quarta-feira, 19 de maio de 2010

Reflexão do dia – Karl Marx


Não se considera a eleição filosoficamente, quer dizer, em sua essência peculiar, quando ela é compreendida imediatamente em relação ao poder soberano ou ao poder governamental. A eleição é a relação real da sociedade civil real com a sociedade civil do poder legislativo, com o elemento representativo. Ou seja, a eleição é a relação imediata , direta, não meramente representativa, mas real, da sociedade civil com o Estado político. É evidente, por isso, que a eleição constitui o interesse político fundamental da sociedade civil real. É somente na eleição ilimitada , tanto ativa quanto passiva que a sociedade civil se eleva realmente à abstração de si mesma, à existência política como sua verdadeira existência universal, essencial. Mas o acabamento dessa abstração é imediatamente a superação da abstração. Quando a sociedade civil pôs sua existência política realmente como sua verdadeira existência , pôs concomitantemente como inessencial sua existência social , em sua diferença com sua existência política; e com uma de suas partes separadas cai a outra, o seu contrário. A reforma eleitoral é, portanto, no interior do Estado político abstrato, a exigência de sua dissolução, mas igualmente da dissolução da sociedade civil.


(Karl Marx, “Crítica da Filosofia do Direito de Hegel”, 1843, Pag. 135 – Boitempo Editorial, São Paulo, 2005)

Limites na campanha:: Merval Pereira

DEU EM O GLOBO

A decisão do PSDB de entrar com um processo no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por propaganda antecipada da candidata Dilma Rousseff no programa do PT, do dia 13, é sinal de que prevaleceu o bom senso, em vez da proposta anarquista de que também os tucanos e seus aliados aproveitassem seus programas partidários para fazer a apologia do candidato José Serra.

Como o TSE só age quando instado por alguma queixa, o PT ficaria livre de punição desta vez, abrindo caminho para um acordo tácito com o PSDB.

Não foi outra, por sinal, a proposta que o presidente do PT, José Eduardo Dutra, fez ao senador Sérgio Guerra, presidente do PSDB, logo no início da chamada pré-campanha.

A pretexto de não permitir a judicialização da campanha sucessória, Dutra propôs que os dois partidos abrissem mão de recorrer ao TSE.

Com isso, estariam os próprios partidos estabelecendo os limites da campanha eleitoral, ou, por outro lado, decidindo que não há limites, fazendo tábula rasa da legislação existente.

Seria a oficialização do vale-tudo eleitoral, um retrocesso institucional digno de nota.

Depois que o próprio presidente Lula ancorou o programa do PT que apresentou a candidata Dilma Rousseff como a verdadeira responsável por todos os êxitos do seu governo, transformandoo em mero coadjuvante, quebrando claramente as regras que visam a dar um equilíbrio à disputa eleitoral, também o PSDB se viu tentado a fazer o mesmo.

Recorrendo à Justiça Eleitoral mais uma vez, os tucanos indicam que continuam querendo estabelecer limites legais à atuação de Lula, em cuja popularidade repousam as esperanças de eleger Dilma.

Pedindo que o PT seja punido com o cancelamento do programa partidário do segundo semestre de 2011, o PSDB sinaliza que, mesmo sendo a punição inócua em termos eleitorais, prefere marcar posição ao exigir o cumprimento da lei.

A chamada judicialização da política, esse novo fenômeno que leva em algumas situações à politização da Justiça, se generalizada, poderia criar condições para impasses institucionais.

Em todos os casos recentes, no entanto, os tribunais superiores foram chamados a decidir por consultas dos próprios políticos, o que retiraria o caráter de ingerência de um poder sobre o outro.

A judicialização da campanha presidencial reflete sobretudo o esforço da oposição de criar constrangimentos para o presidente Lula, para que, quando a campanha realmente começar, depois da Copa do Mundo, ele esteja menos à vontade para quebrar as regras da lei.

Essa guerrilha judicial é consequência da participação ativa de um presidente extremamente popular disposto a tudo para eleger sua candidata.

Também a oposição é acusada pelo PT de infringir a lei, e esta não foi a primeira vez em uma campanha que um partido exorbitou no programa partidário.

O PSDB teve seu programa suspenso na campanha de 2006 pela mesma razão: usar o tempo partidário para fazer apologia de seu candidato, naquela ocasião Geraldo Alckmin.

Nesta campanha, no entanto, têm sido do partido governista as iniciativas que se chocam com a legislação eleitoral, e as multas se tornam mais graves por que foram dadas ao próprio presidente da República, coisa que nunca acontecera anteriormente.

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso teve uma participação exemplar na eleição de 2002.

A oposição alega que assim procedeu porque não teve condições de participar da campanha, já que naquela ocasião o candidato tucano, José Serra, tentava se separar da imagem do governo, que era mal avaliado.

Essa é uma ilação venenosa da oposição da época que não se coaduna com a transição de poder verdadeiramente republicana que ele patrocinou.

Seja como for, nesta campanha eleitoral, o presidente Lula tem todas as condições de trabalhar abertamente por sua candidata, que só existe em termos políticos devido ao apoio que recebe dele.

Justamente por isso, o TSE tem que atuar com a maior firmeza para manter o clima de igualdade entre os candidatos.

Uma consequência da crescente importância que os tribunais vêm ganhando nas disputas políticas é justamente a facilidade com que os juízes se pronunciam em público.

O ministro do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio Mello, que assumiu um dos cargos do TSE, já antecipou sua posição ao comentar que fica muito triste ao ver um programa como o do PT que, segundo ele, fez apologia de uma pré-candidata à Presidência.

Para o ministro do Supremo, o presidente deveria adotar postura equidistante, e o contrário, como está acontecendo, é abandono de princípios, perda de parâmetros, inversão de valores.

Mesmo que esteja 100% certo e eu acredito que esteja , o ministro Marco Aurélio Mello não poderia se pronunciar previamente sobre um caso que vai julgar, assim como o presidente da República não poderia defender tão abertamente uma candidata à sua sucessão, utilizando os poderes que tem como na cadeia nacional do programa de 1º de Maio para alavancar sua votação.

Mas, com a exorbitância do presidente, o sistema de pesos e contrapesos entre os poderes só pode ser exercido por um membro de outro Poder, e nos últimos tempos tem sido o Judiciário que vem exercendo esse papel.

Sinal de que a legislação eleitoral está sendo ultrapassada pelos fatos e pela tecnologia, e precisa ser revista para que não reste a sensação de que a democracia brasileira é de fancaria.

A pena vale a pena:: Dora Kramer

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

A conta é simples, pragmática e impudente: mais vale o risco de uma ilegalidade de resultados que a desvantagem da legalidade do prejuízo certo.

Em miúdos políticos eleitorais: foi tão vantajosa a aposta que o PT fez ao transformar seu programa partidário pela segunda vez consecutiva, na quinta-feira passada, em programa de propaganda eleitoral da pré-candidata Dilma Rousseff, que os partidos de oposição também usarão os seus para promover o pré-candidato José Serra.

A lei? Esta deveria ser apenas obedecida, mas é objeto de todo tipo de discussão. Fala-se de tudo: da impossibilidade de se atender às balizas legais face à imposição da realidade que requer igualdade de condições na disputa até as evidências de que a Justiça Eleitoral se mostra incapaz de assegurar o cumprimento da lei.

Isto posto, não haveria como ? sem enveredar para o terreno da mais completa ingenuidade ? se exigir dos partidos a observância da compostura.

Ou seja, uma vez comprovado que a Justiça não só tarda como falha, passa a prevalecer o entendimento de que o custo-benefício do ponto de vista eleitoral dá ganho de causa à transgressão.

As premissas de um debate dessa ordem sem dúvida alguma são deformadas, mas o cenário em que ele se dá é lamentavelmente realista.

Começou a ser desenhado ao longo do ano passado. De um lado, o Tribunal Superior Eleitoral por reiteradas vezes rejeitou ações da oposição reclamando que o governo fazia campanha eleitoral antecipada para a então ministra Dilma Rousseff.

Argumentava-se que as representações não eram bem fundamentadas. E aí entra o outro lado, o do Ministério Público, que durante todo o tempo se manteve omisso a despeito de ter também a prerrogativa de, em nome da sociedade, contestar não apenas abusos eleitorais, mas administrativos como o uso indevido da máquina pública.

