segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Reflexão do dia – Fernando Henrique Cardoso


"A recorrência do linguajar político e a forma de agir [do presidente Lula] levam à crença de que o que vale é ter maioria. [...] A democracia é mais do que ter maioria, o que é conquistado à força pelas ditas democracias populares. Democracia também é respeito à lei, respeito à Constituição, respeito às minorias e à diversidade. Tudo isso é obscurecido nas democracias populares, onde se entende que, se você tem a maioria, você tem tudo e pode tudo. Tem o direito de fazer o que bem entender. O presidente Lula não pensa em fazer isso, mas essas são as consequências do comportamento político que ele tem. "


(Fernando Henrique Cardoso, O Estado de S. Paulo, 19 set. 2010.)

O lulismo sem Lula:: Luiz Werneck Vianna

DEU NO VALOR ECONÔMICO

Esta coluna, pelos idos de agosto, já em meio à sucessão presidencial, deixou-se tentar por uma metáfora meteorológica, anunciando que ao longe soprava um vento sudoeste, sinal certo de chuva grossa. Bem, as chuvas chegaram, como se pode constatar das palavras, em um registro quase filosófico, como que apenas observando a mudança climática, com que o ex-ministro José Dirceu dirigiu-se em palestra a sindicalistas. Não será Lula quem sucederá a Lula, mas Dilma, e nem mesmo os marinheiros de primeira viagem, que são tantos, podem ficar indiferentes a mudanças de tal envergadura no regime dos ventos.

Fora da tripulação, o grande timoneiro desses últimos oito anos deverá, é claro, manter sua influência sobre a sua sucessora, embora, na prática, mesmo isso não seja uma operação fácil, sempre sob o risco de fragilizá-la na chefia do Estado e dos negócios da administração pública.

Ainda mais que, a se confiar nos relatos sobre sua biografia, ela aparenta ser suscetível a arranhões em sua autoridade. Sem Lula, é trivial, o lulismo sai do governo, e o que fica nele é o PT e sua imensa base aliada, à testa o PMDB, com um dos seus principais condestáveis, Michel Temer, no posto estratégico da Vice-Presidência da República.

O tempo é novo e próprio à navegação

O programa do novo governo, dito à saciedade na campanha eleitoral que ainda transcorre, não é o de fundar principado novo, e sim o de imprimir continuidade às linhas mestras do que sucede, e personagens como Antonio Palocci, Henrique Meirelles e Nelson Jobim, salvo incidentes extraordinários, devem ocupar postos-chave. Da base aliada, reanimados por prováveis vitórias eleitorais, deverão permanecer no proscênio políticos de genuína cepa conservadora, como José Sarney, Renan Calheiros, entre tantos outros de perfil semelhante, todos comprometidos, no essencial, com a continuidade dos princípios e práticas do governo Lula, principalmente com a sua expressão pluriclassista, em um arco que vai do agronegócio, passando pelo grande empresariado e pelo sindicalismo, ao Movimento dos Trabalhadores Sem Terra.

Tais princípios e práticas não estão enunciados em um programa, consistindo, na verdade, em uma política a que se chegou erraticamente, reagindo-se às contingências das conjunturas interna e externa, particularmente em dois momentos cruciais: a crise, em 2005, do chamado "mensalão", que demonstrou ao governo a necessidade de ampliar a sua base de sustentação congressual, levando o governo à incorporação do PMDB; e a crise, em fins de 2008, do sistema financeiro mundial.

As respostas aos duros desafios que se apresentaram nessas oportunidades, a primeira delas admitindo a possibilidade de um impeachment, a segunda, pondo em risco a economia do país, acabaram por se traduzirem em um sistema de orientação política não escrito, implicando em uma reinterpretação, em chave positiva, da história brasileira, em especial com a valorização do papel do seu Estado.

O cerne desse sistema de orientação está no seu caráter pluriclassista e pluripartidário, reafirmado sem equívocos na campanha da candidata situacionista, em seu objetivo de consolidar e aprofundar a experiência do capitalismo brasileiro, tendo em vista inclusive a ultrapassagem dos seus limites nacionais, para o que conta com o Estado e suas agências produtivas e financeiras como instrumentos estratégicos. Dele igualmente fazem parte políticas destinadas à inclusão social de setores marginalizados, na forma dos programas de assistência social em curso.

O lulismo é isso e mais as habilidades de comunicação do seu inventor, especialmente na sua relação compadecida com as massas mais pobres da população. Reinterpreta, pois, a história do país, ao se por em linha de continuidade com ciclos afirmativos da modernização brasileira, como os de Vargas, o do JK e o do regime militar, contrapondo-se à versão do PT, que, desde as suas mais remotas origens, foi refratária a políticas centradas na questão nacional e em estratégias de modernização "pelo alto".

Não há motivo para espanto com o diagnóstico de que, em um eventual governo Dilma, se assim o quiserem as urnas, poderão ocorrer fortes tensões entre o lulismo e o PT - certamente com sua nova representação congressual bem mais encorpada -, que não conhecerão mais a arbitragem de Lula detendo os poderes de chefe de Estado. No caso, é de se esperar que as intervenções escoradas no carisma cedam lugar à política, inclusive porque Dilma, intocada por esse sortilégio, deverá governar com a aliança que suporta sua candidatura - é falso dizer, não se perde por esperar, que seus aliados não tenham ideias, apenas interesses -, e o PMDB, como já se sabe, se não compuser a maior bancada nas duas casas congressuais, ficará bem perto disso.

Por onde se devassa o horizonte, os sinais são os da volta da política. Os caminhos de hoje, filhos da contingência, saberão encontrar justificação no terreno aberto da batalha das ideias? Haverá intelectuais entre nós capazes de defender persuasivamente, para além dos sussurros de hoje, uma via de "nacionalismo revolucionário" em aliança com a burguesia, y compris o agronegócio? A esquerda está pronta a se reencontrar com os caminhos da democracia como valor universal, que já encontrou abrigo até em setores do próprio PT? De qualquer forma, o tempo é novo e próprio à navegação, mesmo que se saiba, de ciência certa, que a rota que tiver curso vai se defrontar com o carisma de Lula rondando por aí.


Luiz Werneck Vianna é professor-pesquisador do Iesp-Uerj. Ex-presidente da Anpocs, integra seu comitê institucional. Escreve às segundas-feiras

Eleições e mudanças estruturais :: José Goldemberg

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Eleições gerais, como as que serão realizadas no dia 3 de outubro, oferecem uma oportunidade para tentar melhorar o País, elegendo dirigentes mais qualificados, que se proponham de fato a melhorar as condições de vida dos brasileiros. Sob esse ponto de vista, os principais candidatos à Presidência da República, e muitos dos postulantes aos governos estaduais, têm feito um grande esforço, adequado para exaltar sua biografia, suas realizações passadas e seus planos para o futuro.

O problema é que esses planos têm pouco conteúdo quando se trata de enfrentar os problemas estruturais do País. Eles se concentram em manter ou expandir o Bolsa-Família, com seu forte conteúdo paternalista e eleitoral, melhorar os sistemas de saúde e segurança e, sobretudo, realizar obras irrigadas com recursos do Tesouro, como residências populares, trem-bala, pré-sal, reatores nucleares. Mas sem um foco claro nas imensas necessidades de melhorar o saneamento e de obras de infraestrutura, como portos, aeroportos e estradas, que permitam uma expansão real da economia. Como disse recentemente o ex-ministro Delfim Netto, essas obras, indispensáveis para os jogos da Fifa em 2014 e para a Olimpíada em 2016, não cabem nem no Orçamento da União nem no produto bruto nacional brasileiro. O que é preciso é fazer a economia crescer, e para isso é necessário solucionar os problemas estruturais do Brasil, que impedem que o País realmente se desenvolva:

Melhorar o sistema de ensino fundamental e técnico, base do avanço dos tigres asiáticos, desde a Coreia do Sul até a Índia.

Dinamizar o apoio à ciência e tecnologia e vinculá-lo ao desenvolvimento industrial, como fizeram com sucesso os Estados Unidos e o Japão.

Simplificar e racionalizar o sistema de licenciamento ambiental, sem o que as grandes obras de infraestrutura de que o País necessita não deslancharão.

A atual campanha eleitoral mal tem tocado neles.

Em relação ao sistema educacional, basta olhar o que a Inglaterra fez no século 19 para ver o que estamos fazendo de errado: introduziu o ensino fundamental de qualidade, público e obrigatório, durante um mínimo de sete anos, e uma rede de escolas técnicas para preparar os artífices da grande revolução industrial que a tornaram a maior potência mundial durante mais de 150 anos. Enquanto as grandes universidades inglesas (Oxford e Cambridge) formavam os pensadores da época, a rede de escolas técnicas e de engenharia (que nem eram consideradas parte das universidades até recentemente) formava os mestres de obras e engenheiros que construíram as ferrovias e a infraestrutura em todas as colônias do Império Britânico. O desenvolvimento da Índia, hoje a maior fonte de técnicos de computação do mundo, tem sua origem no sistema educacional que a Inglaterra implantou naquele país.

Nos Estados Unidos o caminho seguido não foi o mesmo, mas as grandes universidades, como Princeton, abrigaram não só Einstein e outros grandes cientistas, como estabeleceram íntima relação com a indústria, como fez Stanford, dando origem ao Vale do Silício e à grande revolução da informática no mundo todo.

