segunda-feira, 12 de julho de 2010

Reflexão do dia – Raimundo Santos


" Vinte anos depois daqueles escritos de Armênio Guedes, alguns autores consolidariam a matriz que ultimamente vêm sendo chamada de “campo da revolução passiva”. Trata-se de uma matriz de raiz pecebista na qual a uma moderna interpretação do Brasil se associa uma orientação política que por sua vez requer aferição crítica das suas consequências práticas. Usualmente, os militantes desse campo avaliam suas próprias ações tomando por base o avanço da democratização da vida nacional e o aperfeiçoamento do estado democrático de direito. Essa construção viria não só convalidar o estilo antigo de pensar e agir do PCB como oferecer referenciais aos protagonistas do reformismo democrático situado no mundo brasileiro dos nossos tempos. "


(Raimundo Santos, cf. Teoria e prática no nosso marxismo político, texto inédito (2010).)

Futebol, crime e política:: Luiz Werneck Vianna

DEU NO VALOR ECONÔMICO

O assassinato de Eliza Samudio em que está envolvido como suspeito o goleiro Bruno, ex-capitão do Flamengo, vencedor do último campeonato brasileiro de futebol, não deve ficar confinado às páginas do noticiário policial. O horror que ele suscita por seu enredo escabroso, a história dos personagens, a gratuidade do crime, a forma da execução - os restos mortais da vítima foram lançados a cães para serem devorados -, a presença do mal em estado bruto, tudo isso reclama que se olhe para além das patologias dos indivíduos já indiciados como culpados. Em primeiro lugar para o clube, agremiação mais que centenária, e para a estrutura do futebol, o esporte de massas que é uma paixão nacional. Em segundo, para o tipo de sociabilidade selvagem, à margem da vida civil, que se reproduz em escala crescente e que encontra na cultura do narcotráfico e do consumismo, alçado a valor supremo, os seus paradigmas.

Bruno, um dos mais altos salários do seu clube, era uma liderança, portando a braçadeira de capitão por indicação de seus dirigentes, em que pese várias manifestações arrogantes de sua parte, inclusive nas relações com o seu técnico, e já se envolvera, com alguns colegas, em escândalos públicos em festas promovidas em domínios territoriais do narcotráfico. Em uma dessas ocasiões, proferiu uma declaração em que, explicitamente, admitiu ser normal a violência física entre casais, e, embora sua agremiação desportiva fosse dirigida por uma mulher - uma ex-atleta olímpica -, manteve a honraria da braçadeira.

Registre-se, ainda, que dois companheiros de clube, como o noticiário esportivo com frequência denunciava, eram contumazes participantes de pagodes em redutos do crime organizado, um deles fotografado ao lado de marginais armados com metralhadoras, o outro levado à polícia para esclarecer relações mercantis com notórias lideranças do mundo do tráfico em favelas cariocas.

Em todos os casos, o clube optou pela contemporização, em nome certamente de uma política de resultados, uma vez que esses jogadores se notabilizavam por seus feitos nas competições. E o que importa aí é deslocar o foco para a estrutura do nosso futebol, com sua organização autocrática, dominada por um vértice que se eterniza no poder, apenas orientada para a produção de vitórias nas competições, inteiramente arredia às possibilidades de fazer do futebol, com sua penetração capilar na vida do povo, um instrumento de educação de massas.

Para ela, o futebol do país se resume a ser mais um ator no processo de globalização dessa atividade esportiva graças à qualidade dos seus praticantes, um celeiro de craques de exportação. Nesse sentido, a expressão esportiva e cultural que ele representa se encontra crescentemente contaminada pela ameaça de ser submetida inteiramente à lógica mercantil. E não à toa não se pode mais descrever a sua história atual sem incluir o papel dos empresários no recrutamento de jovens jogadores talentosos que passam a administrar suas carreiras, relegando o papel das agremiações esportivas a um lugar subordinado, quando não inteiramente ausente, na sua formação como homens e cidadãos.

Os frutos bem-sucedidos desse sistema se convertem em mercadorias do mercado globalizado do futebol, as transferências para os milionários clubes europeus, para onde migram cada vez mais jovens, significando a realização de suas carreiras. Nada mais natural que seus praticantes, desde cedo sem tempo para se dedicarem aos estudos, encapsulados na bolha do mundo do futebol, manifestem fortes opções religiosas, em geral pentecostais, aí encontrando escoras emocionais que lhes permitam suportar as pressões do mercado que condiciona suas vidas.

Sem essas escoras, seus profissionais, com uma educação formal em geral precária, muitos vindos de lares destroçados - o caso de Bruno -, se veem à mercê da cultura do consumismo, o tempo livre de jogos e treinamentos dissipados em meio a uma legião de fãs, sua presença prestigiosa disputada em pagodes e orgias em que são convidados de honra. Os clubes, indiferentes ao comportamento dos seus profissionais, cerram os olhos a seus desvios de conduta, por sua vez prisioneiros da lógica de resultados que comanda o futebol. Assim, os clubes e seus heróis do maior esporte de massas do país, que poderiam exercer um papel na difusão dos valores civis na formação da juventude, tornam-se uma vitrine a estimular o hedonismo e o comportamento narcísico.

Futebol é cultura - no nosso caso uma de suas mais vigorosas manifestações -, fazendo as vezes de uma escola moderna em que se ensina a competir sob a jurisdição de regras interpretadas por um árbitro e que são de prévio conhecimento dos seus praticantes e do seu público. Atividade generalizada na juventude do nosso país, presente no mais remoto dos rincões, a política e os partidos não podem ser estranhos a ela, esperando-se da sua intervenção a criação de regras que venham a atuar no processo de formação dos seus profissionais, que chegam a ela, em muitos casos, como pré-adolescentes. De outra parte, cabe à opinião pública, reclamar que os clubes adotem padrões de conduta que impeçam os seus atletas de manterem relações privilegiadas com o submundo da criminalidade.

Entre tantos fatos estarrecedores no caso de Bruno, está a revelação de que ele estava conscientemente envolvido com personagens e com os padrões vigentes nas redes do crime organizado. Só faltou o uso de micro-ondas na eliminação da pobre Eliza para tornar ainda mais evidente as impressões digitais da cultura do narcotráfico nesse caso.


Luiz Werneck Vianna é professor-visitante da UERJ e ex-presidente da Anpocs. Escreve às segundas-feiras.

Desfaçatez :: Ricardo Noblat

DEU EM O GLOBO

Brizola: "Cunhado não é parente".
Bill Clinton: "Traguei, mas não fumei".
Dilma: "Rubrica não é assinatura".

A desfaçatez está no DNA dos políticos. E não se passa uma semana sem que eles ofereçam provas abundantes disso. Exemplos? Candidatos às próximas eleições, os senadores Ideli Salvatti (PT-SC), Raimundo Colombo (DEM-SC), José Agripino Maia (DEM-RN) e Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN) pediram licença dos cargos para cuidar de suas campanhas.