O TSE só começou a agir quando cobrado mais duramente pela imprensa. Multou duas vezes o presidente da República que, ainda assim, confrontou. No caso do programa do PT que foi ao ar na quinta-feira passada, ganhou porque o tribunal julgou com quatro meses, 13 dias e uma decisiva hora e meia de atraso a ação que pedia a suspensão.

O pedido visava a penalizar o partido por infração do mesmo tipo cometida em dezembro de 2009. Foi apresentado ao TSE no último dia do ano às 17h20. Só foi julgado no dia 13 de maio de 2010, uma hora e meia após a exibição do programa contestado.

A pena? R$ 25 mil em multas e suspensão do programa do PT em 2011. Francamente, foi de graça.

Agora, DEM, PSDB e PPS têm cada um 10 minutos nos dias 27 de maio, 17 e 24 de junho, respectivamente.

O DEM já anunciou por intermédio do presidente Rodrigo Maia disposição de usar o espaço para fazer propaganda de José Serra.

O PPS, segundo o presidente Roberto Freire, prefere um programa de caráter partidário, mas sem ignorar o período eleitoral. "Vamos dizer que temos candidato e que é José Serra."

O PSDB diz que sua atitude depende da resposta da Justiça a uma representação do partido contra o último programa do PT, pedindo multa de R$ 250 mil.

Parece pretexto, feito no propósito de perder. Inclusive porque se os tucanos se consideram vitimados por dano irreparável com a propaganda de Dilma não será com multa que vão se sentir reparados.

Só há um jeito à vista: com troco na mesma moeda, triplicando a aposta, entrando no jogo em que a Justiça joga seu crédito.

Vai você. Enquanto amigos e correligionários de Aécio Neves se alvoroçam a espalhar a ressurreição da hipótese da formação da chapa puro-sangue no PSDB para disputar a Presidência da República, os mais próximos do pré-candidato José Serra que antes eram os inquietos, agora se fazem de mortos.

Dizem que o que "Minas" decidir estará bem decidido. Já Aécio, da Itália, manda avisar que o que Serra resolver estará bem resolvido.

O ex-governador mineiro volta ao Brasil no fim de semana. Ao deixar o governo de São Paulo, Serra havia dito que a questão do vice seria resolvida em maio.

O que é isso, companheira? :: Fernando de Barros e Silva

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

SÃO PAULO - "Vocês notaram que do Gabeira ninguém fala? Esse sim sequestrou. Ele era o escolhido para matar o embaixador. Ninguém fala porque é candidato ao governo do Rio e se aliou ao PSDB".

Marta Suplicy falava como militante petista, em defesa de Dilma Rousseff. Mas, dentro dela, falava também a sinhazinha que Marta tantas vezes não consegue reprimir: "Esse sim sequestrou"!

A frase lembra, é claro, o "relaxa e goza", que ela, ministra do Turismo, dirigiu às vítimas do caos aéreo em 2007. Lembra ainda a pergunta que seu programa de TV fazia a Gilberto Kassab na campanha de 2008: "É casado? Tem filhos?".

Da primeira, Marta se desculpou logo. Da segunda, premeditada, veio se desculpar só recentemente, numa entrevista para a TV. O deputado deve esperar mais um pouco.

Gabeira tinha o codinome de Honório quando alugou a casa que serviu como cativeiro do embaixador Charles Elbrick, sequestrado em setembro de 1969. Era uma figura secundária na operação. Não integrou o grupo que capturou o americano nem, muito menos, seria seu assassino se as coisas desandassem.

O provável algoz de Elbrick, conforme todos os relatos, seria Virgílio Gomes da Silva, o Jonas, veterano da ALN que comandava a ação. A ideia do sequestro, que Elio Gaspari no seu livro chama "o grande golpe", havia sido de Valdir. Era este o nome de guerra de Franklin Martins, atual ministro de Lula.

Tudo isso é história conhecida, que Marta deve saber. Mais, pelo menos, do que se sabe a respeito da atuação de Dilma entre 1967 e 1970, na Colina e na VAR-Palmares, também adeptas da luta armada.

"Lutei contra a ditadura do primeiro ao último dia, com os meios e as concepções que eu tinha", disse ela outro dia no programa de TV do PT. Era uma fala sinuosa, cheia de termos proibidos, como se Dilma precisasse ocultar do grande público algo de que, no fundo, se orgulha. Gabeira é diferente. Este, sim, virou a página da guerrilha. E não consta que seja um monstro de direita.

PT & PMDB, Inc. :: Fernando Rodrigues

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

BRASÍLIA - O PMDB formalizou a indicação do deputado Michel Temer como candidato a vice numa chapa encabeçada por Dilma Rousseff, do PT. Embora as convenções das duas legendas ainda precisem ratificar o casamento, a aliança hoje parece quase irreversível.

Trata-se apenas de um projeto de poder. Não há ideologia envolvida. Mas mesmo esse aspecto negocial e previsível não retira do acordo um ar de virada histórica. O PT nunca disputou o Palácio do Planalto apoiado, desde o início, por uma sigla tão forte como o PMDB.

Quem sempre ancorou as pretensões do PT foram seus militantes e a presença constante de Lula em todas as eleições pós-ditadura militar. Lula neste ano está fora. Parte considerável dos militantes aboletou-se em empregos públicos. Restou ao PT capitular ao establishment. O epítome da guinada é a joint venture com o PMDB.

A propósito da trajetória do PT rumo à centro-direita, o PP (ex-Arena, ex-PDS) só não entra na aliança dilmista porque não quer. Lula ainda tem esperanças de cooptar a sigla de Paulo Maluf.

A entrada do PMDB na coalizão petista é parte de um escambo. Os peemedebistas têm centenas de cargos no governo federal. Em troca, dão o seu precioso tempo de TV para o PT. Simples assim.

Há também oportunidade política. O PMDB embarca por ver perspectiva de poder no "projeto Dilma" -apesar de a sigla não ser especialista em vatícinios eleitorais.

O PMDB perdeu a eleição para presidente em 89 (com Ulysses Guimarães) e em 94 (Orestes Quércia). Em 98, ficou sem candidato. Em 2002, com José Serra (PSDB), registrou novo fracasso.

Agora a cúpula peemedebista considera ter acertado o passo. E se Dilma perder? Não tem problema. É só um negócio. O PMDB acabará participando do próximo governo. Não importa qual seja o governo.

Noves fora a economia e a renda mínima...:: Rosângela Bittar

DEU NO VALOR ECONÔMICO

Os candidatos à Presidência da República tateiam para evitar trombadas com o eleitorado que, teoricamente, gostaria de ter a continuidade, nos próximos anos, do governo atualmente em vigor. Estão exagerando, porém, na omissão sobre seus propósitos e planos que devem incluir, não é possível que não, mudanças cuja necessidade é óbvia. Não podem confundir a popularidade recorde e pessoal do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 80%, que os pesquisadores apuram e dizem de onde vem, com aprovação de erros expostos à luz do dia e à crítica de quem tem o mínimo de discernimento.

A ideia da continuidade, como estratégia de campanha, é aceitável, mas no que o governo vai bem. Ou os candidatos não estão falando o que pensam ou estão com muito medo. Medo de confundir o eleitorado e levá-lo a concluir que vai mudar tudo. Porém, quem pensa seu voto acha o método uma péssima escolha, agressiva à inteligência dos que esperam exatamente mudanças do que, acreditam, vai mal no governo.

Se os três principais candidatos à sucessão do presidente Lula, dois deles com mais de 30% de intenção de voto, estão realmente decididos a manter o país como está, falta aparecer o que vai consertar o que está errado e preencher as lacunas.

Os candidatos precisam dizer, em algum momento, o que não pode, não deve e é preciso evitar a todo custo que seja continuado. Volta e meia um deles, inclusive a que tem o apoio do governo, faz uma declaração que revela discordância do que está em curso, mas as propostas são medrosas, genéricas, do tipo "vamos avançar", nada mais.

Na Educação não se espera continuidade de uma administração que se dedicou à expansão, à quantidade a qualquer custo, e ficou a dever tudo na qualidade em todos os níveis de ensino. Os planos de saúde prosseguem sem controle, destemperando os cidadãos, sem regulação eficiente. Já vai se tornando um abuso a injustiça com a previdência social do trabalhador do setor privado, em confronto com os privilégios do funcionário público, reforma da qual foge o governo como vão fugir os continuistas candidatos.