Aqui, no Brasil, só São Paulo, com os governos Covas-Alckmin, deu ênfase ao ensino técnico, experiência que deveria ser estendida a todo o Brasil.

Isso não significa reduzir a importância da pesquisa científica pura, mas estabelecer vínculos entre ela e o desenvolvimento do País. O fato de as universidades brasileiras publicarem trabalhos científicos em grande quantidade, mas o número de novas patentes ser ínfimo, é um motivo de grande preocupação. Isso foi o que aconteceu na União Soviética, cujo sistema científico foi privilegiado por Stalin, mas se restringiu a realizações técnicas militares, contribuindo muito pouco para a modernização do país, como o próprio Gorbachev declarou na ocasião.

É essencial, por isso, manter o sistema de acesso pelo mérito às universidades, para garantir sua qualidade, e abandonar os "slogans" populistas de cotas, que, na verdade, violam os próprios fundamentos do que se entende como cidadania republicana, em que todos são iguais perante a lei. O risco de introduzir qualquer tipo de cotas é que elas podem beneficiar/prejudicar diferentes grupos sociais, dependendo da militância desses grupos. Corrigir injustiças sociais do passado pode ser feito por outros mecanismos que não afetem negativamente a qualidade do ensino e da pesquisa, os quais exigem critérios elevados de avaliação. No que se refere ao ensino fundamental, é preciso melhorar as condições de trabalho e remuneração dos professores, mas vincular essas condições ao desempenho, e não a uma reivindicação puramente sindical, como fazem alguns candidatos que se opõem, no fundo, à melhoria da qualidade da educação.

Finalmente, no que se refere aos problemas ambientais, é necessário que se reconheça que a legislação ambiental se tornou complexa demais para permitir que as grandes obras de infraestrutura de que o Brasil precisa sejam realizadas. O sistema atual, em que as promotorias ambientais e as organizações não governamentais acabaram por se transformar em órgãos que competem com os órgãos licenciadores, não é um processo salutar. A preservação do meio ambiente é um dos ingredientes essenciais de um desenvolvimento sustentável, mas não deve ser um obstáculo ao desenvolvimento, apesar de haver alguns ambientalistas que adotam essas posições. Seria muito importante que os próprios candidatos mais próximos da área ambiental fizessem propostas nesse sentido.

Enfim, a resposta aos desafios que o Brasil enfrenta vai depender dos seus recursos humanos, e esse aspecto fundamental do problema não pode ser negligenciado nas eleições de outubro.


Professor da USP, foi Ministro de Educação, Ciência e Tecnologia e Secretário de Meio Ambiente do Estado de São Paulo

Lulismo e ferida aberta:: Fernando de Barros e Silva

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

SÃO PAULO - O cientista político André Singer publicou ontem na Ilustríssima o ensaio "A História e seus Ardis: o lulismo posto à prova em 2010". Como indica o subtítulo, trata-se de uma tentativa de entender a eleição em curso a partir deste fenômeno, o lulismo. O texto funciona como adendo ao artigo que Singer publicou em 2009, na revista do Cebrap, sobre as "Raízes Sociais e Ideológicas do Lulismo".

O cerne da análise (e a sua força) está na identificação do realinhamento sociopolítico que foi gestado no primeiro mandato e veio à luz na campanha da reeleição.

Lula venceu em 2002 na esteira do desgaste do segundo governo FHC, ancorado no apoio de camadas médias historicamente associadas ao PT. Em 2006, quem elegeu Lula foi sobretudo o eleitorado de baixíssima renda, beneficiado por uma política social (Bolsa Família, crédito consignado, salário mínimo etc.) cuja eficácia até então não tinha sido bem dimensionada.

Enquanto a crise do mensalão dava combustível à ojeriza ao PT nas classes médias, o lulismo surgia nos braços do povo, em grande medida descolado do petismo. A ligação com o getulismo é evidente.

Quando, diz Singer, "um governo põe em marcha mecanismos de ascensão social como os que se deram no New Deal, e como estamos assistindo hoje, determina o andamento da política por um longo período". Nessa configuração de forças, a escandalização da campanha funciona como último suspiro de uma oposição que não consegue falar aos mais pobres, mas que encontra acolhida nas camadas intermediárias da sociedade (sobretudo entre os mais conservadores).

O lulismo sairá vitorioso das urnas, mas é uma incógnita saber como se comportará na ausência de seu criador. Ainda mais agora, após as revelações da traficância na Casa Civil envolvendo personagens diretamente ligados à candidata oficial. O caso Erenice abre uma ferida que a provável vitória de Dilma não será suficiente para cicatrizar.

Amnésia e desqualificação :: Fernando Rodrigues

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

BRASÍLIA - Há duas regras básicas seguidas por políticos, de esquerda ou de direita, abatidos por uma crise: 1) esquecimento súbito dos fatos e 2) desqualificar seus adversários e acusadores.

A cartilha vale no Brasil e no mundo. Quando Ronald Reagan teve de depor no Congresso dos EUA, nos anos 80, a respeito do escândalo Irã-Contras, sua frase mais marcante foi "I don"t recall" (eu não me lembro). Repetiu a negativa várias vezes ao ser indagado a respeito da participação de assessores da Casa Branca num esquema complexo e ilegal de venda de armas envolvendo o Irã e contrarrevolucionários anticomunistas na Nicarágua.

No anos 90, o governo Fernando Henrique Cardoso passou por apertos éticos. Um deles foi a compra de votos a favor da emenda da reeleição, em 1997. Deputados confessaram, em conversas gravadas, terem se vendido por R$ 200 mil para votarem a favor da mudança da Constituição. FHC se reelegeu em 1998. O termo chavismo ainda não existia, mas o PT acusou os tucanos de algo semelhante.

A cúpula do PSDB reagiu dizendo que os deputados eram desqualificados (todos do Acre). A Procuradoria Geral da República engavetou o caso. No Congresso, uma CPI foi abafada ao custo de dois ministérios para o PMDB (Justiça e o apetitoso Transportes).

Anos depois, Lula também não se lembrou de nada do mensalão. Vive desqualificando o acusador até hoje. Agora, Dilma Rousseff diz não se recordar de traficâncias na Casa Civil quando a pasta estava sob seu comando. Dentro do PT a crítica mais forte é sobre a origem da escumalha disposta a relatar o lobby no Planalto. "São bandidos", repetem os lulistas. Como se algum escândalo possa ocorrer só com o envolvimento de pessoas probas e acima de qualquer suspeita.

Tudo considerado, petistas e tucanos reagem de forma idêntica se flagrados fazendo o que não devem. Não sabem como são típicos.

Declaração de voto:: Ricardo Noblat

DEU EM O GLOBO

Quem soube do novo escândalo na Casa Civil? (Serra, em comício no interior de Sergipe. Poucos levantaram as mãos.)


"Vem por aqui" --- dizem-me alguns com olhos doces,
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom se eu os ouvisse
Quando me dizem: "vem por aqui"!
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos meus olhos, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali...

A minha glória é esta:
Criar desumanidade!
Não acompanhar ninguém.
-- Que eu vivo com o mesmo sem-vontade
Com que rasguei o ventre a minha mãe.

Não, não vou por aí! Só vou por onde
Me levam meus próprios passos...

Se ao que busco saber nenhum de vós responde,
Por que me repetis: "vem por aqui"?
Prefiro escorregar nos becos lamacentos,
Redemoinhar aos ventos,
Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,
A ir por aí...

Se vim ao mundo, foi
Só para desflorar florestas virgens,
E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
O mais que faço não vale nada.
Como, pois, sereis vós
Que me dareis machados, ferramentas, e coragem
Para eu derrubar os meus obstáculos?...
Corre, nas vossas veias, sangue velho dos avós,
E vós amais o que é fácil!
Eu amo o Longe e a Miragem,
Amo os abismos, as torrentes, os desertos...

Ide! Tendes estradas,
Tendes jardins, tendes canteiros,
Tendes pátrias, tendes tetos,
E tendes regras, e tratados, e filósofos, e sábios.
Eu tenho a minha Loucura!

Levanto-a, como um facho, a arder na noite escura,
E sinto espuma, e sangue, e cânticos nos lábios...

Deus e o Diabo é que me guiam, mais ninguém.
Todos tiveram pai, todos tiveram mãe,
Mas eu, que nunca principio nem acabo,
Nasci do amor que há entre Deus e o Diabo.

Ah, que ninguém me dê piedosas intenções!
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou.
É uma onda que se alevantou.
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou,
-- Sei que não vou por aí.

(Tomado emprestado de José Maria dos Reis Pereira, José Régio, poeta português do início do século passado. O nome do poema é Cântico Negro. Eu o ouvi pela primeira vez declamado por Paulo Autran em 1965.)

Olha a soberba, Dilma! Isso é lá jeito de se tratar um senador? Álvaro Dias (PSDB-PR) sugeriu que o Congresso a convidasse para falar sobre malfeitos ocorridos na Casa Civil. A senhora poderia ter calado a respeito. Ou simplesmente ter dito que o convite não passava de uma jogada eleitoral do senador o que de fato é. Mas daí a afirmar que, partindo dele, a senhora não aceitaria nem convite para cafezinho? Como imagina governar sem tomar cafezinho com aliados e adversários?

