domingo, 17 de abril de 2011

Rendição na guerra cambial:: Vinicius Torres Freire

Governo desiste de novas batalhas contra o real forte e deve elevar os juros mais do que pretendia até março

Como previsto, o governo por ora jogou mesmo a toalha no combate à valorização do real.

Desde 2009, as equipes econômicas petistas, basicamente as mesmas, tomavam providências a fim de manter o dólar na casa do R$ 1,70. Tratava-se de remendos, controles menores da entrada de capitais de curto prazo via impostos, além de uma brutal compra de dólares por parte do Banco Central.

O dólar agora descerá para o degrau inacreditável de R$ 1,50, valor nominal, que ilude. Considerada a inflação (o "câmbio real"), a valorização da moeda brasileira é ainda maior, a maior do mundo relevante desde a crise de 2008.

Note-se, de passagem, que a quantidade de dinheiro que o BC empilhou em suas reservas agora está perto do terço de trilhão de dólares. Equivale a quase dois anos de importações do país inteiro.

Ainda neste mês os economistas de Dilma Rousseff aumentaram o imposto sobre empréstimos tomados no exterior. Mas qualquer observador avisado sabe que a medida tinha como objetivo conter a torrente de dinheiro que vem de fora por causa da inflação, não do câmbio.

Mais dinheiro, mais crédito disponível. Mais crédito, mais estímulo a uma economia já aquecida demais. Mais inflação, provavelmente. Em suma, o governo recorreu a um aumento de imposto "regulatório" a fim de tentar controlar a inflação.

Não se sabe bem se o governo desistiu da liça cambial por desalento (não há o que fazer) ou interesse (dólar barato ajuda a abater um tico da inflação) ou uma mistura das duas coisas. Mas o ímpeto guerreiro (da "guerra cambial") do Ministério da Fazenda claramente arrefeceu.

"Guerra cambial" foi o nome confuso dado a vários fenômenos diferentes, resultado da "grande impressão de dinheiro" de 2008-2010 no mundo rico, que tinha como objetivo reflacionar ou inflacionar economias em recessão mesmo com taxas de juro no nível zero.

Esse estímulo monetário nos EUA, na Europa e no Japão tende a desvalorizar as moedas desses países em relação às de "emergentes". No fim das contas, acaba por exportar inflação para as economias periféricas, para as Bolsas de Valores e para as cotações de commodities.

Foi o que aconteceu, enfim.

Alguém aí ainda se lembra dessa "guerra", motivo de tanto ranger de dentes do Ministério da Fazenda?

Não, ela não acabou. Apenas foi perdida. A torrente de capital barato posto à disposição (ou indisposição) do mundo pelos bancos centrais de EUA, Europa e Japão arrasou quase todas as barragens. O Brasil, de resto, é uma esponja de capital, pois cresce mais que o mundo rico e paga juros altos demais.

Enfim, do canto de "guerra cambial" de 2010 o governo brasileiro passou a uma discreta rendição condicional ao quase inevitável. Além do mais, dado o aumento extra da inflação, inesperado até para o governo, começa a se difundir a ideia de que o BC terá de elevar os juros mais do que o imaginado até o mês passado. Mais um motivo para uma vitaminada extra do real.

Essa onda vai acabar. No segundo semestre, os EUA vão pensar em subir seus juros. A eurolândia já o faz. O clima financeiro do mundo vai mudar. Até lá, para quem gosta de viajar e comprar importados, ainda haverá tempo para fazer um estoque de dólar baratinho.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

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