Não deve haver um só brasileiro pronto a dar seu voto à continuidade da situação na área da Saúde, do recrudescimento de doenças ao descaso do governo com os problemas crassos da área, da omissão diante da necessidade de travar uma verdadeira guerra, uma revolução que consiga compatibilizar políticas preventivas com o enfrentamento do descalabro do atendimento hospitalar, público e também privado, este sem qualquer controle ou fiscalização.

Aqui, candidatos, é preciso mão de ferro, não continuidade da leniência, da contemporização. Sobre essa questão dilacerante da saúde - ainda ontem um contribuinte reclamava, na TV, que seu doente tirou a própria temperatura e trocou o próprio soro no corredor do hospital, ou seja, estão todos pela garganta com essa situação - o que surge é uma nova ameaça. O aumento de impostos, da carga tributária, novamente o chororô pela falta do imposto do cheque, a CPMF, cuja arrecadação nunca foi integralmente para a saúde e não se tem notícia de que a saúde tinha todas as atenções até 2008, quando o transbordante imposto desapareceu.

O secretário Otacílio Cartaxo, da Receita Federal, em entrevista, ontem, deu uma dose de coragem aos postulantes ao comando do país ao afirmar que o desempenho dos primeiros quatro meses de 2010 indica que a arrecadação de tributos não somente recuperou as perdas da crise, como está aumentando a taxas superiores às verificadas antes dela. Não, continuam a falar em criação do imposto.

Como se não bastasse, o governo prossegue na punição ao contribuinte de quem recolheu mais impostos do que o devido, retendo suas devoluções quando já havia anunciado não fazê-lo, numa espécie de picuinha teimosa e pessoal que os candidatos à sucessão querem continuar. Dirão, são bobagens. Mas bobagens que tiram da classe média a tolerância para ouvir bobagens de candidatos que lhe pedem o voto.

Não há promessas de descontinuidade da tolerância com a sangria das centrais sindicais impostas ao trabalhador, via governo, que com elas exacerba em adulação, inclusive com o veto à fiscalização mínima. Da falta de soluções reais para a segurança pública, não há promessa de descontinuidade.

Na promessa de continuidade está implícita, então, a desobediência às leis, à justiça e à ética, o respeito aos transgressores de toda sorte, tolerados hoje como nunca antes. Descontinuar o aparelhamento da administração é preciso, como é mais do que necessário retomar a construção de instrumentos que tornem possível fazer uma gestão pública eficiente. Um parênteses para a desmontagem promovida nas agências reguladoras e sua ocupação partidária, o desvirtuamento de um instrumento promovido sistematicamente a partir de uma rebelião do Executivo na área de Energia Elétrica.

Por coincidência, os candidatos falaram esta semana sobre o assunto, a do governo, sobre quadro de pessoal para as agências - funcionários, contratações, abertura de postos para o funcionalismo - , o da oposição sobre a desregrada ocupação política. Mas do seu resgate como instrumento de regulação, controle e fiscalização, com suas funções em administração moderna preservadas, não se prometeu nada. O governo combate a fiscalização de uma maneira geral, especialmente a do Tribunal de Contas da União. Haverá continuidade?

É de se imaginar que sim, pois só falam em continuidade, continuidade, continuidade. Talvez temam que, falando em mudanças do que está equivocado, mesmo na linguagem cifrada de palanque, o eleitorado passe a temer a perda do que, mostram das pesquisas superficiais aos estudos mais científicos, deu certo: a economia e os programas de transferência de renda. Não é pouco, mas o medo da mistura de estações leva-os a preferir simplificar com a promessa de continuidade das mazelas.


Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília. Escreve às quartas-feiras

Tucanos pressionam para anunciar mineiro na convenção de junho

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Ausência de Aécio na pré-campanha estaria fazendo Serra perder espaço no Sudeste, especialmente em Minas

BRASÍLIA - Dirigentes do PSDB e setores próximos do presidenciável José Serra querem o ex-governador mineiro Aécio Neves como vice na chapa tucana já na convenção nacional de 12 de junho. Mas, nos bastidores, Aécio diz que "quem tem prazo não tem pressa".

Os aecistas advertem que "não se dilui um fato da importância da vice-presidência na convenção". Aécio só desembarca em Minas na segunda-feira, de volta de férias na Europa.

O que provocou a inquietação dos tucanos foi a informação de que pesquisas do próprio partido mostram Serra perdendo terreno no Sudeste - especialmente em Minas - por conta da ausência de Aécio e dos programas do PT na televisão. Setores do tucanato avaliam que o debate da chapa puro-sangue favorece o PT. Acreditam que a discussão "acordou" a militância petista e que é preciso agir rápido com um fato político capaz de pôr Serra em curva ascendente nas pesquisas.

A Lei Eleitoral estabelece prazo até 30 de junho para lançamento oficial dos candidatos, mas tucanos estão divididos. Os que trabalham com a data-limite da convenção afirmam que a chapa terá de ser apresentada dia 12. Não querem escolher um "nome-estepe" para vice e, depois, trocá-lo. "Não há essa exigência de fechar a chapa no dia 12", diz o presidente do PSDB mineiro, deputado Nárcio Rodrigues.

Em Fortaleza, Serra classificou de "especulação" a notícia de que Aécio teria confidenciado a amigos em São Paulo, por telefone, que seria vice na chapa presidencial. "Não ouvi de nenhum amigo próximo. Só vi especulação na imprensa e não tenho nada para comentar. Qualquer coisinha que eu diga dá margem para especular", disse. / C.S. e CARMEN POMPEU, ESPECIAL PARA O ESTADO

PERGUNTAS & RESPOSTAS

1. Por que a definição de Michel Temer como vice agrada a Dilma?

O principal patrimônio de Temer é o tempo da propaganda eleitoral gratuita na TV e no rádio. Com o PMDB do seu lado, Dilma ganha 2 minutos e 53 segundos em cada bloco de 25 minutos. No campo estritamente político, Temer tem ainda o comando da fatia mais forte da poderosa máquina do PMDB. O maior partido do País é extremamente dividido, mas o grupo liderado por Temer tem dado as cartas na legenda já há um bom tempo.

2. Por que Aécio Neve é opção preferencial de Serra para vice?

Aécio garantiria força eleitoral em Minas, segundo maior colégio eleitoral do País, com 14,2 milhões de eleitores. Ex-governador do Estado e neto de Tancredo Neves, ele é bastante popular e teve sua administração aprovada em níveis semelhantes aos do presidente Lula. Com Aécio como vice, Serra garantiria a unidade doPSDB e produziria uma novidade capaz talvez de influir no processo eleitoral em benefício da candidatura tucana.

Escolha do vice de tucano fica com o PSDB e aliados

DEU NO DIÁRIO DO NORDESTE (CE)

Militância do partido, no Marina Park, acompanhando discurso de Serra
Kiko Silva

O tucano José Serra iniciou sua programação de ontem, no Ceará, concedendo entrevistas aos veículos do SVM

O nome de um companheiro de chapa para a disputa presidencial não é motivo de preocupação para o pré-candidato do PSDB, José Serra. Em entrevista aos veículos de comunicação do Sistema Verdes Mares ele elogiou Ciro Gomes (PSB), considerando-o um homem "sério e honesto". Por uma questão de natureza ética se recusou a comentar o fato de o PSB ter negado legenda para sua candidatura à Presidência da República.

Sobre a escolha do seu candidato a vice-presidente da República disse que o nome será o de quem o seu partido (PSDB) e os partidos aliados escolherem. "Eu não estou dando muita volta nisso. Quem mais tem ansiedade é a imprensa que sempre pergunta. Mas qualquer coisa que eu fale pode dar fofoca, confusão". Então, prefere não dar palpite, mas acredita em uma boa solução em breve.

No Ceará, onde o PSDB não tem candidato a governador, disse que o pessoal do Estado é que vai definir. "Eu não meto muito o bico nos Estados não. Só se me pedem ajuda. Nem em São Paulo eu faço isso". José Serra faz questão de esclarecer que, como está concentrado no conjunto do Brasil, atrapalha se for se meter em uma realidade local que às vezes você não conhece direito e se for interferir pode não melhorar.

