segunda-feira, 21 de março de 2011

Yes, we créu! :: Fernando de Barros e Silva

Depois de visitar a "favela pacificada", Barack Obama fez à tarde no Theatro Municipal do Rio um discurso calculado para adular o Brasil. Simpático e articulado, mas também demonstrando certa condescendência com o país diante da plateia de elite que estava ali para aplaudi-lo de pé. Um discurso, afinal, protocolar e de conteúdo um tanto chocho, que só foi histórico para nós. Yes, we créu.

Não se pode compará-lo, em importância ou desenvoltura, à sua fala para o mundo muçulmano na Universidade do Cairo, em 2009.

A máquina retórica do presidente americano é sempre poderosa. Conhecendo-se, porém, a realidade a que ele se refere, ficam transparentes as concessões do estadista ao discurso publicitário, preso a generalidades e a clichês amáveis.

Isso vale para o surrado "país abençoado por Deus e bonito por natureza". Vale ainda mais para a citação infeliz de Paulo Coelho, no final. Mas talvez faça sentido. Estamos, como nação, mais próximos do Mago da besteira global do que do Bruxo do Cosme Velho, Machado de Assis. Yes, we créu!

A menção inicial a "Orfeu da Conceição", embora também estereotipada, ao menos recorda a peça de Vinicius de Moraes, em que pela primeira vez um ator negro subiu no palco do municipal carioca. Podemos lembrar, com ironia, que enfim um negro subiu a rampa do Palácio do Planalto. Afinal, somos um país miscigenado. Yes, we créu!

A família Obama, civilizadíssima e despojada, não deixa de evocar para nós uma espécie de "brazilian dream", o sonho de uma sociedade mais inclusiva e educada.

Quem sabe chegamos lá. Enquanto isso, fazemos graça com a foto de Mussum e a legenda "Obamis". Progredimos, mas continuamos tirando vantagem do atraso, cheios de humor de corte oswaldiano, antropofágico. Yes, we créu!

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

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