Consta do regimento interno do Senado que licença para fins particulares é de no máximo 120 dias. Nesse caso, o suplente não assume. A Constituição manda dar posse ao suplente no 121º dia se o cargo permanecer vago. Como driblar o regimento interno e a Constituição de uma só vez para que o suplente assuma logo? Simples: tira-se uma licença médica e emenda-se com a licença para fins particulares.

Oficialmente, Ideli, candidata ao governo de Santa Catarina, ocupou-se com a saúde entre os últimos dias 8 e 10. A partir de hoje entrará de licença por motivos particulares. Adversário de Ideli, Colombo adoeceu no último dia 8. Ficará bom amanhã. A partir do dia seguinte entrará de licença até o fim da campanha. Por causa da saúde, Agripino sairá de circulação entre os dias 15 e 17 deste mês. E Garibaldi entre 15 e 20.

Os suplentes agradecem. Senadores por quatro meses, passam a desfrutar de todas as vantagens do cargo - inclusive o direito à aposentadoria. Em troca, se empenharão para que a estrutura dos gabinetes continue funcionando a contento. Quer dizer: funcionando para facilitar a eleição dos que a comandaram até aqui. Sempre é possível ao senador temporário arranjar empregos para afilhados.

O que disse Joaquim Roriz quando lhe perguntaram outro dia sobre o risco de ser atropelado pela Lei da Ficha Limpa e impedido de concorrer ao governo do Distrito Federal? Disse: “Eu não sei o que é Ficha Limpa, não tenho condenação. Renunciei ao mandato de senador dispensando todas as mordomias”. O Ministério Público pediu a impugnação do registro da candidatura dele.

A Lei da Ficha Limpa barra candidaturas de políticos que renunciaram ao mandato para escapar de processo por quebra de decoro. Com medo de ser cassado e de perder os direitos políticos, Roriz renunciou ao mandato de senador em 2007 depois da divulgação de uma conversa sua com o ex-presidente do Banco Regional de Brasília sobre a partilha de um cheque de R$ 2,2 milhões do empresário Nenê Constantino.

O mensalão do DEM derrubou o ex-governador Arruda. O vice Paulo Octávio foi obrigado a renunciar ao cargo - assim como o presidente da Câmara Legislativa. Um deputado distrital acabou cassado. Do total de 24 deputados, pelo menos 16 se envolveram com a bandalheira que começou no último governo de Roriz, segundo a Polícia Federal. E Roriz alega candidamente que renunciou a mordomias...

Há limites para a desfaçatez dos políticos? Perguntem a Lula se ele fez campanha antecipada para Dilma Rousseff. Responderá que não. Mas por ter feito foi multado seis vezes pela Justiça. Nenhum presidente da República foi multado tantas vezes por violar a lei. Não, não perguntem a Dilma pelo dossiê sobre despesas sigilosas do governo Fernando Henrique montado na Casa Civil quando ela era ministra.

Que dossiê? Que pergunta mais velha! Jamais existiu dossiê. Existiu um banco de dados para atender a pedidos de informações do Tribunal de Contas da União. Dilma jamais assinou o programa de governo enviado ao Tribunal Superior Eleitoral para acompanhar o pedido de registro de sua candidatura. É verdade que ela rubricou cada página do programa retirado às pressas e substituído por outro mais ameno.

Mas rubrica é uma coisa, assinatura é outra, ensinou Dilma. Os dicionários ensinam que rubrica é assinatura abreviada. Uma vale tanto quanto a outra. Se não valesse, a rubrica seria dispensável. Para não admitir que assinou o programa sem ler, Dilma preferiu desmoralizar o peso de sua própria assinatura. Adiante. É o moto-contínuo.

Reputação ilibada :: Paulo Brossard

DEU NO ZERO HORA (RS)

A lei determina que os candidatos à presidência da República registrem no Tribunal Superior Eleitoral o seu programa de governo. Na manhã do dia 5 de julho, a candidata do partido oficial e de seus associados registrou o seu programa. Este o fato, certo, público, incontestado e incontestável. Sem demora, passou a ser divulgado, principalmente pela internet. Na mesma segunda-feira, 5 de julho, no fim da tarde ou na boca da noite, o programa apresentado e registrado pela manhã foi retirado e apresentado outro. É outro fato, também certo, público e incontroverso. Foi igualmente publicado. Ou seja, pela manhã o TSE recebeu e registrou um programa de governo de uma candidata e no fim da tarde, retirado o programa matinal, foi apresentado e registrado outro, retocado ou podado ou corrigido ou escoimado de algumas inconveniências ou que outro nome tenha. Os dois fatos são certos e notórios.

É a respeito deles que pretendo fazer breve comentário, embora eles se prestassem a várias observações, dado o ineditismo da ocorrência, pois, acredite ou não, isto que ocorreu na manhã e à noite de segunda-feira, 5 de julho, não foi obra de pessoas hostis à candidata ou a ela antipáticas, mas por pessoas da imediata confiança da declarante e do seu partido e, quiçá, da própria coligação costurada em torno e a favor da própria autora de ambas as declarações, uma substitutiva da outra, a vesperal sucedendo e substituindo à matinal.

Até aqui, os dois fatos, tal como divulgados pela imprensa e demais meios de comunicação. Falo em imprensa uma vez que se não apagam facilmente os fatos divulgados por via impressa. Muitas coisas poderiam ser ditas a respeito do episódio, que é sem precedente, donde se possa dizer que, ao contrário do que disse o rei Salomão, e vem sendo repetido há séculos, pode haver coisa nova debaixo do sol; trata-se de novidade, sou levado a cometer um pleonasmo dizendo que se trata de novidade nova. Limitar-me-ei ao mínimo, exatamente em virtude de sua singularidade.

Se não estou em erro, ao dispor como o fez, a lei quis que os candidatos à Presidência, por via da mais alta Corte eleitoral do país, pudessem fazer e fizessem uma declaração solene de suas pretensões em caso de eleitos. Um ato sem embustes, ato de lealdade praticado sob as vistas do povo por quem, eleito, sob custódia do TSE, viesse a ser proclamado o primeiro magistrado e servidor da nação. Um ato de limpidez sem mácula, incompatível com a felonia, a falsidade, a perfídia, a deslealdade. Ora, estava reservada à candidata do oficialismo, saída da costela do presidente da República, à maneira de Eva, desfazer no fim da tarde o feito no começo da manhã, como se o programa de governo pudesse ser obra de marqueteiro que se apraza em refazer a estampa física da pessoa. Uma contrafação em matéria de solenidade suprema. Lamento ter de fazer esta observação, mas não poderia calar diante de sua gravidade sem par.

Em outras palavras, presume-se que o candidato à presidência da República goze de reputação ilibada. Não sei se incido em erro, mas tenho lembrança de que o currículo oficial da mesma personagem ostentava títulos universitários inexistentes e, apontado o dado fantasioso, ela própria apressou-se a corrigir o divulgado. A lei eleitoral, na cláusula em exame, tem a finalidade altamente meritória e deve ser observada com fidelidade, sob pena de jazer na inutilidade das leis esquecidas, embora não revogadas.

