terça-feira, 22 de março de 2011

O infiel da balança:: Wilson Figueiredo

Partidos nominalmente liberais e, entre nós, carimbados como de direita, já não produzem eco eleitoral na sociedade de consumo. E, daí para baixo, ainda menos. A última legenda partidária da linhagem liberal genuinamente brasileira levou com ela a própria democracia (ou terá mesmo sido o contrário?) para o exílio depois de 1964 e, na redemocratização seguinte, coube àquela Frente Democrática que substituiu o primeiro PSD – como infiel da balança – decidir o impasse ao fazer o resultado pender em favor da oposição na última eleição presidencial indireta. Página virada. E assim voltamos para onde estamos há mais de vinte anos, de onde não será fácil alcançar nível mais credenciado, por ignorância do que possa ser uma social- democracia. Inclusive, pelo equivoco de tratar no mesmo nível liberalismo e direita, como se fossem univitelinos. A falta de atenção nas semelhanças e nas diferenças pode ser fatal.

Acaba de ser oficialmente devolvida ao consumo, pelo seu autor e principal interessado, um novo Partido Social Democrático, que, ao contrário do seu antecessor histórico, nasce fora da órbita federal para reunir as sobras dos acertos que escaparam aos caprichos das urnas na última eleição. Nada a ver com aquele PSD que, por trás do crédito universal da social- democracia, se situou no nível da realidade social, econômica e política, no mesmo Brasil sem compromisso com ideias que passam ao largo. Naquele tempo não se falava em social-democracia mas em pessedismo, como estilo de fazer política e manter-se no poder. Em último caso, não passar recibo. Uma arte que alcançou seu apogeu no PSD mineiro. Foi-se a Constituição de 1946 e, com ela, o PSD: o pessedismo se recolheu, e o Brasil ficou órfão.

O pessedismo deixou de saldo lição que teve tudo a ver com as condições do país que saiu da ditadura em 1945 para a democracia, sob os auspícios de situação internacional favorável ao grande salto político depois da Segunda Guerra. Já este novo PSD nasce de olho na eleição estadual de São Paulo em 2014. É pensar curto num prazo longo. E, a partir daí, o neopessedismo perde o pé na realidade que desautoriza como solução o novo partido para resolver situações pessoais. Um partido a mais, entre três dezenas de legendas soltas, não contribui para dar viabilidade à democracia, como a própria reforma política, que tardou a ser proposta com responsabilidade, tendo em vista o verdadeiro lixão ético que se acumula com ramificações políticas e administrativas, sem a menor consideração pelo cidadão (que não esquece que é ele quem custeia o enriquecimento pessoal de políticos).

Como se vê, mesmo a contragosto, as causas do que se passa não são piores nem mais ocultas do que as consequências, a começar do novo PSD que, sem os que o ajeitaram, não quer mais do que está implícito, e deixa ao acaso os que arriscam uma cota de futuro num saco de gatos-pingados. Pois a reforma política vem por aí e, se não vier, também não será melhor o que espera este exacerbado pluripartidarismo que vem purgando o jejum bipartidário a que os militares submeteram os políticos de então.

Não custa lembrar que, na eleição que trouxe o Brasil de volta à democracia em 1945, o presidente da República foi eleito pelo partido organizado dentro do poder, onde se encontravam também seus dirigentes, já em nome da social- democracia que sobrava do passado na Europa e podia ser importada livremente. Assim que se anunciou o resultado favorável ao PSD, agraciado com a eleição do ministro da Guerra, general Eurico Dutra, não faltou o telegrama de felicitações de um partido (dizia-se à época) social-democrata que, da Turquia, saudava o triunfo da social-democracia em terra brasileira. E, óbvia e pessedistamente, o PSD deve ter agradecido com a maior naturalidade como se fosse verdade. Se non è vero, è bene trovato.

FONTE: JORNAL DO BRASIL

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