Só uma vez na história de Pernambuco, um governador foi eleito sem eleger seus dois candidatos ao Senado. Aconteceu com Miguel Arraes em 1994. Armando Monteiro Filho (PDT), que fazia parte da chapa dele, foi derrotado por Carlos Wilson (PSDB). Eduardo Campos (PSB), neto de Arraes, será reeleito governador com mais de 50 pontos de vantagem sobre Jarbas Vasconcelos (PMDB). E elegerá senador Armando Monteiro Neto (PTB). Pela primeira vez, Marco Maciel (DEM) perderá uma eleição.

Bolcheviques e gambás na carnificina dos dossiês:: Luiz Eduardo Soares

DEU EM GRAMSCI E O BRASIL

A manipulação de dossiês é uma prática repugnante e é bom que se torne alvo da repulsa coletiva. Pena que a mídia tenda a focalizar o problema apenas em campanhas eleitorais. Houve, sim, é verdade, reportagens importantes sobre manobras clandestinas, politicamente orientadas, alimentadas por dossiês fabricados ad hoc para atingir a reputação de pessoas honradas. Mas são raras essas matérias, enquanto a prática, infelizmente, é contínua. Eu mesmo fui atingido por esse tipo de arma desleal, em que o acusador esconde sua identidade e, portanto, sua motivação, evitando, assim, responder por seus atos, comprovar as acusações e responsabilizar-se pelos eventuais efeitos caluniosos. Curioso que, em meu caso, o dossiê, sua autoria e os interesses inconfessáveis escondidos pela máscara do anonimato não foram objeto de interesse por parte da mídia, salvo exceções. Pelo contrário, tomaram gato por lebre, morderam a isca e ignoraram solenemente a forma pela qual as “informações” chegaram às redações de revistas e jornais. Em poucas horas eu me tornei nepotista, ainda que ninguém tivesse parado para verificar se as acusações procediam ou não. Pois elas não procediam, como se constatou posteriormente. Mas era tarde. Estava ali, não na oposição ao governo, mas no coração mesmo do governo, a fonte dessa prática facistoide.

Interessante observar como se inverteram os valores. A mídia perdeu a oportunidade de descobrir o ovo da serpente instalado no centro do poder, porque preferiu os fogos de artifício do escândalo. E o partido no poder, o PT, ao qual eu pertencia, em vez de tratar o episódio com dignidade, compostura, decência e um mínimo de respeito pelo acusado — cuja longa trajetória cidadã e profissional era conhecida e respeitada — optou por desqualificar a vítima do dossiê calunioso e covarde — nesse caso, eu.

Como se deu a desqualificação? Pela manhã, ao telefone, eu disse ao então presidente do PT, Genoíno, que não era necessário que ele me defendesse, porque disso eu mesmo trataria, mas que ele tinha o dever de afirmar, publicamente, que o partido não aceitava o uso de dossiês apócrifos como meio de ação política e que, portanto, se viesse a ficar provado que os autores eram militantes do PT, eles seriam punidos nos termos determinados pelas normas internas.

Algumas horas depois, o deputado Genoíno, que eu e boa parte do país aprendêramos a admirar, deu uma entrevista coletiva em que me chamou de “gambá”, porque espalhava mau-cheiro para ocultar-me. Solicitei minha imediata desfiliação. Ao cargo eu já havia renunciado. Seguiram-se quase dois anos de perseguição stalinista, durante os quais meu nome foi incluído no index governamental. Governos que me convidaram a atuar como consultor foram informados de que não receberiam verbas federais para projetos na área de segurança se eu fosse contratado. Um querido amigo, que ainda mantinha boas relações com Genoíno, foi procurá-lo, em Brasília, para esclarecer a situação e, quem sabe, separar disputas, divergências e até atritos pessoais, de políticas de Estado, como o repasse de recursos. A resposta que colheu foi curta e grossa: se meu amigo quisesse trabalhar na área, que se afastasse de mim. Eu não era um gambá, mas, pela manobra stalinista, fui transformado no bicho pestilento.

Como é que o quadro mudou? Quando mandei recados pela mídia de que estava disposto a contar minha história, publicamente, sem poupar personagens e práticas contra as quais sempre me batera, mas que terminaram por me derrotar. Somente recuaram do cerco que impuseram a meu nome quando perceberam que eu não me deixaria acuar e que teria energia e coragem política para sair das cordas e partir para o ataque. Por justiça, registro minha gratidão a Tarso Genro e Lindberg Farias, que se recusaram a jogar o jogo da estigmatização e não se furtaram a estabelecer parcerias e valorizar minha contribuição.

Por isso, digo aos amigos: o uso de dossiês é uma peste muito mais comum e corrosiva da democracia do que as escaramuças eleitorais sugerem. A direita sempre trabalhou com essa arma antidemocrática. Mas a esquerda que chegou ao poder adotou essa repulsiva tradição como se fosse uma herança bendita. No fundo, isso mostra que os velhos sonhos de uma sociedade regida pelo respeito aos direitos humanos foram para o espaço, nos setores comprometidos com a esquerda autoritária. Nesse espaço, triunfou o utilitarismo mais rastaquera, segundo o qual os fins justificam os meios. Os arautos dessa esquerda não dizem, mas pensam: às favas com os escrúpulos burgueses; às favas com o moralismo pequeno-burguês; às favas com as normas institucionais. A vitória tudo justifica, tudo redime. Pisemos o pescoço do companheiro da véspera. Exponhamos o aliado ao ultraje e ao linchamento público. Assassinemos reputações. O poder estenderá sobre o passado o manto do oblívio. Ao indivíduo, cujo único poder é a dignidade de sua biografia, resta prestar seu pequeno testemunho para que os netos não lhe cobrem a omissão.


Luiz Eduardo Soares é professor da Uerj e ex-secretário nacional de Segurança Pública. É autor, entre outros, de Tropa de elite.

Sob o espesso manto da fantasia... :: José Israel Vargas

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Nosso "oráculo maior" tem repetidamente anunciado para breve os "amanhãs que cantam" como verdade absoluta. Diferentemente de seu homólogo délfico, ocupa-se também do passado, para ele, sempre maldito. Há pouco anunciou, com a ênfase que lhe é peculiar, nossa marcha batida rumo ao Primeiro Mundo para alcançarmos a 4.ª posição entre as economias mais avançadas.

Objetivo extremamente louvável, mas não se podem ignorar os inúmeros obstáculos a vencer e que não se rendem a mero falatório peripatético em palcos eleitoreiros.

Proclamou também como "o maior da humanidade" o investimento da Petrobrás no pré-sal; diante disso, são pífios investimentos como os da Nasa, entre outros muitos.

Admitindo o crescimento anual alegado de 7% dos PIBs do Brasil e da China, em relação a 2009, em 2010, adotando-se as taxas de 1% para EUA, Japão, Alemanha, França e Itália, de 4% para a Índia e 3% para a Rússia, pode-se fazer um exercício que mostra que o País ocuparia o 5.º lugar. Adotada, porém, a taxa histórica de nosso crescimento (média anual de 4% durante o regime republicano), o Brasil se colocaria, em 2020, no 5.º ou 6.º lugar, com PIB de US$ 3,141 trilhões. O rendimento per capita para a população, que então alcançará 207 milhões de habitantes (IBGE), ainda nos colocaria abaixo do 50.º lugar. Os objetivos mencionados seriam dificilmente atingidos, a menos que continuemos quase exclusivamente crescentes exportadores de matérias-primas e permaneça congelado em 1% o crescimento dos demais.

Somente a observação e a manipulação, direta ou indireta, da natureza permite conhecer seu comportamento e torna possíveis os imensos benefícios hoje desfrutados. A divisão do trabalho revelou que o desenvolvimento implica mobilização dos fatores de produção: capital, recursos naturais e trabalho - este, sobretudo, na forma de "capital humano". Nossa resposta às aspirações indeclináveis de conforto crescente, saúde, segurança e acesso aos bens culturais foi bem modesta até hoje, comparada, por exemplo, com países que emergiram das imensas destruições do último conflito mundial. Assim, a porcentagem de analfabetos em nosso país alcançava 50% em 1950 e hoje, segundo dados do IBGE, ainda temos 20% de analfabetos funcionais, além de 9,8% de adultos iletrados.

Ao longo de nossa vida republicana partimos de diminuta base de acumulação de capital, decorrente de nosso passado colonial, para finalmente desfrutarmos crescimento do nosso PIB de 4% anuais médios. Valor respeitável, devido a vantagens competitivas dos abundantes recursos naturais e populacionais. Na atual administração, esse crescimento tem sido em média de 4,3% anuais, colocando-a na 21.ª posição, comparada com administrações republicanas passadas. Não cabe, pois, o bordão de presumida "herança maldita"... A menos de também incluir-se nela. A despeito disso, nosso poder de compra por habitante nos situa hoje na 75.ª posição!

Apesar do progresso já realizado, mesmo que tardio, a situação da educação é ainda dramática. Segundo o Academic Ranking of World Universities (2010), a mais prestigiosa de nossas universidades, a USP, foi classificada entre o 101.º e o 150.º lugares, entre as principais instituições de todo o mundo. As cinco outras universidades de melhor classificação interna estão listadas entre a 201.ª e a 400.ª posições, em ordem decrescente.