PS. Depois de entregue este artigo à Redação, a imprensa informou que está sendo elaborado um terceiro programa de governo.

*Jurista, ministro aposentado do STF

O 'dilmômetro' de Lula :: José Roberto de Toledo

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

A política é a arte da repetição. A máxima de Fernando Henrique Cardoso está sendo demonstrada por seu sucessor e desafeto. Foi falando que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva viabilizou a candidatura de Dilma Rousseff a sua sucessão. E é repetindo que ele tenta elegê-la.

Lula disse e repetiu o nome de Dilma até convencer a cúpula do PT, cooptar os simpatizantes petistas, os aliados do PMDB e, por ora, 38% do eleitorado. Há uma correlação direta entre as menções de Lula e o crescimento de Dilma nas pesquisas.

A operação do presidente não respeitou prazo legal. As citações continuadas a Dilma lhe renderam seis multas por propaganda antecipada. Dado o benefício eleitoral, a infração parece compensar. Lula deve R$ 42,5 mil à Justiça eleitoral, ou 0,02% do custo oficial da campanha presidencial do PT, estimado em R$ 157 milhões.

O primeiro sinal de sua opção por Dilma apareceu no discurso de Lula em meados de 2007, muito antes de que a maioria dos caciques do partido se desse conta de que uma neopetista, filiada há menos de 10 anos, cortaria a fila e viraria a candidata governista.

Em uma série de lançamentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), em todas as regiões do País, o presidente soltou seu balão de ensaio eleitoral. Em apenas 54 dias, entre julho e agosto de 2007, ele repetiu o nome de Dilma em 18 discursos diferentes.

Até então, as menções do presidente à ministra-chefe da Casa Civil eram proporcionais ao destaque de seu cargo: cerca de três por mês ? embora isso já fosse duas vezes mais frequente do que as citações a seus colegas Ciro Gomes e Marina Silva.

O balão subiu devagar. Lula voltou à carga em março de 2008, quando batizou Dilma de "mãe do PAC", um epíteto que abandonaria mais tarde. Desde então, as citações a Dilma nos discursos e entrevistas do presidente só aumentaram, como se pode notar nos gráficos.

Em 2003, quando era uma desconhecida ministra das Minas e Energia, Dilma aparecia em apenas 4% dos discursos de Lula, metade do que Ciro (Integração Regional) e um terço a menos do que Marina (Meio Ambiente). Em 2005 ela substitui José Dirceu na Casa Civil e é lembrada por Lula em 12% dos discursos e 17% das entrevistas. O "dilmômetro" de Lula não parou mais de subir.

Foram 39 discursos (15% do total) de Lula citando a ministra em 2006, 63 em 2007 (19%), 80 em 2008 (24%), até chegar ao recorde de 98 citações em diferentes ocasiões ao longo do ano passado, o que significa que ele mencionou a ainda ministra em um a cada três discursos que fez em 2009. Repetiu a dose com as entrevistas: citou-a em 87 oportunidades, ou 32% das vezes que falou aos jornalistas.

Em 2010, o "dilmômetro" entrou em curto-circuito. Só nos três primeiros meses do ano, o presidente mencionou Dilma em 39 dos 78 discursos que fez. Ou seja: um sim, um não. Em março apenas, Lula citou Dilma em 20 discursos, repetindo seu nome 94 vezes, mais até do que falou "Deus" (47 vezes), uma referência permanente nas falas presidenciais.

Aí foi demais para o TSE. O tribunal multou Lula duas vezes em março, por propaganda antecipada. Coincidência ou não, Lula não citou Dilma em nenhum discurso em abril ? fato inédito desde que ela assumiu a Casa Civil. Em maio o presidente não se conteve e falou seis vezes o nome da ex-ministra, inclusive na festa do Primeiro de Maio, além de uma vez em junho. Resultado: quatro novas multas do TSE.

Mas o "dilmômetro" descontrolado de Lula já tinha dado o efeito esperado pelo presidente. Entre dezembro e junho, Dilma praticamente dobrou sua intenção de voto, ganhou cerca de 27 milhões de eleitores e empatou com José Serra (PSDB). Ela chegou ao patamar histórico de Lula nessa fase da corrida eleitoral.

A burla à lei e as multas do TSE implicaram um custo de R$ 1,00 para cada grupo de 635 novos eleitores que o presidente conseguiu para sua candidata. Lula pode dizer que fez sua parte. Agora é com Dilma.

Centrais atacam Serra para ajudar Dilma

DEU EM O GLOBO

As cinco principais centrais sindicais fizeram um manifesto, divulgado ontem pelo PT, acusando o presidenciável tucano, José Serra, de praticar "golpe contra os trabalhadores". No Ceará, Serra dançou forró, enquanto Dilma Rousseff (PT) e Marina Silva (PV) não tiveram agenda.

Centrais sindicais atacam Serra via PT

Em resposta, campanha de candidato divulga nota dizendo que os sindicalistas tentam "reescrever a História"

Leila Suwwan


SÃO PAULO. O PT divulgou ontem um manifesto, elaborado por cinco centrais sindicais, afirmando que o candidato tucano à Presidência, José Serra, pratica "impostura e golpe contra os trabalhadores". As centrais afirmam que ele mente ao divulgar que foi um dos responsáveis pela criação do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador) e pela implementação do seguro-desemprego. A carta é assinada pelos presidentes da CUT, Força Sindical, CGTB, CTB e Nova Central.

Esse grupo de sindicalistas realizou uma conferência nacional no dia 1º de junho no qual firmaram um compromisso de apoio à "continuidade" nas eleições. As centrais sindicais receberam das cinco maiores estatais do país R$7,4 milhões, entre 2006 e 2010, para a realização da festas de 1º de Maio.

"Tanto no Congresso Nacional quanto no governo (de São Paulo), sua marca foi atuar contra os trabalhadores", diz o manifesto.

A assessoria da campanha de Serra reagiu ao manifesto, por meio de uma nota:

"É a mesma mentira que o PT tenta imputar a Serra desde 2002, mas não cola. Estão usando as centrais para tentar reescrever a História e jogar baixo. Vindo de uma candidata que nunca apresentou um projeto e nunca recebeu um voto, trata-se de uma atitude imoral, reprovável, injusta e irônica", informou a campanha. De acordo com a assessoria, José Serra nunca alegou ter criado o seguro-desemprego, e sim de ter viabilizado sua implementação.

Em sua campanha, Serra tem reiterado seu papel na criação do FAT e na implementação do seguro-desemprego. No site da Câmara dos Deputados consta que o tucano propôs, em maio de 1989, o projeto de lei 2.250 que regulamentava o FAT. Mas foi considerado prejudicado, ainda de acordo com os arquivos da Câmara, porque, em 1988, um outro projeto de lei semelhante já havia sido aprovado. Também no site do Ministério do Trabalho consta que a criação do FAT e do seguro desemprego ocorreu em 1988.

