segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Opinião do dia – Fernando Gabeira : a máquina estatal

(...) É fato que o uso da máquina do Estado turbina o crescimento dos partidos. Não é a única forma de crescer. Com essa prática a democracia se enfraquece, as eleições vão perdendo vida. Como vencê-las só com um candidato, um programa e uma equipe de governo? (...)

(...)Não somos uma República bananeira. Mas também não podemos ser uma República de laranjas. Esse processo de tomada da máquina estatal não é perverso apenas por desviar dinheiro de áreas necessitadas. É um processo cuja estratégia é a permanência no poder, reduzindo as chances de alternância democrática.

Não quero dizer com isso que o governo seja o culpado pela fragilidade da oposição. São poucos os políticos que se opõem claramente à ocupação partidária da máquina. No entanto, vivemos um momento claro de transição. As demandas sociais por mudanças políticas estão no ar, embora ainda neutralizadas por uma sensação de bem-estar com o crescimento econômico (...).

Fernando Gabeira, jornalista. E o vento levou. O Estado de S. Paulo, 28/10/2011.

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO
Dilma suspende repasses a ONGs e ordena devassa
Lula está animado para tratamento
Infraero desperdiça em obra no Galeão

FOLHA DE S. PAULO
Governo só investe 9% do aumento de impostos
Tratamento leva Lula a cancelar agenda até 2012
ONGs terão 60 dias para se regularizar ou restituir verba

O ESTADO DE S. PAULO
Dilma suspende pagamento a ONGs e manda rever contratos
Lula cancela viagens e inicia tratamento
Mais risco para ter o trem-bala

VALOR ECONÔMICO
Falta de estrutura trava licenciamento ambiental
Volta a pressão pela valorização do real
Software do Dnit é porta aberta a fraude
Dilma deve manter decisão do Congresso sobre royalties do petróleo
Plano vai definir novas concessões de aeroportos, diz Bittencourt

BRASIL ECONÔMICO
Mais de 75 % das compras do governo não têm licitação
Após disparar 17% em um mês, dólar desaba
G20 discutirá, enfim, o fluxo de capitais
Lula começa hoje luta contra o câncer

CORREIO BRAZILIENSE
Vem aí bafômetro que pega bêbado de longe
Lula teme perder a voz

ESTADO DE MINAS
Lula encara a primeira batalha
Ação pronta para julgamento
ONGs ficam sem dinheiro
Estabilidade está em jogo

ZERO HORA (RS)
Massacre em motos põe em debate revisão de lei
Câncer faz Lula cancelar viagens

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
Um mundo de 7 bilhões
Lula suspende viagens para iniciar tratamento

Dilma suspende repasses a ONGs e ordena devassa

Medidas, que têm prazo de pelo menos 30 dias, atingem todo o governo

Quatro dias após demitir Orlando Silva do Ministério do Esporte, por denúncias de repasses irregulares de verbas a ONGs ligadas ao PC do B, a presidente Dilma Rousseff suspendeu ontem, por 30 dias, todos os repasses de verbas federais para essas instituições. Em decreto, ela determinou uma devassa em todos os convênios firmados entre o governo e ONGs até 16 de setembro, quando foram criadas regras mais rigorosas para contratos dessa natureza. Dilma preservou do bloqueio programas de proteção a testemunhas, serviços do Sistema Único de Saúde (SUS) e convênios com histórico idôneo de pelo menos cinco anos. Se, em 30 dias, os órgãos não concluírem o pente-fino nos convênios, terão de instaurar processos financeiros, suspender os repasses por mais 60 dias e avisar a Controladoria Geral da União (CGU). Segundo o Tribunal de Contas da União (TCU), o governo federal repassou R$ 3,548 bilhões a ONGs só em 2010.

Pente-fino em contratos com ONGs

Dilma suspende repasses de verbas por 30 dias e ordena devassa em todos os convênios

Jailton de Carvalho

A presidente Dilma Rousseff assinou ontem decreto determinando uma devassa em todos os convênios firmados entre o governo federal e organizações não governamentais (ONGs) até 16 de setembro passado, quando foram estabelecidas regras mais rigorosas para contratos desta natureza. No mesmo despacho, ela decretou a suspensão por 30 dias dos repasses de verbas federais para essas instituições. Entidades civis sem fins lucrativos, as ONGs estiveram no centro dos escândalos que derrubaram os ex-ministros Orlando Silva (Esporte) e Pedro Novais (Turismo). Com a medida, a presidente busca se antecipar a novas denúncias em outras áreas do Executivo.

Dilma preservou do bloqueio contratos ligados a programas de proteção a testemunhas, serviços do Sistema Único de Saúde (SUS) e convênios com histórico idôneo de pelo menos cinco anos. Segundo o último balanço do Tribunal de Contas da União (TCU), o governo federal repassou R$3,548 bilhões para ONGs em 2010.

Pelo decreto, os gestores têm 30 dias para concluir as auditorias. O prazo começa a contar a partir de hoje, quando o texto será publicado no Diário Oficial da União. Os gestores deverão checar se o dinheiro público está sendo devidamente aplicado. Se surgirem indícios de irregularidades, deverão cobrar os valores desviados.

Caso não obtenham resposta, terão de instaurar processos financeiros, suspender repasses por mais 60 dias e avisar a Controladoria Geral da União (CGU). As auditorias da CGU podem resultar em demissões de servidores públicos, multas, devolução de verba desviada e inquéritos criminais.

Responsabilidade agora é de ministros

Após a primeira fase da auditoria, já no início de dezembro, as ONGs que passarem ilesas pela fiscalização voltarão a receber verba federal. Mas a retomada dos repasses dependerá de autorização prévia do "ministro de Estado ou do dirigente máximo da entidade da administração pública federal", diz o decreto.

O texto estabelece ainda que a decisão do ministro ou dirigente máximo "deverá ser devidamente fundamentada e precedida por parecer técnico que ateste a regularidade da execução do convênio, contrato de repasse ou termo de parceria avaliado".

Com esse detalhe, Dilma transfere para ministros e presidentes de autarquias a responsabilidade direta pelo bom andamento dos convênios. Com as regras antigas, ministros podiam culpar assessores, fiscais ou até a polícia por não coibirem fraudes.

A partir do resultado da fiscalização, caberá a ministros e presidentes de autarquias criar a lista de ONGs proibidas de fazer novos convênios financiados com verbas federais. A lista suja será exibida no Portal da Transparência, da CGU. A medida impedirá que ministros e gestores aleguem desconhecer o passado da ONG quando confrontados com histórico nada recomendável de algumas entidades que continuam recebendo verba pública.