O ensino fundamental e médio não desfruta melhor situação, segundo O Estado de S. Paulo, com base na avaliação internacional de desempenho de estudantes de 15 anos promovida em 2006 pela OCDE. Participaram 57 países, entre os quais o Brasil. As notas foram atribuídas em seis níveis de desempenho, 1 a 6. Dos alunos brasileiros participantes, 27,9% tiveram notas inferiores a 1, 71,6% alcançaram notas 1 a 4, só 0,5% atingiu nota 5 e nenhum alcançou a nota máxima, 6.

Nos países da OCDE, 56,7% dos estudantes tiveram desempenho acima da média de 500 pontos. No Brasil, apenas 15,2% dos estudantes conseguiram esse resultado, isto é, 84,8% ficaram abaixo da média!

O desenvolvimento pressupõe a capacidade de inovar, gerar e/ou apropriar-se de novas tecnologias, frutos da ciência e da engenharia, logo, da educação, cujo panorama, como se viu acima, é desolador. Não é, pois, surpresa que esse mal também ocorra na inovação, medida em geral pelo número de patentes concedidas. Recente publicação da Organização Mundial da Propriedade Intelectual lança preocupante luz sobre o nosso quadro. O Brasil colocou-se na 33.ª posição, em 2006, quanto ao número de patentes registradas por unidade do PIB, expresso em bilhões de dólares. E é o 23.º em relação ao número de patentes por despesa com investimento em ciência e tecnologia (ano de 2007), na mesma unidade. No Brasil, 90,5% das patentes aqui concedidas provêm do exterior (não residentes),

colocando-nos em 13.º lugar entre os países em desenvolvimento. Tais fatos estão seguramente vinculados à baixa participação do setor produtivo nos gastos nacionais com pesquisa e desenvolvimento (P&D), de apenas 6% em 1990, que evoluíram para 30% em 1998 e atingiram hoje cerca de 34%. Nos países industrializados e em alguns emergentes, de mercado aberto, as empresas chegam a despender 60% dos gastos com P&D.

Para superar nosso atraso torna-se indispensável: 1) Melhorar radicalmente o ensino básico, incluindo salário digno para seus professores; 2) aumentar a participação de P&D de 1,4% para 2%, pelo menos; 3) investir na formação de nossos engenheiros - segundo dados em entrevista à CBN, ingressam anualmente nas escolas de engenharia 130 mil alunos e se formam a cada ano apenas 30 mil, dos quais cerca de 20 mil teriam formação insuficiente; 4) reclassificar, por mérito, instituições universitárias, pela abolição do Regime Jurídico Único, que enquadra seus servidores.

Eis um programa mínimo de trabalho para que o próximo presidente comece a romper o espesso manto da fantasia!

Foi Ministro da Ciência e Tecnologia
(Artigo publicado em 18/9/2010)

Paranoia???? :: Graziela Melo

Em meus momentos de sonhos sinistros, paranoicos, maquiavélicos, não vejo fantasmas, almas do outro mundo. Não! Vejo almas verdadeiras, deste mundo mesmo. Aquelas do outro mundo, estão fugindo do inferno. Estas, as verdadeiras estão querendo nos levar ao inferno.

Os pronunciamentos de Lula e do Dirceu, com relação ao futuro da imprensa, da mídia, não nos permite ficar em dúvida quanto o que pode vir por aí, diante da possibilidade de a Dilma ganhar a eleição.

E, ao que tudo indica, isto pode realmente acontecer, sim, não obstante todos os escândalos que giram sempre em torno da grana, do enriquecimento pessoal das figuras que compõem a cúpula do mando petista em Brasília, a população continua apoiando Lula e disposta a eleger a Dilma.

Diante de tudo isso, o que pode vir por aí, o tal Decreto dos Direitos Humanos, passa ser um obscuro "pintinho" sem qualquer importância.

Assim, fico apreensiva e preocupada.
Graziela Melo é poetisa

A indústria brasileira nos próximos anos:: Luiz Carlos Mendonça de Barros

DEU NO VALOR ECONÔMICO

O processo de abertura tem sido muito positivo tanto do ponto de vista macro como na vida dos consumidores

Em 2007 o Valor publicou um artigo escrito por mim e pelos economistas Paulo Miguel e José Roberto Mendonça de Barros, sobre a influência da China na indústria brasileira. Chamava-se "China - Um dragão de três cabeças."

A imagem que construímos - a China como um poderoso dragão de três cabeças - ainda não tinha assumido os contornos claros que podemos observar hoje. Era preciso um exercício de futurologia para entender como se daria a interação das duas economias. Hoje, quase três anos depois, as coisas estão muito mais claras para o analista.

Dizíamos então que uma das cabeças do dragão chinês - aquela que engolia quantidades fantásticas de produtos primários - seria responsável por uma expansão muito forte de nossas exportações. Uma das formas de medir os efeitos dessa primeira cabeça é pela evolução dos chamados termos de troca de nosso comércio exterior. Em 2000 cada US$ 100 de exportação brasileira comprava US$ 90 de produtos importados; agora, em 2010, os mesmos US$ 100 exportados compram US$ 120 de importação.

O aumento de nossas exportações fez com que o Brasil apresentasse saldos comerciais crescentes e, a partir de 2006, se transformasse em um país credor internacionalmente (reservas maiores do que a dívida externa total). Dizíamos que, com essa nova realidade externa, a economia brasileira começaria a viver um processo de abertura importante, com as importações de bens finais e intermediários crescendo de forma sistêmica.

A partir do momento que os canais de importação e distribuição se estruturassem as importações de bens industriais finais e de componentes cresceriam rapidamente pelo simples movimento de arejamento de uma economia ainda muito fechada. Esse movimento sempre gera um aumento da eficiência produtiva, pois as empresas nacionais são obrigadas a se modernizar para conseguir competir com as importações.

O que surpreende hoje são a rapidez e a intensidade com que isso ocorreu. O comportamento do preço do aço é didático nesse sentido: por décadas, sem a concorrência das importações, o preço do aço brasileiro sempre foi negociado com um ágio - de 20% a 30% - sobre os preços internacionais. Hoje essa diferença não ultrapassa 10%, valor compatível com os custos de logística para trazer esse produto do exterior. O mesmo vem ocorrendo com os preços de vários bens de consumo, principalmente os automóveis. Como sempre acontece no Brasil, os agentes econômicos reconheceram rapidamente as oportunidades abertas pela confiança na nossa moeda e pela intensa disponibilidade de produtos em um mundo desenvolvido em recessão.

Neste período - 2006 até os dias de hoje - o processo de abertura tem sido muito positivo tanto do ponto de vista macro como na vida dos consumidores brasileiros. No nível macro dois aspectos precisam ser ressaltados: a criação de outro canal de oferta de bens industriais e a diminuição do poder de controle de preços de setores importantes nas cadeias produtivas. Ambos vêm funcionando como instrumentos auxiliares no controle da inflação por parte do Banco Central e no aumento sistêmico da eficiência de nosso aparelho produtivo. No nível micro, o resultado mais importante do processo de abertura é certamente o aumento da oferta de bens de melhor qualidade e preços ao consumidor brasileiro.

Mas temo que a penetração das importações em nosso mercado esteja agora entrando em uma fase menos positiva. Com os canais de importação consolidados e com os agentes econômicos no Brasil já acostumados a olhar para o exterior, a queda da competitividade do aparelho produtivo, por aumento de custos internos, passa a afetar mesmo as empresas que são competitivas e eficientes. E se olharmos para frente o cenário não é nada animador.

De um lado está o imobilismo do governo no sentido de incorporar à sua agenda de prioridades a questão da competitividade. Isto fica ainda mais grave com o aumento da presença do Estado em áreas importantes e a baixa eficiência dos órgãos públicos responsáveis pela regulação e controle de setores ligados à logística. Do outro está o aparecimento de gargalos de oferta que até hoje não existiam. O mais importante deles é o mercado de trabalho com a escassez de mão de obra especializada começando a criar aumentos salariais muito superiores ao de outras economias com as quais competimos. Essa pressão de custo é ainda mais grave na medida em que o real forte leva a um aumento ainda maior quando os salários são medidos em dólares.

Se esse cenário não for revertido, vamos começar a perder segmentos produtivos, principalmente na indústria, que ainda são competitivos quando isolamos esses fatores externos às empresas. E a chamada desindustrialização deixará de ser um fenômeno de correção de desequilíbrios estruturais criados por uma economia muito fechada e passará a refletir a destruição de partes eficientes de nosso aparelho produtivo. Também nessas condições deixaremos de nos aproveitar da terceira cabeça do dragão chinês, aquela que importa bens industriais de valor intermediário.


Luiz Carlos Mendonça de Barros, engenheiro e economista, é diretor-estrategista da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações. Escreve mensalmente às segundas.

Denúncia de favorecimento na Casa Civil derruba diretor dos Correios

DEU EM O GLOBO

Nomeado por Erenice Guerra, coronel é suspeito de beneficiar empresa aérea

As denúncias de tráfico de influência a partir da Casa Civil derrubaram o quarto integrante do governo: o diretor de Operações dos Correios, coronel Eduardo Artur Rodrigues. Nomeado pela ex-ministra Erenice Guerra, sucessora de Dilma Rousseff, ele é suspeito de usar o posto para defender interesses da empresa aérea cargueira MTA e atuar como testa de ferro de um grupo estrangeiro. O coronel nega. Duas empresas ligadas ao marido de Erenice, a Mafra e a Unicel, teriam sido beneficiadas no governo. Para José Serra, ou Dilma sabia do esquema na Casa Civil ou não sabe administrar. A petista disse que não irá ao Senado dar esclarecimentos sobre as últimas denúncias.