Arrasta-pé em busca do voto

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Ao lado de Tasso, Serra visita duas festas populares no Ceará e arrisca passos de forró

Moacir Assunção. Enviado especial a Massapê (Ce) e Marco (Ce)

Na luta para conquistar mais votos no Nordeste, o candidato do PSDB à Presidência, José Serra, foi prestigiar duas festas do chitão ? espécie de celebrações pós-juninas ? em dois municípios do interior do Ceará, Massapê e Marco.

Serra também visitou outras três cidades da região norte do Estado, sempre na companhia do candidato do partido ao Senado, Tasso Jereissati, e do candidato ao governo do Estado, Marcos Cals.

Ao chegar à festa na cidade de Massapê, Serra foi anunciado com empolgação pelo apresentador do evento: "É o carequinha ou não é?" Na sequência, o tucano foi abordado por moradores do lugar que queriam apertar sua mão e pediam-lhe para tirar fotos ao seu lado.

A comitiva que acompanhava os candidatos tucanos assistiu de perto à exibição da tradicional Quadrilha Esperança, que se apresentava em frente à Igreja Matriz. Já Serra, Tasso, Cals e o candidato a vice-governador, Pedro Fiúza, acompanharam o evento de um camarote.

Quando Serra se preparava para sair, o locutor pediu que ele dançasse forró e o candidato arriscou alguns passos. Mais habituado ao ritmo, Tasso fez bonito ao dançar com uma eleitora.

Ao fundo, o músico Luiz Gonzaga era homenageado numa canção que contava a história da fictícia moeda "gonzagão", descrevendo uma reunião na Casa Branca para "descobrir quantos dólares vale um gonzagão".

Em Marco, onde se apresentava o cantor Reginaldo Rossi, Serra atravessou um corredor humano e conversou com eleitores. Apertou muitas mãos, tirou fotos e também dançou forró com uma mulher.

Antes, para chegar à cidade, a comitiva tinha enfrentado uma perigosa estrada de terra, em obras. Os carros do grupo se deslocaram com grande dificuldade para chegar até o município.

Serra dormiu em Acaraú, numa fazenda de propriedade do deputado estadual João Jaime (PSDB). O candidato tucano voltaria para São Paulo ainda ontem.

Jarbas dribla Guerra e busca reforço de Serra

DEU NO JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Candidato das oposições a governador vai a São Paulo marcar visita do presidenciável ao Estado, mas evita contato com o coordenador-geral da campanha, de quem está cada vez mais afastado

Sheila Borges

Ninguém confirma, mas o distanciamento entre os senadores Jarbas Vasconcelos (PMDB), candidato a governador, e Sérgio Guerra (PSDB), candidato a deputado federal, está cada vez mais evidente. O tucano viajou a São Paulo ontem, mas não participou do encontro que o peemedebista manteve com o presidenciável José Serra (PSDB), no início da noite. Jarbas foi conversar com Serra sobre a campanha em Pernambuco e convidá-lo a vir ao Estado, no fim do mês, para o primeiro ato público conjunto desta campanha. Após a audiência com Jarbas, Serra recebeu Guerra – coordenador-geral da sua campanha – para organizar uma agenda de trabalho. No caso, os atos públicos previstos para os próximos 15 dias.

Jarbas quer a companhia de Serra em dois eventos no Sertão. Em Petrolina, haverá uma feira agrícola, que reunirá especialistas de todo o País. Em Exu, uma festa em homenagem ao Rei do Baião, o cantor Luiz Gonzaga. Há um ano, Serra esteve naquele município para participar desse mesmo evento. Na ocasião, chegou a cantar trechos de músicas de Gonzagão e colocou um chapéu de vaqueiro. Foi até o sítio onde o músico nasceu. E fez questão de enfatizar que Gonzagão esteve muito presente em sua infância e adolescência, já que morava em um bairro onde havia muitos nordestinos. Caberá a Sérgio Guerra confirmar ou não a participação de Serra nos dois eventos, que acontecem no último fim de semana de julho. Por telefone, o senador tucano antecipou que é “provável” que Serra visite os municípios.

Para driblar a falta de apoio dos prefeitos - já que a maioria está apoiando o governador Eduardo Campos (PSB), candidato à reeleição, e entre os oposicionistas uma parte aderiu ao Palácio -, Jarbas está organizando uma agenda seguindo o formato “pé no chão”. Ou seja, dispensando a estrutura que normalmente é oferecida pelos prefeitos. Em geral, eles mobilizam os correligionários para dar mais “empolgação” às visitas. O peemedebista fará contato direto com os eleitores, visitando feiras e mercados públicos no interior. Tudo vai depender da característica de cada cidade.

O senador já vem adotando essa estratégia no Recife. Nos últimos dias, tem ido a locais públicos sem divulgar nada à imprensa. O objetivo é “sentir o clima” das ruas. Essa estratégia vai ser intensificada nas próximas semanas por conta do recesso do Senado, que só volta ao trabalho em agosto. No próximo fim de semana, Jarbas deve prestigiar uma feira de Caprinos e Ovinos em Sertânia, no Sertão.

Amanhã, em Brasília, ele se reúne com correligionários para definir o nome do coordenador-geral de sua campanha. Os mais cotados são os ex-secretários Fernando Dueire, que integra a equipe de finanças, e Cláudio Marinho, que está no comando do programa de governo. Outro cargo ainda vago é o do coordenador da agenda de trabalho.

Serra dança forró em festas de lideranças tucanas no CE

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Da enviada ao Ceará

O candidato do PSDB à Presidência, José Serra, foi, na madrugada de ontem, o convidado especial de duas festas populares organizadas por tucanos no Ceará.

A presença dele foi exaustivamente anunciada ao microfone em forró promovido pela Prefeitura de Massapê, administrada pelo PSDB.

O prefeito da cidade, João Pontes, é primo do deputado Luiz Pontes, coordenador da campanha do PSDB no CE.

Apresentado ao microfone como ex-governador -numa tentativa de evitar problemas com a Justiça-, Serra assistiu a campeonato de quadrilhas e até ensaiou alguns passos. Ele seguiu ainda para um forró patrocinado pelo deputado estadual Rogério Aguiar (PSDB), em Marco.

Do camarote, ele ouviu elogios de Reginaldo Rossi. Durante show, o cantor disse que se resignaria caso surpreendesse sua mulher "na cama com Serra", porque ele "será o melhor presidente".

Pela manhã, ele tomou café com prefeitos na fazenda do deputado João Jayme. Segundo o anfitrião, Serra manifestou interesse pelo Bolsa-Bode, programa de complementação de renda com doação de rebanho.

