domingo, 10 de abril de 2011

Em xeque:: Merval Pereira

A presidente Dilma Rousseff, que tem como objetivo político fixar sua imagemcomo administradora competente, está disposta a enquadrar governadores e prefeitos das cidades envolvidas na Copa do Mundo para garantir o cumprimento do organograma da Matriz de Responsabilidades acertada entre os três níveis de governo para a realização da Copa do Mundo de futebol em 2014.

Todos os 54 projetos que compõem o conjunto de obras da Copa do Mundo foram, sem exceção, reprogramados em relação ao que ficara definido em janeiro do ano passado. No final do ano passado, metade desses projetos sofreu novos acertos, abrangendo 12 dos 17 entes federativos neles envolvidos. Apenas cinco deles mantiveram o cronograma combinado no final de 2010: municípios de Belo Horizonte, Curitiba, Recife e Rio de Janeiro, e estado de São Paulo. Para ressaltar seu empenho, é provável que a presidente Dilma anuncie, na volta de sua viagem à China, a permissão para que o terceiro aeroporto de São Paulo, localizado em Caieras, seja construído e administrado pela iniciativa privada.

Essa decisão já era para ter sido tomada no final do governo Lula, mas opresidente refugou em assinar o decreto para não perder um tema de

campanha eleitoral, a oposição entre o público e o privado na administração do país. A presidente reunirá os responsáveis pelos projetos e anunciará que aprestação de contas sobre a evolução das obras será feita publicamente, com aidentificação dos responsáveis por eventuais atrasos.

O primeiro semestre deste ano — cuja metade já se foi — éfundamental para marcar umnovo ritmo nas obras, pois estão concentrados neste ano 70% das obras e 85% dos investimentos totais. Os projetos de mobilidade urbana, que são os principais legados que as cidades receberão depois dos jogos da Copa, necessitamde financiamentos da Caixa Econômica, mas há problemas burocráticos emperrando a liberação, desde oenvio de documentos para a própria Caixa ou para a Secretaria Nacional do Tesouro, como também demora na resposta do SNT . Recife e Brasília, por exemplo, não enviaram no prazo documentos pedidos pela Caixa. Já Fortaleza e Natal aguardam uma resposta da Secretaria do Tesouro. O estado do Amazonas está tentando uma liminar no Supremo para se livrar do enquadramento da Lei de Responsabilidade Fiscal, que o impede de financiar os projetos da prefeitura de Manaus. Há diversos projetos de transportes emperrados em vários estados. EmBrasília, o VL T (Veículo Leve sobreTrilhos) está sob embargo judicial, com seu processo de licitação questionado. Estudase realizar outra licitação ou até mesmo redefinir o tipo de transporte a ser implantado.

Em Recife, os burocratas ainda discutem se devem adotar o BRT(corredor de ônibus rápido) ou monotrilho. Em São Paulo, o monotrilho aguarda uma decisão do Ministério Público, que quer suspender a licitação. Em Cuiabá, o culpado pelo atraso é o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), do Ministério dos Transportes, que temq ue fazer obras para que os corredores de ônibus sejam implantados.

E em Manaus a licitação para o monotrilho não teve concorrentes por duas vezes, ea prefeitura está sugerindo substituí-lo por corredores de ônibus. Os atrasos são tão acentuados que, mesmo cumprindo todos os compromissos, cerca de 30% das obras, que representam metade do valor total, serão entregues somente no segundo semestre de 2013. Com relação aos aeroportos, do total de 25 empreendimentos, nada menos que

22 estão com atraso em relação ao primeiro cronograma, e pelo menos oito desses representam algum risco para a Copa de 2014. O plano proposto pela Infraero para reduzir os problemas dos aeroportos tem prazos que não são factíveis, de acordo com a análise do Ministério dos Esportes. Em Belo Horizonte, por exemplo, a previsão para outubro de 2013 para o fim das obras na pista, no pátio e no terminal de passageiros do Aeroporto de Confins tem a possibilidade de só se concretizar em março de 2014. O plano da Infraero para tentar atingir os objetivos iniciais prevê aredução do tempo das obras em cinco meses em média, o que certamente implicará redução de qualidade.

Em Manaus, Brasília, Porto Alegre e São Paulo (Viracopos), as mudanças nos terminais de passageiros ainda estão em planejamento ou em projetos ainda sem licitação, e é possível que tanto Viracopos quanto ode Manaus só fiquem prontos depois da Copa. Mesmo com as obras pre-

vistas, alguns dos nossos principais aeroportos estarão funcionando além de suas capacidades, o que torna quase uma certeza problemas na recepção dos turistas.Confins, em Belo Horizonte, estará com 153% de saturação; Brasília eFortaleza, com118%;Guarulhos, emSão Paulo, e Cuiabá, com 111%; e Porto Alegre, com 110%. Nenhum dos sete portos que receberão investimentos para a Copa teve obra iniciada, mas já há reprogramação prevendo aconclusão para 2014, como é o caso do porto do Rio de Janeiro, cujas obras estão previstas para terminarem em março do ano da Copa. O porto de Manaus está em meio a uma disputa trabalhista, pois é uma concessão, eé possível que seja inviável chegar-se a um acordo para investimentos.

O porto de Fortaleza terá seu edital de obras lançado apenas em setembro deste ano, por dificuldades na obtenção de licenças ambientais. Como se vê, o que está em xeque não é apenas a capacidade de opaís realizar os dois maiores eventos esportivos do planeta (Copa do Mundo e Olimpíadas). Muito além do aspecto meramente esportivo, estarão expostas ao mundo as possibilidades de um país moderno e progressista, que se pretende um dos expoentes do novo mundo multipolar , em contraposição aos nossos vícios e mazelas terceiro-mundistas.

FONTE: O GLOBO

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