sábado, 8 de janeiro de 2011

Depois da festa:: Míriam Leitão

DEU EM O GLOBO

O comércio continua otimista, mas teme dois inimigos em 2011: a inflação e os juros. O aumento dos preços pode tirar renda das famílias, e a alta dos juros encarece o crédito e afeta o humor dos empresários.

As vendas na semana do Natal de 2010 foram 15% maiores que em 2009. O movimento nos shoppings continua forte, com queimas de estoque. A economia continuará crescendo, mas há mais cautela no ar.

Quem paga aluguel pode perder um bom pedaço de sua renda por causa da alta do IGP-M. Nem todos os contratos têm esse índice de atualização, mas os que tiverem terão que amargar um reajuste forte no preço.

Ele fechou o ano em 11,32%.

Quer dizer que uma pessoa que paga R$ 1.000 de aluguel passará a pagar R$ 1.113. Em um ano, o gasto extra no orçamento dessa família chegará a R$ 1.358, que seria suficiente para a compra de uma TV de LCD — uma das recordistas de venda — em prestações fixas em 12 meses.

O melhor caminho neste caso para o inquilino, o proprietário, e a economia será a negociação por um reajuste menor.

Grande parte da alta dos IGPs é resultado da elevação dos preços de matériasprimas, que subiram por pressão da demanda chinesa, ou por especulação no mercado futuro de commodities.

O inquilino acabará pagando essa conta.

Outros pagadores serão os governadores, porque o IGP corrige as dívidas dos estados com a União. Nos índices de preços ao consumidor, o que mais pesou foi a inflação de alimentos, preços sobre os quais a ação do Banco Central tem menos impacto. Eles sobem por problemas climáticos em grandes países produtores de grãos, como a Austrália.

O economista Luiz Roberto Cunha acha que em 2011 os alimentos continuarão sendo uma fonte de pressão inflacionária.

Mas, independentemente das causas, a inflação corrói a renda das famílias.

— Em 2011, quem vive de aluguel gastará um percentual maior de sua renda com isso. Vale lembrar que em 2010 isso não aconteceu, porque os IGPs fecharam com deflação — disse o assessor econômico da Serasa Experien, Carlos Henrique de Almeida.

Almeida ainda não vê indícios de desaceleração no consumo e acredita que o índice de inadimplência medido pela Serasa — de volume de atrasos nos pagamentos — continuará em alta nos próximos meses: — O comércio teve crescimento na semana do Natal de 15,5% em relação a 2009.

O consumidor se endividou mais. No início do ano, ele terá gastos extras com impostos, seguro de automóveis, gastos com educação.

A situação este ano também é diferente de 2010, com crescimento menor tanto do PIB, quanto da renda e do crédito. O nosso indicador já mostra um aumento da inadimplência nos últimos seis meses, a tendência é que isso continue.

O maior receio do comércio, segundo o superintendente de Economia e Pesquisa da Fecomércio- RJ, João Carlos Gomes, está no aumento de juros.

Com a alta da inflação, a taxa Selic pode subir já na reunião do Copom dos próximos dias 18 e 19. Gomes explica que o impacto sobre o comércio não será imediato, ou seja, via encarecimento das parcelas nas compras a prazo, mas pelo efeito que a alta dos juros pode ter na confiança dos empresários.

— Subir muito os juros significa piorar a expectativa dos empresários, num primeiro momento. Depois, afeta os investimentos, e, por fim, o emprego. O tranco não pode ser grande. Se isso acontecer, o emprego será afetado lá na frente e o comércio também — explicou.

Gomes compara a situação atual do Brasil com a dos Estados Unidos. Lá, a economia cresce, mas cria pouco emprego. O empresário está descrente e prefere aumentar a produção via horas trabalhadas e contratação de temporários.

Aqui, ao contrário, o momento é de forte otimismo, com a criação de empregos formais. Ele teme a alteração nesse quadro.

— O que está sustentando o comércio continua sendo o mercado de trabalho, o aumento da renda e também a permanência das pessoas em um mesmo emprego. Mexer nessa dinâmica pode trazer problemas. Por isso, a política fiscal é muito importante porque se os gastos do governo não forem contidos, o BC ficará enxugando gelo. Todo mundo tem que fazer a sua parte — explicou.

O presidente da Abecs (Associação Brasileira das empresas de cartão de crédito e serviço), Paulo Rogério Caffarelli, diz que está aumentando muito o uso de cartões e caindo o uso de cheques, o que, na visão dele, reduz os riscos para os lojistas. Em 2010, o setor emitiu 628 milhões de novos cartões, incluindo crédito, débito e de redes e lojas, o que representa um crescimento de 11% em relação a 2009. As transações subiram 16%, enquanto o faturamento disparou 21%, chegando a R$ 538 bilhões.

— Temos crescido a uma taxa de 20% ao ano, nos últimos dez anos. Há um trabalho enorme de educação financeira sendo feito para as classes C e D, e isso tem se refletido nos índices de inadimplência, que se mantêm baixos, pelos dados do Banco Central — disse.

Adriana Colloca, gerente de pesquisa e assuntos econômicos da Abrasce (Associação Brasileira de Shopping Centers), acredita que as vendas nos shoppings devem crescer mais de 10% em 2011, mesmo após uma alta superior a 15% em 2010. Cerca de 26 shoppings novos serão inaugurados. E o fluxo de pessoas permanece alto neste começo de ano.

A economia continua crescendo, o crédito vai continuar se expandindo, ainda que em ritmo menos acelerado.

No entanto, os empresários temem os efeitos da inflação e do uso do remédio para combater a alta dos preços: a taxa de juros.

Nenhum comentário:

Postar um comentário