sábado, 5 de junho de 2010

Reflexão do dia – José Miguel Wisnik


Meu tio Elson se orgulhava de suportar a tortura. Foi preso muitas vezes e durante o Estado Novo e nos primeiros anos da ditadura pós-64. Era um homem aparentemente pacato, se não soubéssemos que dedicava a vida ao Partido Comunista Brasileiro. Suas aparições familiares transmitiam firmeza e serenidade, sem qualquer ansiedade proselitista. Seu orgulho era do tipo antigo: supunha ainda que os próprios aparelhos repressivos mantinham um limite – digamos com toda a ironia – “civilizado” , e que o que estava em jogo na tortura era antes de tudo uma aposta férrea de convicções disputada sobre o próprio corpo. Uma vez solto, voltava sobriamente ao trabalho clandestino em meios operários.

Quando a esquerda tendeu para a guerrilha, no final dos anos 60, ele continuou seguindo religiosamente a linha do partido, que era contra a luta armada. Que os órgãos da repressão, vencida a guerrilha, tenham se mostrado um organismo cuja lógica inerente era a de seguir matando, tendo como alvo da vez o Partido Comunista, é algo que ele terá descoberto na carne, em situação extrema. Meu tio Elson, que não empunhava arma, é um dos torturados, executados e desaparecidos durante a ditadura.



(José Miguel Wisnik, no artigo, “A bola dividida”, publicado em O Globo/ Segundo Caderno (29/5/2010)

Ânsia por moralidade:: Merval Pereira

DEU EM O GLOBO

Mesmo antes da sanção pelo presidente Lula da lei do Ficha Limpa, anunciada ontem, ela já entrara na campanha eleitoral, numa clara manifestação de que deve vigorar já para esta próxima eleição.

Caberá ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a definição de sua vigência e, sobretudo, a interpretação de seu alcance, depois que emenda de redação do Senado modificou a expressão “os que tenham sido condenados” para “os que forem condenados”, o que produziu interpretações de que só seriam inelegíveis aqueles que passassem à condição de réus depois da sanção da lei pelo presidente da República.

Ao sancionar ontem a lei, o presidente tinha um parecer da Advocacia Geral da União que afirma que a mudança verbal não alterou o espírito da lei.

Mas não é nem a AGU nem o Senado que definirão essa questão e, sim, o TSE, que certamente será chamado a se pronunciar.

Não foi outra, aliás, a intenção da mudança dos tempos verbais, para criar a celeuma e atrasar a entrada em vigor da lei.

Caberá ao TSE fazer com que o previsível julgamento do caso não facilite a vida dos que têm ficha suja. O interesse do cidadão sobre o tema continua grande, refletindo o fato de que a lei foi originada de uma ação popular com mais de quatro milhões de assinaturas.

O leitor Rafael Augusto Valente Carvalho de Mendonça enviou análise que define bem o sentimento generalizado.

Lembrando que “a Carta Magna visa acima de tudo ao bem comum”, o que está registrado em seu preâmbulo e no artigo 3oque menciona “promover o bem de todos...”, sendo tal cláusula pétrea, ele diz que a dúvida em favor da sociedade deveria ser usada na Justiça Eleitoral.

“Na hora de o juiz aceitar uma denúncia e abrir o processo, ou de o Ministério Público denunciar ou não, há o princípio da dúvida pró sociedade, isto é, na dúvida denuncia, pois a sociedade merece que o crime seja esclarecido, ou verificar se o réu é um sujeito que prejudica a sociedade cometendo crimes”.

O mesmo deveria ser feito em relação aos candidatos, diz ele: “Se há dúvidas pairando sobre a idoneidade do indivíduo, o mesmo deve ser rejeitado como candidato, pois seria muito ruim para sociedade no futuro descobrir que o candidato na verdade era um bandido”.

Ecoando esse sentimento dos eleitores, o ex-deputado Marcelo Cerqueira, candidato ao Senado pelo PPS, levou para suas aparições nos programas eleitorais de seu partido uma proposta mais arrojada do que a que foi aprovada no Congresso e sancionada pelo presidente Lula ontem.

Para ele, a lei que foi sancionada “é um insignificante avanço”, embora considere que qualquer ato que modifique a questão eleitoral “como norma penal estrito senso é um avanço”.

Cerqueira lembra que a presunção de inocência entrou no Direito Constitucional na Constituição Federal de 1988, o que implica dizer que as diversas constituições anteriores não a contemplaram.

Mesmo concordando com a tese de que a “vontade do legislador” é para ser interpretada por psicólogos e não por juristas, comparandoa com “um pássaro que voa e se liberta do seu cativeiro”, Marcelo Cerqueira diz que tudo indica que “tal norma foi criada para proteger os inocentes do arbítrio judicial tão comum nos anos de chumbo”.

Como a Constituição é um conjunto harmônico de normas, não pode ser interpretada em tiras, ressalta Cerqueira.

“Assim, aquela norma deve corresponder, para ter eficácia plena, a outras da mesma Constituição e com o mesmo valor normativo”.

Ele destaca o disposto no artigo 37 da Constituição Federal, que cuida da legalidade, da impessoalidade e da moralidade.

“A Constituição, fácil de ver-se, não se quer refúgio de delinquentes. Para se habilitar a qualquer função pública, o candidato tem de apresentar folha corrida ‘limpa’.

Por que na habilitação a cargo político de representação deveria ser diferente?”, questiona Cerqueira.

A proposta que ele vem fazendo na sua propaganda eleitoral é que, condenado na 1ainstância, o eventual eleito teria sua posse sobrestada.

Se absolvido no órgão colegiado (exclusive o Tribunal do Júri que é de 1ainstância, mas é colegiado), tomaria posse regularmente.

Marcelo Cerqueira diz que para tal medida entrar em vigor bastaria que se introduzisse tal norma na lei de inelegibilidades.

Com a vantagem, diz ele, de que a defesa do condenado funcionaria ao contrário do que é hoje: em vez de alargar os prazos com recursos meramente protelatórios, diligenciaria para abreviar o processo e satisfazer o “eleito” com uma solução rápida, abrindo mão de “agravos”.

Além da força punitiva da norma-conceito, diz Marcelo Cerqueira, sua simples enunciação bastaria para inibir aqueles que buscam um mandato como refúgio.

“O custo-benefício afastaria os aventureiros do voto”.

O presidente Lula recebeu sua quinta multa por propaganda eleitoral antecipada ontem à noite. Demonstrando que a paciência do Tribunal Superior Eleitoral está esgotada, o ministro Henrique Neves aplicou multa pela atuação presidencial em solenidade da Central Única dos Trabalhadores (CUT), no Dia do Trabalho.