Então, aqui no Ceará confia no trabalho a ser desenvolvido pelos aliados Tasso Jereissati (PSDB), candidato a senador e o suplente dele, Chiquinho Feitosa, presidente regional do DEM.
Interrogado se teria conversado ou vai conversar com o governador Cid Gomes (PSB) disse que "aqui o pessoal toca e me diz o que é necessário fazer e eu faço. O que o PSDB e o DEM estabelecer eu vou topar e vou junto com eles".

Discurso

Esclareceu ainda que o discurso adotado para o Ceará é o mesmo para o Brasil, quanto à conclusão de obras em andamento. Além disso, tem como credencial no Ceará a sua biografia, citando como exemplo obras que tiveram a sua participação como ministro: Porto do Pecém, Açude Castanhão, Aeroporto Internacional Pinto Martins, Metrofor. Foram grandes empreendimentos, enfatizou, iniciados nas gestões do ex-governador Tasso Jereissati.

Disse ainda que sempre fez o que disse que ia fazer, começo, meio e fim, o que é muito importante porque "na política é fácil anunciar, difícil é começar e mais difícil ainda é concluir". Revelou que não procura olhar a cor partidária, pois vai governar para todos, lembrando que fez isso no Ministério da Saúde, na Prefeitura e no Governo de São Paulo.

Pesquisas

Sobre os resultados das últimas pesquisas disse que não vai comentar, senão não vai fazer outra coisa e nessa fase vai ter pesquisa toda semana e depois todos os dias e isso o tira da campanha. Para José Serra a pesquisa que vale, realmente, é a da urna porque quem for eleito presidente vai governar o País e a campanha só começa de fato após a Copa do Mundo.

Brasil

Para o País ele defendeu prioridades para os setores de educação, saúde e segurança pública. Na sua concepção a saúde precisa ser reforçada em tudo, inclusive na área de consultas. "Uma coisa que nós precisamos acabar no Brasil é essa espera de seis meses, um ano, para se obter uma consulta de ginecologia ou de ortopedia". Esclarece que isso começou a ser feito em São Paulo, e deu certo.

Ainda na área da saúde e assistência social voltou a defender a criação de dois ministérios, um do Deficiente e outro da Segurança. Para ele a questão da segurança inquieta o Brasil, em todas as regiões.

CRÍTICAS AO PT

Serra diz que defenderá ética para o indivíduo

O pré-candidato do PSDB a presidente da República, José Serra, afirmou, ontem à noite, no Ceará em Debate, evento promovido pela direção estadual do Instituto Teotônio Vilela (ITV), ligado ao PSDB, que quer inverter a lógica da ética do partido, pela ética do indivíduo, uma das poucas críticas veladas que o tucano fez ao PT.

O senador Tasso Jereissati, por sua vez, reiterou as críticas à falta de conclusão das obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do Governo Federal, provável carro chefe da campanha de Dilma Rousseff (PT), adversária de Serra. "Eu só posso estar ficando louco, mas não conheço uma, apenas uma, obra concluída do PAC em qualquer município deste Estado. É incrível o que a propaganda é capaz de fazer", ironizou.

Ética

Depois de abordar sobre sua trajetória como líder estudantil e político, José Serra afirmou que, como presidente, conversará com os prefeitos de todos os partidos e, de forma discreta, fez uma crítica ao PT. "Nós vamos restabelecer a ética do indivíduo e não deixarmos a ética do partido contaminar e fazer com que o indivíduo cometa abusos e faça lambanças", disse.

O tucano também citou ações em prol do deficiente físico, reiterando o discurso de se criar um programa nacional em defesa do cidadão portador de deficiência. Recentemente, Serra defendeu a criação de um ministério para setor.

Apesar de defender a desoneração fiscal, Serra criticou o Governo Federal em reduzir o IPI, gerando prejuízo à arrecadação dos municípios dependentes do FPM.

Serra: PT tem 'duas caras' sobre privatizações

DEU EM O GLOBO

Sobre queda nas intenções de voto, ex-governador, de volta ao Nordeste, disse que "pesquisa vai e vem"

Isabela Martin

FORTALEZA. Pela primeira vez caindo nas pesquisas de opinião, o pré-candidato do PSDB a presidente, José Serra, partiu ontem para o ataque e disse que o PT tem duas caras porque faz um discurso contra as privatizações e, na prática, prefeituras do partido também privatizam.

Ele abordou o tema em palestra no grupo O Povo de Comunicação.

Serra fez rápida menção à experiência de São Bernardo (SP), administrado pelo petista Luiz Marinho, e da privatização de um matadouro na prefeitura de Juazeiro do Norte, gerida pelo PT. Depois, em coletiva, negou que estivesse tentando vincular o PT às privatizações.

Não tentei vincular. Apenas mostrei que é relativo o que se fala. Em São Bernardo, o Luiz Marinho aprovou projeto de lei que lhe permite usar organizações sociais em todo o conjunto do sistema de saúde. Foi na direção que o próprio governo do estado (de São Paulo) tem e outras prefeituras do PT têm. No entanto, tem outro discurso, paralelo a esse, que considera que a privatização é isso e aquilo.

Mas o fato é que o PT a pratica.

É um problema de duas caras.

Perguntado por que o PSDB ficou com a imagem de partido que privatiza, interrompeu: Não é essa imagem. É o outro que diz e o pessoal acredita

Lula não vai ser presidente

Serra falou por 58 minutos para empresários e lideranças de partidos aliados, como PPS e DEM. Fez a defesa das privatizações do governo Fernando Henrique e disse que foi o responsável pelo programa de privatização quando ministro de FH.

Nunca condenei o passado.

A intervenção do Estado no Brasil sempre foi eficiente. Mas o mundo tinha mudado.

Em entrevista na rádio Verdes Mares AM, Serra comentou o resultado das últimas pesquisas de intenção de voto, em que foi ultrapassado pela principal adversária, Dilma Rousseff (PT).

Pesquisa vai e vem, vai e volta, é uma fotografia variável.

A campanha mesmo só vai começar depois da Copa. Estive praticamente à frente sempre, agora tem empate. Logo vai desempatar.

A pesquisa que importa é a da urna e do voto.

Na pesquisa CNT Sensus divulgada anteontem, o tucano está tecnicamente empatado com Dilma (35,7% contra 33,2%). No Vox Populi, teve 38% contra 35% da petista. Na sexta visita como pré-candidato ao Nordeste, onde Dilma lidera, o tucano insinuou que Lula não governará no lugar de Dilma caso ela seja eleita.

A partir do ano que vem o Lula não vai ser presidente. O Brasil vai ser entregue a um presidente eleito que as pessoas têm de escolher com vistas a quem pode tocar o Brasil, fazer com que melhore É uma tarefa indeclinável. Quem for eleito presidente vai ter de governar.

Ninguém governa por ele.

Serra prometeu criar o Conselho de Desenvolvimento do Nordeste, para coordenar investimentos na região. E anunciou que criará o Ministério da Segurança e do Deficiente Físico.

Mesmo tendo criticado o inchaço do governo do PT, não disse como enxugará a máquina.

A prefeitura de São Bernardo afirmou, em nota, que não foi aprovado projeto para usar organizações sociais na saúde na administração de Luiz Marinho.

A Secretaria de Saúde de São Bernardo do Campo mantém contrato de gestão com a Fundação ABC, fundação pública de direito privado da qual o município foi instituidor, em 1967, em conjunto com Santo André e São Caetano do Sul. Ao contrário, a rede vinha sendo administrada por meio de convênios com OS (Organizações Sociais) no governo passado e, ao assumir, o atual governo rompeu o contrato.

PT vai intervir no Maranhão para forçar apoio a Roseana

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Por ordem de Lula, partido terá de suspender encontro estadual e rever aliança com PC do B

Vera Rosa / BRASÍLIA


Preocupada com o novo foco de incêndio político na campanha de Dilma Rousseff à Presidência, a cúpula do PT fará intervenção branca no Maranhão para obrigar o partido a apoiar a candidatura à reeleição da governadora Roseana Sarney (PMDB).

O primeiro passo do roteiro combinado com o Palácio do Planalto será suspender o Encontro Estadual do PT, marcado para sábado e domingo, sob o argumento de que haverá confronto entre as alas petistas. O último encontro, no dia 27 de março, havia aprovado a aliança com o deputado Flávio Dino (PC do B-MA) para a sucessão de Roseana.

