quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Fase perigosa:: Míriam Leitão

O economista-chefe do FMI, Olivier Blanchard, resumiu numa frase o dilema do momento: "O ajuste fiscal dos países não pode ser tão rápido que mate o crescimento, nem tão devagar que mate a credibilidade." O FMI não sabe mais o que sugerir. O relatório divulgado ontem conta que tudo piorou muito na economia mundial e revê para baixo o crescimento de todos os países.

O Fundo não sabe se quer que os governos reduzam os déficits ou se prefere que mantenham o crescimento, mesmo que isso signifique gastos maiores. Confuso, fez essa proposta em cima do muro. Quando as crises aconteciam na América Latina, como nos anos 1980; na Ásia, como nos anos 1990; ou quando aconteciam em um país específico, como na Argentina em 2002; o Fundo parecia mais seguro. Agora, quando a crise atinge o coração do que eles chamam de "economias avançadas", o FMI parece confuso no diagnóstico e nas receitas que oferece.

Sempre em setembro a instituição divulga a revisão das suas perspectivas econômicas para o ano corrente e o seguinte. No "World Economic Outlook" divulgado ontem ficou claro que a previsão de crescimento caiu em todos os países, para 2011 e 2012. O Brasil vai crescer apenas 3,8% este ano e 3,6% no ano que vem, este é o segundo pior desempenho na América Latina. O Brasil vai crescer menos do que a média de 4,9% para a região e menos que a média mundial nos dois anos.

A Itália é o país que teve a queda mais pronunciada para o ano que vem: menos um ponto percentual. Vai crescer apenas 0,3% em 2012. Noves fora: nada. O crescimento da Alemanha no ano que vem ficará 0,7 ponto percentual menor do que o previsto. Vai ser de apenas 1,3%. Isso preocupa porque a Alemanha é que estava mantendo o crescimento da Europa. Blanchard explicou que apesar de tudo isso não espera recessão para os Estados Unidos, mas sim um crescimento mais fraco, de 1,8%.

O que aconteceu desde o começo do ano para cá foram eventos que desestabilizaram a economia mundial colocando-a numa "fase perigosa", na expressão usada pelo FMI. Houve alguns inesperados, como o terremoto no Japão. Na economia, ele não é visto pela tragédia humana que provocou, mas sim pelo fato de ter afetado cadeias produtivas e jogado o país na recessão. O levante político em alguns países árabes é outro inesperado. Para a economia, a revolta no mundo árabe é vista apenas pelo lado negativo. Não é o fim de ditaduras, nem a chance de um novo começo para os povos da região, mas sim uma instabilidade que atingiu os preços do petróleo.

Houve também decepções. A economia americana, que parecia estar se recuperando, deu meia volta e começou a desacelerar. O ritmo dessa mudança de marcha foi inicialmente subestimado. Ela atinge principalmente a falta de confiança dos consumidores. A Europa não está conseguindo encontrar uma solução para a crise da dívida de alguns dos seus países. Segundo disse o economista-chefe do FMI na entrevista: "os mercados estão céticos sobre a capacidade de alguns governantes de estabilizarem o nível da dívida pública."

Quando se olha o número da previsão de crescimento, o cenário não parece tão mal. O mundo vai crescer 4% este ano e 4% no ano que vem, pelas previsões do Fundo. O problema é que isso é média: 1,6% nas economias avançadas; 6,4% nas economias emergentes.

Uma parte do baixo desempenho dos países dito avançados vem dos enormes déficits públicos e do crescimento forte das dívidas. O baixo crescimento é em parte alimentado pelo desequilíbrio fiscal; mas o desequilíbrio fiscal alimenta o baixo crescimento, informa o FMI.

Diante disso, fazer o quê? O Fundo, no fundo, não sabe. Sobre a Itália que acaba de ser rebaixada, o FMI diz que o ajuste fiscal do país conseguirá inverter a curva de crescimento da dívida em 2013. Sobre as políticas monetárias de cada país, o FMI diz que é hora de "parar para ver". Sobre o Brasil, o que se explica é que a redução da taxa de juros apesar da inflação em alta será compensada por uma política fiscal apertada.

Ontem mesmo o IPCA-15 trouxe outra má notícia. Ficou acima do esperado para o mês. Com isso, a inflação em 12 meses foi para 7,33%. Esse índice deve ser confirmado no IPCA do mês. O que significa que a inflação continuou subindo em setembro, apesar de o governo ter previsto que a partir deste mês ela começaria a cair. A esperança foi adiada para outubro. Segundo o economista Luiz Roberto Cunha, ainda há possibilidade de o índice cair para 6,5% até o fim do ano. A inflação terá que ficar em torno de 0,4% a 0,5% ao mês até dezembro para bater na trave: ou fica no teto máximo da meta ou então estoura ligeiramente a meta.

Alimento até não subiu muito no índice divulgado ontem, em que o vilão foi a tarifa aérea. O problema é que a partir de agora os alimentos começam a subir por causa da sazonalidade, e o dólar em alta não ajudará mais a inflação; pelo contrário. O Brasil apesar de ser do grupo dos emergentes, começou a crescer cada vez menos e com inflação subindo.

E o que o FMI tem a dizer sobre tudo isso é que o mundo entrou agora numa fase perigosa, e pede que os governos cooperem para encontrar uma solução.

FONTE: O GLOBO

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