domingo, 9 de janeiro de 2011

Erro de cálculo não volta atrás:: Wilson Figueiredo

DEU NO JORNAL DO BRASIL

Por enquanto, não há como admitir que nos dois mandatos e, de modo contundente no segundo, exercido por Luiz Inácio Lula da Silva, possa ter sido semeada a ideia de uma época pela qual boa parte dos brasileiros espera em vão. A popularidade do ex-presidente Lula independe do cargo e da condição de ex, com o qual vai demorar a se acostumar. Ele está solto e sem pressa de encontrar o que fazer. Para passar tempo já tem o estilo à vontade que se firmou no segundo mandato e lhe facilitou enrolar o que estivesse à mão. Candidaturas têm prazo fixo, e erro de cálculo em política não volta atrás. Lula mira 2014 sem perder de vista o resto. Primeiro, não ser esquecido. Segundo, ser lembrado sem exagero. E, terceiro, não deixar passar oportunidades ocasionais. É encontrar o que fazer para passar o tempo, e boa sorte.

Que fazer, no entanto, para não dissipar os 87% de popularidade? Fora do governo é temeridade insistir por aí. O próprio Lula deve ter se assustado com a hipótese de vir a ter mais de cem por cento de brasileiros dispostos a aprová-lo. Que houvesse, vá lá. Que a pesquisa revelasse, no entanto, não cairia bem numa democracia que já resistiu a seis eleições presidenciais sem correr qualquer risco. O ex-presidente se sente em plena forma e se dispõe a procurar uma atividade ocupacional maneira. Quem sabe, fundar um clube de ex-presidentes, com a inclusão dos vices que não encontram o que fazer, nem durante o mandato, nem depois. Principalmente, vice que não tenha se destacado no que não fazia.

É natural aos eleitores entenderem as razões pelas quais o ex-presidente Lula terá de caprichar no gênero Chacrinha, quando proclamava que não veio ao mundo senão para confundir. A democracia resistiu a ambos porque soube fazer concessões na hora em que foram necessárias. Temos então de entender que a iniciativa continua com Lula, mas as possibilidades só na aparência tendem à facilidade que encontrou depois que o mensalão, em vez de servir à oposição, caiu no seu colo e beneficiou quem percebeu a tempo perigo entre os que vinham com ele e se entendiam em torno de oportunidades consideradas históricas para o PT.

Se a popularidade chegasse mais perto dos cem por cento, o que fosse de Lula estaria com ele, e ele estaria longe do que tivesse de acontecer. Ao desistir do terceiro mandato, Lula estava abrindo uma porta a outro personagem que não tinha a ver com a sucessão, e optando por ficar do lado de fora para voltar na oportunidade seguinte. Estava se sacrificando à causa da democracia, que não teve oportunidade de agradecer a gentileza e poupar- lhe a crise que se desenhava. Fez como o PSDB, que, no auge do mensalão, concluiu que Lula poderia cair por força apenas da gravidade, e lavou as mãos. A democracia agradeceu, mas não se sentiu obrigada a corresponder. A reciprocidade não funciona em política. A candidatura Dilma Rousseff pegou de muda, mas a ponte para Lula passar não figura no PAC.

Não perguntem ao próprio Lula para não ouvirem o que não querem. Ele deixou de falar como presidente. Na condição de ex, ainda não. Tudo indica que vai se apresentar como o único ex-presidente em atividade e intimidar a concorrência. Do jeito como vinham se equilibrando um presidente para sair sem passar recibo e uma presidente para entrar com elegância, deu o que pensar a quem é dado a esse vício.

Em boa hora, porém, a situação se resolveu com a passagem do poder. Dissipou-se a nuvem doméstica e ficou claro que, descontando a expectativa, o governo Luiz Inácio Lula da Silva pode vir a ser considerado, sem favor de qualquer natureza, o último da série que comprovou não saber o brasileiro, até hoje, onde começa a esquerda e onde termina a direita. Ou vice-versa.

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