Serra mira Nordeste e Marina, Sudeste

DEU NO VALOR ECONÔMICO

Ana Paula Grabois

São Paulo - O candidato à Presidência da República do PSDB, José Serra, vai intensificar as viagens ao Nordeste, região onde tem o seu pior desempenho, segundo as pesquisas eleitorais recentes. Amanhã, Serra vai ao Maranhão, onde é recebido no palanque do ex-governador do Maranhão Jackson Lago, do PDT. Cassado no ano passado, Lago tenta voltar ao poder disputando a eleição novamente com a governadora Roseana Sarney (PMDB). Serra visitará São Luís, onde faz caminhada. No sábado, Serra fez campanha no Ceará, onde visitou as cidades de Cascavel, Uruoca, Massapê e Marco.

No sábado que vem, o candidato tucano vai ao Sul da Bahia, nas cidades de Ilhéus e Itabuna. O candidato pode ir ainda nesta semana a Porto Alegre, onde deve fazer campanha ao lado de Yeda Crusius (PSDB), governadora do Rio Grande do Sul que tenta a reeleição. O candidato deve ficar hoje em São Paulo para a reunião semanal do comando da campanha e para gravação de programa eleitoral.

A candidata do PT, Dilma Rousseff, vai concentrar boa parte das atividades da semana em Brasília, onde ficou no fim de semana. Hoje, deve gravar propaganda eleitoral. Amanhã, Dilma tem encontro com representantes da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), entidade que deve declarar apoio à candidatura da petista. No mesmo dia, Dilma, ainda em Brasília, participa da inauguração de seu comitê de campanha e tem jantar com parlamentares do PMDB.

A candidata do PV, Marina Silva, volta ao Rio amanhã, onde esteve na sexta-feira. A candidata deve inaugurar mais um comitê domiciliar "Casa de Marina" ao lado do candidato ao governo do Rio pelo PV, Fernando Gabeira. Marina continua, porém, na estratégia de focalizar a campanha em São Paulo, onde tem um de seus melhores desempenhos. Na avaliação da coordenação da campanha do PV, há potencial de angariar mais votos no Estado, pois é o maior colégio eleitoral do país, com 22,4% do total.

Hoje, Marina vai a São José dos Campos (SP) e faz visita à fabricante de aviões Embraer e ao Instituto de Aeronáutica e Espaço. No sábado, a candidata passeou de barco pela represa Guarapiranga ao lado dos candidatos do PV ao governo paulista, Fabio Feldmann, e ao Senado, Ricardo Young.

'Ninguém escapa ao controle do PMDB'

DEU EM O GLOBO

No Rio, Gabeira critica pressão peemedebista sobre prefeitos; na Baixada, Cabral faz campanha ao lado de aliados do verde

Cássio Bruno e Camila Nóbrega

A hegemonia do PMDB no Estado do Rio leva a cenas de traição explícita nas ruas e cria um desconforto para a candidatura de Fernando Gabeira, do PV, ao governo fluminense. Aliados do verde, como a deputada federal Andreia Zito, do PSDB, fizeram ontem, em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, campanha com o governador Sérgio Cabral, que tenta a reeleição pelo PMDB. Gabeira, em campanha na orla de Ipanema, disse ontem que todo mundo orbita em torno de Cabral por causa de um jeito clientelista de fazer política. Segundo ele, a máquina é tão forte, "o controle é tão poderoso", que as pessoas não conseguem escapar.

O governador fez corpo a corpo, numa feira nordestina, com Andreia Zito, que também disputa a reeleição. A deputada é filha do prefeito de Duque de Caxias, José Camilo Zito, presidente estadual do PSDB. Ela chegou ao local com Cabral. Políticos tucanos espalharam propaganda do candidato do PSDB à Presidência, José Serra, entre aliados do governador. Mesmo abraçada a Cabral e posando para fotos com ele, Andreia negou ter pedido votos para o peemedebista:

- O convite foi de (Jorge) Picciani (candidato ao Senado pelo PMDB). Ele me ligou, avisou que estaria na feira e pediu para eu recebê-lo (Cabral). Foi uma questão de educação e de delicadeza. Não fiz campanha para o Cabral. A amizade com Picciani prevaleceu e não me causou constrangimento.

Já Zito criticou Gabeira e afirmou que não caminhará nas ruas com o verde:

- O dia em que Gabeira tiver apenas um candidato a presidente, e esse for o Serra, eu estarei com ele. Enquanto Gabeira apoiar Serra e Marina (Silva, candidata do PV à Presidência) ao mesmo tempo, não ficarei com ele. Não posso deixar de receber o governador na minha cidade e não aceitar os benefícios que o município recebe dele.

Cabral não falou com a imprensa. No discurso, disse ter o apoio de Zito:

- Temos que dizer ao povo de Duque de Caxias que queremos fazer mais. E nós temos aqui uma parceria com a prefeitura, com o prefeito Zito, e nós vamos fazer mais.

Cabral, no entanto, destacou a parceria do governo estadual com o presidente Lula, e pediu votos para a candidata do PT à Presidência, Dilma Rousseff:

- Trago aqui o abraço daquela que dará continuidade a esse trabalho no Brasil e que será a primeira mulher presidente deste país: Dilma Rousseff.

Não foi só o PSDB que aderiu a Cabral ontem. O candidato a deputado estadual Samuquinha também espalhou sua propaganda na feira nordestina. Samuquinha é do PR, partido do candidato ao governo do Rio, Fernando Peregrino, aliado do ex-governador Anthony Garotinho. Para Gabeira, candidato ao governo do Rio pelo PV, o domínio que o PMDB exerce sobre os prefeitos do estado se deve a uma política que ele classifica como clientelista. Durante um ato de campanha de militantes do PV na Praia de Ipanema, Gabeira chegou a comparar o domínio do PMDB a regimes de governo totalitários, devido ao controle exercido pela máquina do estado sobre os administradores municipais:

- Eu jamais exigiria esse apoio quase unânime. Unanimidade é muito comum em países comunistas antigos, onde a máquina é tão poderosa, o controle é tão grande que ninguém consegue escapar. No Rio, é a política da bica d"água que prevalece. E ela é um polvo, pois alastra seu controle para outros setores da administração, dando grande poder de influência. O PMDB tem o domínio das máquinas, e, portanto, das prefeituras.

Sobre a presença de Andreia Zito, do PSDB, no ato de campanha de Cabral, ontem, Gabeira desconversou, mas disse que espera a redução de episódios como esse durante a campanha.

Ontem, O GLOBO mostrou que Cabral tem o apoio de 91 dos 92 prefeitos do estado. Destes, 35 são do PMDB e 38 de partidos aliados.

Colaborou:Marcelo Remígio

Empresários temem Estado de Dilma e BC de Serra

DEU NO VALOR ECONÔMICO

Cristiane Agostine

Dirigentes de 45 grandes empresas brasileiras resumiram em três pontos suas principais preocupações em relação ao sucessor do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ao participarem de um encontro recente em São Paulo. Querem saber o limite da participação do Estado na economia, quem poderá manter o ciclo de crescimento econômico registrado no governo Lula e se haverá mudanças em câmbio, juros e na autonomia do Banco Central.

