ministro Otávio Bulhões. E era de uma generosidade insuperável no trabalho intelectual, doando ideias para amigos aproveitarem em seus trabalhos e jamais reclamando os créditos. Marca registrada, também, do Aníbal Pinto.

Quando eu estava na Cepal, no final de 1970, escrevemos juntos um artigo sobre a economia brasileira, que acabou virando um texto importante na época: “Além da estagnação: uma discussão sobre o estilo de desenvolvimento recente do Brasil”, título sugerido por Aníbal Pinto. Lembro que passei uns dias com ele na sua casa de praia, revisando linha por linha. O Cláudio Salm escreveu recentemente uma longa e interessante análise sobre esse trabalho.

Uma coisa pouco ou nada sabida: durante alguns meses, em 1972, a Conceição assessorou o governo chileno, para contribuir nas tentativas de dar algum estabilidade à economia, assolada pelo galope da superinflação e do desabastecimento, que levava ao mercado negro. Interrompeu esse trabalho quando voltou ao Brasil, e sugeriu-me substituí-la, coisa que fiz, não por achar que, àquela altura, as coisas iriam terminar bem, mas para tentar alargar os limites do possível. Cheguei até a elaborar o esboço de um plano de estabilização e arrumação econômica, bancado pelo ministro da Fazenda, mas que virou pó diante do acirramento dos conflitos e da crise.

Oito momentos inesquecíveis com a Conceição:

• eu, de cama durante semanas, com febre tifoide grave e reincidente, entupido de antibióticos enjoativos, ouvindo dela a notícia da assinatura do AI-5;

• vendo, em sua casa, o Neil Armstrong pisar na lua e falar com um Nixon eufórico;

• depois de um jantar, na casa do Aníbal Pinto, minha mulher, Mônica, chilena, sorridente mas abismada, contemplando um grupo de pessoas — a Conceição, eu, o Aníbal e a Malucha, sua mulher e bailarina, como a Mônica — cantando e dançando samba puladinho, que ela nunca tinha visto na vida. Conceição tinha o samba no pé e, confesso, foi com ela que aprendi de verdade a deixar o ritmo comandar as pernas;

• de madrugada, na maternidade, na mesma sala onde a Mônica sofria as dores do parto de nossa filha, discutindo política e economia com a Conceição, sempre enfática, embora mais doce do que de costume, dadas as circunstâncias;

• na Cepal, de manhã, ela entrando na sala do dom Aníbal, com quem eu trabalhava, e ele dizendo: “A ver, Doña Emergencia, cuál es el problema grave y urgente en el mundo hoy día? A ver!"

• por incrível que pareça, de novo na maternidade, nas mesmas circunstâncias, quando meu filho nasceu, em junho de 1973 — ela estava de passagem por Santiago e passamos a noite prevendo o golpe que iria derrubar Allende pouco mais de dois meses depois;

• no Rio, em meados de 1977, quando voltei do exílio, então nos Estados Unidos, por um mês e meio apenas — depois de prescrita uma condenação que tivera —, e me hospedei no apartamento dela, na Praia do Flamengo. Um calor daqueles, sem ar refrigerado, e conversa durante toda a madrugada, ela controlando o volume da voz para não acordar os filhos. Lembro muito bem que Conceição e o Lessa, entre outros, tiveram grande influência para que eu fosse convidado a ser professor da Unicamp, ao voltar definitivamente para o Brasil, em 1978. Lá, fomos colegas e continuamos a conviver;

• em São Paulo, na casa dos professores João Manoel Cardoso de Mello e Liana Aureliano, em 1980, ela fazendo 50 anos de idade e ouvindo o ”Parabéns pra você“.

Conceição sempre teve hábitos austeros, noves fora a modéstia dos seus rendimentos face aos encargos familiares.

Eu implicava com sua geladeira, invariavelmente semivazia... Ela poderia ter ganhado muito dinheiro, na iniciativa privada, porque possuía uma boa formação em matemática, além do seu conhecimento de economia, dois requisitos importantes para faturar no mercado financeiro.

Manteve-se, no entanto, sempre professora e pesquisadora, sua grande vocação.

Na política, fora próxima do PCB, nos anos 50, mas não parecia ter paciência para uma militância organizada. Por isso, me surpreendi quando ingressou no PT e se elegeu deputada, talvez na campanha mais barata já feita no Rio de Janeiro. Desistiu, porém, de concorrer a outro mandato e retomou sua vida de sempre.

Ao longo dos anos 80, com meu afastamento gradual da atividade acadêmica, nossos encontros foram se tornando mais raros. Mas carrego sempre comigo o afeto e a admiração por esta amiga tão inteligente, austera, excêntrica, doce e generosa.

José Serra é pré-candidato a presidente da República.

Conceição Tavares faz 80 anos e festa reúne, no Rio, Serra e Dilma

DEU EM O GLOBO

Lista de convidados da economista inclui Luciano Coutinho, Lessa e Belluzzo

Liana Melo

Vai ser uma festa de arromba.