A quarta peça a cair

Denúncias de favorecimento envolvendo Casa Civil derrubam agora diretor dos Correios

Martha Beck, Geralda Doca, Roberto Maltchik e Jailton de Carvalho

BRASÍLIA - O escândalo político envolvendo uma rede de corrupção operada na Casa Civil e nos Correios derrubou mais um integrante do governo. Depois de Erenice Guerra e de dois assessores palacianos, o diretor de Operações dos Correios, coronel Eduardo Artur Rodrigues, é o quarto personagem que cai. Sua carta de demissão será entregue hoje às 10h ao presidente da estatal, David José de Matos. Novamente, a queda é resultado da mistura de negócios pessoais e empresariais com a função pública.

Rodrigues é suspeito de defender interesses da empresa de transporte de cargas Master Top Airlines (MTA) junto ao governo. Segundo reportagem publicada no jornal O Estado de S. Paulo, o diretor nomeado pela ex-ministra da Casa Civil Erenice Guerra em agosto deste ano faria parte de um grupo que tem empresas de fachada no Uruguai, nos Estados Unidos e no Brasil, e atua para transformar a MTA numa empresa pública de carga aérea que o governo pretenderia criar após as eleições.

Rodrigues ficou desgastado devido à ligação com a MTA, pois era sócio da Martel, empresa de consultoria aeronáutica que acertou a documentação que permitiu a criação da MTA.

Ele diz que se desligou quando foi para os Correios e que não vai à sede da companhia desde dezembro: Estou saindo porque minha família está exposta e não aguento mais. Estou há 46 dias levando porrada.

Dinheiro do exterior para a MTA

Rodrigues admitiu que conhece o empresário Alfonso Conrado Rey, apontado como sócio majoritário da MTA, mas nega ser seu testa de ferro.

Rey estaria por trás do esquema para irrigar com dinheiro estrangeiro o funcionamento da MTA no Brasil. A legislação brasileira impede que qualquer empresa do ramo opere com menos de 80% de capital nacional.

Alfonso Rey é dono de uma empresa americana regularizada, a Centurion.

Essa é a informação oficial que tenho. Ele é dono de uma empresa americana. Pelo que eu conheço, não existe o nome de Alfonso Rey nos documentos da MTA. Volto a repetir: pergunte à empresa. Não vou lá há oito meses diz Rodrigues.

Procurados, os sócios da MTA não foram encontrados. Sobre a relação com a Capital, empresa de consultoria tocada pelos filhos de Erenice, e que foi prestadora de serviços à MTA, o coronel afirmou que não conhece seus donos. A Capital recebeu dinheiro para viabilizar a renovação da licença da MTA na Agência Nacional da Aviação Civil (Anac). Após essa renovação, a MTA fechou contrato sem licitação com os Correios.

O presidente dos Correios, David José de Matos, afirmou que a decisão do diretor é pessoal e que, na estatal, não há indício de que ele tenha praticado irregularidade. Segundo Matos, os Correios têm documentos que comprovam que todos os contratos com a MTA são regulares: Ele me disse que está saindo porque está desgastado. Que só queria ajudar e não fez nada de errado.

Foi decisão pessoal disse Matos.

Nos últimos cinco anos, dirigentes da estatal foram alvo da Polícia Federal e do Ministério Público. Em 2005, o ex-chefe do Departamento de Compras Maurício Marinho foi flagrado recebendo R$ 3 mil de propina. irritado com a armadilha preparada contra Marinho, seu afilhado político, o ex-deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) denunciou o mensalão, maior escândalo do governo Lula.

CORONEL RODRIGUES:'Contratos foram fechados antes de eu chegar'

DEU EM O GLOBO

O diretor de Operações dos Correios deixa o cargo dizendo que entrou numa fria ao aceitar a função. Negou operar para facilitar os negócios da MTA

O GLOBO: O senhor é testa de ferro da MTA?

EDUARDO ARTUR RODRIGUES: Claro que não! Não sou testa de ferro. Fui consultor da MTA. Nunca fui testa de ferro, se fosse, a empresa estava no meu nome, não no de outra pessoa.

Mas a ligação com a MTA não era incompatível com o cargo nos Correios?

RODRIGUES: Todo mundo diz que era incompatível, por isso vou pedir demissão, mas eu não achava que era incompatível. Eu não quero mais saber desse troço, bye-bye. Não quero mais!

O senhor favoreceu a MTA?

RODRIGUES: Eu estou lá há 46 dias. Vou favorecer no quê? Os contratos com a empresa foram fechados antes de eu chegar aos Correios. Isso é brincadeira! A MTA foi concebida dentro da lei. Ou a Anac não teria autorizado.

A sociedade foi alterada

RODRIGUES: A lei determina que 80% do capital da empresa sejam brasileiros. O vice-presidente é brasileiro. Eles estão dentro da lei. É o que eu sei.

É complicado trabalhar no governo?

RODRIGUES: Se eu soubesse, não teria botado o meu pé lá. Achei que isso era a coroação da minha carreira. Entrei numa fria. Nunca mais! (R.M.)

Caetano acusa Lula de 'golpismo'

DEU EM O GLOBO

Eleitor de Marina, compositor também diz que Serra é "burro"

SALVADOR. O compositor Caetano Veloso classificou como golpismo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva dizer que é preciso extirpar o DEM da vida pública nacional. Já o candidato do PSDB, José Serra, para Caetano, é burro, por ter tentado associar seu nome ao do petista, no início do horário eleitoral.

As declarações do artista que já manifestou preferência por Marina Silva e apareceu no programa do PV pedindo votos para ela foram dadas a uma emissora de rádio em Santo Amaro, onde esteve para comemorar o aniversário de 103 anos da mãe, Dona Canô.

O povo brasileiro não pode ouvir isso (a declaração de Lula) e não reclamar. E se uma pessoa da imprensa reclamar vem um idiota dizer que a imprensa é golpista. Golpista é dizer que precisa destruir um partido político que existe legalmente. O presidente da República não tem o direito de dizer isso, criticou.

Caetano cobrou explicações sobre a quebra ilegal de sigilo fiscal na Receita, que atingiu pessoas ligadas ao PSDB e a José Serra. Mas sobrou para o próprio candidato tucano, criticado por tentar vincular sua imagem à do presidente.

Serra é um idiota que apareceu com Lula, querendo dizer que está do lado, que é igual a Lula. É burro, decretou o baiano.

Caetano disse enxergar risco de um populismo perigoso em torno do presidente Lula e sua candidata Dilma. É como se fosse assim uma população hipnotizada. As pessoas não estão pensando com liberdade e clareza, analisou.

Para ele, a aprovação a Lula é acrítica e remete aos anos 40 e 50, quando a América Latina teve lideranças populistas como Getulio Vargas no Brasil e Juan Domingo Péron na Argentina: É um atraso. O Brasil não podia estar mais nessa, lamentou.

Apesar de tudo, ressalvou que admira Lula e reconhece no presidente uma figura histórica importante no Brasil.

Serra: Dilma é cúmplice ou é incapaz

DEU EM O GLOBO

Candidato do PSDB cita denúncias e critica gestão da petista na Casa Civil

Adauri Antunes Barbosa

SÃO PAULO. O candidato do PSDB à Presidência, José Serra, voltou a usar as denúncias de tráfico de influência e pagamentos de propina na Casa Civil, que levaram à queda da exministra Erenice Guerra, para atacar sua adversária, a candidata petista Dilma Rousseff.

Durante caminhada e visita a um conjunto habitacional na favela de Paraisópolis, na Zona Sul de São Paulo, Serra questionou a capacidade administrativa de Dilma.

Das duas uma: ou ela, como dirigente, não é capaz, porque se quem está em cima não sabe de um esquema que dura quatro ou cinco, seis, sete anos então não tem capacidade de dirigir; ou, então, era cúmplice. Não há uma terceira hipótese afirmou Serra, em entrevista coletiva.

Tucano faz campanha em favela de São Paulo Acompanhado pelo candidato do PSDB ao governo estadual, Geraldo Alckmin, e pelo prefeito da capital, Gilberto Kassab (DEM), Serra visitou o conjunto habitacional Nova Paraisópolis, inaugurado há 19 dias pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a quem criticou por querer se apropriar de uma obra que seria uma realização de sua gestão.

Mas isso eles fazem com tudo. É um conjunto habitacional nosso que eles vieram inaugurar disse, ao comentar a paternidade da obra.

Remetendo a suas gestões como prefeito e governador de São Paulo, Serra afirmou que a participação do governo federal em Paraisópolis é próxima a zero: Nós fizemos tudo aqui em Paraisópolis. É normal que você venha ou vá a qualquer outro lugar onde você faz muita coisa... Aqui, em matéria de governo federal, é próximo a zero criticou.

Perguntado se ainda considera possível reverter os resultados das pesquisas de intenção de voto, que apontam a vitória da candidata petista à Presidência já no primeiro turno, o tucano respondeu que não há o que reverter.

Não há o que reverter. A partida é para ser jogada em 3 de outubro, não é um campeonato disse.

Logo que chegou a Paraisópolis o ponto de encontro era a Padaria Sorocaba, na qual um cartaz petista estampava fotografias dos candidatos Cândido Vaccarezza, à reeleição como deputado federal, e Dilma Rousseff, ao lado de Lula , José Serra falou sobre sua proposta para a urbanização de favelas.