Ao analisar o discurso de Lula, Neves considerou como propaganda antecipada o trecho em que o presidente diz: “é preciso mais tempo, é preciso que tenha sequenciamento.

Ô Dilma, você viu o que eu falei? Sequenciamento”.

O que espanta é a sequência de multas ao presidente da República, que evidencia seu comportamento ilegal na campanha até o momento.

Dizem que Lula está se contendo nos dias recentes depois que o ministro Marco Aurélio Mello assumiu seu posto no TSE e se pronunciou contra o atropelo da lei, alertando o presidente para as consequências dessas atitudes.

A conferir, como diz o Ancelmo.

Reajuste amaciando:: Dora Kramer

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

No início de maio, quando deputados governistas e oposicionistas, imbuídos de aguda firmeza demagógica, aprovaram reajustes para aposentadorias acima de valores aceitáveis e acabaram com o fator previdenciário, o governo deu um aviso aos navegantes da nação Brasil.

"Ao contrário de outros governos", disse o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, o presidente Luiz Inácio da Silva não se deixaria contaminar pelo clima eleitoral.

Aproveitou para ser mais específico. Disse que, se o Senado confirmasse a votação da Câmara, o presidente não faria como o antecessor, Fernando Henrique, não deixaria a inflação subir nem o câmbio explodir e por aí discorreu a fim de deixar patentes as diferenças e explicar que, para Lula, governo é uma coisa, eleição é outra muito diferente.

Os ministros da área econômica, Planejamento e Fazenda, passaram a recomendar todos os dias o veto presidencial. Ao reajuste de 7,7% aprovado e ao fim do fator previdenciário.

Cerca de duas semanas depois, o Senado confirmou o resultado: mantido o fim do fator, o reajuste muito acima dos 6,14% propostos pelo governo e até dos 7% sugeridos em acordo.

Estava nítida a intenção dos parlamentares: transferir o ônus do veto ao presidente. Do ponto de vista do Congresso, não resta dúvida, uma irresponsabilidade. Para não dizer molecagem.

Mas há que se considerar o seguinte: o governo tem maioria no Parlamento, caberia a ele articular essa vantagem e administrá-la a seu favor.

Nesta altura, já no fim do segundo mandato, é de se perguntar de que vale a posse de tamanha "base" de mais de dez partidos se numa votação crucial como essa o governo não pode contar com ela.

Contudo, o mal estava feito e pela posição manifestada pelo governo não haveria dificuldade no manejo da situação. O próprio presidente Lula depois de definido o jogo no Congresso reclamou de público e, durante o encerramento da Marcha dos Prefeitos em Brasília, pôs em dúvida se aquele tipo de demagogia renderia benefícios eleitorais aos políticos.

"Tem gente que acha que ganha voto com isso quando, na verdade, se o povo compreender o que significa isso, essas pessoas podem até não ganhar o tanto de votos que esperam ganhar."

Recapitulando: o governo apresentou uma proposta de reajuste que era o que as contas públicas suportavam. O Congresso exorbitou. A área econômica alegou que a Previdência não suporta a exorbitância. O ministro da área política garantiu que a eleição não influenciaria a decisão do presidente.

Portanto, em princípio não haveria razão para dilemas. Se o que foi dito correspondesse ao que se pretendesse fazer, Lula já teria vetado o reajuste e o fator previdenciário sem enfeites.

Há prazo até o próximo dia 15 para uma solução. Não é esse o problema. É só uma questão de adaptação à maneira de se apresentar as coisas.

Primeiro foi o tempo de "marcar" o discurso da responsabilidade e de os ministros Paulo Bernardo e Guido Mantega assumirem a parte árida da história: cortes, vetos, números, austeridade.

Logo adiante virá o tempo de Lula fazer a política da bondade.

Não é pecado, mas é truque. Porque é falso que o reajuste dos aposentados não esteja sendo tratado à luz da eleição presidencial.

Na realidade, ela é a demanda principal.

Dois gumes. Na última quarta-feira, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado aprovou o fim do voto secreto nas sessões de votações de cassação de mandatos de parlamentares.

De um lado é defensável porque torna o processo transparente: o cidadão fica sabendo quem votou ou deixou de votar na cassação de quem e passa a entender melhor as razões de muitas absolvições.

De outro, há a realidade do "vício insanável da amizade", que no voto aberto pode acabar inibindo a manifestação ou incentivando "trocas" corporativistas.

De qualquer modo o assunto não é tão simples. Como conceito, o voto aberto obviamente é o mais correto. Como prática é de se conferir. Inclusive se suas excelências deixarão passar a emenda quando chegar no plenário.

Lula lá e cá: Villas-Bôas Corrêa

DEU NO JORNAL DO BRASIL

Está passando em silêncio um dos mais intrigantes e confusos pronunciamentos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, equilibrado no trapézio da dubiedade e que merece ser reposto em circulação.

Como quem está conversando com o espelho, o presidente levantou a bola de várias hipóteses sobre o seu futuro, depois da eleição da sua sucessora, a candidata Dilma Rousseff ou de alguma surpresa das urnas. Lula afirmou a certeza de que, em qualquer hipótese, estará no governo. A menos que considere como favas contadas a eleição de Dilma, ignorando o candidato da oposição, o tucano ex-governador de São Paulo José Serra e seus índices nas pesquisas. O que exatamente o presidente quis dizer com a charada que se enrola em poucas e contraditórias hipóteses?

A mais provável é que seja um recado para a candidata Dilma: se eleita, não conte com a reeleição. Não faz sentido. A candidatura de Dilma foi tirada do chapéu pelo presidente, com o mais absoluto desprezo pelo PT, que não foi ouvido, nem cheirado e engoliu a pílula sem fazer careta. Ao contrário, com a docilidade dos que não têm alternativa, o Partido dos Trabalhadores entrou no corso para ganhar o pedaço do bolo com a reeleição ou a eleição de senadores, deputados federais e estaduais para um dos melhores empregos do mundo.Lula jogou a pedra no lago, na véspera do Campeonato do Mundo na África do Sul. E soprou a vuvuzela para alertar a candidata e o submisso PT de que o humor da população e dos eleitores será pautado pelo desempenho da Seleção de Dunga e da tão xingada bola que não quicava, leve como pluma. A conquista do hexacampeonato será uma festa que se prolongará por mais de um mês, com as homenagens aos craques em Brasília e na recepção nos estados de cada um dos titulares e reservas.

Mas, com a crise moral e ética que lambuza o pior Congresso de todos os tempos, a campanha eleitoral vai impor o debate da reforma política que o presidente Lula tanto prometeu como candidato e esqueceu durante os dois mandatos. Um desafio para os candidatos do majoritário bloco governista e da esquálida oposição a exigir cuidados com o voto. E, com as alianças patrocinadas por Lula para o apoio à candidata Dilma, os riscos de um tropeço eleitoral ameaçam muito mais a oposição do que o governo do presidente mais popular do mundo e que já avisou que uma das suas certezas é que estará no governo.