Daquelas que, se não entrar para a história, ficará para sempre na memória dos cerca de 200 convidados presentes ao aniversário de 80 anos da economista Maria da Conceição Tavares. A festança será exatamente como ela planejou: rodeada de filhos (Laura e Bruno), netos (Leon e Ivan) e amigos. Considerada decana de uma legião de economistas brasileiros, Conceição vai juntar “seus meninos”, como carinhosamente fala da sua enorme lista de ex-alunos.

De economistas ilustres a précandidatos à Presidência da República, já confirmaram presença os adversários políticos Dilma Rousseff (PT) e José Serra (PSDB). Na lista de convidados, está o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, o ex-presidente do banco Carlos Lessa, além do reitor da UFRJ, Aloísio Teixeira, os professores da Unicamp, João Manoel de Mello e Luiz Gonzaga Belluzzo. Sem falar de peemedebistas históricos, como Rafael de Almeida Magalhães.

Procurada, a professora não quis falar sobre o assunto.

A festa vai ser hoje e está marcada para as 20h, na Casa do Minho, no Cosme Velho, Zona Sul do Rio. Conceição nasceu em 24 de abril de 1930.

— A Conceição é uma amiga e uma grande professora. É uma guerreira. Devemos agradecer a Portugal por ter nos presenteado com essa brasileira — declarou Dilma.

A escolha do local traduz à perfeição o estilo de Conceição.

Uma comemoração luso-brasileira para a aniversariante que nasceu portuguesa, na região de Aveiro, mas adotou a cidadania brasileira, três anos após desembarcar no Brasil em 1954.

O economista e ex-aluno José Luís Fiori resume a professora Emérita da UFRJ como “matemática, economista, intelectual com vasta formação histórica, filosófica e literária, professora, militante, deputada federal, torcedora fanática do Vasco e admiradora da Mangueira”.

No texto dedicado a ela, intitulado “À mestre, com carinho” — numa alusão ao clássico do cinema ‘Ao Mestre, Com Carinho’, de 1967 — Fiori remete a uma das características menos conhecidas de Conceição. A professora é cinéfila de carteirinha.

Professora prepara ensaio sobre América do Sul

“Poucos professores no mundo, ao chegar aos 80 anos, poderão assistir uma eleição da importância da que ocorrerá no Brasil, em 2010, e saber que os dois principais candidatos à Presidência da República foram seus alunos, e se consideram, até hoje, seus discípulos”. É assim que Fiori termina sua homenagem à Conceição, que prepara um ensaio sobre América do Sul para entrar no livro que o professor da UFRJ lança este ano.

— Pode ser até que os précandidatos não se encontrem na festa. Mas o simples fato de terem confirmado presença demonstra a enorme capacidade de Conceição de aglutinar admiradores, mesmo sendo polêmica — avalia João Saboia, diretor do Instituto de Economia (IE) da UFRJ.

A roupa para a festa e os sapatos foram escolhidos a dedo para evitar qualquer desconforto na festa. Aos amigos mais próximos, Conceição avisou que quer dançar. Se depender da trilha sonora, ninguém ficará parado.

Amante da Bossa Nova, o cardápio musical incluirá ainda “New York, New York” e até frevo.

Os mais íntimos garantem que é uma homenagem à amiga Hildete Pereira, professora da UFF e que fez a lista de convidados.

Filha de mãe católica e monarquista e de um pai anarquista, Conceição teria aprendido, ainda na infância, a conviver com as divergências ideológicas e uma ligeira “rebeldia anárquica”, como costuma comentar Fiori.

Conceição é uma mulher que nunca teve problema em desancar publicamente o que discordava.

Foi o caso de Marco Lisboa, que, em 2003, era secretário de Política Econômica e um dos autores do documento “Política econômica e reformas estruturais”, divulgado pelo Ministério da Fazenda: “Quase tive um ataque quando li aquilo! Estou histérica”, declarou na época.

O documento defendia a focalização dos programas sociais.

E definiu o ex-aluno como “um bom menino que adorava fazer modelos matemáticos e adora até hoje”

Críticas até aos aliados mais próximos

Nem mesmo o governo de Luiz Inácio Lula da Silva, de quem foi aliada desde o primeiro momento, ficou a salvo.

Em 2008, ela chamou de “imbecil” a política de juros.

Até hoje é vista como a maior representante do pensamento da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), celeiro de teses do desenvolvimento apoiado na industrialização voltada para o mercado interno. Foi lá que conheceu os mestres Celso Furtado, Anibal Pinto e Raul Prebish.

Em cinco décadas de atividade intelectual, Conceição publicou três livros considerados obrigatórios nas faculdades de Economia: “Auge e declínio do processo de substituição de importações”, “Acumulação de capital e industrialização no Brasil” e “Ciclo e crise: o movimento recente da economia brasileira”.

Na época da ditadura, exilou-se no Chile, onde conheceu José Serra, depois de escapar da prisão com a ajuda de Mário Henrique Simonsen, seu ex-aluno e, na época, ministro do governo Geisel. E foi eleita deputada federal em 1994 pelo PT.