Pela ordem de Dilma, o governo não poderá repassar dinheiro para ONGs acusadas de desvios, descumprir metas estabelecidas nos convênios ou mesmo deixar de prestar contas.

Na lista suja - sem direito a repasses e novos convênios -, deverão constar ainda ONGs comandadas por dirigentes ou ex-dirigentes de entidades acusadas de irregularidades. A medida pretende impedir multiplicação de ONGs dirigidas por pessoas com histórico de corrupção. Hoje, dirigentes de ONGs flagradas em desvios costumam criar novas entidades para driblar a fiscalização e manter os negócios com recursos federais.

Claudio Abramo, diretor-executivo da Transparência Brasil, ONG especializada na fiscalização de gastos públicos, vê com reservas o decreto. Para ele, há poucos fiscais diante do volume de ONGs e convênios a serem auditados no pente-fino de Dilma:

- É impossível. Não dá para fazer (auditoria) em todos os convênios. Tem de fazer por amostragem.

FONTE: O GLOBO

Governo só investe 9% do aumento de impostos

Elevação da carga tributária foi usada em gastos sociais e salários

Apenas 8,6% do aumento de impostos ocorrido de 1995 a 2010 se traduziu em novos investimentos públicos - isso significa que, de cada R$ 100 arrecadados a mais, só R$ 8,6 foram para gastos como construção de escolas e hospitais e melhorias em portos e estradas.

Os investimentos subiram R$ 56,9 bilhões nesse período, contra uma alta de R$ 661,6 bilhões na carga tributária, descontada a inflação.

Só 9% da alta da arrecadação é usada para investimentos

Nos últimos 15 anos, maior parte dos recursos extras cobriu gastos e salários públicos

A cada R$ 100 a mais na receita, R$ 8,6 foram para escolas, hospitais e obras, por exemplo, no período de 1995 a 2010

Érica Fraga

SÃO PAULO - Uma fatia pequena do aumento expressivo da carga tributária ocorrido desde meados da década de 90 se traduziu em novos investimentos públicos no Brasil.

De cada R$ 100 a mais em impostos arrecadados entre 1995 e 2010, apenas R$ 8,6 foram direcionados para elevar investimentos feitos pelo governo, como construção de escolas e hospitais, ampliação de portos e aeroportos e melhorias em estradas. A conta é do economista Alexandre Schwartsman, ex-diretor do Banco Central.

A elevação significativa da carga tributária nos últimos anos serviu principalmente para sustentar o aumento dos gastos correntes do governo, que incluem benefícios sociais e salários de funcionários públicos. "Nós aumentamos a carga tributária para gastar mais", afirma Schwartsman.

Os investimentos da chamada administração direta (incluindo governos federal, estaduais e municipais) cresceram R$ 56,9 bilhões entre 1995 e 2010, descontada a inflação. Esse aumento equivale a 8,6% dos R$ 661,6 bilhões a mais arrecadados. "O governo está tomando muitos recursos sob a forma de impostos e retribuindo muito pouco em investimentos", diz o economista Marcelo Moura, do Insper.

Moura ressalta que, em 2010, quase metade das despesas do governo federal foi direcionada a gastos sociais (como os programas de transferências de renda e a previdência social). Outros 25% cobriram gastos com servidores públicos e 6,8% se converteram em investimentos.

Segundo especialistas, essa divisão de gastos reflete, em parte, o fato de que a Constituição de 1988 amarrou parcela significativa do gasto público a despesas sociais, incluindo o regime de aposentadorias.

O foco na área social aumentou com os programas de transferência de renda adotados no governo FHC e ampliados na gestão Lula. Segundo o economista Mansueto Almeida, do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), nesse contexto, a política de valorização do salário mínimo -a qual muitos gastos estão atrelados- tem contribuído para elevar despesas do governo. "Isso acaba limitando o espaço para aumentar investimentos", afirma Almeida.

No segundo mandato de Lula, houve uma recuperação do investimento público. Segundo estimativas do economista Sergio Gobetti, secretário-adjunto de política econômica do Ministério da Fazenda, os investimentos da administração direta passaram de 1,66% do PIB em 2005 para 2,86% em 2010.

Mas, em 2011, os investimentos públicos voltaram a ser reduzidos para aumentar a fatia de recursos economizados para pagar juros da dívida (superávit primário).

Segundo especialistas, a estrutura do gasto público brasileiro limita o crescimento econômico do país. Schwartsman ressalta que é necessário aumentar o nível de investimentos -principalmente em infraestrutura para elevar a capacidade da economia se expandir sem que haja pressões extras sobre a inflação.

O difícil, segundo especialistas, é encontrar espaço para investir mais. Uma aposta do governo, segundo a Folha apurou, é que o aumento da renda do setor público com petróleo e mineração -em consequência de maior produção e possíveis ajustes de tributação - venha a ser usado para aumentar investimentos. Outra solução seria mudar a fórmula de reajuste do salário mínimo de forma a garantir aumentos acima da inflação, mas evitar situações como a de 2012, quando a elevação prevista é de aproximadamente 14%.

Isso ajudaria a limitar o crescimento dos gastos correntes do governo. Mas analistas e técnicos da equipe econômica acreditam que essa solução é inviável no curto prazo porque acarretaria um custo político grande.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Ministério favorece prefeitos do PC do B

"Esporteduto" beneficia 37% das cidades onde partido venceu eleição em 2008; taxa de atendimento é a maior entre todas as legendas

Daniel Bramatti

Mais de um terço das prefeituras comandadas pelo PC do B estão na lista das atuais beneficiadas por recursos do programa Segundo Tempo, do Ministério do Esporte, pasta que é controlada pelo partido desde 2003. Em termos proporcionais ao desempenho eleitoral, o partido é o líder disparado do ranking de convênios.

Dos 41 prefeitos que os comunistas elegeram nas últimas eleições, 15 (37%) recebem recursos do Segundo Tempo, programa destinado a jovens e crianças "em situação de risco social". Empatados, PT e PPS têm a segunda maior taxa de prefeitos atendidos - apenas 7%.

Em números absolutos, o número de convênios conquistados pelo PC do B é igual ao assinado por prefeitos dos oposicionistas PSDB e DEM - 15 cada um. Isso foi alardeado pelo Ministério do Esporte como prova de que os recursos são distribuídos de acordo com critérios técnicos, e não políticos. Mas PSDB e DEM elegeram, respectivamente, 18 e 11 vezes mais prefeitos que os comunistas - o fato de não haver uma proporção próxima a essa na assinatura dos convênios é evidência estatística que de que o favorecimento partidário é o que predomina.