Entende-se. O presidente Lula e a candidata Dilma precisam de pelo menos mais quatro anos para terminar o pacote de obras inacabadas e consertar os estragos dos temporais que derrubaram casas, deixaram milhares ao desabrigo, além dos mortos e feridos.

Quatro anos é pouco. Mas, com quatro e mais quatro da reeleição, serão 16 anos do reinado de Lula e Dilma.

Esse Paulinho :: Fernando de Barros e Silva

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

SÃO PAULO - Discursando outro dia diante de sindicalistas, Paulo Pereira da Silva chamou José Serra de "esse sujeito". Repetiu o tratamento pelo menos três vezes. Apesar da sua naturalidade, tratava-se de uma grossura premeditada.

As pessoas que se incomodaram -e com razão- deveriam refletir por que talvez não sintam a mesma indignação quando Lula é tratado assim, como "esse sujeito" (ou variações), o que, aliás, é mais comum. Isso talvez nos ajude a entender certas encrencas brasileiras.

Mas nosso assunto é Paulinho. Na divisão das tarefas da campanha de Dilma Rousseff, a ele parece ter sido reservado o que, com eufemismo, se chamaria de "serviço pesado". Pregando em público, Paulinho dizia que Serra -"esse sujeito que fica aí tentando ganhar a eleição"- quer "tirar o direito dos trabalhadores, mexer no fundo de garantia, nas férias, na licença-maternidade". Ou seja, Paulinho age como quem recebeu uma espécie de licença-malandragem para propagar inverdades sobre seu desafeto.

Coerência não é o seu forte. Em 1998, o líder da Força Sindical apoiou a reeleição de FHC; em 2002, foi vice de Ciro Gomes; em 2004, na eleição à prefeitura paulistana, deu seu voto a "esse sujeito" -sim, José Serra- contra Marta Suplicy. De lá para cá, vem se acomodando no colo macio do lulismo.

Este é o lado edificante da trajetória deste representante do peleguismo de resultados que se aninhou no Estado. O outro lado, como se sabe, é assunto da PF.

Lula passou a vida defendendo a liberdade sindical, falando contra a obrigatoriedade do imposto instituído pelo Estado Novo. No poder, não só preservou o traço autoritário da herança getulista como, não satisfeito, mudou a lei para repassar às centrais uma parte do bolo arrecadado. Paulinho faz parte da oligarquia sindical que se alimenta do imposto descontado compulsoriamente do trabalhador brasileiro.

Lula pôs o sindicalismo no bolso. E Paulinho é o Lula paraguaio.

Razões do voto e medo:: Cesar Maia

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

As pesquisas eleitorais são reiterativas sobre intenção de voto e deveriam servir para que as equipes de campanha avaliassem as razões -positivas e negativas- que levam os eleitores a decidir votar. Não é um processo simples. Essas perguntas não são óbvias.

A pesquisa qualitativa -de muito difícil avaliação- é quase sempre tratada com a mesma ótica da pesquisa quantitativa. Os institutos que as fazem querem tirar conclusões sobre probabilidade de voto e destacar uma ou outra expressão a ser usada pela campanha ou respondida.

Uma utilidade seria preparar perguntas para as pesquisas quantitativas e, com esta combinação, tirar conclusões.

Mas há outra questão ainda mais complexa. Se o eleitor atribui a um candidato qualidades maiores que as do outro, deve-se perguntar se é esta uma razão de voto.

O Datafolha listou atributos e pediu que o eleitor indicasse o candidato que mais se aproxima deles. Destacou o candidato da oposição como o mais experiente, inteligente, realizador, preparado para ser presidente, próximo aos ricos...

Já na candidata do governo, destacou ajudar os pobres e as mulheres, embora entre as mulheres ela perca na intenção de voto. E 18% dizem que a candidata verde defenderá os pobres, embora tenha quase a metade disso em intenção de voto. O eleitor tende a fazer o voto útil e, mesmo que priorize esse atributo, tende a não transformar isso em voto se ela não tiver chance.

Esses pontos são importantes, mas não necessariamente decidem o voto. As equipes de campanha devem analisar qual é a agenda vencedora no imaginário do eleitor.

Um caso clássico é o da primeira eleição de Clinton a presidente. Numa lista de 40 questões, Clinton só vencia em uma: a economia. Sua equipe de campanha a testou como razão de voto e surpreendeu-se com a correlação. A partir daí, nas reuniões com os multiplicadores de campanha, Carville (coordenador de comunicação) gritava: "É a economia, estúpido!". E foi.

A razão de voto pode ser positiva ou negativa. As ruas funcionam como uma pesquisa qualitativa. Uma mesma expressão usada em três pontos completamente diferentes de uma cidade quase sempre significa que dezenas de milhares de pessoas pensam da mesma maneira. Em seguida, deve-se avaliar se é razão de voto e então incluir em uma pesquisa quantitativa.

É esse estudo (que já deveria ter sido feito pelas campanhas) de investigação das duas ou três razões de voto que construirá a agenda a ser priorizada na comunicação via mídia e, principalmente, na comunicação direta, nas ruas e reuniões, de forma a acelerar os fluxos de "opinamento" -a favor de si e contra o adversário.

Cesar Maia escreve aos sábados nesta coluna.

Ficha limpa agora é lei, e TSE dirá se já vale em 2010

DEU EM O GLOBO

O presidente Lula sancionou sem alterações a lei que proíbe a candidatura de políticos com condenação judicial por crimes graves. A lei Ficha Limpa é resultado de projeto de iniciativa popular, apresentado no Congresso com 1,3 milhão de assinaturas. "O recado foi dado pelos eleitores: basta de corrupção, de usar os mandatos como instrumento de impunidade. Basta de tratar a política como negócio privado", disse o presidente da OAB, Ophir Cavalcante. Agora, o Tribunal Superior Eleitoral deverá decidir se a exigência de ficha limpa vale para as eleições deste ano, e se a lei será aplicada contra candidatos já condenados ou só para as futuras condenações.

Sem veto, Ficha Limpa vira lei

Tribunais superiores terão de decidir agora sobre o alcance da medida para este ano

Luiza Damé e Isabel Braga


BRASÍLIA - Cinco dias antes do encerramento do prazo final, em 9 de junho, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou ontem, sem vetos nem mudanças, a lei que proíbe a candidatura de políticos com condenação judicial por crimes graves. A lei, conhecida como Ficha Limpa, é resultado de um projeto de iniciativa popular, apresentado na Câmara em setembro do ano passado, com mais de 1,3 milhão de assinaturas.