Com a emoção à flor da pele, que a levou às lágrimas em cadeia nacional de televisão, ao defender o Cruzado, nos anos 80, Conceição mantém a verve afiada.

Sobre si mesma escreveu, certa vez, em publicação do Conselho Regional de Economia: “Eu pessoalmente, já fui para a cadeia, sem nem saber por que, dado que sou apenas uma rebelde, pelo que escrevo, pelo que esbravejo. Mas a vocês quero dizer o seguinte: já estou velha e cansada, mas não desisti”.

A crítica em questão :: Prosa & Verso



Qual o valor e o lugar da crítica literária hoje? Espremida em meio à celebração geral de festivais, prêmios e campanhas publicitárias, ela se conforma ao papel de guia de consumo e, numa manifestação conservadora, prega o retorno à estabilidade e pureza das belas letras. A opinião é da crítica literária Flora Süssekind, professora de teoria do teatro da UNI-Rio e pesquisadora da Fundação Casa de Rui Barbosa, autora do ensaio "A crítica como papel de bala", capa do Prosa deste sábado. Flora constrói sua análise a partir de obituários sobre o prolífico crítico Wilson Martins, que morreu em janeiro, marcados por um "certo proselitismo agressivamente conservador". E aponta "o apequenamento e a perda de conteúdo significativo da discussão crítica, assim como da dimensão social da literatura no país nas últimas décadas". Um texto profundo e corajoso, que convida a pensar.

A edição traz ainda resenhas dos livros "Léxico familiar", de Natalia Ginzburg (Cosac Naify), por Manoela Sawitzki e "Poeira: demônios e maldições", de Nelson de Oliveira (Língua Geral), por Antonio Marcos Pereira. Em sua coluna, José Castello comenta "O dia da coruja", do italiano Leonardo Sciascia (Alfaguara).

Na última página do caderno, um convite aos leitores: na próxima terça-feira, dia 27, às 19h30m, na Travessa do Shopping Leblon, acontece mais uma edição do projeto Prosa nas Livrarias e desta vez o tema será "Alice no País das Maravilhas", obra-prima de Lewis Carroll. Desde que o diretor Tim Burton anunciou sua versão para a história - que chegou finalmente aos cinemas do Rio nesta sexta - o mercado editorial vive uma febre de Alice, com a chegada de caprichadíssimas edições do clássico. Para falar sobre o encantamento que o personagem e o livro ainda provocam, estarão na mesa a escritora Ana Maria Machado, apaixonada por Alice e autora de uma tradução da obra para a editora Ática; o artista plástico Luiz Zerbini, responsável pelas belas ilustrações que integram a edição da Cosac Naify, lançada em dezembro; Isabel Lopes Coelho, editora da área infantojuvenil da Cosac; e Mariana Zahar, da Editora Zahar, que acaba de lançar sua segunda versão da obra, agora em formato de bolso, com as ilustrações originais de John Tenniel.

A entrada é franca.

Jobim Sinfônico

A arte de Antonio Carlos Jobim esteve sempre próxima, em sua sofisticação, da música de concerto. Profundos conhecedores desse veio específico de sua obra, os compositores e arranjadores Mario Adnet e Paulo Jobim, filho de Tom, adaptaram para orquestra sinfônica 17 composições do maestro carioca, nascido na Tijuca em 1927, criado em Ipanema e falecido em Nova York, em 1994.


A canção do africano :: Castro Alves


Lá na úmida senzala,
Sentado na estreita sala,
Junto ao braseiro, no chão,
Entoa o escravo o seu canto,
E ao cantar correm-lhe em pranto
Saudades do seu torrão ...

De um lado, uma negra escrava
Os olhos no filho crava,
Que tem no colo a embalar...
E à meia voz lá responde
Ao canto, e o filhinho esconde,
Talvez pra não o escutar!

"Minha terra é lá bem longe,
Das bandas de onde o sol vem;
Esta terra é mais bonita,
Mas à outra eu quero bem!

"0 sol faz lá tudo em fogo,
Faz em brasa toda a areia;
Ninguém sabe como é belo
Ver de tarde a papa-ceia!

"Aquelas terras tão grandes,
Tão compridas como o mar,
Com suas poucas palmeiras
Dão vontade de pensar ...

"Lá todos vivem felizes,
Todos dançam no terreiro;
A gente lá não se vende
Como aqui, só por dinheiro".

O escravo calou a fala,
Porque na úmida sala
O fogo estava a apagar;
E a escrava acabou seu canto,
Pra não acordar com o pranto
O seu filhinho a sonhar!

O escravo então foi deitar-se,
Pois tinha de levantar-se
Bem antes do sol nascer,
E se tardasse, coitado,
Teria de ser surrado,
Pois bastava escravo ser.

E a cativa desgraçada
Deita seu filho, calada,
E põe-se triste a beijá-lo,
Talvez temendo que o dono
Não viesse, em meio do sono,
De seus braços arrancá-lo!