Critérios. Os dados ressaltam o alcance do "esporteduto" montado pelo PC do B, que, conforme revelou o Estado em uma série de reportagens, também alimenta com verbas federais uma rede de militantes instalada em organizações não governamentais e secretarias municipais e estaduais de Esportes por todo o País.

Os números também demonstram que o "aparelhamento" das verbas federais não sofrerá impacto apenas com o fim dos convênios com ONGs e sua substituição por prefeituras, medida anunciada pelo novo ministro do Esporte, Aldo Rebelo, logo depois de ser indicado para o cargo. Rebelo, assim como o antecessor, Orlando Silva, é um dos líderes nacionais do PC do B.

Características. Das 15 prefeituras comandadas por comunistas e beneficiadas por recursos do ministério, a maioria são de cidades pequenas, e apenas três têm razoável peso político e populacional - Aracaju (SE), Olinda (PE) e Juazeiro (BA). Um terço dos municípios tem menos de 15 mil habitantes, e em mais da metade o número de moradores não chega a 30 mil.

Isso não impede que essas cidades estejam entre as que têm, em termos proporcionais, as maiores quantidades de jovens atendidos pelo programa Segundo Tempo - fator determinante para o volume dos repasses financeiros.

Na pequena São Sebastião do Passé (BA), por exemplo, há 3 mil adolescentes atendidos, divididos em 30 núcleos do programa. A população tem pouco mais de 40 mil habitantes, ou seja, em tese, 7% da população é beneficiada. Em Santos (SP), onde o prefeito é do PMDB, também há 30 núcleos para 3 mil atendimentos, mas a cidade tem quase dez vezes mais moradores que São Sebastião do Passé.

Em números absolutos, o maior dos convênios, com 32 mil atendidos, foi fechado com a prefeitura do Rio de Janeiro - onde o secretário municipal dos Esportes é do PC do B.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Metalúrgicos ameaçam entrar em greve no dia 7

Sindicato da categoria rejeitou contraproposta das empresas, de reajuste salarial entre 7,5% e 8,5%, e insiste em receber aumento superior a 10%

Os metalúrgicos de São Paulo e Mogi das Cruzes rejeitaram a contraproposta de 7,5% a 8,5% de reajuste salarial apresentada por representantes das empresas e entraram em estado de greve. Em assembleia realizada ontem, eles decidiram que farão greve a partir de 7 de novembro, caso não seja apresentada uma nova proposta considerada por eles satisfatória.

A categoria, com data-base em 1.º de novembro, reivindica reposição salarial com aumento real, valorização do piso da categoria e redução da jornada de trabalho para 40 horas semanais.

Em uma pauta de 152 cláusulas, eles também pedem que as empresas estendam o pagamento de Participação nos Lucros (PLR) para todos os funcionários e aumentem o prazo da licença-maternidade para 180 dias, entre outros pleitos.

"A inflação dos últimos 12 meses encerrados em outubro deve ficar em torno de 7%. Queremos aumento real significativo e não vamos aceitar reajuste inferior a 10%. Os patrões têm até o dia 4 de novembro para reformular sua oferta, caso contrário, vamos começar a parar as fábricas a partir do dia 7", disse o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo e Mogi das Cruzes, Miguel Torres.

Segundo o sindicato, a greve poderá ser organizada por empresa, por segmento econômico ou por região. O Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo e Mogi das Cruzes representa 270 mil trabalhadores. Além da entidade, participam da campanha salarial outros 53 sindicatos de metalúrgicos filiados à Federação dos Metalúrgicos do Estado de São Paulo e à Força Sindical. Ao todo, eles representam aproximadamente 800 mil pessoas.

Sem crise. Apesar da desaceleração da economia brasileira, Torres afirma que há "bastante espaço" para um aumento real neste ano. O sindicato diz que um aumento real de 5% está de acordo com a economia do País.

"O crescimento deste ano é em cima de uma base muito grande", diz o metalúrgico. A projeção do Ministério da Fazenda é que o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro cresça entre 3,5% e 4%, um ritmo mais lento do que a expansão de 7,5% registrada em 2010.

A maior dificuldade do sindicato será convencer as empresas de que o momento é favorável a aumentos reais. No segmento automotivo, por exemplo, a produção de veículos caiu 19,7% em setembro, na comparação com o mês anterior, de acordo com dados da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea).

As empresas reagiram para conter os estoques. No início de outubro, Volkswagen, Fiat e General Motors deram férias coletivas para parte dos funcionários das fábricas brasileiras.

Segundo o sindicato, os trabalhadores estão mobilizados para pressionar as empresas caso elas relutem em atender às reivindicações. "O que eu vejo na categoria é que a disposição para a greve está muito forte", diz Torres.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Volta a pressão pela valorização do real

Com a euforia nos mercados após o pacote contra a crise na zona do euro, o dólar perdeu valor ao redor do mundo. O real foi trocado pela moeda americana a R$ 1,6840 e há bancos que acreditam que ele vá encerrar o ano valendo ainda mais.

Um sinal importante de que essa direção pode ser a mais provável no curto prazo é a posição dos investidores estrangeiros no mercado de dólar futuro, que voltou a ficar "vendida" - aposta na valorização do real. A exposição líquida desses investidores chegou a US$ 2,75 bilhões na quinta-feira, incluindo contratos de dólar e cupom cambial. Segundo operadores de mercado, essa posição deve ter subido cerca de US$ 1 bilhão na sexta, tamanha a movimentação nas mesas internacionais.

Sob especulação, real volta a subir

Fernando Travaglini

SÃO PAULO - A euforia que tomou conta dos mercados após o anúncio do pacote de socorro à Grécia e aos bancos europeus teve efeito direto no dólar, que perdeu valor ao redor do mundo, incluindo o Brasil. A tendência no curto prazo deve se manter nessa direção, segundo especialistas. A explicação é o cenário internacional mais positivo, com a redução do risco de ruptura no sistema financeiro, além da volta do fluxo de recursos para o país, intenso nos últimos dias.

A expectativa é de que a reestruturação da dívida grega e a intenção de recapitalização dos bancos evitem a contaminação de outros países da região, como a Itália e a Espanha. Nesse caso, o dólar ainda deve perder valor em todo o mundo, inclusive no Brasil, onde os fatores externos estão entre os principais determinantes da moeda brasileira, explica Cristiano Souza, economista do Santander.