Agora, começará no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e no Supremo Tribunal Federal (STF) o debate sobre se a exigência de ficha limpa vale para as eleições de 2010 e se a lei será aplicada para barrar os candidatos que já foram condenados ou apenas para os que vierem a ser condenados.

Uma emenda de redação, apresentada pelo senador Francisco Dornelles (PP-RJ) e aprovada no Senado, provocou polêmica sobre a abrangência da lei e sua validade para as eleições de outubro. Os senadores substituíram a frase “os que tenham sido condenados” por “os que forem condenados”.

Há a interpretação de que a nova lei só valerá para condenações futuras. O presidente do TSE, Ricardo Lewandowski, entende que a lei abrange apenas os condenados entre a sanção (segunda-feira) e o registro das candidaturas, em 5 de julho.

A Advocacia Geral da União (AGU) recomendou ao presidente a sanção da lei, sem vetos. Sobre a emenda de redação, a AGU disse que deve ser ouvida a Comissão de Constituição e Justiça do Senado, que a aprovou, considerando que não modifica o espírito da proposta. Integrante do Movimento Ficha Limpa, o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Ophir Cavalcante, comemorou: — O recado foi dado pelos eleitores: basta de corrupção, de usar os mandatos como instrumento de impunidade.

Basta de tratar a política como negócio privado. É uma vitória da sociedade, um grito de independência pela ética na política.

Ophir disse que não há por que pôr em dúvida a aplicação da nova lei nas eleições deste ano. E lembrou que a própria lei de inelegibilidades foi aprovada em maio de 1990 e vigorou nas eleições do mesmo ano: — Justificou-se à época que não haveria modificação no processo eleitoral, mas no requisito de elegibilidade.

Por que valeu para aquela época e agora não vale? Ophir disse achar que a alteração do tempo verbal feita pelo Senado não alterou a essência do projeto: — É uma interpretação absurda.

O entendimento é o de que ainda não temos candidatura, elas só serão formalizadas depois. A lei abrange todos os que estão condenados em processo em curso.

Especialistas em legislação eleitoral entendem que, como a lei foi sancionada antes de 9 de junho, data de início das convenções partidárias para escolha dos candidatos, as regras poderão ser aplicadas neste ano. Mas os prejudicados pela lei poderão recorrer à Justiça, pois a Constituição estabelece que as normas eleitorais têm de ser aprovadas pelo menos um ano antes do pleito.

Inelegibilidade passa para oito anos

Pela legislação atual, são considerados inelegíveis apenas os candidatos com condenação definitiva, em última instância da Justiça. A Lei Ficha Limpa veda a concessão do registro eleitoral aos condenados na Justiça por crimes graves, em instância colegiada (decisões tomadas por mais de um juiz).

Estão incluídos, por exemplo, processos de cassação de mandato, crimes contra a vida, tráfico de drogas e improbidade administrativa.

A lei veda ainda o registro de candidatura aos políticos condenados por crime eleitoral cuja pena é a prisão, e também aos políticos que renunciarem aos mandatos para que não seja aberto processo por quebra de decoro. O prazo de inelegibilidade é ampliado de três para oito anos.

O deputado Índio da Costa (DEMRJ), um dos relatores do projeto na Câmara, comemorou a sanção: — Foi um grande passo, mas precisamos dar continuidade a esse trabalho, através da reforma política.

Jovita José Rosa, do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral, que articulou a coleta de assinaturas para o projeto de iniciativa popular, vibrou com a sanção. O MCCE integra mais de 40 entidades da sociedade civil: — Estamos que é só alegria e já pensamos na reforma política. Se o Congresso não faz, a sociedade vai fazer.

Estamos com uma mobilização boa, não podemos deixar que se desfaça.

Temos que ousar mais.

A proposta original vetava a candidatura até dos políticos condenados por crimes graves em primeira instância, mas enfrentou resistência.

TSE 5 X 0 Lula

DEU EM O GLOBO

O presidente Lula foi multado pela quinta vez pelo TSE por fazer campanha eleitoral fora do prazo legal e promover a pré-candidata do PT, Dilma Rousseff. O ministro Henrique Neves considerou irregular o discurso feito por Lula na festa de 1º de Maio da CUT. Dilma não foi multada.

Lula é multado pela 5ª vez por campanha antecipada

Ministro aponta propaganda subliminar pró-Dilma em ato da CUT; punições ao presidente já somam R$ 37,5 mil

BRASÍLIA. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi multado ontem, pela quinta vez, por campanha eleitoral fora do prazo legal e promover a candidata Dilma Rousseff. A decisão foi tomada pelo ministro Henrique Neves, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), por causa do discurso feito por Lula na comemoração do Dia do Trabalhador promovida pela (CUT). Neves multou Lula em R$ 7,5 mil. O presidente pode recorrer ao plenário do TSE.

Neves não acatou o pedido dos partidos de oposição de multar também Dilma e a CUT. Segundo o ministro, das quatro passagens destacadas pelos advogados eleitorais da oposição, apenas em uma delas ele considerou que houve referência subliminar de Lula à campanha de Dilma.

Para o ministro, o presidente Lula estava dizendo que muito já havia feito e que mais seria preciso fazer. Lula diz: “É preciso mais tempo, é preciso que tenha sequenciamento. Ô Dilma, você viu o que eu falei? Sequenciamento”.

Para Neves, ao parar o discurso e falar o nome de Dilma, enfatizando a palavra sequenciamento, o presidente Lula fez propaganda subliminar.

— Vi relação entre o que ele estava falando, sobre o fim de seu mandato, a necessidade de correção de erros. Segui o entendimento do plenário, ressalvando meu ponto de vista de que meu primeiro entendimento era o de que precisaria algo mais concreto.

O ministro explicou que rejeitou o pedido de multa a Dilma porque não foi anexado o discurso feito por ela, apenas o que a mídia trouxe sobre isso, frases soltas. No caso da CUT, o ministro entendeu que a central promoveu o encontro, mas não é responsável pelo que outros falaram no evento. Com a multa de ontem, o valor a ser pago por propaganda irregular, só pelo presidente, chega a R$ 37.500.

“Quero ver jogador argentino trançando as pernas” Mais cedo, Lula foi recebido com vaias na abertura da 3aConferência Nacional do Esporte. Chegou ao evento com uma hora e 40 minutos de atraso, irritando os delegados, que alegaram estar famintos e vaiaram também o ministro do Esporte, Orlando Silva. Mas Lula acabou virando o jogo ao pedir desculpas e incluir, no discurso, piadas sobre sexo e argentinos na Copa da África. Lula falou da importância do esporte para a saúde e para a inclusão social. Citou a recomendação do ministro da Saúde, José Gomes Temporão, de que as pessoas tenham relações sexuais para prevenir a hipertensão. E entrou na polêmica provocada pelo técnico da Argentina, Diego Maradona, que liberou o sexo na Copa: — É esporte e sexo, a moda agora, segundo o Temporão. E parece que o único técnico que adotou a moda foi o Maradona. Quero ver jogador argentino chegar lá trançando as pernas. O Brasil vai ganhar essa Copa.