Agora, a estratégia autorizada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva consiste em empurrar a decisão sobre a chapa ao governo do Maranhão para o Diretório Nacional do PT, que vai se reunir em 12 de junho, véspera da convenção que homologará a candidatura de Dilma.

Sob pressão do Planalto, o diretório deverá dar sinal verde à coligação com Roseana, desmontando a parceria com o comunista Dino. Motivo: Lula quer palanque único para Dilma no Maranhão e alega que precisa do apoio do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), pai de Roseana.

Creolina. A manobra, porém, não ocorrerá sem traumas. "Pode ter morte no Maranhão", ameaçou o deputado Domingos Dutra (PT), que ocupou ontem a tribuna da Câmara para protestar contra a suspensão do encontro. "Se houver alguma tragédia lá, a responsabilidade será de Sarney, Roseana e da turma do PT que quer vender o partido."

O PT do Maranhão é dividido em duas correntes e uma delas ocupa cargos no governo Roseana. Pelo script acertado com Lula, a Executiva Estadual do PT vai aprovar resolução, hoje, suspendendo o encontro que indicaria o vice de Dino e os candidatos ao Senado, à Câmara e à Assembleia Legislativa.

Em rota de colisão com o comando petista, Domingos Dutra está organizando um ato político para sexta-feira, em São Luiz, que promete pôr mais combustível na crise. "Nós vamos lavar a estrela do PT com creolina para tirar a catinga dos Sarney", anunciou ele. "Ninguém entende por que Dilma não pode ter dois palanques no Maranhão se essa prática vai ocorrer em nove Estados. Dois palanques dão mais votos do que um."

Magoado, Dino afirmou que a cúpula do PT não pode "simplesmente ignorar" a decisão do partido de aderir à sua candidatura. "Isso seria um desrespeito a um aliado, um ato de violência, uma espécie de golpismo."

Partidos divergem sobre o voto distrital

DEU NO JORNAL DO BRASIL

RIO - No segundo dia do 22º Fórum Nacional, realizado na sede do BNDES, no Rio de Janeiro, a reforma política deu o tom dos debates promovidos no painel Fortalecimento das instituições políticas do país: sistema de partidos e Congresso Nacional.

O presidente nacional do PT, José Eduardo Dutra, afirmou que o seu partido é contra o voto distrital, proposta defendida pelo ex-deputado tucano Márcio Fortes, que representou o presidente do PSDB, Sérgio Guerra (impedido de comparecer por problemas de saúde).

No caso do Brasil, eu tendo a aceitar o voto distrital misto. Nós temos um problema aqui, que é exatamente a definição geográfica de cada distrito. Uma coisa é um país em que você tem a distribuição mais ou menos semelhante da população por todo o território nacional. A outra coisa é um país como o Brasil, onde, por exemplo, um distrito em São Paulo pode ser composto por um único bairro, e, no Amazonas, o distrito pode ser uma área de milhares de quilômetros quadrados opinou.

Já o representante do PSDB, Márcio Fortes, além de defender o voto distrital, também criticou as coligações para campanhas proporcionais.

Nós, do PSDB, preferiríamos que houvesse o voto distrital, assim como não aceitar coligações para campanhas proporcionais. Isso faz com que um conjunto de partidos funcionem como único, mesmo partidos grandes, como o DEM e o PSDB. Por isso se interessam em se coligar com pequenos partidos. É uma disfunção, porque a coligação existe para a eleição e depois se desfaz.

Congresso

Na segunda mesa-redonda montada para o painel, o senador Cristovam Buarque (PDT) e o deputado federal Fernando Gabeira (PV) pré-candidato ao governo do Rio de Janeiro debateram assuntos relacionados à modernização do Congresso Nacional.

Cristovam Buarque defendeu ações que garantam a modernização eleitoral, política e ética para o país.

É preciso reduzir o mandato de senador para quatro anos, e acabar com a figura do suplente. Também temos de dar fim a todo benefício privado ao parlamentar, fora o salário. Seria ainda saudável a divulgação online de todos os gastos do exercício do mandato afirmou, como tinha antecipado ao JB na edição do últmo domingo.

Fernando Gabeira comentou que a reforma política no Brasil só será possível se houver pressão popular:

Nos últimos anos, o Brasil experimentou avanços econômicos e sociais, mas não avançou na política. É muito difícil a reforma política sair por quem a teme (políticos com mandatos). É mais fácil sair pela pressão popular finalizou.

Ficha Limpa deve ser votado hoje

DEU EM O GLOBO

Adriana Vasconcelos

BRASÍLIA. Um acordo de líderes poderá viabilizar a votação ainda hoje, no Senado, da medida provisória que reajusta em 7,72% as aposentadorias acima do salário mínimo e também do projeto do Ficha Limpa, que proíbe o registro de candidatos condenados em segunda instância.

No caso dos aposentados, a MP deve voltar à Câmara. Diante do grande apelo popular suscitados pelas duas matérias, o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), praticamente desistiu da estratégia de vincular a aprovação do Ficha Limpa à votação dos projetos do pré-sal, que estão com urgência para votação na Casa.

Nós alertamos Jucá que se ele insistisse nessa vinculação poderia ser massacrado pelo plenário. Até porque o primeiro signatário do pedido de urgência foi o líder do PT, Aloizio Mercadante (SP) disse o líder do DEM, José Agripino (RN), após reunião com Jucá e com o líder do PSDB, Arthur Virgílio (AM).

O primeiro-vice-presidente do Senado, Marconi Perillo (PSDBGO), que deverá substituir esta semana o presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP), anunciou que pretende pôr o Ficha Limpa em votação hoje, às 16h.

O ministro de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, negou que a proposta não seja prioridade, mas disse que o governo não pretende retirar os pedidos de urgência.

Jucá, porém, poderá ajudar a livrar o presidente Lula de veto impopular. Como relator da MP dos Aposentados, antecipou que fará pelo menos duas mudanças, que, se aprovadas, levarão a proposta de volta à Câmara.

Como a vigência da MP expira em 1ode junho, há risco de a matéria caducar se os deputados não votarem na próxima semana.

Além de corrigir as tabelas que fixam o tetos das aposentadorias acima do mínimo que ficaram com valores referentes ao reajuste de 7% e não dos 7,72% aprovados , Jucá estuda alternativas para o fim do fator previdenciário

TSE nega pedido do PT para retirada do site do PSDB do ar

DEU NO VALOR ECONÔMICO

De Brasília

O PT perdeu, ontem, mais uma ação contra o PSDB no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O ministro Joelson Dias negou pedido para retirada do site dos tucanos do ar.

O PT alegou que o PSDB fez campanha antecipada em seu site ao veicular críticas contra a pré-candidata petista à Presidência República, Dilma Rousseff. Mas, para o ministro Dias, o fato de os tucanos criticarem Dilma não configura propaganda eleitoral. Segundo ele, "críticas à ação administrativa do governo são inerentes à atividade política".

"A propaganda eleitoral, tanto positiva quanto negativa, ainda não pode ser realizada, pois a legislação só a permite a partir de 6 julho", escreveu Joelson Dias. Mas, a Constituição "garante a todos o direito de crítica, em respeito à liberdade de manifestação do pensamento", continuou o ministro.

Dias enfatizou ainda que: "Se o governante pode divulgar publicidade institucional e referir-se às realizações de sua administração antes do período oficial da propaganda eleitoral, sem que isso configure propaganda antecipada, é razoável que também se assegure àqueles que se apresentam como seus adversários políticos o direito de criticar referida ação administrativa".

Na semana passada, o TSE multou Dilma em R$ 5 mil por prática de campanha antecipada. O PT foi multado em R$ 20 mil. Entre março e abril, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi multado em R$ 5 mil e em R$ 10 mil, em duas decisões que consideraram que ele fez campanha fora do prazo para a ministra Dilma.

Na noite de segunda-feira, o PSDB pediu ao TSE a aplicação de multa de até R$ 250 mil por conta do horário eleitoral do PT de quinta-feira, que teria sido quase inteiramente dedicado à campanha de Dilma. Na ação, os tucanos pedem ainda que o PT fique sem o direito de exibir propaganda partidária no segundo semestre de 2011. O TSE já retirou do PT o direito ao horário gratuito que teria no primeiro semestre do ano que vem por entender que o horário do partido foi utilizado para promover Dilma.