Souza ainda acredita em momentos de nervosismo nos mercados, com a moeda americana atingindo uma cotação perto de R$ 1,75 no fim do ano. Mas o patamar deve cair para R$ 1,65 já em 2012. "A solução apresentada na Europa ainda precisa ser testada, mas se o pacote evitar o contágio, a tendência do dólar é de apreciação", diz.

Há bancos que acreditam que o dólar possa encerrar o ano em um patamar ainda mais baixo do que o atual. "Esperamos uma acomodação ao redor de R$ 1,65", diz André Hübner, diretor de Global Markets do HSBC. O nível seria o mesmo no fim de 2012, completa.

Um sinal importante de que essa direção deve mesmo ser a mais provável no curto prazo é o posicionamento dos investidores estrangeiros no mercado de dólar futuro da BM&F. Os fundos internacionais voltaram a apostar contra o dólar na bolsa brasileira desde o início da semana passada.

A posição passou a ser novamente "vendida" - aposta na valorização do real - mesmo sujeita à IOF. A exposição líquida desses investidores chegou a US$ 2,75 bilhões, pelos dados da bolsa da quinta-feira - incluindo contratos de dólar e cupom cambial. Segundo operadores de mercado, essa posição deve ter subido cerca de US$ 1 bilhão na sexta-feira, tamanha a movimentação nas mesas internacionais.

Outra fonte de pressão tem sido a volta do fluxo real de divisas para o Brasil, reflexo tanto da redução da aversão ao risco, que trouxe de volta parte dos aplicadores internacionais, quanto da internalização de recursos captados por empresas brasileiras no exterior recentemente. A Eletrobras fez uma emissão em dólares de US$ 1,75 bilhão e a OSX fechou um empréstimo sindicalizado de US$ 850 milhões.

O fluxo ainda pode se manter nas próxima semanas. Há outras grandes companhias esperando uma janela para buscar mais dinheiro lá fora, como Petrobras, Banco do Brasil e JBS. Mas vale lembrar da sazonalidade da economia brasileira, com grandes remessas de lucros e dividendos das multinacionais todo o fim de ano, diz Hübner, do HSBC.

Como consequência da melhora global e da volta do fluxo de dólares, a moeda brasileira teve forte apreciação sobre a americana, de expressivos 4,5% em apenas dois dias, com o dólar fechando abaixo do piso psicológico de R$ 1,70, cotado a R$ 1,684.

"Até a virada do ano, a chance é de melhora dos mercados", avalia Jayro Rezende, operador de câmbio da corretora Banif. Segundo ele, o problema de ruptura na zona do euro foi mitigado e os ativos sofreram uma correção muito grande, diz. "Mas se a solução vai ser efetiva ou duradoura ninguém sabe", pondera Rezende.

Na própria sexta, a Itália viu uma elevação dos custos de captação, o que ligou o sinal de alerta dos investidores. O euro voltou a perder valor no fim do dia em relação ao dólar, depois de ter chegado à máxima de quase dois meses, mostrando que novos momentos de volatilidade devem surgir ao longo do processo.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

No campo, mais de 37 mil escolas fechadas

Problemas de acesso, infraestrutura e formação de professores afetam área rural, onde analfabetismo chega a 23%

Karine Rodrigues e Letícia Lins

ESCADA (PE) e RIO. "Vai reformar?"; "Quando é que as aulas começam?"; "Vai ter 6ª série?", pergunta, quase sem pausa, Heronildo José de Araújo, 11 anos, confundindo a equipe de reportagem com autoridades da prefeitura de Escada, município a 62 quilômetros da capital pernambucana. Ele vive em uma casa no Engenho Canto Escuro, em frente à Escola Municipal Tiradentes, um dos 37.776 estabelecimentos de ensino rurais do país que fecharam as portas nos últimos dez anos, segundo dados do Censo Escolar do Ministério da Educação (MEC).

- Não gosto de viajar todos os dias para tão longe - reclama o menino, que sente enjoo no sacolejo do ônibus escolar e tem dois irmãos que também estudam muito distante de casa.

O número de escolas fechadas impressiona, mas está longe de ser o único dado que chama atenção na educação do campo, onde existem cerca de 80 mil estabelecimentos de ensino. Entre a população de 15 anos ou mais, a taxa de analfabetismo na zona rural chega a 23,3%, três vezes maior do que em áreas urbanas, e a escolaridade média é de 4,5 anos, contra 7,8 anos, mostra estudo de 2009 da socióloga Mônica Molina e mais dois especialistas para o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social da Presidência da República.

- A ausência do Estado na garantia do direito à educação se traduz na precariedade da oferta. As alterações ocorridas nos últimos dez anos foram pequenas. Os professores são mal formados, não há infraestrutura e nem material pedagógico - avalia Mônica, professora da Universidade de Brasília (UnB).

Segundo ela, o fechamento das escolas, em geral, resulta de expansão do agronegócio e da nucleação - quando escolas de menor porte são extintas e os alunos, transferidos para unidades mais distantes e maiores. Mônica observa ainda que as diretrizes do setor dizem que a nucleação deve ser feita após os cinco anos iniciais do ensino fundamental e, preferencialmente, em escolas situadas também no campo, e não na área urbana.

Na opinião de Mônica, as políticas públicas para o campo precisam não só vincular o desenvolvimento à educação, mas garantir outros direitos:

- Ter acesso à terra é a primeira condição para o cidadão permanecer onde está e levar os filhos para a escola. O que está causando o fechamento das escolas não é só a nucleação. As áreas rurais estão sendo engolidas pela concentração fundiária. E os pais enfrentam de tudo para as crianças estudarem.

Que o diga José dos Santos, que foi morar na periferia de Escada para garantir o estudo dos filhos. Com o fechamento da Tiradentes, este ano, os dois filhos ficaram quatro meses sem aula.

- A escola era pequena, mas servia à comunidade. Tinha 14 alunos. Era pobre, não tinha luxo, mas fechar é muita perda - lamenta a mulher de José, Edna, que, assim como o marido, estudou somente até a 4ª série e deseja bem mais para os filhos.

Com pós-doutorado em Educação, Eliane Dayse Furtado, da Universidade Federal do Ceará (UFC), também considera que a nucleação está por trás de boa parte do fechamento das escolas. Foi o que constatou ao percorrer 14 estados das cinco regiões do país em projetos de formação de educadores rurais. Na ocasião, também ouviu reclamações sobre precariedade do transporte escolar.