Oposição cobra critério na liberação de emendas

DEU EM O GLOBO

Líder petista diz que pedidos serão liberados até dezembro e que eles devem ter sintonia com ações do Executivo

Fábio Fabrini


BRASÍLIA. Parlamentares da oposição acusaram ontem o governo de liberar o dinheiro de emendas ao Orçamento com fins eleitorais e cobraram critérios técnicos na repartição do bolo. Líderes do PSDB e do DEM propuseram regras para garantir distribuição mais equânime das verbas ou mesmo que a execução seja obrigatória.

Reportagem do GLOBO publicada ontem mostrou que a base aliada tem tido tratamento diferente na aplicação dos recursos.

Presidente da Comissão Mista de Orçamento, o deputado Waldemir Moka (PMDB-MS) teve 90% de suas emendas, o equivalente a R$ 9,8 milhões, empenhadas, ou seja, autorizadas para pagamento. Já o presidente do Senado, José Sarney (PMDBAP), conseguiu R$ 8,3 milhões (72%). É muito mais do que conseguiram os 70 parlamentares do PSDB (R$ 6,1 milhões) e os 66 do DEM (R$ 5,1 milhões).

Líder do DEM na Câmara, o deputado Paulo Bornhausen (SC) diz que o presidente Lula se vale do dinheiro público para beneficiar aliados: — O presidente da República tomou a decisão de ganhar a eleição de qualquer forma.

Abandonou o governo e virou cabo eleitoral. É mais uma forma de usar a máquina.

Bornhausen propõe o fim das emendas ou que o Orçamento seja impositivo, de forma que os valores previstos sejam executados. Hoje, a peça é autorizativa, o que permite que o governo a maneje.

— As emendas tornaram-se moeda de troca, e isso é uma ofensa ao Parlamento — reclama Otávio Leite (PSDB-RJ) .

Fora o filtro político, Leite alega que os parlamentares têm que percorrer um verdadeiro labirinto na burocracia dos ministérios.

Para ele, a solução para as distorções seria uma norma que garantisse a execução igualitária das emendas. Enquanto PMDB, PT e PSB já conseguiram liberar, respectivamente, 10,2%, 6% e 8,3% dos montantes pleiteados, PSDB e DEM asseguraram menos de 2%.

O líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PTSP), afirma que, assim como há oposicionistas contemplados, muitos aliados não conseguiram ainda garantia de execução.

Ele pondera que os dados são de maio e, até dezembro, há tempo para que montantes maiores sejam autorizados: — Na medida do possível, vamos liberar todas.

O petista diz que, em muitos casos, os pedidos não têm sintonia com as ações do governo.

Campanha de Dilma convidou araponga para fazer dossiês

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Sargento Dadá, que trabalhou na Operação Satiagraha, chegou a propor preço do serviço e a contatar outros agentes

A articulação para montar uma central de dossiês a serviço da campanha de Dilma Rousseff (PT) à Presidência contou com a participação de agentes ligados aos serviços secretos oficiais, informa o repórter Rodrigo Rangel. Um deles é Idalberto Matias de Araújo, o "sargento Dadá", um dos mais experientes agentes do Cisa, o serviço secreto da Aeronáutica. Ele se notabilizou por ter trabalhado nas investigações que resultaram na Operação Satiagraha, contra o banqueiro Daniel Dantas. Em abril, após solicitar auxílio de outros agentes, Dadá teve contato com um dos principais profissionais de comunicação da campanha de Dilma, o jornalista Luiz Lanzetta, com quem acertou o preço do serviço. Ele pediu R$ 200 mil por mês e uma equipe de 12 pessoas. O assunto chegou ao coordenador da campanha de Dilma, Fernando Pimentel.


Campanha de Dilma trouxe Araponga da Satiagraha para montar dossiês

Sucessão. Conhecido por suas apurações sigilosas, o sargento da reserva da Aeronáutica Idalberto Matias de Araújo aceitou a missão proposta por petistas e indicou o delegado aposentado Onésimo de Souza para ajudá-lo; o trabalho custaria R$ 200 mil mensais

A articulação para montar uma central de dossiês a serviço da campanha de Dilma Rousseff à Presidência da República contou com a participação de arapongas ligados aos serviços secretos oficiais. Um deles é o sargento da reserva Idalberto Matias de Araújo, o Dadá, recém-saído do Cisa, o serviço secreto da Aeronáutica.

Conhecido personagem de apurações sigilosas em Brasília, o sargento esteve, por exemplo, ao lado do delegado Protógenes Queiroz nas investigações que deram origem à Operação Satiagraha, que levou o banqueiro Daniel Dantas à prisão.

A participação de Idalberto de Araújo remonta às origens do plano de inteligência petista. Em abril, após ter sido procurado por emissários da campanha, o sargento disse que aceitaria o serviço, mas necessitaria de apoio. Deixou claro que, para executar a missão proposta pela campanha, seria preciso chamar mais gente.

O sargento, então, indicou um amigo de longa data, o delegado aposentado da Polícia Federal Onésimo de Souza, dono de uma pequena empresa de segurança instalada num conhecido centro comercial de Brasília. As conversas avançaram.

Outros agentes, dentre eles um araponga aposentado do extinto Serviço Nacional de Informações (SNI) e um militar que já serviu à Agência Brasileira de Inteligência (Abin), chegaram a ser contatados para integrar a equipe. O passo seguinte foi chegar a um valor para o serviço.

É onde começa o contato direto entre o agente e um dos principais profissionais da área de comunicação da campanha de Dilma, o jornalista e consultor Luiz Lanzetta. Dono da Lanza Comunicação, empresa contratada pelo PT para fazer a assessoria de imprensa da campanha, Lanzetta marcou um encontro com o sargento e o ex-delegado.

A reunião ocorreu no restaurante Fritz, na Asa Sul de Brasília. A dupla disse a Lanzetta que, pelo serviço, cobraria R$ 200 mil por mês. O delegado justificou o preço com o argumento de que seria preciso montar uma equipe de 12 pessoas para a missão.

Bunker. Lanzetta se encarregou de detalhar o serviço de que precisava. A primeira tarefa seria interna, no bunker que ele próprio montara no Lago Sul. Desconfiado de que seu trabalho estaria sendo sabotado por gente do próprio PT, o consultor queria que os arapongas descobrissem a origem do fogo amigo.

