domingo, 21 de agosto de 2011

Até onde vai a faxina para varrer a corrupção?


ESCÂNDALOS EM SÉRIE

Brasileiros de diferentes setores são unânimes em dizer que Dilma precisa do apoio da sociedade para desmontar esquemas no governo

A faxina iniciada pela presidente Dilma Rousseff para reduzir os focos de corrupção no governo federal tem sido creditada pela sociedade, em parte, a um traço de personalidade da presidente. Há quem identifique nela uma intolerância maior em relação à corrupção em comparação ao antecessor, Luiz Inácio Lula da Silva.

Mas ninguém nutre expectativas de que, sozinha, Dilma conseguirá seguir muito além do que já foi, desmontando esquemas de corrupção alimentados pelo loteamento político da máquina pública. Até porque muitos dos partidos que a apoiam são contra a faxina.  

Silvia Amorim e Carolina Benevides

- A sociedade tem que apoiá-la ou ela não conseguirá governar - opina Ney Matogrosso.

Na terça-feira que vem, a Frente Suprapartidária Contra a Corrupção e a Impunidade, lançada semana passada por um grupo de senadores que apoiam a faxina, fará um ato no Congresso para receber apoio de diversas entidades.

"Dilma tende a se isolar se a sociedade não apoiá-la. Não sei até que ponto (a faxina e a mobilização dos senadores) é briga política, mas quando os movimentos sociais eram fortes, a pressão da sociedade fazia com que o Congresso tomasse determinada atitude. Se as universidades, a OAB, a ABI, os sindicatos e os estudantes se manifestarem, esse movimento pode não ser só a luta pelos interesses de determinado grupo, mas pode pressionar os políticos que nos representam. As novas mídias também podem ajudar" - Adauto Novaes, filósofo

"Isso precisa ser feito, mas sou pessimista se não forem adicionadas novas medidas institucionais para deixar de ser algo voluntarista, que dependa da personalidade deste ou daquele presidente. Seria algo equivalente à operação Mãos Limpas que ocorreu na Itália. Uma das coisas que eu acho que a Dilma precisa fazer é ter um discurso nessa direção. Dizer que a partir de agora vamos tomar várias medidas de combate à corrupção que visem à montagem e ao fortalecimento de instituições que façam isso. Por exemplo, termos na Justiça equipes com juízes e promotores aparelhadas para só fazer investigação desse tipo. O voluntarismo é bom, mas se ficarmos dependendo deste ou daquele presidente nada vai adiante. Não acho que ela esteja jogando para a plateia. Isso é uma coisa que vem dela." - Alberto Carlos Almeida, Cientista político e autor do livro "A cabeça do brasileiro"

"O Brasil não tem tradição no combate à corrupção, e a postura da presidente causa boa impressão. A Polícia Federal gasta 23% do tempo investigando corrupção e 15%, tráfico de drogas. Estão presos, no Brasil, menos de 80 corruptos; presos por tráfico são 135 mil. Estou otimista, mas os resultados não dependem apenas dela. O combate à corrupção deve ser praticado com envolvimento compartilhado dos Poderes. A polícia tem que ser mais bem estruturada. A Justiça deve sair da catalepsia." - Odilon de Oliveira, juiz federal que combate o tráfico de drogas em Mato Grosso do Sul

"Nossa obrigação é apoiar. O Congresso fez a vida inteira de um jeito, os políticos acham que estão imunes. Pode até ser que a presidente erre em algum momento. Mas acho excelente que a casa comece a ser arrumada. Vejo com bons olhos, acho saudável esse movimento, como um recado que diz: não é mais assim que a banda toca, não é como você pensa que é. - Marina Person, cineasta

"A presidente Dilma sempre esteve muito perto da corrupção. Não se sabe se por vontade própria ou devido ao contexto político do governo anterior. Também não se sabe se a atual faxina partiu dela ou se resulta da atuação independente da Polícia Federal. Seja como for, o tamanho e a profundidade da sua faxina vão nos dar uma medida do peso que a ética e o jogo político tradicional têm nas suas decisões. - José Padilha, cineasta

"Mesmo que a opinião pública fracasse, o governo tem a obrigação de combater a corrupção. Não podemos depender só da opinião pública, ainda que toda manifestação que cobre mudanças seja benéfica. Nós temos leis. No mais, se Dilma continuar a faxina, terá sua ação facilitada. Vai ganhar respeito e autoridade. - Célio Borja, jurista e ex-ministro da Justiça

"A faxina da Dilma é inesperada, ter coragem para realizá-la é inesperado, mas também uma questão delicada. Não tenho certeza ainda do que isso pode representar, mas a sociedade tem que apoiá-la ou ela será destruída e não conseguirá governar. Afinal, o Congresso não está muito satisfeito com o rumo das coisas. O que tem acontecido (o combate à corrupção) é positivo porque tinha que ser feito em alguma hora. Ou continuaríamos como no governo Lula, que fez acordos com muita gente e aí precisava fingir que não via. - Ney Matogrosso, cantor

"A democracia é praticada no civismo, o ano inteiro, e não só na eleição. A democracia não está circunscrita só aos políticos. Essa faxina, esse movimento de combate à corrupção deve mostrar a união cívica de todos os brasileiros, acima das ideologias partidárias. O Brasil tem um problema amplo de corrupção. A pressão da opinião pública é importante. - Jorge Mautner, cantor, compositor e escritor

"Sou cético. Meu pensamento é grego clássico: "políticos aprenderam com os sofistas retórica e corrupção". Não acho que todo mundo que está lá está roubando. Tem gente séria, incluindo Dilma. Tenho fé nela. Não que ela vá resolver, mas vai ser mais difícil roubar com ela. Vejo austeridade no governo, mas me desmotivam o Congresso e a Justiça. A faxina pode se dar em torno da Dilma, mas e no Congresso? A vassoura da Dilma não atravessa a praça, a rua." - Gabriel Vilella diretor de teatro

FONTE: O GLOBO

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