- Outro dia, em Redenção (CE), as crianças ficaram três semanas sem aula porque o único ônibus quebrou. E, quando chove, ele não passa - conta ela.

Professora da Universidade Federal de Sergipe (UFS), Sonia de Jesus observa que, apesar dos problemas que comprometem a qualidade na educação do campo, quem mora na área rural quer frequentar a escola:

- Tem estabelecimentos sem banheiro, com paredes rachadas, sem material pedagógico. Mas, ainda assim, a população quer estudar. E há professores que, apesar dos problemas, fazem de tudo para dar aula.

Ednalva Cavalcanti, que hoje ensina 12 alunos, é assim, mas está desanimada, pois acha que a Escola Santa Rita, em Escada, está marcada para morrer: das três salas, duas estão fechadas.

- É triste ver o pessoal indo embora para dar lugar à cana - diz, informando que, em média, os alunos passam apenas três horas na escola, considerada uma das mais conservadas da área rural do município, pois tem alpendre, luz e água.

Entre 2007 e 2011, seis escolas municipais cerraram as portas em Escada, diz a secretária de Educação do município, Elizabeth Cavalcanti, explicando que a Tiradentes fechou por falta de alunos no Canto Escuro, onde O GLOBO computou, pelo menos, 20 moradias próximas:

- No engenho, só há quase adultos e adolescentes.

As três pesquisadoras ressaltam que a educação no campo é melhor nos assentamentos, por pressão e organização de movimentos sociais, como MST, que, recentemente, lançou a campanha "Fechar escola é crime".

O MEC informa que municípios, estados e DF recebem apoio técnico e financeiro por meio de várias ações e programas para educação do campo, onde estão quase 50% das escolas da educação básica do país, e diz que está elaborando um programa para implementar a Política de Educação do Campo. Destaca ainda que orienta para que a nucleação ocorra "quando realmente necessária", e dentro das diretrizes da área.

FONTE: O GLOBO

Um governo na encruzilhada: para onde vai? :: José Serra

A crítica ao loteamento político desenfreado dos cargos federais foi um ponto que repisei bastante na última campanha eleitoral. A necessidade de alianças para obter maioria parlamentar acabou gerando no Brasil um desdobramento nefasto: a partilha da máquina estatal por grupos políticos interessados apenas em se servir dela, e não em servir ao povo.

O caso do Ministério do Esporte foi o mais recente e emblemático. Dia após dia, as notícias brotaram, trazendo exemplos de iniciativas nas áreas que receberam o dinheiro, mas nada fizeram. Ou fizeram muito menos do que os recursos permitiriam fazer.

O problema não é monopólio de um partido ou de uma orientação ideológica. Da direita à esquerda, passando pelo centro e também por quem não chega a ter ideologia, a coisa se repete como um script pré-ensaiado. A turma instala-se na máquina e passa a ordenhá-la em benefício próprio.

A versão supostamente benigna diz que é para turbinar campanhas eleitorais, mas será legítimo desconfiar. É provável, como, aliás, o noticiário também começou a mostrar, que os desvios de conduta estejam a abastecer o patrimônio privado dos envolvidos. Ou, então, talvez estejamos diante de um modelo misto. Uma parte para a legenda e outra para quem coloca a mão na massa.

Mas, se o problema não está localizado numa sigla, ou num ponto do espectro ideológico, onde estará? A resposta é simples: na atitude de quem governa. As pressões são parte da política, mas ceder a elas e dar até o mau exemplo não é uma fatalidade. O governante tem margem de escolha, pode fazer ou não fazer. O partido pedir um ministério “de porteira fechada” é do jogo, mas quem governa deve ter força e convicções para conseguir dizer “não”. E vejam bem: daria na mesma se, em vez da porteira fechada para um partido, se dividisse cada ministério ou empresa estatal entre vários partidos e subgrupos, como, aliás, é feito na Petrobrás e na área elétrica do governo.

O presidencialismo de coalizão não éfenômeno recente no Brasil. Foi suspenso durante o regime militar e voltou com força plena desde a redemocratização, especialmente depois da Constituinte. A pulverização partidária obriga. Mas, infelizmente, os últimos anos mostram que o sistema degenerou, degradou-se por força de circunstâncias político-policiais. Especialmente no governo anterior a este, período no qual governabilidade acabou se tornando sinônimo de reunir apoio para abafar escândalos.

Mas a nova presidente não estava obrigada a prosseguir na mesma toada. E para alguns, o início do governo parecia começar a acenar com uma diferença. Houve quem apostasse num esforço para promover cirurgias em pontos críticos da máquina, drenar abcessos, acabar com a “porteira fechada”. Segundo os portadores dessa boa vontade, isso seria natural, pois a presidente precisava mostrar capacidade de comando, alguma ascendência sobre uma administração praticamente organizada pelo antecessor.

Mas, agora, no caso do Ministério do Esporte, evidenciou-se a fraqueza dessa tese. Precisou o STF agir para que o Planalto se mexesse. Talvez não estivesse convencido das vantagens do trade-off na relação com um velho aliado, flagrado em meio a todo tipo de malfeitoria. E ia cedendo à tentação dos panos quentes, que não resolve problema nenhum.

O STF acabou ajudando o governo. Um mau desfecho para a crise no Esporte representaria a renúncia definitiva da presidente da República à ideia da “faxina”, que tão útil tem sido para implantar uma marca. E teria sido assim, não fosse o tribunal. No mundo político os limites da presumida “faxina” presidencial são bem conhecidos, mas, agora, tratar-se-ia de escancará-los ao grande público.

Mais grave, porém, seriam as consequências no médio e no longo prazo. As diversas facções e grupos instalados na máquina olhariam a coisa como uma senha para a impunidade. Construa uma blindagem formal, e seu feudo político estará protegido. Fale grosso e sobreviverá, independentemente do que você fez. O resultado seria acelerar a degeneração.

O governo Dilma Rousseff está numa encruzilhada, num daqueles pontos onde as coisas se definem para o futuro. Ou mostra que tem força para fazer as coisas acontecer na administração e para continuar dissecando os abscessos – e, portanto, sinaliza que está no controle da situação – ou acaba abrindo um período de vale-tudo. Perto do qual o que vimos até agora parecerá brincadeira de criança.

A política é relação de forças e não admite o vácuo. Ou a presidente manda no governo dela, ou saberemos que alguém está a mandar.

