domingo, 1 de maio de 2011

Programa de segurança de Dilma não sai do papel

Principal projeto de combate à violência tem corte de R$ 1 bilhão

Apesar de ter passado a campanha eleitoral prometendo priorizar a segurança, a presidente Dilma Rousseff não apenas não tirou do papel as promessas como cortou fortemente o orçamento da área. Só o Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci) perderá R$ 1,028 bilhão este ano, ou 47% do previsto. O investimento feito nestes quatro primeiros meses de gestão Dilma é inferior ao executado no mesmo período do ano passado. A criação dos postos de polícia comunitária e a modernização de cadeias, por exemplo, são projetos que ainda não receberam qualquer investimento. Apontado como solução para o patrulhamento de fronteiras, o projeto Vant (veículo aéreo não tripulado) também não decolou. O governo alega que a política para o setor foi replanejada.

Investir em segurança ficou só no discurso

Pronasci terá R$ 1 bi a menos este ano, e programas não saem do papel

Fábio Fabrini e Jailton de Carvalho

BRASÍLIA - Contrariando o discurso de campanha, que alardeou mais participação federal na segurança pública, o governo Dilma Rousseffainda não tirou do papel suas promessas para a área. Com os cortes orçamentários, os investimentos para o combate ao crime minguaram eprojetos amplamente explorados na corrida eleitoral não avançaram após quatro meses de gestão. Principal meio de colaboração com estados e municípios, o Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci) terá menos R$ 1,028 bilhão este ano, o que corresponde a 47% do previsto. Não por acaso, as despesas foram 28,5% menores de janeiroa abril, em comparação com o mesmo período de 2010. O Orçamento prevê R$ 2,1 bilhões para o

Pronasci, mas a secretária nacional de Segurança Pública, Regina Miki, admite que o Ministério da Justiça terá só R$ 1,25 bilhão para bancar as atividades do programa este ano. Até agora, foram aplicados R$ 279,7 milhões, ante R$ 391,2 milhões no primeiro quadrimestre de 2010. Quase 40% do montante são de restos apagar, ou seja, compromissos assumidos em anos anteriores, mas só quitados agora. Os dados constam do Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi). Projetos de orçamento vultoso permanecem sem investimento algum, a exemplo daimplantação de postos de polícia comunitária, cuja previsão original era de receber R$ 350 milhões até ofim do ano; e damodernização de cadeias, que poderia consumir até R$ 20 milhões. Outras ações tiveram execução mínima. O apoio à construção de estabelecimentos penais especiais, por exemplo, mereceu até agora R$ 230 mil, de um total de R$ 50 milhões inscritos no Orçamento.

Efeitos do corte já são sentidos nos estados

Os estados já sentem os efeitos da tesoura. Em Minas, os convênios firmados com o ministério em 2010 continuam sem verba. OEspírito Santo, que amarga uma das maiores taxas de homicídio do país, aguarda o repasse de cerca de R$ 1 mi lhão para construir uma nova Delegacia de Tóxicos e um Centro de Instrução para os bombeiros, conforme acordado desde o ano passado. O secretário de Defesa Social do estado, Henrique Herkenhoff, diz que bateu à porta do ministério,mas ouviu que a prioridade são os projetos inscritos no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

— Informaram que as verbas do Pronasci estão contingenciadas para este ano — lamenta, acrescentando que, sem colaboração, o jeito é tocar as atividades por conta própria:

— Estamos investindo dentro das nossas possibilidades. Mas, se a União ajudasse, conseguiríamos fazer mais rapidamente. Apesar dos cortes, ogover- no capixaba pretende continuar inscrevendo projetos no Pronasci, tendo em vista os desafios para a segurança no estado.

— Ootimismo éo último que morre —justifica o secretário.

A máxima “fazer mais com menos”, explorada pelo governo, por ora não vale para o Bolsa Formação, braço do Pronasci que dá ajuda financeira a profissionais de segurança. No Rio, segundo a Secretaria de Estado de Segurança Pública, o corte nos repasses “impactou significativamente” o projeto. O montante aplicado caiu de R$ 50,2 milhões para R$ 38,4 milhões (23%) nos primeiros quatro meses de 2011, em comparação com o mesmo período de 2010. Com isso, menos gente foi atendida: o número de beneficiários por mês variou de 17,7 mil a 28,4 mil; no ano passado, de 29,4 mil a 32,7 mil. A secretaria também teve de extinguir o módulo Olimpíada do projeto, voltado para a preparação dos profissionais com vista ao evento esportivo, que poderia atender 45 mil profissionais, ao custo de R$ 280 milhões.