Ontem, 21 promotores eleitorais fizeram reunião para definir a linha de atuação do Ministério Público na fiscalização dos candidatos durante as eleições deste ano. Eles decidiram que vão fazer um monitoramento sobre as campanhas individuais dos políticos com o objetivo de identificar casos de compra de votos e de arrecadação irregular de dinheiro.

"Vamos atuar sempre que houver indícios de abuso de poder econômico e político, visando cassar o registro do candidato envolvido antes mesmo das eleições, bem como de seu diploma, caso já eleito" afirmou o procurador regional eleitoral do Distrito Federal, Renato Brill de Góes. Segundo ele, a análise das prestações de contas dos partidos políticos e dos candidatos também será uma ação prioritária do MP, bem como o monitoramento das doações de empresas para as campanhas. (JB)

TSE multa Lula por antecipar campanha

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

É a 3ª punição do presidente por promover a candidatura de Dilma: desta vez, a propaganda ocorreu durante inauguração em Minas

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu ontem multar em R$ 5 mil o presidente Luiz Inácio Lula da Silva por entender que, em janeiro, ele fez propaganda eleitoral antes do permitido durante inauguração em universidade federal de Teófilo Otoni, em Minas Gerais.

De acordo com 4 dos 7 ministros do TSE, Lula usou o seu discurso no evento para promover a pré-candidatura à Presidência de sua então ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff (PT).

A maioria dos integrantes do TSE aceitou recurso do DEM, PPS e PSDB questionando decisão anterior, do ministro Aldir Passarinho, que havia sido contrária à punição. Ontem, o próprio ministro voltou atrás e defendeu que Lula fosse multado por propaganda antecipada.

O problema ocorreu durante um discurso de Lula sobre a necessidade de garantir as conquistas de seu governo, o que levou a plateia a gritar o nome de Dilma.

Reconhecendo que não poderia fazer campanha, Lula afirmou: "Eu não posso falar o que vocês estão falando porque a lei não permite. Mas podem ficar certos de uma coisa. Nós vamos fazer a sucessão nesse país para dar continuidade ao que nós estamos fazendo". Ele acrescentou: "Esse país não pode voltar para trás como se fosse um caranguejo."

Na opinião de Aldir Passarinho, houve propaganda antecipada em função da interação entre a fala do presidente e os gritos do público, além de Lula ter falado sobre a sucessão. Todos os integrantes do TSE rejeitaram o pedido para que Dilma também fosse multada.

Sensus. Em outra decisão tomada ontem, o TSE multou em R$ 53,2 mil o instituto Sensus por ter divulgado em abril o resultado de uma pesquisa sobre a eleição presidencial antes do prazo mínimo de cinco dias, previsto na legislação eleitoral. Esse prazo conta a partir do registro da pesquisa no TSE.

PARA LEMBRAR

Sequência de punições soma R$ 40 mil

Em março, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) multou o presidente Lula duas vezes - no total de R$ 15 mil - por propaganda antes do permitido em favor de Dilma, durante eventos no Rio e em São Paulo. Na quinta-feira passada, o TSE também decidiu que o PT terá de pagar multa de R$ 20 mil por propaganda antecipada em dezembro. Dilma também foi punida, com multa de R$ 5 mil.

ONU ignora acordo e já debate sanções ao Irã

DEU EM O GLOBO

China apoia punição, mas diz que população não pode ser prejudicada

Um dia após o Irã assinar com Brasil e Turquia um acordo de enriquecimento de urânio fora do país, os EUA anunciaram ontem ter obtido apoio dos outros quatro membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU para novas sanções ao regime iraniano. Tanto a Rússia quanto a China, que relutavam, deram consentimento. Mas Pequim ressaltou que as punições não podem atingir a população iraniana e que seu objetivo é levar o Irã de volta à mesa de negociações. O chanceler Celso Amorim e seu colega turco vão enviar carta à ONU explicando o acordo.

Hillary atropela acordo de Lula

EUA apresentam sanções no Conselho de Segurança, e Brasil anuncia que não entrará em debate


Marília Martins

Apenas um dia após a assinatura do acordo obtido por Brasil e Turquia para o Irã enriquecer urânio no exterior, os Estados Unidos atropelaram o compromisso de Teerã ao anunciarem o rascunho de uma nova rodada de sanções.

A secretária de Estado americana, Hillary Clinton, informou ontem que obteve o apoio dos demais membros permanentes do Conselho de Segurança para o novo texto, que foi apresentado ainda à tarde na ONU, numa reunião convocada às pressas.

Alcançamos um acordo para um forte rascunho com a cooperação tanto da Rússia quanto da China disse Hillary, destacando o apoio dos membros mais relutantes às punições ao Irã. Acho que este anúncio é uma resposta convincente aos esforços feitos por Teerã nos últimos dias.

Entre as sanções propostas estão medidas para banir investimentos internacionais no programa nuclear iraniano, novas restrições à importação de armas, mesmo as convencionais, e a proibição de qualquer atividade de transferência de tecnologia que possa levar ao desenvolvimento de armamento nuclear. Há também medidas para bloquear o uso do sistema financeiro internacional, particularmente os bancos e qualquer outra instituição financeira, para apoiar a proliferação de armas nucleares ou de mísseis, ainda que convencionais.

Os governos devem também fiscalizar qualquer transação financeira de bancos iranianos, inclusive o Banco Central, para impedir o suporte ao programa nuclear e à Guarda Revolucionária iraniana.

China quer Irã na mesa de negociação

Até ontem, o principal impedimento para a adoção de sanções era a resistência de Rússia e China, que têm laços estreitos com o Irã e poder de veto no Conselho de Segurança. Embora tenha elogiado o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o premier turco, Recep Tayyip Erdogan, o embaixador russo, Vitaly Churkin, declarou que seu governo estava confortável com os termos adotados na resolução. Segundo o diplomata, a troca de urânio para uso em reatores de pesquisa e geração de energia é uma questão que não toca no cerne do problema: O acordo patrocinado por turcos e brasileiros foi uma iniciativa louvável, mas não resolve a questão central do problema, que é a insistência iraniana na continuidade do enriquecimento de urânio alertou.

Mais cedo, o ministro do Exterior chinês, Yang Jiechi, disse que estava encorajado pelo acordo obtido por Brasil e Turquia. À noite, no entanto, o chanceler afirmou que o objetivo das sanções é levar o Irã de volta à mesa de negociações, fazendo pressão para que o regime dos aiatolás cumpra suas obrigações com a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA): As sanções debatidas hoje são específicas, visam a atingir o programa nuclear, e não as atividades econômicas iranianas de modo geral. É importante notar que a população não será punida nem o comércio internacional será afetado garantiu.

A reunião dos 15 membros do Conselho de Segurança convocada para debater a proposta de mais de dez páginas apoiada por EUA, França, Reino Unido, Rússia, China e Alemanha (o chamado P5+1) começou às 16h. Cerca de 40 minutos depois, a embaixadora Maria Luiza Viotti saiu da sala para marcar a posição do Brasil: O Brasil não vai se engajar no debate sobre essa resolução. O Brasil acredita que já existe um instrumento de negociação, que é um acordo importante que foi fechado ontem (anteontem) disse Maria Luiza. O Brasil ainda acredita na diplomacia.

Depois, a representante brasileira voltou à sala de reuniões. A apresentação da proposta do P5+1 demorou duas horas. Na saída, a embaixadora americana, Susan Rice, declarou-se confiante num processo rápido de tramitação da proposta, sem especificar um prazo. Mas algumas fontes falavam numa votação em junho.

O Irã prometeu cumprir as exigências da AIEA, abrir suas instalações.

E mesmo depois do acordo patrocinado por Brasil e Turquia, insiste em continuar este enriquecimento a 20%, o que não se justifica para fins pacíficos disse Rice.

Marina critica política externa de Lula

DEU NO VALOR ECONÔMICO

Sérgio Bueno, de Porto Alegre

A pré-candidata do PV à Presidência da República, Marina Silva, disse ontem em Porto Alegre que a política externa do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva deixou de lado a questão dos direitos humanos e das liberdades políticas - princípios que para ela não podem ser "violados nem relativizados" - nas relações com o Irã e também com Cuba. "O Brasil, e isso é minha preocupação, não tem atentado para isso nessa relação", disse a ex-ministra do Meio Ambiente do governo petista.

