quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Alimentos fazem inflação bater recorde de seis anos

Os alimentos voltaram a ser vilões do custo de vida. O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), da meta do governo, ficou em 0,37% em agosto e, em 12 meses, acumula 7,23%, o maior em seis anos. O limite para o IPCA é de 6,5% no ano. Com o resultado, economistas subiram o tom das críticas à redução de 0,5 ponto na taxa básica de juros, decretada pelo Banco Central. Os juros menores podem colocar mais lenha na inflação, argumentam analistas. Entre as maiores altas estão o chuchu, que subiu mais de 70% este ano. Ficaram mais caros também serviços como cursos de natação, ginástica, aluguel, asilo e até ingressos para jogos

A maior inflação em seis anos

Alimentos fazem IPCA subir para 7,23% em 12 meses, bem acima da meta

Henrique Gomes Batista

A inflação voltou à mesa: depois de dois meses comportados, os preços dos alimentos subiram 0,72% e foram os principais responsáveis pela aceleração do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA - índice oficial do governo) que chegou a 0,37% em agosto, no topo das expectativas dos analistas, conforme divulgou ontem o IBGE. Com esse resultado, o índice acumula alta de 7,23% em 12 meses, maior taxa em seis anos. Assim, a inflação se distancia cada vez mais da meta do governo, que mirava 4,5% em 2011, podendo chegar, no máximo, a 6,5%. Analistas já estimam que este valor será ultrapassado, o que reforça a análise de que não se justifica tecnicamente o corte em 0,5 ponto percentual que o Banco Central (BC) fez na taxa básica de juros (Selic), que foi reduzida para 12% ao ano na semana passada.

Mas o governo anunciou ontem o adiamento da elevação do IPI para os cigarros, o que significa um alívio para inflação. O aumento na tributação faria o preço do cigarro subir 20%. Segundo especialistas, a medida pode representar um corte de até 0,2 ponto percentual do IPCA no ano. Isso pode ser a diferença entre fechar o ano dentro da meta. As projeções estão girando entre 6,3% e 6,7% para 2011.

- Mas joga essa inflação para 2012. O fato é que o IPCA de agosto não surpreendeu, venho em linha com o que as pessoas esperavam. A inflação vai continuar rodando acima do centro da meta, mais perto do teto de 6,5% ao ano - afirmou o professor da PUC, Luiz Roberto Cunha, que acredita que a decisão do BC na semana passada em cortar o juros incluiu uma meta de crescimento, além da inflação: - Nos EUA há meta de inflação e empregos, acho legítimo ter a meta de crescimento, mas isso tinha de ser explícito, para ampliar o debate.

Metade do IPCA veio dos alimentos

Eulina Nunes, coordenadora do Sistema de Índice de Preços do IBGE, afirmou que o número de agosto interrompe uma série de dois anos de variações baixas nos meses de junho, julho e agosto:

- A inflação mais que dobrou de junho (0,16%) para agosto (0,37%). No mês, os alimentos voltaram a puxar a inflação e o grupo, sozinho, representou 45% do índice. Houve alta no arroz, no feijão, na carne, no frango. A refeição típica do brasileiro.

Ela afirma que a alta dos alimentos tem diversas causas, como custo maior - caso de açúcar e carne, já que é o momento é de entressafra da carne e houve quebra de safra do milho nos Estados Unidos, grão que serve de ração - e crescimento da demanda.

No ranking dos alimentos que mais subiram de preço no ano, está o chuchu, com alta de 70,84%. Em seguida, estão tomate (43,48%), pimentão (32,65%) e brócolis (29,54%).

Na avaliação de Eduardo Velho, economista da Prosper Corretora, os preços dos alimentos não devem ceder nos próximos meses. A cotação de commodities, mesmo em queda, ainda estão num patamar elevado. No atacado, produtos agropecuários saíram de -0,31% para 1,64%, segundo o IGP-DI da Fundação Getulio Vargas.

- Os preços seguem firmes no atacado e isso certamente chegará ao varejo - disse Velho, acrescentando que a inflação de setembro e outubro será mais elevada do que se viu em agosto. - Puxado por alimentos (que devem subir 1%) o IPCA deste mês deve variar 0,44%.

O antropólogo Lenin Pires, de 47 anos, percebeu claramente a alta de preços. Ele prefere peixe, mas que não pode deixar de comprar carne. No ano, o produto :já subiu 17,10%.

- Deixei de comprar filé, que virou coisa rara, para comprar maminha e alcatra. Costumava gastar cerca de R$20,00 pelo filé, agora não sai por menos de R$25, R$30.

Para o economista Alex Agostini, da Austin Rating, o IPCA de agosto não trouxe surpresas, pois veio no teto das expectativas, mas reforçou a análise de que a pressão nos preços continua forte e que não se justifica a queda de juros. Ele estima que a Selic cairá para 11% ao ano em dezembro e fechará 2012 em 9% ao ano:

- Não há convergência para a meta nem em 2012, nem em 2013. A inflação de serviços continua pressionada e deve haver altas nos alimentos.

O professor Gilberto Braga, do Ibmec, lembra que a alta da inflação foi concentrada em alimentos, com forte impacto social. O INPC - que registra a inflação para famílias com renda de até seis salários mínimos - subiu para 0,42% no mês e acumula alta de 7,40% em 12 meses. O IPCA também registrou alta de 2,38% nos eletrodomésticos em agosto, após queda de 0,32% nos preços em julho. Para Eulina, do IBGE, isso é reflexo da alta dos preços do aço.

Mas a alta de preços não é um fenômeno só do Brasil. Dados da Consultoria Tendências e da FGV mostram que sete de dez países emergentes que têm metas de inflação estão com índice de preços superiores à meta, incluindo México, China e Rússia.

- Essa situação ocorre em muitos países emergentes, mas vemos que, mesmo com maior pressão inflacionária, os governos estão mais cautelosos, mantiveram as taxas de juros nas últimas decisões - afirmou a professora Lia Valls, da FGV.

IPI adiado para conter inflação

O aumento do cigarro, mais uma pressão inflacionária este ano, ficou para 2012. O governo federal adiou para o início do ano que vem o aumento de imposto sobre o cigarro. As empresas do setor pediram mais tempo ao Ministério da Fazenda para se adaptarem às novas regras anunciadas em agosto, que vão desde a criação de um preço mínimo até a mudança do modelo de cobrança dos tributos. No geral, a alíquota do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) passou de 25% para 45%. Assim a carga tributária total sobre o produto vai variar entre 72% e 81%. As novas alíquotas, que vão entrar em vigor em janeiro ou fevereiro, serviram para compensar as desonerações previstas na política industrial Brasil Maior. O secretário-executivo da Fazenda, Nelson Barbosa, admitiu, porém, que a medida também transfere o impacto que poderia haver na inflação deste ano para 2012.

- Esse beneficio adicional também justifica a adoção da medida.

Colaboraram Gabriela Valente e Fabiana Ribeiro

FONTE: O GLOBO

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