O pacote incluiria ainda investigações que pudessem dar à campanha de Dilma munição para ser usada, em caso de necessidade, contra adversários. O alvo preferencial era o candidato tucano José Serra.

A proposta para contratação dos serviços do araponga e do delegado foi levada, então, para o núcleo central do comitê de Dilma. O assunto chegou a ser discutido com o ex-prefeito de Belo Horizonte Fernando Pimentel, coordenador da campanha. Num primeiro momento, Pimentel avaliou que o preço estava alto demais. Disse que topava pagar, no máximo, R$ 60 mil.

O grupo já estava discutindo estratégias de trabalho - um dos planos era infiltrar um agente no núcleo de inteligência da campanha de José Serra - quando começaram a vazar para a imprensa informações acerca de supostos dossiês produzidos pelo bureau montado por Lanzetta na fortaleza petista do Lago Sul.

Era o que faltava para os ânimos se acirrarem ainda mais no comitê. O imbróglio realçou, no interior da campanha de Dilma, o conflito entre dois grupos: o do mineiro Fernando Pimentel, responsável por levar Lanzetta para o staff de Dilma, e o do ex-ministro Antonio Palocci.

Conspiração. Nos bastidores, Pimentel, alçado ao comando da campanha por conta de sua velha amizade com Dilma, acusa Palocci e o deputado paulista Rui Falcão, coordenador de comunicação do comitê, de tramarem para derrubá-lo. Aliados de Pimentel afirmam que foi Falcão quem deixou vazar informações sobre o dossiê, para enfraquecer o ex-prefeito na cúpula da campanha.

Ao Estado, Pimentel negou que tenha sido procurado pelo grupo de Lanzetta para tratar de contrato o araponga. "Se houve isso, é iniciativa da empresa do Lanzetta, para resolver algum problema relacionado à empresa dele", disse. "Nunca tratamos disso na coordenação da campanha." Pimentel também negou desentendimento com Falcão. "Mnão sei se tem esse negócio de grupos, o que sei é que sou amigo fraterno do Rui há 40 anos."

Procurado pela reportagem, Idalberto não quis falar sobre o assunto. "Não estou entendendo por que você está me ligando", disse ele, antes de desligar o telefone. Lanzetta se negou a dar declarações, embora tenha admitido o contato com o araponga e o ex-delegado. Onésimo de Souza não foi localizado até o fechamento desta edição. A assessoria de Dilma limitou-se a reproduzir declaração da pré-candidata petista, segundo a qual não havia ninguém autorizado a negociar dossiês para a campanha.

PARA ENTENDER

Um especialista em seguir alvos sem ser notado

No universo dos arapongas de Brasília, o sargento da Aeronáutica Idalberto Matias de Araújo, o Dadá, é um personagem graduado. Integrante do enredo de vários escândalos políticos, o militar foi retirado das sombras na Operação Satiagraha.

Espécie de braço direito do delegado Protógenes Queiroz, responsável pela Satiagraha, Dadá fez parte do consórcio de arapongas e policiais federais que investigaram o banqueiro Daniel Dantas, em um episódio marcado pela suspeita de uso de escutas clandestinas e perseguições não autorizadas.

Apontado no meio como um especialista em seguir alvos sem ser notado e na produção de grampos, o sargento, hoje com 49 anos, teria sido o principal responsável pela investigação que relacionou o ex-ministro da Defesa Élcio Alvares, primeiro ocupante civil da pasta, ainda no governo Fernando Henrique Cardoso, ao crime organizado no Espírito Santo.

Com trânsito entre agentes dos diversos serviços de inteligência - das Forças Armadas, da Polícia Civil do Distrito Federal, da PF e da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) -, o sargento tem seu "passe" valorizado em épocas eleitorais.

Movimentação de um tucano teria sido rastreada

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Rui Nogueira

No trabalho dos arapongas que estavam a serviço do comitê da pré-candidata do PT à Presidência, Dilma Rousseff, nem tudo é informação velha obtida em pesquisas no Google, como dizem os assessores da ex-ministra. Entre a papelada, há pelo menos um indício de que alguém rastreou a movimentação financeira de um importante integrante da cúpula do PSDB.

Esse tucano foi procurado, três semanas atrás, por jornalistas que lhe pediram informações adicionais sobre um depósito feito no início de janeiro na conta bancária dele.

O documento sobre o depósito estava entre os papéis reunidos pelos arapongas. O tucano avisou a cúpula do seu partido e também aos dirigentes da campanha do ex-governador paulista José Serra.

Para Serra, ação do PT é ''factoide''

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Pré-candidato do PSDB afirma que adversários querem desviar atenção sobre dossiê ao afirmarem que vão interpelá-lo judicialmente

Evandro Fadel e Adelson Barbosa

O pré-candidato do PSDB, José Serra, disse ontem em Campina Grande (PB) que o PT tenta criar um "factoide" ao anunciar que vai interpelá-lo judicialmente, em razão das declarações de que a pré-candidata Dilma Rousseff (PT) tem responsabilidade no suposto dossiê com denúncias contra ele.

"Isso é factoide para enganar a imprensa", declarou Serra em entrevista à rádio 98 FM. Segundo ele, quem tem que de se explicar é o PT e a ex-ministra. Serra afirmou que o PT "tem tradição nessa matéria" de criar dossiê. "Foi descoberto um esquema de dossiê fajuto e difamante da parte deles", disse o tucano, para quem não é a primeira vez que o PT cria dossiê contra ele.

"Você lembra que isso ocorreu em 2006? Lembra do dossiê dos aloprados. Era contra mim, que era candidato a governador", disse Serra, acrescentando que os responsáveis pelo dossiê dos aloprados foram presos. "Eles (os petistas) é que têm de explicar o que está acontecendo e não os outros, são vítimas."

Serra foi recebido em Campina Grande por três políticos considerados ficha suja: o ex-governador Cássio Cunha Lima (PSDB), cassado por compra de votos; o ex-governador e pai de Cássio, Ronaldo Cunha Lima (PSDB), acusado de tentar matar o ex-governador Tarcísio Burity em 1993 com três tiros; e o senador Efraim Morais (DEM), acusado de manter servidores fantasmas em seu gabinete. Efraim está sendo investigado pela PF.

Do aeroporto, Serra seguiu para entrevistas a duas emissoras de rádio. Na rádio do Sistema Correio, dançou forró com a jornalista Verônica Guerra, ao som da música "Chiclete com banana", do paraibano Jackson do Pandeiro. Em tom, de brincadeira, falou de futebol e de música.

