terça-feira, 31 de maio de 2011

Crônica de arrogância e incompetência:: Raymundo Costa

Com a crise no pé em que se encontra, a presidente da República não mexe na posição do ministro Antonio Palocci. A menos, é claro, na contingência de um fato novo que deixe Dilma Rousseff sem outra alternativa. O chefe da Casa Civil não é ministro para ser defenestrado com seis meses de governo, por isso Dilma banca sua permanência. Mas ninguém no PT é capaz de especular sobre o futuro de Palocci no prazo de além de uma semana.

Palocci está manco por causa de sua inexplicável evolução patrimonial. Este é o fato. Já a coordenação política do governo fracassou por uma combinação de arrogância, nervosismo eleitoral e incompetência de todos os seus integrantes. O mapa da votação do Código Florestal é complexo e requer uma análise cuidadosa do governo. Mas é certo que a debilitação de Palocci escancarou uma janela de oportunidades para demandas e interesses há muito reprimidos, que mais dia menos dia iriam se manifestar no plenário da Câmara dos Deputados.

O que impressiona é ter acontecido com o Código Florestal uma votação que havia 20 dias o Palácio do Planalto sabia que iria perder. Não foi por outro motivo que os líderes governistas, orientados pela Casa Civil, pediram o adiamento da votação, semanas antes. Estavam certos, como demonstram os 80% de votos dados ao relatório de Aldo. O governo teve tempo para fazer uma retirada organizada, antes de perder a iniciativa política por conta das suspeitas levantadas sobre a origem do enriquecimento rápido de Antonio Palocci.

Culpar agora o PMDB não é uma boa política. Os pemedebistas não fizeram nada escondido, não traíram - como é reconhecido na caciquia companheira - e se a presidente da República e seu ministro da Casa Civil não conversaram com o partido, o maior da aliança governista, foi porque não quiseram. A presidente, ao contrário, preferiu ameaçar com a demissão dos ministros pemedebistas e em troca recebeu um desconcertante não do partido do vice-presidente. Palocci foi um mensageiro que tinha o poder de desarmar o petardo antes que ele explodisse no colo da presidente e não o fez. Chamar o irmão mais velho para resolver a parada revelou em close a extensão da paralisia política do atual governo.

Aparentemente, o Palácio do Planalto não acompanhou devidamente as sucessivas manifestações de unidade que o PMDB deu em votações recentes como a do projeto de reajuste do salário mínimo e aquela contrária à convocação para o ministro Palocci explicar no Congresso como seu patrimônio aumentou 20 vezes em quatro anos.

A boa avaliação da presidente, ao fim dos 100 primeiros dias de mandato, parecem ter feito mal ao governo, de acordo com juizo corrente no PT. Em vez de aproveitar o bom momento para tomar a iniciativa, apresentar medidas e consolidar posições, Dilma "se trancou", para usar a expressão empregada entre líderes do Congresso. Ela e Palocci. Acreditava-se que a popularidade recorde da presidente daria fôlego para o governo se manter ao largo das pressões grandes e miúdas por um bom tempo. Não deu e o Planalto agora corre para retomar a iniciativa perdida.

Segundo pesquisa Datafolha, ao fim dos três primeiros meses de governo Dilma contava com a aprovação de 47% dos brasileiros, uma singularidade entre os presidentes eleitos desde a redemocratização: em junho de 1990, Fernando Collor, que tomara posse em março, era considerado bom ou ótimo por 36% dos entrevistados; com três meses de mandato, Fernando Henrique Cardoso marcou 39%, enquanto Lula - presidente que bateria todos os recordes de popularidade ao final de seu governo - teve 43% de bom e ótimo.

A presidente ganhou o aplauso da opinião pública ao "enquadrar" o PMDB. Mas se trancou em palácio não só aos pemedebistas, como também a todos os partidos da chamada base aliada. Todos, inclusive o PT. Palocci, em tese a válvula de escape, adotou o mesmo comportamento, por falta de tempo ou opção própria. Os mais "compreensivos", como a cúpula do PCdoB, dizem que Palocci ficou sobrecarregado de coisas "pequenas, médias e grandes". Acuado Palocci, o governo ficou paralisado.

Há outros enfoques sobre a clausura de Palocci. Entre dirigentes petistas afirma-se que é um distanciamento seletivo, pois na prática o ministro da Casa Civil tratava de ganhar posições dentro do partido, beneficiando aliados e potenciais correligionários. O chefe da Casa Civil de um governo de sucesso nunca deve ser desprezado como possível candidato de seu partido a presidente, como Palocci aliás esperava ser na sucessão do ex-presidente Lula da Silva, em 2010.

A força da disputa interna do PT não deve ser ignorada na crise e em sua solução. Ela é maior do que expõem seus dirigentes, como comprova a decisão de não realizar uma nova eleição para a sucessão do ex-presidente do partido, José Eduardo Dutra, que renunciou ao cargo no mês de abril. O PT preferiu empurrar o problema com a barriga a desencadear uma guerra companheira, fratricida.

As eleições municipais de 2012 também causam sobressaltos no governo e na base aliada, mas especialmente no PT. A maioria dos 63 votos contrários ao relatório básico do Código Florestal teve origem petista. Paira sobre o partido o bom desempenho eleitoral de Marina Silva nas capitais e grandes cidades na eleição presidencial de 2010. O PT vislumbra a oportunidade de retomar a prefeitura de São Paulo, e para isso considera indispensável recuperar o voto perdido na classe média.

Em resumo, a atuação da presidente e de seu ministro da Casa Civil, durante a discussão e votação do Código Florestal, serviu para agregar a maioria do plenário da Câmara contra o governo, jogar a derrota no colo de Dilma Rousseff e dar um discurso a uma oposição que mal conseguia tecer um enredo para as próprias dificuldades.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

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