Na comparação entre as propostas já feitas pelos presidenciáveis Dilma Rousseff (PT) e José Serra (PSDB), pairam mais dúvidas entre os empresários em relação ao tucano e suas ideias para a política macroeconômica. Um dos questionamentos é sobre a independência do Banco Central. O tucano defendeu o modelo chileno de BC, no qual as decisões são tomadas em conjunto com o Ministério da Fazenda, mas não deixou claro se pretende fazer mudanças no modelo brasileiro. Ao sinalizar em direção a um BC mais integrado com a Fazenda, o tucano despertou nos empresários dúvidas sobre o grau de controle que pretende ter nos rumos da política monetária. Também afirmam não saber ao certo como o candidato do PSDB poderá baixar as taxas de juros, tampouco se intervirá no câmbio -- e se intervir, como fará.

Reunidos pela consultoria Prospectiva, os empresários demonstraram mais preocupação sobre o peso do Estado num eventual governo Dilma. A candidata, na visão desses dirigentes, é favorável a que o governo fomente política de crédito e a capitalização do BNDES, enquanto o tucano prefere a regulação, sem interferência direta do Estado. Mediador do debate, o economista e cientista político Ricardo Sette descreveu que o receio de empresários é de o Estado ganhar "muita musculatura" e alterar a lógica do mercado num eventual governo Dilma.

Os dirigentes empresariais, segundo Sette, ainda têm dúvidas sobre o modelo de política industrial. A análise preliminar é que a petista deve desenvolver uma política "vertical", ao eleger setores da economia que considera estratégicos e investir fortemente neles, enquanto o tucano poderá aplicar uma política "horizontal", ao gerar incentivos fiscais independente do setor e as empresas que estiverem mais capacitadas ao desenvolvimento se beneficiarão.

Existem muitas incertezas sobre os dois candidatos, resumiu Sette. Professor da PUC, o diretor da consultoria foi chamado pelos empresários para apresentar o cenário sucessório. Participaram dirigentes dos setores automobilístico, aéreo, de alimentação, transportes, construção civil, entre outros.

De acordo com o relato de Sette, os empresários estão divididos em relação ao candidato que poderá dar continuidade a alta taxa de crescimento registrada pela economia brasileira nos últimos anos, no governo Lula. A predileção de alguns por um candidato é clara, mas mesmo os que já escolheram em quem votar na eleição de outubro têm dúvidas sobre propostas e ações. "Um empresário me disse que como pessoa física vota no Serra, mas que como pessoa jurídica prefere a Dilma", comentou. "Os empresários têm mais medo do Serra", disse Sette.

Mais do que as propostas os candidatos têm para áreas como Saúde, Educação, Política Externa e Política Industrial, os empresários preocupam-se com as futuras nomeações para os ministérios. Sette relatou os temores apontados pelos empresários sobre os dois presidenciáveis. Em relação a Dilma, a preocupação é como a petista lidará com o apetite dos aliados sobre as pastas, sobretudo do PMDB. Dirigentes analisam que o governo da candidata poderá ampliar o aparelhamento da máquina e o loteamento de cargos, com mais nomeações políticas do que técnicas. Já sobre Serra, a percepção é que o perfil centralizador do tucano poderá restringir a autonomia das equipes ministeriais.

A regulação vai ao campo :: José Graziano da Silva

DEU NO VALOR ECONÔMICO

As aquisições definitivas de enormes glebas, como tem ocorrido na África, são discutíveis se não vierem associadas a projetos para o desenvolvimento local

A crise de 2008 acionou um freio de arrumação no escopo institucional do desenvolvimento. Na esfera agrícola, a reafirmação das políticas nacionais de segurança alimentar - uma prioridade destacada pela Conferência da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), de novembro de 2009, em Roma, deslocou a ênfase anterior que transferia a responsabilidade pública do abastecimento a uma suposta coalizão de preços baixos e oferta "just-in-time" assegurada pelos mercados globais.

Estoques reguladores; políticas de abastecimento e o próprio desenvolvimento da agricultura familiar haviam sido rebaixados diante das promessas da presença de um mercado provedor sempre abastecido com preços suficientemente baixos - porque subsidiados - para desincentivar a produção local. O colapso econômico, sobretudo seu estágio preliminar de entropia especulativa e agigantamento da fome mundial desautorizou a crença numa correlação de interesses entre segurança alimentar e desregulação econômica.

Economias pujantes, mas não autossuficientes em alimentos, caso da China, por exemplo; ou aquelas desprovidas de água, sol e solo suficientes para engatar sua matriz energética à era dos bicombustíveis, como as europeias, decodificaram o recado da crise: a segurança alimentar - e, no futuro, segurança bioenergética - dependerá cada vez mais de um certo grau de controle sobre os meios de produção.

Esse aprendizado tem mão dupla. Um desdobramento da sua reciprocidade são as manifestações sobre a necessidade de se regular o comércio internacional de terras, particularmente a venda de enormes glebas a capitais estrangeiros destinadas a reserva de valor ou à exportação de alimentos.

Estima-se que milhões de hectares tenham passado ao controle estrangeiro a partir da crise de 2008, num movimento fortemente concentrado na África que reuniria 80% da "terra disponível" mirada pelos investidores, atuantes também na Ásia e, em menor proporção, na América Latina.

Só no Brasil, segundo o Ministério do Desenvolvimento Agrário, o saldo da propriedade estrangeira reúne 4,3 milhões de hectares. E isso porque considera empresa nacional qualquer registro de pessoa física estrangeira que tenha domicílio no país.

Considerando que a agricultura ocupa cerca de 1,5 bilhão de hectares no planeta e ainda existiria uma fronteira disponível equivalente a 50% disso, a escala das transações recentes, em tese, não justificaria receios diversos. O que de fato parece pesar nos temores de governos e especialistas é uma inédita convergência de impulsos apontando para um mesmo horizonte ampliado de pressão fundiária nos próximos anos.

As fragilidades do abastecimento expostas pela crise foram apenas a ponta do iceberg. O fato é que os aumentos drásticos nos preços das commodities entre 2007 e 2008 abalaram uma arraigada confiança na tendência secularmente baixista nos preços de produtos primários. Na linha do tempo das cotações, desde a II Guerra, houve apenas um precedente que desmentiu essa percepção: durante a crise do petróleo, em meados da década de 70. O que se deu em 2007 e 2008 poderia ser apenas mais um ponto fora da curva, mas não é isso que se desenha, pelo menos por enquanto: segundo recentes projeções da FAO em conjunto com a OCDE, os preços das commodities agrícolas permanecerão elevados na década dificultando assim o acesso de bilhões de pessoas pobres em todos os cantos do mundo.