Serra voltou a prometer que, se eleito, vai criar uma bolsa complementar ao Bolsa-Família, para incentivar adolescentes matriculados em escolas profissionalizantes. Disse que outra prioridade será o Programa de Saúde na Família. Afirmou que pretende exigir dos laboratórios farmacêuticos parceria que contemple os médicos do Programa de Saúde da Família (PSF) em todo o País.

Curitiba. Em entrevista à Rede Independência de Comunicação, afiliada da Rede Record no Paraná, Serra disse que não adotará estilo agressivo durante a campanha eleitoral e negou que tivesse havido qualquer cobrança ou reunião do partido para pedir-lhe isso. "Eu tenho o meu estilo, sou do jeito que eu sou."

As críticas mais pesadas ao governo federal vieram quando o ex-governador paulista comentou a carga tributária. "Realmente é um exagero, prejudica a atividade, o emprego, a produção."

Serra evitou falar muito sobre a política paranaense, onde há indefinição em relação ao posicionamento do senador Osmar Dias (PDT), assediado pelo PSDB, que lhe ofereceu a possibilidade de ser candidato à reeleição ao Senado, e pelo PT.

"Eu tenho visão, conversei, estou por dentro, mas se eu falo alguma coisa dá confusão", ponderou. "Como se dizia antigamente: sapo de fora não chia."

Declarando-se amigo de Richa e de Osmar, e de ter boas relações com o ex-governador Roberto Requião (PMDB), salientou esperar uma "boa solução para efeito de pregação nacional". Ao final, Serra alertou: "Até a semana que vem se resolve tudo isso."

Serra: 'Eles é que têm que explicar'

DEU EM O GLOBO

Tucano chama de factoide decisão do PT de interpelá-lo na Justiça

CAMPINA GRANDE (PB). O précandidato do PSDB à Presidência, José Serra, acusou o PT de criar factoides para desviar a atenção da imprensa quanto a um suposto dossiê que teria sido preparado contra ele pelo partido. Segundo Serra, o PT e a ex-ministra Dilma Rousseff precisam explicar os motivos pelos quais o dossiê teria sido feito.

O factoide, segundo Serra, diz respeito à decisão petista de interpelálo judicialmente, para que ele prove que Dilma teria elaborado o dossiê. Indagado sobre a ameaça petista de interpelação judicial, Serra respondeu: — Eles é que têm que explicar o que está acontecendo, não os outros, que são vítimas — disse.

— O PT tenta criar factoide para enganar a imprensa e tem tradição nessa matéria (de dossiê).

Serra disse ter descoberto um esquema de “dossiê fajuto e difamante” supostamente elaborado pelos petistas: — Você lembra que isso ocorreu em 2006? Lembra do dossiê dos aloprados? Era contra mim, candidato a governador de São Paulo. Aquele pessoal foi preso, e encontraram com eles R$ 1,7 milhão.

Em outra emissora, Serra se referiu a uma chuva forte que caía em Campina Grande quando ele desembarcou no aeroporto da cidade, depois de quase seis meses de seca. Ele lembrou que, no início do seu casamento, fez uma viagem ao deserto do Atacama, no Chile, onde nunca chove. Disse que, ao chegar ao local, começou a chover. No mesmo instante, um raio caiu na cidade e tirou a emissora do ar por mais de 20 minutos.

Nas entrevistas em Campina Grande, Serra disse que o Brasil precisa de investimentos em segurança pública e no setor de produção, para gerar mais empregos.

E que pretende criar incentivos aos médicos do Programa Saúde da Família (PSF). Ele disse que vai recorrer aos laboratórios para que financiem cursos de capacitação dos médicos do PSF e deem ajuda financeira.

Serra afirmou que vai dar continuidade ao Bolsa Família e prometeu que famílias cadastradas no programa vão ter mais recursos para incentivar seus filhos adolescentes a estudarem em escolas profissionalizantes.

Ele disse que não definiu o nome do vice em sua chapa, o que só acontecerá na convenção do partido, no dia 12, em Salvador.

A força, o idioma de Israel :: Clóvis Rossi

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

O status quo é confortável para Israel, que acaba como vencedor todas as vezes em que aposta em saída militar

Há um err de avaliação terrível na afirmação do presidente Barack Obama de que "não é prematuro dizer a israelenses e palestinos -e aos demais envolvidos- que o status quo é insustentável".

Pode até ser que, a longo prazo, seja insustentável, mas, como a longo prazo estaremos todos mortos, fiquemos no curto e médio prazo.

Nestes, Israel -o governo e uma parcela substancial da sociedade- sente-se perfeitamente confortável com o status quo.

Não há, portanto, qualquer pressão interna para alterar o status quo, seja para criar um Estado palestino, seja para levantar o cerco à faixa de Gaza, seja para fazer acordos de paz com os vizinhos com os quais ainda está tecnicamente em guerra (Síria e Líbano).

Desde que avançou a construção do muro que mantém os palestinos da Cisjordânia isolados de Israel, o conforto só aumentou, porque diminuíram os atentados.

Para tornar ainda menos correta a avaliação de Obama, há o fato de que Israel também sente-se confortável com o uso da força.

Afinal, ganhou todas as vezes em que a utilizou. É bom deixar claro que não estou fazendo qualquer juízo de valor sobre o uso da força por Israel. Fazê-lo demandaria um tempo de pesquisa e um espaço que escapa muito ao âmbito do jornalismo diário.

Estou apenas fazendo uma constatação factual: com o uso da força, Israel ganhou a guerra de independência, expandiu seu território, reduziu à impotência os países árabes hostis e, mais recentemente, diminuiu o poder de fogo tanto do Hamas, em Gaza, como do Hizbollah no Líbano -a rigor os dois únicos movimentos que contestam, com armas na mão, o direito de Israel de existir.

(O Irã dos aiatolás também o faz, mas, por enquanto, é mais pela palavra que pelas armas.)Tornou-se, na prática, uma política de Estado que David Grossman, brilhante e pacifista autor israelense, chama de "torpe e calcificada".

Escreve Grossman: Israel "uma e outra vez recorre, por inércia, ao uso maciço e exagerado da força, a cada momento decisivo, quando se pediria, ao contrário, sabedoria, sensibilidade e pensamento criativo".

É sintomático que, no momento em que boa parte do mundo pede justamente "pensamento criativo" para pôr fim ao cerco a Gaza, Aluf Benn, editor de assuntos diplomáticos do jornal israelense "Haaretz", proponha o seguinte:

"Israel deveria informar a comunidade internacional que está abandonando toda a responsabilidade pelos residentes de Gaza e seu bem-estar. A fronteira Israel-Gaza deveria ser completamente fechada (...). Uma data deveria ser fixada para dissociar os sistemas de água e eletricidade de Gaza daqueles de Israel. A união aduaneira com Israel cessaria, e o shekel [a moeda israelense] deixaria de ser a moeda de curso legal em Gaza".