Para Marina, ninguém pode criticar Lula por dialogar com o presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad, mas o Brasil "deu muita audiência para o Irã, um país que não respeita os direitos humanos e cassa as liberdades políticas". Ela voltou a afirmar que torce pelo cumprimento do acordo, intermediado pelo Brasil, que prevê o enriquecimento de urânio iraniano na Turquia, e também para que ele signifique uma "quebra de paradigma" na tradição do Irã, "porque o que eles querem mesmo é ter a bomba atômica".

A pré-candidata do PV dedicou o dia de ontem a entrevistas para as principais emissoras de rádio e televisão de Porto Alegre. Ela destacou a origem humilde, elogiou as políticas sociais e o programa Bolsa Família do governo Lula, que tirou "25 milhões de pessoas" da linha da pobreza, mas classificou o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) de uma "colagem de obras". Segundo Marina, a maior parte do PAC 1 ainda não saiu do papel, o PAC 2 é uma "carta de intenções de tudo aquilo que não foi feito" no governo do PT e, caso eleita, ela criaria um programa de "infraestrutura para o desenvolvimento sustentado".

Classificada pelo próprio presidente Lula como "mãe do PAC", a pré-canditada do PT, Dilma Rousseff, foi alvo de algumas estocadas desferidas pela concorrente. Marina disse que o Brasil "não precisa de um gerentão, mas de uma liderança política que saiba sentir os problemas do povo", e prometeu apostar na geração de energias renováveis, enquanto outros candidatos, "na hora de se eleger, fazem fotos diante de uma (usina) eólica e passam oito ou quatro anos criticando as fontes alternativas". Neste mês, o programa do PT mostrou Dilma no parque eólico de Osório, no litoral gaúcho.

Durante as entrevistas, a ex-ministra também defendeu o financiamento público de campanha e afirmou que se chegar à Presidência não tentará a reeleição. Reafirmou ainda que tentará convocar uma Constituinte exclusiva para fazer as reformas política, tributária, previdenciária e trabalhista, defendeu o regime de metas para inflação e disse que, embora seja favorável ao "princípio" da redução da jornada de trabalho de 44 para 40 horas, a questão merece cuidado.

"Isso precisa ser feito sem onerar o processo produtivo porque precisamos criar empregos e não criar apenas um grupo (de trabalhadores) de elite, que já está incluído enquanto a maior parte continua como informal". Contrária à legalização do aborto e da maconha, Marina disse que se eleita irá propor um plebiscito para tratar das duas questões. Ela anunciou ainda que pretende implantar um projeto de "emissão zero" durante a sua campanha, mediante o plantio de árvores para compensar o volume de carbono gerado pelas atividades relacionadas à disputa, incluindo viagens de carro e avião. O cálculo das emissões será feito por uma empresa especializada, explicou.

Europa, colírio e óculos escuros :: Vinicius Torres Freire

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Europeus atacam especulação e imitam medidas que os EUA adotaram quando tentavam evitar a grande quebra de 2008

OS GOVERNOS da Europa promovem uma campanha de "bombardeios cirúrgicos" contra partes do mercado financeiro. Atiram bombas que os americanos dispararam quando tentavam evitar a quebradeira de bancos, antes e depois de setembro de 2008, quando faliu o Lehman Brothers. A Europa procura evitar o dominó bancário e a quebra de governos.

A bomba mais recente caiu ontem, depois do fechamento dos mercados europeus. Como nenhum bombardeio é cirúrgico, houve danos colaterais no mercado daqui, no americano e nos negócios globais com o euro. Hoje tem mais.

O órgão regulador das finanças da Alemanha proibiu que investidores "especulem" de modo a elevar os juros pagos pelos governos, a encarecer seguros de crédito e a derrubar o preço dos papéis ações de certas instituições financeiras.

Segundo o regulador alemão, a "especulação" causa "mudanças excessivas de preços" e "ameaça a estabilidade de todo o sistema financeiro" (não usam a palavra "especulação". Isso é "coisa de políticos").

Note-se que o grosso da "especulação" ocorre em Londres. Logo, se "especulação" havia, continuará a haver. De resto, quem não tem colírio usa óculos escuros. Quem não pode "especular" com os títulos em tese protegidos pelos alemães "especula" com o euro, por exemplo, que se desvalorizou ainda mais.

Qual a "especulação"? Gente com dinheiro grosso vende papéis de que não dispõe apostando que, quando tiver de acertar o negócio, no futuro, comprará tais papéis por um preço inferior àquele da venda de hoje.

Quanto mais o mercado vende, mais cai o preço do papel em questão.

Grosso modo, é esse o negócio: venda a descoberto de títulos no mercado futuro. O mercado também compra seguro contra dívida da qual não é credor, o que eleva o custo de fazer seguro de dívidas. Tudo isso eleva o custo do crédito na Europa.

O "mercado" diz que está apenas dando o preço para uma coisa que perde valor -a dívida de alguns governos europeus e os papéis de bancos enganchados nesses papagaios. Apostam no que acham que vai acontecer. Ou seja, que governos europeus, sob desconfiança dos credores, pagariam juros cada vez maiores (seus papéis valeriam menos, pois) ou mesmo quebrariam.

Os governos dizem que o mercado se aproveita do medo a fim de causar pânico e ganhar dinheiro com isso.

Provavelmente, governo e mercado estão cada um com parte da razão.

O EUA proibiram algumas vendas a descoberto antes do grande colapso de setembro de 2008. Fez efeito no curto prazo e, depois, baubau. O preço das ações de gigantes da finança americana foi parar no lixo. Estavam mesmo quebrados.

Há outras bombas. A União Europeia está para aprovar restrições a negócios de grandes fundos de investimento. Houve o pacote para a crise da dívida. Isto é, crédito para a Grécia, um fundo de garantia para a dívida de outros países e, na prática, o Banco Central Europeu ora financia governos que não conseguem rolar seus papagaios.

Mas os "mercados" por ora acham que a crise da dívida europeia foi apenas remediada. Que o caldo entornará adiante. Logo, antecipam a crise. Que não para.

Dívida pública e pimenta:: José Roberto Afonso

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Dívida pública pode ser medida por diferentes conceitos e abrangências. A dívida bruta leva em conta apenas o que é devido pelos governos (exclui banco central e estatais) e é considerada um indicador melhor para avaliar o risco de rolagem. A dívida líquida desconta da bruta o caixa e alguns haveres financeiros e é considerada mais útil para avaliar solvência e impactos sobre juros e de crescimento. Esse segundo conceito é o mais visto no Brasil (aplicado a todo setor público). No resto do mundo, todos apuram a dívida bruta, mas nem sempre a líquida. Por princípio, o ideal é apurar e acompanhar os dois indicadores. Errado é misturar os métodos, como às vezes ocorre quando comparam a saúde fiscal brasileira com a de outros países.

O Brasil está mais perto das economias avançadas do que dos emergentes em termos de dívida pública, como revela o Monitor Fiscal, recente documento do FMI, com estatísticas atualizadas e análises detalhadas, de modo a permitir melhores comparações internacionais. A evolução da dívida bruta entre 2000 e 2009 dos governos brasileiros (incremento de 5,5 pontos do PIB) seguiu a mesma trajetória crescente dos países ricos, no sentido radicalmente inverso dos emergentes (decréscimo de 8,2 pontos). Com isso, o tamanho da dívida brasileira também supera a de seus pares: 80% acima da dívida média dos emergentes ao final de 2009 (38% do PIB) e, dentre 27 países, só devemos menos que Índia e Hungria. Ao menos devemos um quarto a menos que a dívida média dos países ricos (90.6% do PIB).

Na visão oficial, a expansão recente do nosso endividamento não preocupa porque decorreu do acúmulo de reservas internacionais (hoje, próximas de 15% do PIB). Sem contar que o Tesouro Nacional virou (indiretamente) a maior instituição de crédito do País (ativos de 12% do PIB, fora a rolagem da dívida dos outros governos). A propósito, na comemoração dos dez anos da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), o Ministro da Fazenda, Guido Mantega, finalmente assumiu posição contra limites para a dívida federal, um dos pontos da lei ainda não regulamentados: "A União tem de estar preparada para uma crise, quando o endividamento pode aumentar... Não adianta botar uma camisa de força porque vai inviabilizar a ação do Estado brasileiro."

