quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Battisti enganou todos, afirma acusador

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Pietro Mutti diz que ex-terrorista foi o mais esperto e será o único a gozar a vida sem pagar por seus pecados

Fundador do PAC diz que Battisti sempre foi mais um "pequeno delinquente" do que um militante político


Giacomo Amadori - revista "Panorama"

Se o caso Cesare Battisti tornou-se uma confusão internacional a culpa também cabe a Pietro Mutti, que 30 anos atrás chefiou o grupo que libertou o ex-terrorista do presídio de Frosinone.

Com Battisti fugiu também um jovem membro da Camorra: "Não nos surpreendemos: Cesare era e continuou sendo mais um pequeno delinquente do que um extremista político", afirma Mutti.

Mutti vive em Milão, cidade em que nasceu. Nos anos 70, como terrorista, praticou 45 roubos, matou um homem, depois passou a colaborar com a Justiça e cumpriu oito anos de prisão. Ex-operário da Alfa Romeo, em 1977 fundou o PAC, ao qual Battisti aderiu: "Mas ele se juntou a nós mais para escapar de seus problemas com a lei do que por ideal político".

Panorama - O que acha da decisão do ex-presidente Lula de não extraditar Battisti?

Pietro Mutti - Acho que Battisti tem sido o mais inteligente de todos. Ele não era um personagem do nível do Renato Curcio, nem do Valerio Morucci, que se dissociou do terrorismo para sair "limpo" e hoje é bem-sucedido. Mas Cesare, ao contrário, conseguiu fugir. Enganou todos e agora provavelmente vai curtir sua vida sem nunca ter pago por seus pecados.

O sr. é testemunha do assassinato do agente penitenciário Antonio Santoro por Battisti?

Sim, eu o vi, com meus olhos, matar naquela manhã em Udine. Battisti e Enrica Migliorati estavam abraçados como dois namorados na frente da casa de Santoro. Quando ele saiu, Battisti disparou por trás dele [três tiros]. Eu e outro amigo, Cláudio Lavazza, vimos tudo do carro onde os esperávamos. Não me lembro se virei minha cabeça ou se eu observei a cena pelo espelho retrovisor do nosso Simca 1300. Mas vi que foi ele que disparou.

O sr. tem certeza do que diz?

Não tenho nenhuma dúvida. Foi ele quem disparou.

O sr. diz que Battisti também matou Andrea Campagna.

Confirmo essas palavras. Ele mesmo me contou sobre a sua participação.

Battisti foi preso por causa de suas declarações. Mas, no Brasil, ele diz que o sr. mente.

Apesar de ele não ter sido condenado apenas por minhas afirmações, de qualquer forma foi acusado e julgado por magistrados que não creio terem se enganado devido a meu depoimento. Em todo caso, gostaria de ouvir com meus ouvidos Battisti me chamar de mentiroso.

Battisti chamou o sr. de "um carrasco, cujo falso testemunho custou-me uma sentença de prisão perpétua".

Sobre mim disseram coisas piores. Mas quando contei aos juízes a história do PAC, acusei a mim mesmo por atividades para as quais não havia evidência contra mim. Apenas disse a verdade, sem culpar inocentes.

Se o sr. encontrasse Battisti, o que perguntaria para ele?

Acho que fingiria que não o conheço. Não tenho mais nada a dizer a ele. Fechei as contas com o meu passado.

O que sente em relação a ele?

Amar, eu nunca o amei. Tínhamos temperamentos muito diferentes. Mas jamais o odiei. Hoje simplesmente eu não me importo com ele.

O que pensa ao vê-lo sorrindo no meio da polícia brasileira?

Vejo o Battisti de 30 anos atrás. Sempre foi um cara inteligente, arrogante. Quando vejo aquele sorriso, acho que foi o mais esperto de todos.

Mas foi também o mais cruel?

Éramos mais ou menos todos iguais. Pessoas determinadas. Digamos que ele não era santo, mas em matéria de crueldade não posso dar notas. Eu também atirei.

O sr. nunca sentiu remorso?

E como! Eu matei um policial por acidente. Por muitos anos acordava à noite pensando sobre ele e sua família. Também o pensamento dos companheiros que eu tinha "traído" com meu arrependimento abalou-me por longo tempo. Às vezes estes dois pesadelos se cruzavam. Mas hoje eu venci essa angústia.

E Battisti? O sr. acha que às vezes ele é assombrado pelos fantasmas do passado?

Se o conheço bem, não. Ele sempre correu atrás de seus interesses. Antes, depois e agora. Não o culpo. Ele deliberou se salvar e conseguiu.

"Panorama" é uma revista semanal de informação italiana. Pietro Mutti concedeu a entrevista em 3 de janeiro, em Milão.

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