Não deixa de ser uma maneira de admitir, como Obama, que o status quo é insustentável. Mas a saída proposta -e não por um militante da extrema-direita- corresponde ao uso da força por outros meios.

Equivale igualmente a atirar ao mar os palestinos de Gaza, tal como os palestinos do Hamas sonham em fazer com os judeus de Israel. Pode ser insustentável, mas é o idioma de uso corrente e disseminado.

Quanto Israel Decaiu:: David Grossman

Traduzido pelo PAZ AGORABR

Nenhuma explicação pode justificar ou passar uma borracha no crime que foi cometido. E nenhuma desculpa pode explicar as estúpidas ações do governo e do exército israelense.

Israel não enviou seus soldados para matar civis a sangue frio. Esta seria a última coisa que desejaríamos. Mas, uma pequena organização turca, fanática em suas visões religiosas e radicalmente hostil a Israel, recrutou para sua causa várias centenas de pacifistas e defensores da justiça.

Conseguiram atrair Israel para uma armadilha, porque sabiam como Israel reagiria, sabiam como Israel é movido e compelido, como um marionete, a reagir da forma que fez.

Quão inseguro confuso e atemorizado deve ser um país, para agir como Israel agiu! Com uma combinação de força militar excessiva, e uma fatal ausência de previsão sobre a intensidade da reação dos que estavam no navio, matou e feriu civis. E o fez fora de suas águas territoriais, como um bando de piratas.

Esta percepção não implica em concordar com os motivos, abertos ou ocultos, e muitas vezes maliciosos, de alguns participantes da flotilha de Gaza. Nem todos eles são humanistas amantes da paz. As declarações de alguns pregando a destruição do Estado de Israel são criminosas. Mas esses fatos são simplesmente irrelevantes no momento. Tais opiniões não merecem a pena de morte.

Estas ações de Israel não são mais do que a continuação do vergonhoso bloqueio de Gaza, que por sua vez é a perpetuação da abordagem de punho de ferro do governo de Israel, que está disposto a arruinar a vida de um milhão e meio de gente inocente na Faixa de Gaza, para obter a libertação de um soldado aprisionado. Por mais precioso e amado que este possa ser.

E este bloqueio é conseqüência natural de uma política truculenta e calcificada, que sempre volta a recorrer ao uso de forças massivas e exageradas, em todas situações decisivas, onde a sabedoria, a sensibilidade e o pensamento criativo seriam necessárias.

E de alguma forma, todas essas calamidades - incluindo os últimos eventos mortais - parecem ser parte de um processo corruptor maior, que está afligindo Israel. Sente-se um sistema político podre e inchado, alarmado pela desordem produzida ao longo dos anos por suas próprias ações e equívocos. E sem esperança da possibilidade de desatar o imenso nó que amarrou, torna-se ainda mais inflexível frente a desafios prementes e complexos, nesse processo perdendo as qualidades que um dia caracterizaram Israel e sua liderança - vitalidade, originalidade e criatividade.

O bloqueio de Gaza fracassou. Já fracassou há quatro anos. Isto significa que ele não é meramente imoral, mas também impraticável e, na verdade, piora toda a situação, como estamos revendo nesta mesma hora.

E também prejudica os interesses vitais de Israel.

Os crimes dos líderes do Hamas, que vêm mantendo cativo o soldado israelense Gilad Shalit por quatro anos, sem permitir uma única vez que a Cruz Vermelha o visite, do Hamas que disparou milhares de foguetes desde a Faixa de Gaza sobre cidades e vilarejos israelenses, são atos que precisam ser tratados com firmeza, utilizando os vários meios legais disponíveis a um Estado soberano. O atual cerco a uma população civil não é um deles.

Eu gostaria de acreditar que o choque das ações enlouquecidas desta 2ª feira, levará a uma reavaliação de toda a idéia do bloqueio, libertando por fim os palestinos dos seus sofrimentos e limpando Israel do seu desgaste moral. Mas a nossa experiência nesta região trágica nos ensina que acontecerá o contrário: os mecanismos de resposta violenta e os ciclos de vingança e ódio. Nesta 2ª iniciou-se uma nova rodada, cuja magnitude ainda não se pode imaginar.

Acima de tudo, esta operação insana mostra o quanto Israel declinou. Não é preciso exagerar esta afirmação. Qualquer um que tenha olhos para ver entende e sente isto. E ainda existem aqui os que buscam converter a sensação natural e justificada da culpa israelense numa afirmativa estridente de que o mundo todo é culpado. Está cada vez mais difícil de conviver com a nossa vergonha.


DAVID GROSSMAN é um dos três expoentes da literatura contemporânea israelense, ao lado de Amós Oz e A. B. Yeoshua. Como eles, é veterano ativista do Movimento PAZ AGORA, tendo sido signatário da DECLARAÇÃO CONJUNTA ISRAELENSE-PALESTIN A e do ACORDO DE GENEBRA.

Tecendo a Manhã :: João Cabral de Melo Neto


1.
Um galo sozinho não tece uma manhã:
ele precisará sempre de outros galos.

De um que apanhe esse grito que ele
e o lance a outro; de um outro galo
que apanhe o grito de um galo antes
e o lance a outro; e de outros galos
que com muitos outros galos se cruzem
os fios de sol de seus gritos de galo,
para que a manhã, desde uma teia tênue,
se vá tecendo, entre todos os galos.

2.
E se encorpando em tela, entre todos,
se erguendo tenda, onde entrem todos,
se entretendendo para todos, no toldo
(a manhã) que plana livre de armação.

A manhã, toldo de um tecido tão aéreo
que, tecido, se eleva por si: luz balão.

Obras de Ivan Alves Filho são divulgada na Europa



A Universidade de Varsóvia, da Polônia, inaugurou um curso sobre Brasil, África de expressão portuguesa e Portugal, selecionando obras de cerca de vinte autores latino-americanos, norte-americanos, africanos e europeus para exame no decorrer do ano letivo.

Para orgulho da Fundação Astrojildo Pereira, ao lado de obras de autores de peso como Celso Furtado, Edward Said, Raymond Williams e Rui Castro, a Universidade de Varsóvia selecionou também o livro Brasil, 500 anos em documentos, do historiador e jornalista Ivan Alves Filho, editor do site da FAP e membro do Conselho editorial da revista Política Democrática, além de integrante da Direção Nacional do PPS.

Outras obras de Ivan Alves Filho, como Memorial dos Palmares, editada pela FAP em 2009, e História pré-colonial do Brasil, foram adotadas por Universidades da Alemanha, da Itália, da França e de países da América Latina e dos Estados Unidos.