Essa fornalha carregada de vapor altista não passa desapercebida no radar de fundos e megainvestidores. Insatisfeitos com o baixo retorno das aplicações convencionais na longa convalescença pós-crise, o dinheiro ambulante garimpa oportunidades de rendimento superior ao da papelaria financeira. A aquisição de terras férteis, mesmo sem a intenção imediata de produzir, pode ser uma delas, aquinhoada por uma singularidade adicional: ao contrário das inovações financeiras, terra é um recurso finito que a economia e a engenharia dos mercados não consegue replicar. Mas é por isso também que aquisições definitivas de enormes glebas, ou o seu arrendamento por prazos longos de 50 até 99 anos, como tem ocorrido na África, são discutíveis se não vierem associadas a projetos que ofereçam contrapartidas de desenvolvimento local. A justificativa corrente de que é melhor o grande capital estrangeiro que agrega tecnologia e eficiência à reprodução vegetativa da pequena agricultura contém uma perigosa meia verdade. O truque consiste em utilizar o confronto de escalas como biombo para omitir o debate que verdadeiramente importa: desenvolvimento para quem? Desenvolvimento para quê?

Uma das questões evidenciadas na crise, enfatizada pela FAO, foi a vulnerabilidade de muitas economias que renunciaram ao desenvolvimento agrícola próprio, fragilizando assim a produção familiar em troca de maior dependência externa, com aumento da pobreza no campo e nas cidades. A reversão desse processo demanda decisão política dos governos locais para recolocar a segurança alimentar na agenda das políticas públicas. Os países ricos ajudariam se mudassem a qualidade da ajuda internacional, destinando fundos ao desenvolvimento agrícola, em vez de vincular recursos a doação em especial e importações subsidiadas de alimentos que asfixiam o produtor local.

Carência financeira e defasagem tecnológica constituem fatos inquestionáveis na vida dos agricultores das nações mais pobres. A agonia ou a ressurreição de sua agricultura, porém, dependerá muito mais da forma como esses recursos serão internalizados do que do seu aporte.


A discussão de normas regulatórias para o comércio internacional de terras tem aí um ponto de partida interessante. Cuidados como a transparência nas negociações; respeito pelos direitos existentes; partilha de benefícios com comunidades locais; proteção ambiental e adesão a políticas nacionais de comércio e segurança alimentar, são alguns critérios cogitados preliminarmente, aos quais acrescentaríamos ainda: transferência de tecnologia agrícola; destinação de uma parte da produção ao abastecimento nacional e o desenvolvimento de infraestrutura local que possibilite a irradiação do desenvolvimento. Mais que um veto ao investimento estrangeiro, medidas como essas esboçam um pertinente código de conduta para regular o grande investimento agrícola no mundo pós-crise, seja ele de que bandeira for.


José Graziano da Silva é representante regional da FAO para América Latina e Caribe.

A Venezuela está a caminho do desastre :: José Roberto Mendonça de Barros

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

A Venezuela é aquele país que, segundo nosso presidente, tem democracia demais. Apesar disso, os esforços para o aprimoramento democrático não param: o ex-ministro General Baduel (aquele que garantiu o poder a Chávez) foi condenado a oito anos de prisão, os esforços para fechar o único canal oposicionista de TV estão quase concluídos, com o pedido de prisão de seu diretor, enquanto outros críticos (como Oswaldo Alvarez Paz, ex-governador do Estado de Zulia) são presos. Ainda isso é pouco, pois a democracia tem de ser defendida de seus inimigos solertes; nessas condições, como mostrou o Estado em matéria publicada em 16 de junho passado, a ajuda de Cuba tem sido inestimável. Agentes da democracia vizinha participam cada vez mais do controle militar e da segurança interna, matéria na qual o aparato cubano é craque respeitado em todo o mundo.

Entretanto, o controle político do presidente Chávez vem sendo sistematicamente testado pela firme deterioração da economia venezuelana. Apenas para se ter uma ideia, dos dezoito países cobertos pelo Latin American Consensus Forecast (edição de junho), a Venezuela é o único no qual se projeta uma queda no PIB, para uma média do crescimento regional de 4,5%.

A desordem econômica é profunda e generalizada. Comecemos pelos números: o PIB venezuelano caiu 3,3% em 2009 (depois de crescer 4,8% em 2008) e é projetada uma contração de mais 4,1% em 2010 (dados do Consensus). A estimativa mais recente disponível é do Morgan Stanley, que projeta um mergulho de 6,2% para este ano e mais queda (1,2%) para 2011. Os investimentos caíram 3,3% em 2008 e 8,2% em 2009. Para 2010, projeta-se queda entre 12,5% (Consensus) e 28% (Morgan Stanley). Da mesma forma, o consumo caiu em 2008 (3,2%), cifra que deve se repetir neste ano. O que cresce mesmo é a inflação: os preços ao consumidor se elevaram 32% em 2008 e 27% no ano seguinte. Para 2010, a inflação deve atingir 40% e ficar por aí em 2011.

Deterioração. A recente situação econômica é fruto de uma longa deterioração em várias frentes, que as elevações dos preços de petróleo até 2008 mascararam, uma vez que as receitas externas facilitavam as importações e geravam recursos para os gastos do governo central. Vejamos as principais.

Petróleo: no final de 2000, a Venezuela produzia 3 milhões de barris de óleo por dia; entre fevereiro e maio deste ano, a extração média foi de 2,3 milhões de barris/dia, segundo a Opep, ou uma queda de quase 25%. Uma sistemática redução dos gastos de manutenção e de investimentos em novos campos, resultante do desvio do caixa da empresa para cobrir gastos correntes do governo, explica esse resultado. A situação é tão difícil que a PDVSA acumulou uma dívida de mais de US$ 21 bilhões com prestadores de serviços e fornecedores. O problema é estrutural e dificilmente será revertido a curto e médio prazo, mesmo após o acordo de exploração com a China. Como os preços do petróleo estão em queda, podendo chegar a US$ 60, a geração de caixa irá piorar ainda mais.

Setor externo: o petróleo é o único item relevante na pauta de exportações da Venezuela. A lenta redução na produção e a queda na cotação do produto após 2008 resultaram numa contração da oferta de divisas. Como a limitação da produção local exige grandes importações para atender o consumo doméstico, o mercado de câmbio ficou muito pressionado, especialmente depois da forte queda nas reservas de divisas. Essas caíram de US$ 32 bilhões, em 2008, para a faixa de US$ 17 bilhões nos dias de hoje, o que levou as autoridades a estabelecer controles diretos e racionamento das divisas (Cadiv). Nessas condições, as empresas passaram a buscar o mercado paralelo de dólares para pagar pelas importações. Estima-se que 30% das importações chegaram a ser liquidadas desta forma, naturalmente numa taxa de câmbio muito mais desvalorizada que a cotação oficial. Entretanto, o vezo autoritário do governo o levou a aprovar legislação que criou penas drásticas para coibir o mercado paralelo. A solução policial para um problema econômico, como é usual, só vai agravar a situação, pois se for bem-sucedida, a recessão e a inflação se elevam com o choque de oferta; se mal sucedida, a desordem e a inflação ficam mais agudas.