A solução para comunidades mais pobres do Brasil é transformá-las em bairros, que foi o que fizemos aqui.

Quando eu entrei na prefeitura, havia quatro escolas, sendo duas de lata. Hoje são 14 escolas e uma escola técnica garantiu.

Ainda na favela, que fica ao lado do Morumbi, bairro nobre da Zona Oeste de São Paulo, Serra parou para jogar sinuca em um boteco. Depois de algumas tacadas com Alckmin, parou de jogar assim que encaçapou uma bola. Serra caminhou pelas vielas do local por mais de duas horas na tarde fria do domingo, conversando com eleitores.

Dilma diz que não irá ao Congresso dar explicações

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
Dilma: ''Convite do Alvaro Dias, nem para cafezinho''

A candidata do PT à Presidência, Dilma Rousseff, afirmou que não aceitará o convite do senador Álvaro Dias (PSDB-PR) para falar no Congresso sobre as acusações de tráfico de influência na Casa Civil. Para ela, Dias tenta criar um factoide. Dilma disse não conhecer o advogado Vinícius Castro, pivô do escândalo.

No Facebook, uma foto da candidata petista aparece na lista de amigos de Castro.

Candidata do PT recusa convite de tucano para dar explicações no Congresso e afirma não conhecer pivô do escândalo de propinas

Vera Rosa

A candidata do PT à Presidência, Dilma Rousseff, afirmou ontem que não aceitará convite do senador Alvaro Dias (PSDB-PR) para explicar, no Congresso, acusações de tráfico de influência na Casa Civil. Dilma garantiu, ainda, que não conhece o advogado Vinícius Castro, pivô do escândalo da cobrança de propina, demitido da Casa Civil há uma semana.

Andre Dusek/AE
"Factoide". Dilma, em carreata por Agnelo Queiroz, ontem em Ceilândia: convocação "é mais uma tentativa do senador de criar um factoide"

"Convite do senador Alvaro Dias eu não aceito nem para cafezinho", devolveu a candidata do PT. "Aliás, não é um convite, é mais uma tentativa do senador de criar um factoide. Ele tenta, sistematicamente, tumultuar essas eleições."

Dias disse que apresentará hoje à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado uma representação pedindo que Dilma seja convidada a esclarecer denúncias de que há um "balcão de negócios" na Casa Civil.

Ao saber da resposta da petista, o tucano reagiu, fazendo coro com o candidato do PSDB, José Serra. "Não estamos falando de café pequeno, mas, sim, de um grande escândalo. Como alguém pode se dispor a ser presidente da República e não enxergar um propinoduto instalado a um palmo de seu nariz?", provocou Dias.

Dilma participou ontem de uma carreata em Ceilândia - maior cidade satélite do Distrito Federal - e, mais uma vez, tentou colar a sua imagem à do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Pesquisas de intenção de voto recentes mostram que ela caiu entre oito e nove pontos na região.

"Não conheço". Sem esconder a contrariedade com acusações de que há um esquema de facilitação de negócios funcionando dentro da Casa Civil, Dilma disse desconhecer o advogado Vinícius Castro. Demitido na segunda-feira, ele era assessor da Casa Civil, contratado pela então ministra Erenice Guerra no ano passado, quando Dilma ainda era titular da pasta. Erenice caiu há quatro dias, dizendo-se "traída" pelo ex-assessor.

"Eu não me sinto traída porque não nomeei esse senhor. Não o conhecia. Ele não era da minha confiança. Era da confiança dela", insistiu a candidata.

Segundo reportagem da revista Veja, Vinícius era sócio de Israel Guerra, filho de Erenice, na empresa de consultoria Capital e teria embolsado R$ 200 mil em dinheiro, dentro da Casa Civil, em junho de 2009. O dinheiro, de acordo com Veja, integrava o lote da propina paga em pacotes a servidores da Casa Civil como agradecimento à compra adicional do medicamento Tamiflu, usado no tratamento da gripe suína.

Para Dilma, todo ministro ou "ex-ministro da Saúde" sabe bem que processos licitatórios dessa área "nada têm a ver com a Casa Civil". Era uma referência a José Serra, que foi ministro da Saúde de 1998 a 2002, no governo Fernando Henrique Cardoso. No sábado, Serra disse que "se Dilma sabia (da corrupção) é crime; se não sabia, não é boa administradora".

No ano passado, o Ministério da Saúde comprou sem licitação, em caráter emergencial, mais medicamentos para combater a gripe suína. Foram sete compras, que somaram cerca de R$ 400 milhões. "O Tamiflu é fornecido por um único laboratório internacional. A negociação foi feita entre o Ministério da Saúde e a direção do laboratório. O preço foi reduzido em 76% e a Casa Civil não tem qualquer vinculação com processos licitatórios da Saúde", assegurou Dilma.

Pane. De microfone em punho, na carreata ao lado do candidato do PT ao governo do Distrito Federal, Agnelo Queiroz, Dilma alfinetou a oposição e pediu apoio. "Não vamos deixar que o desespero deles (oposição) contamine a nossa campanha", gritou a petista.

O Jeep que transportava Dilma pifou com menos de 40 minutos de carreata e ela acabou indo embora mais cedo. Antes, porém, teve tempo de transmitir aos eleitores um "recado" de Lula. "O presidente disse para mim: "Dilma, você vai lá em Ceilândia. Saiba que está lá o meu povo, que é igual a mim, que veio também do Nordeste e é para esse povo que a gente tem de governar"", discursou. "É isso que vamos fazer: dar continuidade ao governo Lula."

Após denúncia, Correios anunciam demissão de diretor

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Coronel cai depois de "Estado" revelar que ele era testa de ferro em empresa aérea

A presidência dos Correios anunciou que o coronel Artur Rodrigues deixará hoje a diretoria de Operações da estatal. O Estado revelou ontem que o coronel é testa de ferro do argentino Alfonso Rey na empresa aérea MTA. Beneficiada pelo tráfico de influência do filho da ex-ministra Erenice Guerra, Israel, a MTA tem contratos de R$ 60 milhões com os Correios. Documentos comprovam que o diretor participou da montagem de uma rede de empresas de fachada criada para operar a MTA no País. O artifício foi usado para driblar a lei, que limita a 20% a participação do capital estrangeiro no setor.


Denúncia derruba diretor dos Correios

""Estado"" revelou que coronel era testa de ferro de argentino, dono da MTA; empresa é pivô de lobby que provocou demissão de Erenice

Karla Mendes

O presidente dos Correios (ECT), David José Matos, afirmou ontem ao Estado que o coronel Eduardo Artur Rodrigues Silva deixa hoje a diretoria de Operações da estatal. O diretor, que sai do cargo menos de dois meses depois de sua posse, acertou ontem que vai entregar a carta de demissão hoje ao ministro das Comunicações e ao presidente da República.

"Assim que eu receber a carta (de demissão), vou levá-la a quem de direito", disse Mattos, referindo-se ao ministro das Comunicações, José Artur Filardi. O próprio coronel confirmou, depois da reportagem publicada ontem pelo Estado, a decisão de deixar a diretoria. "Eu vou pedir demissão. A minha família está destroçada. Não aguento mais". A partir de amanhã, acrescentou, voltará a ser consultor de empresas aéreas, mercado em que atua há 15 anos. "Já falei com o presidente dos Correios que vou embora."

Na primeira reportagem sobre o caso, dia 29 de agosto, o Estado revelou conflito de interesses por trás da nomeação do coronel Artur. Ele assumiu um cargo que administra as contratações das empresas privadas que prestam serviços de transporte de carga aérea para os Correios, mesmo tendo presidido a Master Top Linhas Aéreas (MTA). A empresa tem contratos no valor de R$ 60 milhões com os Correios. Ao assumir, no dia 2 de agosto, o coronel entregou o comando da MTA à filha, Tatiana Blanco, o que deixou o diretor na condição de contratante e contratado.

Como revelou ontem o Estado, o coronel Artur é testa de ferro do empresário argentino Alfonso Conrado Rey, verdadeiro dono da MTA. Este se beneficiava do tráfico de influência feito em seu favor por Israel Guerra, filho da ex-ministra da Casa Civil, Erenice Guerra. Quando a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) suspendeu a licença de voo da MTA, foi Israel quem conseguiu, numa operação que juntou tráfico de influência e cobrança de propina - como revelou a Veja da semana passada - a certificação da transportadora.

Ex-coronel da Aeronáutica, Artur faz parte de um grupo de executivos e advogados que tem uma rede de empresas de fachada espalhadas por Uruguai, EUA e Brasil. Eles movimentam dinheiro para um casal de laranjas brasileiros, como provam documentos do Banco Central.

Pulo maior. Os documentos mostram também que o grupo trabalha para fazer da MTA o embrião da empresa de logística e carga aérea que o governo Lula promete criar após as eleições, um negócio de cerca de R$ 400 milhões.

Os documentos mostram ainda que o coronel Artur se envolveu pessoalmente no esquema montado para viabilizar a MTA no Brasil com recursos externos e driblar a legislação, que é clara: o capital estrangeiro não pode superar 20% em empresas aéreas. Por isso, foi criada, de 2005 para cá, a rede com pelo menos seis empresas de fachada com sede em apenas dois endereços: em Campinas e em Montevidéu, no Uruguai. Em outra ponta, sustentam o esquema empresas com sede nos EUA, ligadas a Rey. Atualmente, a MTA é dirigida no Brasil pelo peruano Orestes Romero.