Vant ainda não decolou, apesar das promessas

Em fevereiro, o governo chegou a publicar portaria impondo limite de beneficiários por estado e por categoria profissional. Diante da pressão dos estados, voltou atrás e revogou a mudança, mas manteve regras para ajustar o projeto à realidade orçamentária. Uma nova portaria, publicada em março, diz que as bolsas serão distribuídas por categoria e por estado, “respeitadas as disponibilidades orçamentárias”. Os profissionais cujos benefícios venciam antes podiam pedir a renovação em qualquer mês, mas agora precisam esperar o ministério abrir inscrições, uma vez por ano.

— Abolsa de muitas pessoas vai expirar até dezembro e elas vão ter de esperar . Algumas já a perderam.Muita gente conta como dinheiro para alimentação e complemento da educação dos filhos —afirma Aarão José da Silva, gestor es-tadual do Bolsa Formação em Alagoas. A secretária Regina Miki argumenta que a Política Nacional de Segurança Pública foi re- planejada nos primeiros meses de governo.

Por isso, a execução orçamentária de programas como o Pronasci não foi “tão alta”. Segundo ela, o foco das ações, a partir de agora, será a redução de homicídios, o combate ao tráfico de drogas e o patrulhamento de fronteiras. Omecanismo de repasse de verbas também vai mudar. A exemplo do que ocorre com o PAC, serão lançados editais de habilitação para estados e municípios apresentarem seus projetos, que serão selecionados conforme as três prioridades. Nos próximos dias, a nova política deve ser apresentada à presidente Dilma. A promessa é criar um sistema de informações de homicídios, alimentado pelos estados, que ajudará a diagnosticar problemas e identificar desafios.

—Em 15 dias, deve sair o primeiro edital— adianta Miki, que relativiza as limitações de caixa: — Nem sempre o orçamento se traduz em boas políticas públicas. Se ele é menor, temos de otimizar os recursos. O corte no orçamento do Ministério da Justiça também atingiu o Projeto Vant (Veículo Aéreo Não Tripulado), uma das prioridades anunciadas pela presidente Dilma durante a campanha eleitoral. O primeirodos 14 Vants que a Polícia Federal planeja comprar chegou ao país em março, mas está parado num hangar emSãoMiguel do Iguaçu. Pela previsão do governo, até setembro não há condições de o avião decolar. Ele está parado por falta de combustível e de um caminhão usado no transporte terrestre da aeronave. O projeto, orçado em R$ 655 milhões, foi apresentado, durante a campanha eleitoral, como um marco do uso da tecnologia para se intensificar a fiscalização das fronteiras contra o narcotráfico, ocontrabando e otráfico de armas, entre outros crimes. A proposta era vista como uma tentativa do governo de chamar para si o comando das grandes operações de combate àviolência urbana apartir

de ações em áreas remotas do país. Mas, depois de chegar ao Brasil com quatro meses de atraso emrelação à previsão inicial, o Vant deve permanecer ainda um longo tempo sem uso prático.

—Faz tempo que não vejo uma situação como essa. O corte no orçamento tem atrapalhado demais. Não tem dinheiro para nada — reclama um dos superintendentes da

Polícia Federal. O corte também atingiu diárias, compras de passagens e todo o custeio da estrutura da polícia. Segundo um delegado, o efeito da crise financeira é geral. Algumas superintendências já estariam sofrendo com atrasos nos pagamentos das contas de telefone, energia elétrica, combustível e aluguel de prédios. O delegado entende que oarrocho terá reflexos ainda mais fortes nas grandes operações de combate à corrupção nos próximos seis meses, períodomínimo dematuração de uma importante investigação criminal.

— A PF está praticamente parada. Acredito que 80% das operações já estão prejudicadas. A única coisa que anda são os inquéritos, que não precisam de dinheiro. Basta ao delegado

sentar à mesa e despachar — afirma o presidente do Sindicato dos Policiais Federais do Distrito Federal, Jones Borges Leal. A partir das regras estabelecidas pela equipe econômica, a Polícia Federal terá que cortar este ano R$ 83 milhões em gastos com diárias ao longo deste ano. O valor cor- responde a 25% da média anual de despesas da polícia com o deslocamento de policiais. Os sindicalistas reclamam também do esvaziamento das grandes operações. Segundo eles, a última investigação de impacto foi a Operação Caixa de Pandora, lançada em novembro de 2009. Para os sindicalistas, a Polícia Federal tem se retraído. A assessoria de imprensa da PF confirma que o primeiro Vant a chegar ao país está parado em São Miguel do Iguaçu. A PF diz que vai abrir licitação para a compra do caminhão necessário para otransporte em terra da aeronave. Afirma tambémque o combustível para o Vant será comprado a partir do contrato de fornecimento geral de combustível para a instituição e não mais em contrato exclusivo para os aviões não tripulados. OMinistério da Justiça sustenta que oVant entrará em ação em setembro.

FONTE: O GLOBO

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