José Serra, ex-prefeito e ex-governador de S. Paulo

FONTE: BLOG JOSÉ SERRA

Por isto ou por aquilo:: Wilson Figueiredo

Em Grandes Homens Contemporâneos, Winston Churchill garante ser “verdade que o curso da história é sempre influenciado por isto ou por aquilo”. A observação se encaixa naturalmente na atual situação brasileira, onde isto e aquilo se revezam em cena. Falta apenas identificar e definir o que seja isto ou aquilo na apresentação dos grandes espetáculos de defenestração de ministros em série, a título de encaminhamento da Copa do Mundo em 2014.

Já somam cinco ministros, em dez meses de governo Dilma Rousseff, e não faltam nomes sussurrados de ministros pilhados em escândalos no ministério à beira de quarenta figurantes que se acotovelam no governo Dilma Rousseff. Não que isto (os ministros) tenha a ver com aquilo (os 40 ladrões que Alí Babá isolou na caverna). Seja por isto que se lê ou aquilo de que já se sabia, a média de dois meses per capita para a degola de ministros, de um jeito ou de outro, vai para a história, tanto faz com inicial maiúscula ou minúscula mesmo.

A presidente Dilma nega que seja faxina, mas não pode contestar que se respira um ar renovado de limpeza, nem impedir que se conjugue o verbo defenestrar, etimologicamente correto, para garantir uma atmosfera respeitável aos episódios que merecem agradecimento público. São animadores os espetáculos que precedem a saída de cada ministro que vem abaixo com estrondo. A presidente está lavando as mãos e o ex-presidente faz o papel de padrinho dos que saem, considerando as circunstâncias, pois tudo vai acontecendo por conta própria. Às vezes parece que mão invisível move os personagens. Nada, no entanto, sobrenatural.

Por enquanto, nada de novo mantém juntos a presidente e o ex , mas pouco do que ficou para trás os separa. O acerto final tem hora marcada na sucessão presidencial. Não é por acaso que a oposição, se é que assim se pode considerar os que perderam a eleição e o rumo, bate cabeça vazia de idéias com cabeça com idéias demais.

Por essa janela que se abre na história brasileira já se vê mais do que é mostrado na coreografia de ministros que saem aos trambolhões, embora amaciados e despachados com pedidos de desculpas. Seja como for, ministros estão sendo despejados pela janela aberta no mandato da presidente Dilma, e não enxotados pela vassoura com que os meios de comunicação varrem o espaço oficial, à falta de melhor. Por esta ou por aquela, a janela ou a vassoura, não faz diferença. O curso das mal contadas histórias dos que saem vai compondo sentido próprio com episódios impróprios, e aplausos do eleitor.

Em Roma, era pão e circo para satisfazer a multidão quando o império ia para o beleléu. Aqui a diversão, mais em baixo, é ver ministro balançar, garantir que não sai e despencar em poucos dias. Até que a Loteria Federal já poderia ter criado um sistema de apostas e, como atenuante, permitir a cidadãos ganharem dinheiro honestamente com jogo real.

A bem da verdade ou, na sua falta, da própria mentira, a questão não está nos nomeados nem com os demitidos, mas na própria seleção dos pretendentes a ministros, que limitam a opção presidencial às indicações dos partidos. Sobre essa base movediça de interesses é que se equilibra o governo. A rigor, não é o presidente quem escolhe os ministros, mas apenas os nomeia como se fosse uma honra, mesmo sabendo que não chega a tanto. É contingência de um presidencialismo esgotado.

Eis a questão: nomeação de ministro com o governo em movimento, quando não em sobressaltos, como ocorria no tempo em que crises se davam ao respeito dos cidadãos, pouco tem a ver com um sistema parlamentar de exercer o poder. Apenas aparência. Ninguém segura nosso presidencialismo envergonhado, que já está mais para caricatura de parlamentarismo à brasileira. A isto se dá o nome de governabilidade, apesar de não chegar a tanto, e pode acabar tornando mais difícil o exercício das atribuições de governo. Ou mesmo deixando sem saída, exceto a própria, quem estiver no exercício dos poderes presidenciais.

Wilson Figueiredo é jornalista

O que é isso, companheiro? :: Ancelmo Gois

Adormecida há uns 30 anos, desde quando Lula ainda comandava greves no ABC, Brizola assustava os militares com a possibilidade de chegar à Presidência e Zico (Mengoooo!) fazia gols pelo Flamengo, a briga entre PCB e PCdoB pelo legado do comunismo no país ressurgiu semana passada com as denúncias contra o pecedobista Orlando Silva no Ministério do Esporte.

Em nota, o velho Pecebão acusou os camaradas do PCdoB de “propaganda enganosa, falsidade ideológica, estelionato político e apropriação indébita” por terem divulgado em seu programa na TV que o partido deles vai fazer 90 anos em 2012. “Todas as pessoas razoavelmente informadas, todos os intelectuais, historiadores, militantes políticos e sociais sabem que o PCdoB foi fundado em 1962 por uma insignificante minoria do Comitê Central do PCB. O PCB, sim, vai fazer 90 anos. O PCdoB fará 50 anos em 2012.”

Na verdade, o Pecebão atual representa também um grupo que não aceitou as resoluções do X Congresso, em 1992, que alterou o nome e a sigla de Partido Comunista Brasileiro, PCB, para Partido Popular Socialista, PPS, sob o comando de Roberto Freire.

Já o PCdoB garante que, ao romper com o Partidão, em 1962, levou junto — além da preposição “do” que constava do nome original (o PCB, até ali, chamava-se Partido Comunista do Brasil) — o ideário da fundação, em 1922.

Calma, gente.

Aliás...

Também ressurgiram do túnel do tempo as diferenças entre os dois ramos da família do grande líder comunista Luís Carlos Prestes. Anita Leocádia, a filha de Prestes com Olga Benário, escreveu carta ao PCdoB em protesto contra o uso da imagem do pai no programa do partido na TV num momento de crise.

Logo depois, Luiz Carlos Prestes Filho e sua mãe, Maria Ribeiro, 81 anos, segunda mulher do Cavaleiro da Esperança, também escreveram carta ao PCdoB — só que para agradecer pela menção ao velho Prestes no programa.

Calma, gente.

FONTE: COLUNA DO ANCELMO GOIS/ O GLOBO, 30/10/2011.