Mas no papel os ex-sogros da filha do coronel, Tatiana Silva Blanco, são os donos, na condição de "laranjas".

Ao Estado, o coronel desabafou: "Eu tenho 61 anos e estou saindo frustrado, por não poder passar meus conhecimentos para a empresa. Tudo que eu queria era consertar a rede postal noturna, sei que posso deslanchar o departamento de logística (da estatal)". Disse que seria "a primeira vez" que um aviador chegaria à direção da empresa.

"Eu poderia mudar a rede postal noturna, mas perdi a vontade. Não quero mais ir lá", disse, ao fim de seus 48 dias na estatal. O presidente da ECT antecipou que não iria tentar impedir a saída do coronel Artur. "Pedir para quê? Não vale a pena. Não adianta dizer a verdade (para a imprensa)", afirmou David Matos. "Vou chamar os dois para virem ao ministério nesta segunda, para conversar", disse Filardi.

"Família destroçada". O coronel observou que não está se desligando da empresa "com medo de A, B ou C" ou em função das denúncias. "Se a minha família não estivesse destroçada emocionalmente, eu ia continuar lá. Não fiz nada de errado." Trazendo à memória o caso da Escola de Base, em São Paulo, o coronel prosseguiu: "Vocês acabaram com a minha vida. Não durmo direito e, quando falo com a minha mulher e minha filha, os olhos delas se enchem de água. Não aguento mais."

Ele admitiu conhecer o empresário Alfonso Conrado Rey, mas negou que seja seu "testa de ferro" na MTA. "Nunca fui dono, nem presidente, nem sócio da MTA. Me mostre qualquer documento que prove isso. Estou pronto para responder qualquer investigação". Ele negou ainda que tenha sido convidado por indicação de Roberto Teixeira, compadre do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A indicação, garante, partiu do senador Leomar Quintanilha (PMDB-TO). Leomar nega essa informação.

PONTOS-CHAVE
Nomeação
No dia 2 de agosto deste ano, o coronel Eduardo Artur Rodrigues assumiu a diretoria de Operações do Correios, numa "reformulação administrativa" comandada por Erenice Guerra

"Direto da Fonte"
Na mesma semana, a colunista do "Estado" Sonia Racy revelou a influência do coronel para viabilizar a constituição da empresa cargueira Master Top Linhas Aéreas (MTA)

Laranjas
A MTA foi registrada em nome de Anna Rosa Pepe Blanco Craddock e Jorge Augusto Dale Craddock, mas o verdadeiro dono é o empresário argentino Alfonso Conrado Rey

Esquema
Ontem, o "Estado" revelou que o coronel é testa de ferro de Alfonso e faz parte de um grupo de executivos que tem uma rede de empresas de fachada espalhadas pelo Uruguai, Brasil e EUA

Funcionário da Casa Civil foi sócio do marido de ex-ministra

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

O funcionário da Casa Civil Paulo de Tarso Viana foi sócio do marido de Erenice Guerra, José Roberto Campos, em consultoria de negócios quando já trabalhava na pasta, relatam Fernanda Odilla e Matheus Leitão.

Servidores públicos não podem gerir empresas privadas. Viana e Campos não foram localizados.


Funcionário da Casa Civil foi sócio de marido de Erenice

Servidor Paulo de Tarso Pereira Viana era administrador da Global Energy

Lei proíbe funcionários públicos de atuarem na gerência de empresas privadas; firma era para "intermediar serviços"

Fernanda Odilla e Matheus Leitão


DE BRASÍLIA - O funcionário da Casa Civil Paulo de Tarso Pereira Viana se tornou sócio do marido de Erenice Guerra em uma empresa de consultoria no período em que trabalhava com a ex-ministra. Erenice deixou o cargo na quinta-feira após denúncias de tráfico de influência no governo federal.

A empresa Global Energy Investments foi criada em setembro de 2009, em nome de José Roberto Camargo Campos, marido de Erenice, e de Pereira Viana.

Tanto o marido de Erenice como o servidor da Casa Civil aparecem como sócios administradores da empresa, com participação societária de R$ 500 cada um, na Junta Comercial de São Paulo.

Servidor público é proibido por lei de "participar de gerência ou administração de sociedade privada".

De acordo com registro na Junta Comercial, o objetivo da Global Energy era promover "atividades de intermediação e agenciamento de serviços e negócios em geral, exceto imobiliários".

Cinco meses antes de abrir a empresa, o funcionário havia sido cedido pela Caixa Econômica Federal para trabalhar na Secretaria Executiva da Casa Civil. À época, Erenice era a secretária-executiva e a candidata à Presidência Dilma Rousseff (PT) comandava a pasta.

Com sede numa sala no centro de Santo Antônio de Posse (SP), a Global Energy Investments foi criada para, além de intermediar e agenciar negócios, servir de "holding de instituições não-financeiras", ou seja, controlar um grupo de empresas.

Em julho deste ano, Pereira Viana deixou oficialmente a sociedade. Em seu lugar, entrou Henrique Nardi Campos, que já é sócio do marido de Erenice em outro empreendimento, a Cast Consultoria, também com sede no interior paulista.

A Folha ligou cinco vezes para a casa de Pereira Viana, deixou recado na secretária eletrônica e não obteve resposta. A mãe dele, Lenira, afirmou à Folha que ele "com certeza não tinha nada acrescentar e a declarar". Segundo Lenira, Pereira Viana saiu da Casa Civil "há muito tempo, em maio de 2010".

Não há, contudo, registros no "Diário Oficial" da União do retorno de Pereira Viana à CEF. O nome dele aparece numa portaria do Ministério da Fazenda, com data de 30 de abril deste ano, que prorroga por prazo indeterminado as cessões de empregados da CEF a órgãos públicos.

A Folha não localizou Camargo Campos, que tem negócios também no Distrito Federal. Ele é dono de uma empresa de mineração com sede em Brasília, em parceria com outros dois sócios, entre eles um gerente da Eletronorte que foi colega de Erenice no sindicato do setor elétrico no DF, nos anos 80.

O marido de Erenice é ligado também à Unicel, empresa de telefonia que fez testes de uma rede de telecomunicações no Ministério da Defesa e na Presidência da República e, três anos depois, ganhou atestado de capacidade técnica inédito da Diretoria de Telecomunicações da Presidência.

Amigos do filho da ex-ministra também ganharam cargos na Casa Civil. Israel Guerra, Stevan Kanezevic, Vinícius Castro e Marcelo Moreto trabalharam na Anac (Agência Nacional de Aviação Civil). Depois, os três amigos do filho de Erenice foram nomeados para cargos na Casa Civil, sob Dilma.

Castro e Stevan deixaram os cargos na semana passada, após acusações de que usavam a empresa Capital Consultoria para intermediar negócios com o governo.

Ataques de Lula à imprensa provocam reação

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Para OAB, o ataque de Lula à imprensa "é um desserviço à Constituição e ao Brasil". ANJ e Abert também refutaram a fala do presidente. No sábado, ele afirmara que iria "derrotar" jornais e revistas, que se comportam como partido político.

Entidades reagem a ataques de Lula

Críticas do presidente à imprensa são ""desserviço à Constituição e ao Brasil"", diz OAB; ANJ e Abert também divulgam notas contra a fala

Lucas de Abreu Maia

O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Ophir Cavalcanti, definiu ontem como "um desserviço à Constituição e ao Brasil" as críticas feitas à imprensa pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no sábado, durante comício eleitoral de sua candidata, Dilma Rousseff, em Campinas. Além da OAB, várias outras entidades de defesa da liberdade de imprensa se manifestaram contra o discurso feito pelo presidente.

Mauricio Lima/AFP
Formadores. Lula em comício: "Nós somos a opinião pública e nós mesmos nos formamos"

Segundo o presidente da OAB, a atitude de Lula "demonstra uma certa intolerância com um princípio constitucional que é vital para o fortalecimento da democracia: a liberdade de expressão". E prosseguiu: "Quando o líder maior da nação se coloca contra a liberdade de imprensa, isso é um desserviço à Constituição e ao Brasil".

Lula havia dito, no comício, que alguns jornais e revistas se comportam como partido político.
"Outra vez nós vamos derrotar nossos adversários tucanos, vamos derrotar alguns jornais e revistas que se comportam como se fossem um partido político", declarou. Irritado com recentes reportagens a respeito de tráfico de influência e irregularidades praticadas por funcionários ligados à Casa Civil, o presidente foi adiante: "Essa gente (imprensa e tucanos) não me tolera." As reportagens, segundo ele, são intolerância, ódio e mentira. "Existe uma revista que não lembro o nome dela (sic). Ela destila ódio e mentira."

Na avaliação de Lula, "eles não se conformam que o pobre não aceita mais o tal do formador de opinião pública". E definiu: "Nós somos a opinião pública e nós mesmos nos formamos". Em seu entender, "se o dono do jornal lesse seu jornal ou o dono da revista lesse sua revista, eles ficariam com vergonha do que estão escrevendo."

