terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Articulação paralela:: Raymundo Costa

O quem é quem da coordenação política do novo governo com o Congresso ainda não está muito claro, mesmo para políticos experientes em função de liderança em seus partidos. Na falta de uma definição, o vice-presidente Michel Temer (PMDB) aos poucos assumiu a interlocução com a Câmara dos Deputados, da qual é ex-presidente, num movimento que não passa despercebido ao PT nem ao Palácio do Planalto. Em política não há espaço vazio. Os petistas observam as articulações de Temer receosos de que o PMDB prepare um troco, na eleição para a presidência da Casa, à perda de espaço do partido na composição do governo Dilma.

Após oito anos com José Alencar, que só por algum tempo incomodou com suas críticas ao aumento das taxas de juros, e os oito anos anteriores de Marco Maciel -, que "nunca deu um passo que não fosse absolutamente correto", na definição do próprio Fernando Henrique Cardoso - o país tem outra vez um vice-presidente politicamente ativo, mas não necessariamente alinhado com o partido do titular do cargo. O último foi Itamar Franco, que articulou a "República dos Senadores", quando Fernando Collor já era um moribundo na Presidência.

A cúpula do PT está irritada com Michel Temer por entender que ele está mais presidente do PMDB do que vice-presidente da República. Sua interferência no processo eleitoral da Câmara, aparentemente, é em benefício do candidato petista ao cargo, deputado Marco Maia (RS). Mas dirigentes petistas desconfiam de que Temer, na prática, tomou conta da coordenação política para o PMDB, mais adiante, dispor de um instrumento para retaliar o governo, se continuar a perder espaços para o aliado.

Com o vazio, Temer assume interlocução com o Congresso

Dessa forma, o perigo para a candidatura de Marco Maia a presidente da Câmara não estaria nas candidaturas ensaiadas pelos partidos pequenos ou de médio porte, casos até agora de Aldo Rebelo (PCdoB), que, por sinal, já desistiu de disputar, Sandro Mabel (PR), Sílvio Costa (PTB), entre outros menos cotados. O risco seria o PMDB, descontente com a distribuição dos cargos do governo federal, resolver patrocinar alguém do próprio partido, rompendo o acordo que fez com o PT para o revezamento, entre os dois partidos, na presidência da Camara, na legislatura que se inicia no dia 1º de fevereiro.

PT e PMDB não se entendem sobre a divisão do governo desde antes da posse da presidente Dilma Rousseff, quando se discutia a composição da nova equipe. À época, os pemedebistas tomaram a iniciativa de declarar que se contentavam com a manutenção dos seis ministérios de que dispunham. Levaram quatro e passaram também a administrar um orçamento menor na Esplanada.

Já então o partido ensaiava a formação de um bloco parlamentar na Câmara, iniciativa pela qual Dilma chamou às falas o vice Michel Temer. O caldo entornou de vez após a posse do novo governo, quando o PT, sem aviso prévio, tomou lugares vitais para o PMDB, como a Secretaria de Assistência à Saúde (SAS) do Ministério da Saúde, os Correios e já se preparava para abocanhar outras fatias apetitosas, em termos de orçamento, quando o parceiro gritou.

O que se assistiu, a seguir, foi um verdadeiro "strip-tease" em praça pública. As duas siglas fizeram então um acordo de procedimento para tirar a discussão dos jornais. A briga perdeu alguma visibilidade pública, pois, intramuros, se manteve tão ou mais renhida que antes. Em jogo, os cargos do segundo e terceiro escalões: o PMDB reage a todos os nomes apresentados pelo PT. Esses, se valem da má fama do PMDB, visto como um partido fisiológico, para intrigar a sigla com a opinião pública. levantamento publicado, neste domingo, pelo jornal "Folha de S. Paulo" revela que o PT controla 60% dos 21,7 mil postos de livre indicação do governo federal (os chamados DAS).

Neste ambiente é que se tornou público, semana passada, que Michel Temer reunira-se com o PTB. O objetivo, matar no nascedouro a candidatura do deputado Silvio Costa a presidente da Câmara. Argumento de Temer para convencer o indócil aliado: "A união entre os partidos e a governabilidade da presidenta Dilma."

No PT, a leitura foi outra: a reunião nada mais era de que uma maneira de o PMDB falar por si e pelo PTB no governo. Michel Temer, por outro lado, já fala pelo PP, partido que não integrou a aliança eleitoral de Dilma, mas já está na coalizão governista pelas mãos do PMDB, com o qual deve formar um bloco junto com o PSC, o PTB e talvez o PR. Com a adesão do PP ao blocão, ficou mais fácil a manutenção do partido no comando do Ministério das Cidades, um instrumento de articulação política com os municípios.

Temer conversou com presidentes e líderes de outros partidos da base de apoio governista. É claro, o pemedebista justifica que faz um movimento estratégico em favor da governabilidade. Mas no PT a interpretação é outra bem diversa: a articulação do vice-presidente da República tem o objetivo de isolar o Partido dos Trabalhadores. "Temer desceu da condição de vice-presidente e voltou à condição de presidente do PMDB", como diz um petista bem situado nas discussões.

O entendimento petista é que Temer faz a interlocução parlamentar sobre a eleição para a presidência da Câmara dos Deputados como reação direta à ocupação de cargos pelo PT no governo. O encadeamento lógico seria o partido formalizar a criação do blocão e rifar a candidatura de Marco Maia a presidente, se não tiver atendido seus interesses no preenchimento dos cargos.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

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