Capitanias hereditárias no século 21 :: Paulo Brossard

A senhora presidente está se revelando não uma faxineira, mas uma espécie de enfermeira incomum, especializada em ministros ainda mais inéditos. A especialidade é tamanha, que não tem designação específica, contudo, é capaz de proporcionar-lhes instantes tranquilos quando o fim inexorável se aproxima. Basta dizer que, em apenas 10 meses, cinco entregaram sua alma ao criador, peleando é verdade, mas sob a influência de doces devaneios no sentido de permanecer com as rendosas vantagens terrenas, sem embargo das melifluidades imateriais de mundos desconhecidos, onde inexiste a praga de jornais e revistas, invejosos dos êxitos alheios. Pois a senhora presidente aprendeu, não sei em que escola, a fazer do peculato, por exemplo, alguma coisa semelhante aos inesquecíveis pastéis-de-santa-clara.

O certo é que, salvo um, os quatro restantes que eram portadores de males terríveis, em relação aos quais a farmacopeia está atrasada, em lugar de penetrarem no corredor da morte, passearam entre louros e ciprestes, aspirando o perfume virginal espargido por anjos; não lhes tardaria o dia fatal.

É curioso que de 50 em 50 dias, cadaverizou um após outro. Talvez seja preferível, em vez de cadaverizar, falar de sua mágica, que hipnotiza primeiro e depois, de maneira indolor, celebra as exéquias com as cerimônias de embalsamamento. A versão me parece plausível, pois os mais autorizados meios de comunicação informam que há candidatos à mumificação presidencial.

Mudando de assunto, sem sair dele, o que importa é coisa mais relevante. Extraído o quinto ministro que durante cinco anos dirigiu a pasta, com a divulgação de uma série de atos pouco recomendáveis, porque sua permanência comprometeria o bom nome do país no Exterior, seu sucessor é do mesmo grupo partidário, o PC do B. Eu não sei se o novo ministro possui outros critérios de ação distintos dos adotados pelo sucedido. O que ouvi dizer é que, com as chaves do ministério, simbolicamente, ao seu arbítrio, recebeu o potreiro de porteira fechada. Pelo jeito, a relação da administração caracterizada pela vinculação dos bens concedidos a uma finalidade pública, passa a ser quase de natureza patrimonial, como uma espécie de pecúlio castrense. Seria transferência de parcelas do poder público quando ele é indisponível; enquanto seu concessionário recebe o lote com poderes supremos. Lembraria até as capitanias hereditárias, aliás, malsucedidas e cedo extintas. No entanto, a senhora presidente, renunciando seu poder, não se desligaria de sua responsabilidade constitucional.

Por derradeiro, ocorre-me apontar dois aspectos: Se é certo que os ministros demitidos, menos um, vêm do passado, no caso, do "maior e melhor governo de todos os tempos", nas palavras do ex-presidente, só se pode entender que a manutenção deles no atual teria sido por supostos méritos, a ponto de justificar a distinção que outros não receberam. Destarte é imperioso reconhecer que a ulceração oficial não começou agora.

Outrossim, é inafastável consignar que os "agraciados" com a dispensa continuam liberados de qualquer tipo de apuração; sem pretender ao menor deslize processual, impõe-se a correta apuração dos fatos e a justa responsabilização de cada agente. A omissão da senhora presidente que tem o dever de zelar pela limpeza da administração federal, configuraria crime de responsabilidade, Constituição, art. 85. V. Para não ser longo, lembro o Padre Vieira: "A omissão é um pecado que se faz não fazendo".

*Jurista, ministro aposentado do STF

FONTE: ZERO HORA (RS)

Deixem Aldo em paz:: Ricardo Noblat

"Isso de ONGs é uma visão neoliberal. A participação de militantes do PCdoB em ONGs é minoria". (Renato Rabelo)

Difícil dizer qual foi o momento de mais brilhante cinismo que marcou a entrevista coletiva concedida na última sexta-feira por Renato Rabelo, presidente do Partido Comunista do Brasil (PCdoB). Terá sido aquele onde ele garantiu que Aldo Rebelo, seu correligionário e novo ministro do Esporte, escolherá livremente com quem irá trabalhar?

Ou terá sido o momento seguinte, quando Renato citou Nádia Campeão, ex-secretária de Esporte de São Paulo e ex-presidente do PCdoB no estado? Renato admitiu que Nádia está cotada para a secretaria executiva do Ministério do Esporte, embora "não seja uma indicação do partido". Como é mesmo, Renato? Repita!

Em 2002, ao se eleger presidente da República e decidir que o Esporte caberia ao PCdoB, Lula pediu ao partido que sugerisse o nome do ministro. Por partido entenda-se Renato. Ninguém ali o contesta. Renato tentou emplacar Nádia Campeão. Lula preferiu Agnelo Queiroz, deputado federal pelo PCdoB de Brasília.

Então Renato empurrou goela abaixo de Agnelo os nomes de Orlando Silva para secretário nacional de Esporte, e de Ricardo Leyser Gonçalves para secretário nacional de Esporte de Alto Rendimento. Foi o primeiro emprego da vida de Orlando, que pelo PCdoB presidira a União Nacional dos Estudantes entre 1995 e 1997.

Orlando e Ricardo serviram ao partido no ministério como uma espécie de tutores de Agnelo. Vigiavam seus passos. E confrontavam atos que poderiam desagradar ao partido. Em certa ocasião, Agnelo aceitou convite para assistir no exterior a uma competição de natação. O autor do convite era um dirigente esportivo do Rio.

Os tutores de Agnelo se opuseram. Alegaram que a aceitação do convite fortaleceria seu autor, empenhado em que o Rio sediasse os Jogos Pan-Americanos de 2007. E, para o PCdoB, o melhor seria que o Pan fosse disputado em São Paulo. Ali o partido concentra seus maiores interesses. O ministro viajou mesmo assim.

Os dois viviam no gabinete de Agnelo.Não se anunciavam antes de entrar, simplesmente giravam a maçaneta da porta e entravam. Uma vez, irritado, Agnelo foi visto saindo do seu gabinete com as mãos na cabeça para desabar diante de secretárias perplexas: "Tirem esses dois da minha sala. Não aguento mais". Vexame!

O posto de Orlando só lhe dava direito a dispor de carro oficial para se deslocar dentro da Esplanada dos Ministérios. Pois ele visitava a namorada que morava na Asa Norte dizendo que usara o carro em viagem ao Setor Hospitalar Norte. Para ir ao aeroporto, anotava que usara o carro em viagem ao Setor de Carga. Há um dossiê a esse respeito.

