quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Para analistas, loteamento político é o problema

Avaliação é que, apesar de ser herança do governo Lula, Dilma está conseguindo se descolar dos escândalos

Flávio Freire e Sérgio Roxo

SÃO PAULO. Cientistas políticos acreditam que a queda de Pedro Novais da pasta do Turismo, quarto ministro envolvido em irregularidades na atual gestão, é resultado da política de alianças baseada em loteamento de cargos do governo da presidente Dilma Rousseff (PT). Eles avaliam também que a sucessão de denúncias contra integrantes do primeiro escalão poderá mexer com a imagem da presidente, mas, ainda assim, não projetam uma queda imediata de sua popularidade.

- O eleitor logo pensa que foram tantos acordos com Deus e com o diabo, muito mais com o diabo, diga-se de passagem, que não poderia esperar uma administração sem os vícios do passado - avalia o cientista político Rubens Figueiredo, diretor do Centro de Pesquisa e Análise de Comunicação (Cepac).

Para Fernando Antônio Azevedo, professor de ciência política da Universidade de São Carlos (UFSCar), a demissão de Pedro Novais é "um indicador poderoso de que algo vai mal". Ele acredita que a grande quantidade de cargos de confiança do governo federal favorece a onda de escândalos

- O presidente nomeia 25 mil cargos, sendo que 1.600 com atribuição de manejar recursos. Isso abre uma brecha grande para a corrupção, ainda mais para uma cultura permeável como a brasileira. Só para comparar, nos Estados Unidos, o (presidente Barack) Obama nomeia 2.500 cargos.

Defesa de critérios técnicos

O cientista político Fernando Abrúcio, professor da Fundação Getúlio Vargas, afirma que, se a presidente não adotar medidas mais drásticas que as demissões, a situação tende a se manter do jeito que está.

- Mais do que a faxina, a agenda deve ser profissionalizar os ministérios - avalia o professor.

Abrúcio considera que, por um lado, a queda dos ministros revela um aparente processo de depuração política. Por outro, expõe ainda mais os problemas da gestão. Ele diz que a situação, que se arrasta há décadas, só terá eficácia quando a escolha de um ministro levar em conta não só sua ficha limpa, mas também critérios técnicos que atendam a demanda de cada pasta.

- Essas demissões mostram um lado positivo e negativo. No caso positivo, e não só para o governo, mas para o país, é que os partidos devem se dar conta de que precisam refletir melhor sobre a indicação. E, do ponto de vista histórico, mostra uma certa depuração política. Já o problema é que mostra a fragilidade de gestão, a qual permite justamente que ministros com essa qualificação assumam papéis tão importantes dentro do governo - afirmou o professor da Fundação Getúlio Vargas.

Ainda segundo Abrúcio, Dilma, no entanto, tem conseguido dar resposta positiva ao eleitor quando expurga do governo alguém marcado por denúncias de corrupção. Para ele, a pressa com que Dilma tem trabalhado nesses casos parece render dividendos na popularidade.

- Essa pressa com que Dilma tem procurado afastar essas pessoas tem sido apontada em pesquisas como um fator positivo para o governo. O eleitor pensa: quando surge um problema, ela (a presidente) estanca logo. E, se ela estanca logo, é boa presidente.

Rubens Figueiredo entende que as demissões mostram uma falta de conivência por parte do comandante sobre seus subalternos:

- Por muitos anos, o que se viu é que a roubalheira era institucionalizada e que quase nada era feito para acabar com isso. Agora, pelo menos, há aparentemente um movimento para acabar com isso e moralizar um sistema tão mal avaliado pelo povo.

Fernando Azevedo também acredita que a presidente não deve ter a sua popularidade muito abalada, porque ela conseguirá se descolar dos escândalos do governo.

- Temos que considerar vários fatores. Boa parte desses ministros do governo foi indicada pelo Lula (o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva). E ela (Dilma) também tomou a iniciativa de demitir ou pedir o cargo. Isso ficou associado com aquela expressão de faxina, que foi usada pela mídia, embora a expressão seja até inadequada, porque (a presidente) não faz (isso) sistematicamente, faz de forma reativa - afirmou o professor de ciência política da UFSCar.

Azevedo acrescenta que as últimas pesquisas de avaliação da presidente foram realizadas quando três ministros já tinham sido abatidos por escândalos e não indicaram grandes variação no desempenho de Dilma:

- Por isso, a queda do Pedro Novais não deve repercutir de forma dramática na avaliação da presidente.

De acordo com o professor da UFSCar, o desgaste político com os partidos da base no Congresso Nacional é que deve acabar sendo maior para Dilma Rousseff, apesar de o próprio PMDB ter reconhecido que a saída do ministro do Turismo era inevitável dadas as condições políticas

- É sempre um momento de tensão - afirmou.

Já na opinião do cientista político Amaury de Souza, os últimos episódios têm mostrado que o atual governo tem menos queda para a faxina que evocou nos últimos dias, e muito mais para um processo que beira a autodestruição:

- Esse caso (queda do ministro do Turismo) é de auto-faxina. O ministro é que se derrubou quando usou governanta e motorista pagos com dinheiro público. É ou não um caso de autodestruição?

FONTE: O GLOBO

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