Infraestrutura: o grande crescimento dos gastos correntes do governo central, da mesma forma que o ocorrido na produção de petróleo, reduziu as despesas de manutenção e investimento nas áreas de estradas e energia elétrica. Há poucos anos, um grande trecho da estrada que liga Caracas ao principal porto do país simplesmente ruiu, por falta de manutenção. Como resultado, durante dois anos o transporte se fez por um caminho precário e mal adaptado para uso intensivo, com elevação apreciável de custo. Nestes dois últimos anos, por outro lado, a Venezuela conviveu com apagões na rede elétrica, que neste ano (por causa de uma forte seca) se transformou em racionamento explícito em boa parte do país. As restrições na oferta de energia elétrica explicam parte do mergulho recessivo do país.

Oferta de alimentos: a Venezuela sempre importou alimentos. Entretanto, a situação piorou muito tendo em vista as contínuas intervenções do governo, via tabelamentos, ameaças de expropriação e importações subsidiadas. Estabelece-se então um círculo vicioso: a oferta cai, o governo ameaça e intervém na comercialização, o que leva a reduções adicionais na produção; com a restrição de divisas, o abastecimento via produtos importados é incerto e insuficiente, o que eleva a inflação, reiniciando o circuito. No final, perdem produtores e consumidores.

Intervenção e ineficiência: não deve ser surpresa a constatação de que a economia venezuelana é cada vez mais ineficiente, desde a operação da PDVSA, passando pelos serviços de infraestrutura, por mais de 700 nacionalizações de empresas, pelo capitalismo de compadre (boliburgueses) e chegando à tentativa frustrada de estatizar o abastecimento, como é o caso da rede Mercal. Nada é mais simbólico da ineficiência da economia do que a descoberta de mais de trinta mil toneladas de alimentos importados que apodreceram em algum pátio. A insegurança jurídica é total, a segurança pública piora. Com a inflação elevada, mesmo as tentativas de redistribuição de renda se reduzem com o custo de vida mais alto. Só uma coisa é certa: o presidente Chávez se aproxima cada vez mais de uma ditadura explícita.

Implicações. A situação da economia de Venezuela sugere pelo menos duas implicações para o Brasil. Em primeiro lugar, o saldo comercial bilateral (que começou a se elevar a partir de 2004 e atingiu a faixa de US$ 5 bilhões em 2008) não é sustentável. A recessão e a escassez de divisas limitam as importações. Em 2009, o saldo se reduziu para US$ 3,6 bilhões, caindo mais de 15% nos primeiros cinco meses deste ano em relação a igual período do ano passado, sugerindo um número da ordem de US$ 2,5 bilhões. Além disso, são recorrentes os atrasos no pagamento das importações. Devemos continuar exportando para lá, mas sem grandes expectativas.

Finalmente, patrocinar a entrada da Venezuela no Mercosul é uma das maiores esquisitices da nossa diplomacia. Juntar o que não funciona (Mercosul) com um país em crise, que não soma muito em termos econômicos e com um líder sem limites, não pode dar certo. Seria risível, se não fosse trágico, imaginar que a soma dos Kirchners com Chávez possa produzir algo construtivo.


Economista da MB Associados
(artigo publicado ontem)

Liberdade de imprensa::Graziela Melo




Sempre manifestei preocupação com as ameaças à liberdade de imprensa que tem se revelado, ultimamente, na América Latina. Natural. Meu pai foi jornalista e por conta disso me pré-alfabetizei antes de chegar aos bancos escolares, via manchetes de jornais. Já meu filho mais velho, devido às dificuldades da paraplegia mais o exílio, não tendo chance de frequentar escola, foi também alfabetizado via manchetes dos jornais chilenos.

Talvez, por estas e muitas outras razões, detesto os que pensam e/ou tem intenções de restringir a liberdade de imprensa ou da mídia de modo geral, das atividades culturais, etc. A liberdade de expressão é um dos mais valiosos patrimônios da sociedade. Por isso não gosto de ditaduras. Nem de esquerda, nem de direita.

Duas frases de conhecidas personagens da história passada, constam da "Carta ao Leitor", na revista Veja, dessa semana, com o título: "O ÍMPETO LIBERTICIDA". Uma de Lênin, a outra de Mussolini.

Ambas se assemelham em conteúdo:

Lênin: "nosso governo não aceitaria uma oposição de armas letais. Mas ideias são mais letais que armas".

Benito Mussolini: "os franceses eram decadentes por culpa da sífilis, do absinto e da liberdade de imprensa".

Bem, a "jabulane" está com vocês. Para que mais comentários? Já se sente algum perigo embutido no programa de governo assinado pela Dilma.

Parabéns! Espanha conquista o mundo pela primeira vez


Seleção espanhola sofre para superar violência holandesa e conquista o título da Copa do Mundo da África do Sul apenas no segundo tempo da prorrogação, com gol de Iniesta

O mundo se rendeu aos pés da Fúria. Em jogo dramático, violento e decidido apenas na prorrogação, os espanhóis passaram pela Holanda por 1 a 0 (gol de Iniesta), no Soccer City, em Johannesburgo, e faturaram o título da Copa do Mundo da África do Sul - o primeiro na história da Espanha, que tinha até então como melhor resultado um quarto lugar na Copa do Brasil, em 1950.

Este é o prólogo :: Frederico Garcia Lorca


Deixaria neste livro
toda a minha alma.
este livro que viu
as paisagens comigo
e viveu horas santas.

Que pena dos livros
que nos enchem as mãos
de rosas e de estrelas
e lentamente passam !

Que tristeza tão funda
é olhar os retábulos
de dores e de penas
que um coração levanta !

Ver passar os espectros
de vida que se apagam,
ver o homem desnudo
em Pégaso sem asas,

ver a vida e a morte,
a síntese do mundo,
que em espaços profundos
se olham e se abraçam.

Um livro de poesias
é o outono morto:
os versos são as folhas
negras em terras brancas,

e a voz que os lê
é o sopro do vento
que lhes incute nos peitos
- entranháveis distâncias.

O poeta é uma árvore
com frutos de tristeza
e com folhas murchas
de chorar o que ama.

O poeta é o médium
da Natureza
que explica sua grandeza
por meio de palavras.

O poeta compreende
todo o incompreensível
e as coisas que se odeiam,
ele, amigas as chamas.

Sabe que as veredas
são todas impossíveis,
e por isso de noite
vai por elas com calma.

Nos livros de versos,
entre rosas de sangue,
vão passando as tristes
e eternas caravanas

que fizeram ao poeta
quando chora nas tardes,
rodeado e cingido
por seus próprios fantasmas.

Poesia é amargura,
mel celeste que emana
de um favo invisível
que as almas fabricam.

Poesia é o impossível
feito possível. Harpa
que tem em vez de cordas
corações e chamas.

Poesia é a vida
que cruzamos com ânsia,
esperando o que leva
sem rumo a nossa barca.

Livros doces de versos
sãos os astros que passam
pelo silêncio mudo
para o reino do Nada,
escrevendo no céu
suas estrofes de prata.

Oh ! que penas tão fundas
e nunca remediadas,
as vozes dolorosas
que os poetas cantam !

Deixaria neste livro
toda a minha alma...



(tradução: William Agel de Melo)