É uma boa hora para esse debate. Está determinado pela Constituição que compete ao Senado (exclusivamente) fixar o montante da dívida consolidada, a partir de iniciativa do presidente da República (art. 52, VI); e ao Congresso, dispor sobre o montante da dívida mobiliária federal (art. 48, XIV). Quem julgar improcedente tais limitações deveria propor uma emenda constitucional para suprimi-las. Caso contrário, pode caber uma ação de inconstitucionalidade por omissão - mesmo caso da recente condenação pelo STF da ausência de lei para fixar critérios de rateio do FPE.

A LRF trata do cálculo e do controle da dívida e, nesse contexto, já adotou "válvulas de escape". Algumas são automáticas: o limite da dívida fica suspenso em caso de calamidade pública e estado de defesa (art. 65) ou o ajuste é postergado se o crescimento for baixo ou negativo (art. 66). Outras são disparadas pelo Senado: prazo dilatado se mudar drasticamente a política monetária e cambial (art. 65, § 4º); o limite reavaliado anualmente pelo presidente ao enviar a meta de superávit na LDO (art. 30, § 5º); e, a qualquer momento, se houver instabilidade econômica, o presidente também pode pedir para mudá-lo. Não bastassem tais regras da LRF, os limites propostos há dez anos ficaram ultrapassados: o teto para a dívida mobiliária seria 6,5 vezes a receita corrente, quando a razão está em 4,78; já para a dívida consolidada líquida, seria 3,5 vezes contra 2,22 efetivos; ou seja, se aprovados, a União ainda pode aumentar sua dívida em mais de meio trilhão de reais.

A preocupação com o engessamento é pertinente, mas não se sustenta diante da lei e dos números. Diante do sombrio cenário externo, já passa da hora de o Brasil impor limites à dívida federal. É preciso também corrigir uma injustiça flagrante: descumprir limites da dívida pode levar multa, cassação de mandato, inabilitação e até detenção. Todos os governadores e os prefeitos do País estão submetidos a tais rigores da lei de crimes fiscais, por que o presidente da República deve continuar imune a qualquer risco?

A sabedoria popular ensina: "pimenta nos olhos dos outros é refresco!" A situação econômica e fiscal do Brasil ainda é confortável, especialmente comparada aos países ricos, mas, para que a pimenta do mercado não se volte contra nós no futuro, é hora de avançar nas reformas das instituições, políticas e práticas nas finanças públicas.


Economista, mestre pela UFRJ e doutorando da UNICAMP

Olhar veterano:: Miriam Leitão

DEU EM O GLOBO

Você entra numa das salas da exposição Um Plano Real e vê prateleiras projetadas cobrindo as paredes de uma casa. No centro, uma televisão passando telejornais com velhas notícias de planos, confiscos, desabastecimento e números de uma inflação gigante. Conforme as notícias vão piorando, a sala começa a tremer e o espaço parece se encolher.

Julio María Sanguinetti, que foi presidente do Uruguai, disse que o real não foi um plano, foi um parteaguas.

Esse divisor de águas mudou o país.

Há um Brasil antes e um Brasil depois do Plano Real. E como mudou o Brasil, mudou a América Latina. O plano marcou a presença do Estado como estabilizador e derrotou a memória inflacionária, histórica na América Latina, e endêmica no Brasil.

Sanguinetti foi o presidente da transição democrática do Uruguai. Felipe González foi presidente da Espanha na transição para a democracia estável que o país é hoje.

Ricardo Lagos foi presidente do Chile numa importante fase da consolidação do modelo econômico e político do país. A exposição Um Plano Real faz um passeio pelo passado econômico do país, mas os convidados falaram do presente e futuro.

No presente, a crise global em sua segunda fase. Para González, é a crise financeira que continua. É natural que ele pense assim, ainda mais vindo da Espanha. Os três propuseram mais e melhor regulação financeira internacional, do contrário nada, nem mesmo o gigantesco pacote europeu, será suficiente, e uma mudança radical no controle de gastos públicos.

Lagos acha que a Europa deveria ter feito como o Brasil, em 2000, que, pela Lei de Responsabilidade Fiscal, proibiu os estados de aumentarem o endividamento sem autorização do governo central.

Lagos acha que o problema inicial da Europa é ter um Banco Central, uma moeda, e 16 políticas fiscais. Assim que houve a crise bancária, os governos abandonaram o acordo que limitava a 3% do PIB o déficit público: Em relação à América Latina, a crise interrompeu os melhores seis anos da nossa história em termos de comércio internacional.

Entre 2003 e 2008, o valor do cobre subiu fortemente. Para evitar que isso levasse a um aumento de gastos, aprovamos uma lei fiscal que cria formas de poupar parte do ganho extra. Nesse período, a América Latina reduziu de 44% para 32% o percentual de pobres.

Sanguinetti se preocupa com os maus leitores de Keynes: Para enfrentar a crise, os governos resolveram aumentar os gastos e dizer que eram keynesianistas. Eles dizem: eu gasto, gasto, gasto, sou keynesianista. Isso transforma Keynes numa caricatura.

Eu sei que é duro ler Teoria Geral. Me tomou muito tempo.

Mas, quem não o leu anda justificando descontrole fiscal como se fosse tese dele.

O ex-presidente uruguaio disse também que o que agravou o problema agora foi a ausência de responsáveis pelas decisões insensatas nos bancos. Ele acha que isso decorre de outro erro de interpretação teórica: Sou um velho liberal.

Não um neo. Os neoliberais não entenderam direito o que Adam Smith disse e querem deixar tudo na mão do mercado.

Ricardo Lagos acha que será inevitável é apenas uma questão de tempo que haja uma tarifa sobre as emissões dos gases de efeito estufa. Ele diz que não haverá um preço de uma commodity, mas sim vários preços, dependendo do grau de emissão que estiver contido no processo de produção: Por isso, o Chile que está com dificuldade de ter gás para o processamento do cobre não pode ter termelétricas a carvão, do contrário, estará indo para trás e tornando seu produto menos competitivo. Da mesma forma, não haverá um preço da soja, vai depender do grau de desmatamento que ela possa estar provocando.

Ele lembrou que o desmatamento representa 18% das emissões do mundo e 49% das emissões da América Latina. Por isso, acredita que a primeira tarefa coletiva da região é proteger a Amazônia.

Felipe González acha que a demografia é problema na Europa e na América Latina é vantagem.

Nossa população está envelhecida. Tem alta expectativa de vida e poucos nascimentos. Isso cria várias dificuldades para nós, principalmente de financiamento da previdência. Na América Latina, há uma enorme juventude na base da pirâmide. Isso é uma vantagem, mas investir em educação é fundamental.

Sanguinetti disse que o Brasil concluiu com sucesso, nos últimos anos, três transições: a política, da ditadura para a democracia; a econômica, do regime de alta inflação para a estabilidade; e a partidária, da ausência de partidos estáveis para um quadro em que dois partidos têm se revezado no governo brasileiro há 16 anos.

O recado final que deixaram os ex-presidentes, diante da exposição que mostrava o horror econômico da inflação e a vantagem de se poder planejar o futuro, é que é preciso evitar as utopias regressivas, seja de esquerda, seja de direita, que podem revogar os avanços. Fernando Henrique encerrou alertando que tudo o que o país conquistou pode se perder. A inflação, como se sabe, é inimigo que vive à espreita

A Beleza:: Charles Baudelaire


Eu sou bela, ó mortais! como um sonho de pedra,
E meu seio, onde todos vem buscar a dor,
É feito para ao poeta inspirar esse amor
Mudo e eterno que no ermo da matéria medra.

No azul, qual uma esfinge, eu reino indecifrada;
Conjugo o alvor do cisne a um coração de neve;
Odeio o movimento e a linha que o descreve,
E nunca choro nem jamais sorrio a nada.

Os poetas, diante do meu gesto de eloquência,
Aos das estátutas mais altivas semelhantes,
Terminarão seus dias sob o pó da ciência;

Pois que disponho, para tais dóceis amantes,
De um puro espelho que idealiza a realidade.
O olhar, meu largo olhar de eterna claridade!