domingo, 16 de janeiro de 2011

Como Lula, últimos ex-presidentes não conseguiram deixar a política

Sarney, Collor, Itamar e FH deram entrevistas para série da TV Globonews

Adriana Vasconcelos

BRASÍLIA. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva está longe de ser o primeiro, e também não deverá ser a último, a manter sua influência sobre os destinos do país, mesmo fora do cargo. Há anos longe do Palácio do Planalto, os últimos quatro antecessores de Lula admitiram - em entrevistas concedidas para a série "Profissão: Ex-presidente", produzida pelo jornalista Carlos Monforte e exibida semana passada no "Jornal das Dez", da TV Globonews - que não conseguiram ficar longe da política após deixar a Presidência.

A política não tem porta de saída, disse um deles, o peemedebista José Sarney, que está terminando seu terceiro mandato como presidente do Senado e deve ser eleito para o cargo pela quarta vez em fevereiro. Ele está no segundo mandato de senador pelo Amapá, cada um de oito anos, depois que deixou a Presidência.

Após sofrer o impeachment e perder os direitos políticos por oito anos, Fernando Collor, hoje filiado ao PTB, também voltou à ativa, como senador, na legislatura passada, e, em 2010, ainda tentou, sem sucesso, eleger-se novamente governador de Alagoas. A partir de fevereiro, Sarney e Collor dividirão a tribuna com mais um ex-presidente: Itamar Franco, eleito senador pelo PPS de Minas.

Dos quatro ex-presidentes, só o tucano Fernando Henrique Cardoso se recusou a disputar novas eleições, mas continua sendo uma das principais estrelas de seu partido, o PSDB. É seu presidente de honra, sempre consultado em momentos importantes. Ele diz que mandato não lhe fez falta, admitindo, sem modéstia, que mantém influência na vida política do país:

- Você acha que, com exceção, talvez, apenas do presidente Sarney, que é presidente do Senado, os outros ex-presidentes influenciam mais que eu? Eu influencio bastante o meu partido e outros partidos. Acho que quem já foi presidente da República desmerece o que era se for para uma função que não é tão relevante e que te obriga a ficar na trincheira o tempo todo. Acho que devemos entender que a vida tem momentos que devem ser vividos plenamente. Eu vivi. Nunca fui um presidente resmunguento. Exerci o governo com prazer - disse Fernando Henrique a Carlos Monforte.

Sarney, Collor e Itamar alegam que a opção pela disputa de novos mandatos acabou sendo feita por pressão de aliados e eleitores. Embora tivesse determinado a se dedicar à carreira literária quando deixou a Presidência, em 1990, Sarney hoje reconhece:

- A política só tem uma porta, a de entrada. Não tem a de saída.

Se deixar o poder é difícil, imagine como foi, então, para Collor, apeado do cargo em 1992, após um processo de impeachment. Ele ainda traz na memória os momentos finais de seu governo:

- O dia seguinte foi muito difícil, foi duríssimo. Um presidente eleito pelo voto popular de um momento para o outro se vê afastado do poder... Foi muito mais que traumático, foi como se o mundo tivesse desabado nas minhas costas.

Collor contou que percebeu, logo após sua saída do Palácio do Planalto, em setembro de 1992 - saída, a princípio, temporária -, que não voltaria mais ao cargo.

- Foi uma dor lancinante: pego o helicóptero para ir à (Casa da) Dinda, peço ao comandante que sobrevoe uma obra perto da Dinda, um Ciac (escola de tempo integral). Queria ver o estágio da obra, e ele diz que não podia, que não tinha combustível. Foi aí que realmente caiu a ficha. Percebi que não tinha volta. Aquele piloto tinha certeza que eu não voltaria. Se eu voltasse, ele seria jogado lá de cima na piscina do Ciac - disse Collor, rindo, agora, da situação.

Empossado após o impeachment de Collor, Itamar fez uma revelação: logo após assumir o cargo, convocou os presidentes de todos os partidos para uma reunião no Palácio da Alvorada, onde indagou se alguém gostaria que fossem convocadas novas eleições:

- Se tivessem me pedido, teria organizado novas eleições.

Itamar, aliás, foi o único dos quatro que tentou voltar à Presidência. Chegou a disputar a convenção do PMDB em 1998, mas foi derrotado pela cúpula do partido, que preferiu apoiar a reeleição de Fernando Henrique.

Foi então que ele decidiu disputar o governo de Minas Gerais e se transformou numa pedra no sapato de FH, justamente a quem ajudara a se eleger em 1994, após o lançamento do Plano Real. Mágoa que Itamar não disfarça até hoje em relação ao tucano, que fora seu ministro da Fazenda:

- Quando elegemos Fernando Henrique, ele não disse que seria candidato à reeleição. Considero que foi um grande mal.

A luta de Monforte - responsável pela série - agora é para conseguir marcar uma entrevista com Lula. Os demais ex-presidentes não resistiram à ideia de falar sobre a vida após a saída da Presidência. Com Lula e seus interlocutores, Monforte ainda não conseguiu contato algum. Mas tudo é muito recente.

- Falta o Lula. Falei com o Franklin (Martins, ex-ministro da Secretaria de Comunicação), mas ele disse que não permaneceria mais na assessoria do ex-presidente. Então, liguei para Gilberto Carvalho (ex-chefe da gabinete de Lula), mas não obtive resposta. Acho que é porque Lula ainda nem desencarnou. Ao contrário dos demais, que já estão fora do poder há mais tempo, Lula ainda está na fase de cair em si - diz Monforte.

A expectativa de Monforte é produzir, dentro de 15 dias, no máximo, um novo programa com o que sobrou do material gravado com Sarney, Collor, Itamar e Fernando Henrique, sob o título "Depois do Poder".

FONTE: O GLOBO

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