sexta-feira, 1 de julho de 2011

FH recebe homenagem suprapartidária

Petista elogia o tucano, mas críticas de Serra a Dilma destoam na festa pelos 80 anos do ex-presidente

Adriana Vasconcelos, Isabel Braga e Gerson Camarotti

BRASÍLIA. A festa preparada pelo PSDB para comemorar os 80 anos do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso reuniu caciques de praticamente todos os partidos, ontem, no Congresso. Líderes petistas e um ministro do governo Dilma Rousseff prestigiaram o evento, que teve como mestre de cerimônias a atriz Fernanda Montenegro. Mas o que era para ser uma homenagem suprapartidária acabou tendo momentos de constrangimento pelo tom belicoso do ex-governador José Serra ao criticar o governo petista. E que contrastou com o agradecimento emocionado de FH à carta recheada de elogios enviada por Dilma:

- Confesso, fiquei muito feliz com a carta da presidente Dilma, porque senti neste gesto não um gesto político, no sentido comum, mas de dizer que somos brasileiros e temos que nos entender. E que não vale a pena um destruir o outro, porque isso não leva a nada. Por que não construir juntos? E construir juntos não é aderir, é o debate aberto.

Pouco antes, ao destacar a trajetória de FH e de classificá-lo como o "Fred Astaire" da política, Serra já havia deixado o homenageado e parte da plateia constrangidos ao criticar o que chamou de aparelhamento do Estado pelo PT.

- Ninguém tem condições de competir com o PT, com a força do aparelhamento do Estado. Fernando Henrique jamais, para exaltar a própria obra, desqualificou a obra do adversário. Jamais incentivou a intolerância e buscou dividir o pais. Sempre foi exemplo de decoro, de coragem, de delicadeza. Nunca condescendeu com o mal feito para privilegiar aliados, nem passou a mão na cabeça de aloprados - disparou Serra, que no fim da festa mostrou preocupação:

- Eu não estava mal humorado não, né?

Já o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), começou o discurso chamando FH de amigo e destacou que sua presença poderia surpreender a muitos por sua filiação partidária.

- Podemos ter divergências, às vezes de fundo, de conteúdo, mas mesmo nas divergência sejamos capazes de reconhecer a história e os valores defendidos pelos homens de bem deste país. Vossa Excelência é um homem de bem deste país, construiu sua história nesta perspectiva - disse Maia, finalizando: - Vossa Excelência tem muita responsabilidade de estarmos vivendo num país verdadeiramente democrático.

Ainda se recuperando de uma queda de cavalo, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) gravou um vídeo em que destacou as qualidades de Fernando Henrique e pediu a ajuda dele para que o PSDB volte ao poder:

- Estamos resgatando a verdade. É hora de fazer a nova travessia do Brasil, onde ética e política sejam complementares.

Amigo e ex-ministro de FH , do governo Lula e atual ministro da Defesa de Dilma, Nelson Jobim enalteceu a capacidade de Fernando Henrique de ouvir, sem nunca levantar a voz e criar tensão entre os que o assessoravam. Além de demonstrar saudosismo em relação ao estilo do ex-presidente, o ministro deu a impressão de se queixar do temperamento forte e do tom rude com que, às vezes, a presidente Dilma se dirige a assessores.

- Talvez as características mais marcantes de você sejam a tolerância e o bom humor. Mesmo nas maiores dificuldades que passamos durante seu governo, nunca levantou a voz para ninguém, nunca disse nada que levasse qualquer um de seus assessores ao constrangimento. Só os inseguros são autoritários - disse Jobim.

FH foi recebido no gabinete do presidente do Senado José Sarney(PMDB-AP), onde o vice-presidente da República, Michel Temer, o aguardava. O ex-presidente esclareceu mais uma vez que havia assinado sem ler o projeto do sigilo eterno dos documentos oficiais.

Políticos que apoiaram FH também estiveram presentes, como o presidente do PTB, Roberto Jefferson, e o ex-governador Joaquim Roriz.

Outros petistas compareceram, como o deputado Arlindo Chinaglia (SP), o líder do partido na Câmara, Paulo Teixeira (SP), e os senadores Eduardo Suplicy (SP) e Delcídio Amaral (MS).

'Só quero ser amado e amar'

Ex-presidente esbanja bom humor e fala dos caminhos do país

BRASÍLIA. Fernando Henrique Cardoso mostrou ontem estar vivendo um ótimo momento. Com bom humor, não se limitou a agradecer o carinho que vem recebendo nas comemorações de seus 80 anos. Embora comovido com alguns elogios, feitos inclusive por adversários políticos, o ex-presidente tucano aproveitou a oportunidade para fazer uma reflexão sobre os novos desafios do país após a consolidação da democracia e de iniciar uma trajetória de crescimento econômico, pontos que, segundo ele, chegaram a ser uma obsessão de sua geração.

- Esse é o desafio que temos pela frente, de criarmos uma sociedade mais decente, onde as pessoas se sintam mais seguras, vejam futuro para seus filhos. Ainda é um desafio chegar a um Brasil onde todos se sintam partícipes. Nos slogans existe, na prática ainda não - advertiu.

E num recado indireto à presidente Dilma, que tem enfrentado problemas com sua ampla base no Congresso, Fernando Henrique sugeriu que talvez o melhor caminho seja retomar a política do convencimento.

- É preciso voltar ao tempo da política do convencimento, do debate respeitoso. Quem sabe encontre aqui ou acolá ponto de convergência. Eu me esforcei muito para mudar muitas coisas no Congresso. Mas sempre dialoguei o tempo todo, ativamente, para convencer - aconselhou.

Fernando Henrique fez também um alerta ao Legislativo sobre a necessidade de se garantir uma integração política maior das chamadas classes emergentes, ainda não representadas.

- Teremos que ouvir as vozes que não conseguem chegar aqui. Esse é novo desafio para fazer com que as novas camadas que estão chegando possam participar da vida institucional - observou.

Fernando Henrique esbanjou bom humor e vitalidade nos agradecimentos às homenagens que vem recebendo.

- Às vezes eu me pergunto se já morri, pois no Brasil só se fala bem quando morre, sensação estranha - brincou.

Aos 80 anos, ele disse estar vivendo uma espécie de renascimento.

- A esta altura só quero uma coisa: ser amado e amar. Eu amo vocês, sou amado, sou feliz.

Colaborou: Adriana Vasconcelos e Cristiane Jungblut)

FONTE: O GLOBO

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