Para Cavalcante, porém, "a imprensa brasileira vem formulando denúncias a partir de fatos". Trata-se de "denúncias sérias, denúncias que precisam efetivamente de apuração e de um retorno por parte do Estado brasileiro", completou o presidente da OAB. "A democracia livre tem imprensa livre. O governante pode até não gostar das críticas que são feitas, mas cabe a ele - é seu dever constitucional- apurar e conviver com esse tipo de crítica que é algo extremamente normal. Até porque, quando ele (Lula) estava na oposição, também fazia críticas aos governos existentes, e tenho certeza de que as críticas que ele fez, ou que o partido dele fez, naquele momento foram importantes para o fortalecimento da democracia."

Desconhecimento. A Associação Nacional dos Jornais (ANJ), por sua vez, divulgou nota (íntegra ao lado) em que reage também às palavras de Lula. "É lamentável e preocupante que o presidente da República se aproxime do final de seu segundo mandato manifestando desconhecimento em relação ao papel da imprensa nas sociedades democráticas", afirma o texto, ressaltando que esta não é a primeira vez em que Lula faz tal tipo de crítica. Segundo lembra a ANJ, o papel da imprensa "é o de levar à sociedade toda informação, opinião e crítica que contribua para as opções informadas dos cidadãos, mesmo aquelas que desagradem os governantes". O presidente, recorda a nota, "jamais criticou o trabalho jornalístico quando as informações tinham implicações negativas para seus opositores".

O diretor de assuntos legais da Associação Brasileira das Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), Rodolfo Machado Moura, considerou "infelizes" as afirmações. "O presidente Lula já demonstrou, por diversas vezes, um apreço pela imprensa, e a gente acredita que essas declarações não reflitam efetivamente o pensamento dele, mas que repercutem o momento conturbado que vive a política e a proximidade do processo eleitoral", afirmou.

Para Machado Moura, no entanto, a frequência com a qual o presidente tem feito as críticas "tem uma carga de preocupação". As entidades representativas da liberdade de imprensa "têm de ficar sempre atentas, porque esta luta pela liberdade de expressão é constante".

ÍNTEGRA DA NOTA DA ANJ

É lamentável e preocupante que o Presidente da República se aproxime do final de seu segundo mandato...
... manifestando desconhecimento em relação ao papel da imprensa nas sociedades democráticas. Mais uma vez, provavelmente levado pelo calor de um comício, o presidente Lula afirmou neste sábado, em Campinas, que "vamos derrotar alguns jornais e revistas que se comportam como partido político", dizendo, em seguida, ainda referindo-se à imprensa, que "essa gente não me tolera".

É lamentável que o chefe de Estado tenha esquecido suas próprias palavras, pronunciadas no Palácio do Planalto, no dia 3 de maio de 2006, ao assinar a declaração de Chapultepec (um documento hemisférico de compromisso com a liberdade de imprensa). Na ocasião, ele declarou textualmente: "... eu devo à liberdade de imprensa do meu País o fato de termos conseguido, em 20 anos, chegar à Presidência da República do Brasil. Perdi três eleições. Eu duvido que tenha um empresário de imprensa que, em algum momento, tenha me visto fazer uma reclamação ou culpando alguém porque eu perdi as eleições."

O papel da imprensa, convém recordar, é o de levar à sociedade toda informação, opinião e crítica que contribua para as opções informadas dos cidadãos, mesmo aquelas que desagradem os governantes. Convém lembrar também, que ele jamais criticou o trabalho jornalístico quando as informações tinham implicações negativas para seus opositores.

Planalto manda TV estatal filmar comícios de Dilma

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Presidente 40 Eleições 2010: Lei veta estrutura pública em campanha; governo diz gravar só para registro

A Presidência da República usa funcionários e equipamentos da NBR, TV oficial do governo, para filmar comícios da candidata Dilma Rousseff (PT) dos quais o presidente Lula participa.

A ação caracteriza uso de recursos da União para gravar eventos de campanha que o Planalto define como "compromissos privados" de Lula. A lei veta uso eleitoral da máquina pública.

A direção da estatal orienta os servidores a omitir os sinais de identificação da emissora antes de iniciar a filmagem de comícios. A ordem constava de cartazes na sede da NBR em Brasília, mas os documentos foram retirados na última quinta, após a Folha fotografá-los.

Profissionais que não cumpriram a determinação foram retaliados pela cúpula da TV - um deles recebeu advertência por escrito.

A direção da NBR nega uso eleitoral e diz que as imagens são feitas para "registro histórico" da Presidência e que também podem ser "requisitadas por partidos ou candidatos".

A Presidência confirma a motivação das gravações, mas diz que são de uso exclusivo, não podem ser cedidas a terceiros.

TV estatal manda cinegrafista registrar comícios de Dilma sem identificar canal

Cartaz na sede da NBR orientava equipes a tirarem símbolos com marca da emissora nos eventos de campanha

Mesmos funcionários que viajam para cobrir atos oficiais de Lula têm de registrar campanha e gravar em DVD à parte


Simone Iglesias

DE BRASÍLIA - A Presidência da República usa funcionários públicos e equipamentos de TV oficial do governo federal para filmar comícios da candidata Dilma Rousseff (PT) que tenham a participação de Luiz Inácio Lula da Silva.

A ordem é para que cinegrafistas e auxiliares da NBR gravem todos os discursos do presidente nos eventos da campanha eleitoral.

A direção da TV estatal determinou que esses servidores, antes de iniciarem as filmagens, tenham o cuidado de retirar os sinais de identificação da emissora estatal -a camiseta ou colete, a canopla (peça que tem a logomarca) do microfone e o adesivo colado na câmera.

A TV NBR é o canal da EBC (Empresa Brasil de Comunicação) que noticia atos e políticas do governo.

Na sede da emissora, em Brasília, havia na semana passada cartazes com a ordem para tirar a identificação dos equipamentos. O texto é assinado por Lidia Neves, chefe de reportagem.

"Cinegrafistas e auxiliares: além da agenda oficial, que é parte da nossa cobertura, o presidente Lula tem viajado também para participar de comícios e eventos de campanha", orienta o cartaz.

"Para o que não é agenda oficial, estamos mandando um cinegrafista sempre junto para acompanhar. O objetivo é somente ter um registro, gravando ações do presidente e os discursos", diz o texto.

Em seguida, vem a orientação: "Este material está sendo gravado sem a canopla da TV NBR, porque não é para a NBR. Este conteúdo não é para ser usado na nossa cobertura, nem mesmo para ser gerado para as emissoras. É apenas para registro. Em caso de dúvidas, por favor procurem a mim ou um dos coordenadores. Lidia".

FORA DO EXPEDIENTE

Quando começou a campanha presidencial, Lula avisou publicamente que sua participação nos comícios de Dilma aconteceria nos dias ou horários de folga, "fora do expediente" da Presidência.

Desde julho, o presidente tem conciliado eventos oficiais com atos de campanha. Não há irregularidade nisso. Os gastos da Presidência com essas viagens têm sido ressarcidos pelo PT desde então.

Esse zelo, no entanto, não ocorreu no uso da estrutura da NBR: os funcionários públicos estão trabalhando em eventos que o próprio Planalto classifica como "compromissos privados" de Lula.

Ou seja, para registrar momentos da campanha partidária, o governo federal faz uso de salário, equipamento, passagens e diárias que são bancados pela União.

No fim do texto, há um resumo, destacado: "O que for campanha, gravar tudo na íntegra: reuniões, discursos e entrevistas". Os cartazes foram retirados da NBR depois que a Folha foi até lá e os fotografou, na quinta-feira.

Por meio de nota, a emissora afirmou que tem um contrato de prestação de serviços com a Secretaria de Comunicação da Presidência, e que as imagens estão sendo feitas para "registro histórico". Negou uso eleitoral (leia mais na pág. 3).

Segundo a Folha apurou, no entanto, cinegrafistas e técnicos que se recusaram a seguir a determinação foram ameaçados de demissão ou retaliados pela direção da TV. Houve ao menos duas advertências, uma por escrito, em quatro casos ouvidos.

Os cinegrafistas relataram à Folha -pedindo anonimato por temerem retaliação- que têm de seguir duas outras orientações: gravar os eventos de campanha em DVD diferente daquele em que estão as imagens dos atos institucionais e, ao chegar à sede da empresa, em Brasília, entregar o DVD dos comícios para a chefia.

A reportagem não teve acesso a esse arquivo paralelo de horas de filmagem. Não se sabe se essas imagens foram encaminhadas ao comitê de Dilma ou utilizadas na propaganda eleitoral.

A legislação veda o uso eleitoral da máquina pública (leia texto nesta página).

A determinação fere também o estatuto da NBR. Cabe à emissora divulgar somente os atos institucionais do Executivo, o que inclui os ministérios, com prioridade para a Presidência da República.

A NBR faz parte da EBC, assim como a TV Brasil, a Agência Brasil e a Rádio Nacional. A empresa foi criada em 2007 e juntou a Radiobrás e emissoras públicas estaduais.

Em 2006, quando Lula concorreu à reeleição, a chefia da NBR proibiu a gravação de eventos de campanha, justamente para não configurar crime eleitoral.

Os poemas :: Mario Quintana

Os poemas são pássaros que chegam
não se sabe de onde e pousam
no livro que lês.


Quando fechas o livro, eles alçam voo
como de um alçapão.

Eles não têm pouso
nem porto;
alimentam-se um instante em cada
par de mãos e partem.

E olhas, então, essas tuas mãos vazias,
no maravilhado espanto de saberes
que o alimento deles já estava em ti...