quarta-feira, 11 de maio de 2011

Inflação e demanda:: Amir Khair

Está ocorrendo uma falsa discussão entre os que defendem um crescimento mesmo à custa de um pouco mais de inflação e os que refutam esse argumento. Como a inflação tem um componente importante vindo de fora por meio dos preços de commodities e alimentos, a discussão sobre o controle inflacionário recaiu sobre os componentes internos que a influenciam.

O pensamento tradicional é de que há um excesso de demanda sobre a oferta - esta a causa principal da inflação que, na toada que vai, suplantará neste ano o teto de 6,5%. Esse excesso tem de ser reprimido sacrificando o crescimento, que terá de ser inferior a 4%. Até o governo, que antes previa crescimento de 5%, já baixou para 4,5%, mas o ajuste se daria pela redução seletiva do consumo, e não do investimento, que será estimulado, segundo o ministro Mantega, na reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social no dia 26/4.

Embora o investimento componha a demanda, tem a vantagem de elevar a capacidade produtiva e dar sustentação ao aumento da oferta, que é uma forma de combate à inflação presente e futura, dependendo do tempo de maturação. Por exemplo, comprar um maquinário novo que substitua um antigo que atrasa uma etapa da produção pode ser feito em pouco tempo. Já investimentos em petroquímica podem levar alguns anos até permitir a elevação da produção.

Dentro da estratégia do governo no combate à inflação, medidas já foram tomadas para reduzir a demanda: corte de R$ 50 bilhões no Orçamento; compromisso de cumprir a meta de superávit primário de R$ 117,9 bilhões; aumento do IOF sobre operações de crédito ao consumidor; aumento do requerimento de capital para operações de crédito de maior risco; aumentos sucessivos da Selic, e informação de que continuarão; e elevação dos depósitos compulsórios bancários em cerca de R$ 80 bilhões.

O Banco Central (BC) tem atuado via aumento da Selic e medidas macroprudenciais. A primeira é a desejada pelo mercado financeiro, pois ganha nas aplicações nos títulos do governo. As macroprudenciais, que exigem elevação de capital para operações de crédito (prudencial) e elevação do compulsório (macro), prejudicam o lucro do sistema financeiro e por isso são repudiadas.

Há ainda a possibilidade de que os especuladores externos atraídos pela Selic usem outras vias não sujeitas à incidência do IOF de 6%. Entre elas os investimentos estrangeiros diretos (IEDs), que não são fiscalizados pelo BC nas suas aplicações. Isso aprecia mais ainda o real, barateando as importações, o que serve ao controle inflacionário e prejudica a competitividade das empresas e as contas externas.

Recentemente têm surgido avaliações ponderando que pode ocorrer uma acomodação natural da demanda por causa da perda do poder aquisitivo das classes de rendas média e baixa com a inflação, comprometimento com prestações de compras anteriores e reduções de consumo em razão da elevação dos preços do etanol e da gasolina.

Fato é que inflação reduz a demanda, pela perda de poder aquisitivo na base da pirâmide social, e, consequentemente, o crescimento e, em seguida, a própria inflação. Isso antecede a elevação de preços nos reajustes contratuais e outros relativos a serviços, o que diminui os efeitos da indexação. Por outro lado, o crescimento reduz a incidência relativa do componente indireto de custos das empresas, o que permite preços melhores para as mesmas margens de comercialização. Em adição, a partir de maio os preços do álcool e da gasolina deverão refluir, o mesmo ocorrendo com os fatores sazonais que elevam a inflação no 1.º quadrimestre do ano.

Assim, o mais indicado seria o governo ter a serenidade de observar o cenário externo, que está volátil, e os efeitos das medidas já adotadas para o controle da inflação e do crescimento econômico, que a meu ver não se opõem. Mas, segundo as últimas notícias, parece que não irá resistir ao desgaste político da inflação e poderá sacrificar o crescimento neste ano, deixando dar sequência ao processo de valorização cambial para facilitar as importações. A conferir.

Mestre em Finanças Públicas pela FGV e consultor

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

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