Apontado como o homem-forte dos Jogos Pan-Americanos, Ricardo acabou condenado pelo Tribunal de Contas da União a devolver aos cofres públicos mais de R$ 18 milhões. Foi acusado de superfaturamento e de pagamentos indevidos. Nem por isso deixou o ministério. Mais do que Dilma, Lula tolerava desvios de conduta.

Quem deixou o ministério foi Agnelo, candidato ao governo do Distrito Federal e depois ao Senado. O PCdoB abandonou-o. Agnelo quis voltar a ser ministro no segundo governo de Lula — o partido preferiu Orlando. Mas escalou o advogado Ronald Freitas, um dos sete membros do seu secretariado, para monitorar o novo ministro.

Agora, quem haverá de controlar de perto ou à distância o desempenho de Aldo Rebelo? Dele se diz — e com razão — que é um político experiente e respeitado por seus pares. Foi presidente da Câmara dos Deputados e ministro de Relações Institucionais de Lula.

Até a oposição (leia-se: Aécio Neves e José Serra, ambos do PSDB) gosta dele.

Seria razoável que o PCdoB o deixasse em paz. Aldo é tido como um quadro disciplinado. No ano passado, pediu socorro à direção quando temeu não se reeleger devido à quantidade de dinheiro gasto para eleger o deputado Gustavo Petta, cunhado de Orlando. O partido espera que ele retribua a ajuda que recebeu. Força, Lula.

FONTE: O GLOBO

Lula, Dilma e o câncer:: José Roberto de Toledo

O câncer tem 10% de chances contra Luiz Inácio da Silva, mas 0% contra Lula. Do ponto de vista da opinião pública, a doença tende a reforçar o mito, como o tiro no peito transformou Getúlio Vargas de suspeito em herói - com todas as simplificações que isso implica. Nunca é bom subestimar a empatia do brasileiro por quem está perdendo, mas demonstra garra para virar o jogo.

Lula intui isso ao dar transparência total à doença desde o diagnóstico. O jornal The New York Times comparou-o ao mistério com que Hugo Chávez tratou o próprio câncer no início. Mas o presidente da Venezuela ganhou popularidade desde que o tratamento o fez raspar os cabelos e tornou a doença de conhecimento público. Certamente não foi a nova aparência que fez Chávez somar pontos no eleitorado.

Nesse cenário de mitificação renovada, quais as consequências da doença de Luiz Inácio para Dilma Rousseff e para o jogo político-eleitoral? Para ensaiar uma resposta, só fazendo suposições. Mas convém calçá-las em fatos.

Como o gráfico que ilustra este texto mostra, o crescimento do consumo de massa esteve intimamente ligado à disparada de popularidade de Lula. As curvas que representam a confiança do consumidor (em cinza, medida pelo Inec da CNI) e o saldo de aprovação presidencial (em preto, medido pelo Ibope) correram paralelas, num trajeto cheio de altos e baixos, mas com coeficiente de correlação de 0,83 - num máximo de 1,0.

É uma correlação muito forte. Significa que se um dos indicadores sobe ou cai, o outro tem enormes chances de acompanhá-lo. Foi assim ao longo de todo o governo Fernando Henrique Cardoso e no primeiro mandato de Lula. Mas a partir da segunda metade do segundo mandato, a popularidade de Lula e a confiança do consumidor, embora mantivessem o mesmo rumo ladeira acima, se descolaram. A aprovação ganhou uma camada extra de cobertura.

Mitificação. Há vários nomes para esse exagero de doçura com que o eleitor avaliou o ex-presidente no último período de seu governo, um deles é mitificação: apesar dos ditos e feitos, nada de ruim cola na imagem presidencial. Foi nesse clima que Lula elegeu Dilma.

O gráfico mostra, porém, que terminado o mandato de Lula, a fase mitológica acabou. As curvas de aprovação presidencial e a confiança do consumidor voltaram a convergir durante o governo Dilma - para um patamar muito parecido com o que Lula iniciou seu segundo mandato, antes de começar a virar mito.

Nada indica, por ora, que Dilma repetirá a façanha do antecessor. Além das doses incomparáveis de carisma pessoal, o ex-presidente vinha em ascensão, de melhoria da sua avaliação em relação ao mandato anterior. Com Dilma ocorre o oposto: apesar da alta aprovação, ela perde na maioria da população quando comparada a Lula.

A popularidade de Dilma depende, antes de mais nada, de ela conseguir equilibrar as variáveis econômicas para manter a expectativa de consumo em alta. Mas uma coisa ela não pode fazer, sob risco de ficar em impedimento na opinião pública: dar a impressão de trair seu criador. Especialmente agora. Vai se desdobrar para demonstrar o oposto.

Talvez Lula fale menos por causa da doença, mas também por causa da doença o que ele falar contará mais. As atenções vão voltar, pelo menos enquanto ele estiver em tratamento. Nesse período, em vez de perder, o ex-presidente ganha espaço. E Lula sabe transformar espaço em poder. No máximo, vai ficar de mau humor por não poder beber nem fumar.

Se prevalecerem os 10%, e o câncer ganhar, todas as apostas estão zeradas. Como Getúlio, Lula tem sucessor administrativo mas não político. Sua saída prematura de cena abriria um novo capítulo na história.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

O câncer fortalece o mito:: Vinicius Mota

Do sigilo à publicidade total, cada nação lida a seu modo com as doenças graves que afetam as lideranças políticas.

Um célebre exemplo do primeiro caso é François Mitterrand, o socialista que presidiu a França de 1981 a 1995. Só dias após a sua morte de câncer na próstata, em janeiro de 1996, a imprensa revelou que a doença fora diagnosticada logo depois de sua primeira posse.

Boletins médicos fajutos esconderam a moléstia por dez anos. Houvesse sido divulgada no início da trajetória de Mitterrand, a história francesa do final do século 20 possivelmente teria tomado curso diferente.

A divulgação manipulada do estado de saúde prevalece com o líder venezuelano Hugo Chávez. O conhecimento público de seu câncer o favorece na reeleição do ano que vem. Mas um mistério ainda envolve a gravidade da doença, talvez porque sua veiculação dispararia a sucessão de um líder egocêntrico demais para deixar herdeiros.

No Brasil, o calvário de Tancredo Neves -no qual o despiste era tática usual de médicos e políticos- parece ter encerrado a era da semipublicidade. A exposição das patologias de Mário Covas, José Alencar e Dilma Rousseff dá prova disso.

A empatia com o convalescente, despertada por esses episódios, supera os questionamentos que possam provocar. Aqui não há, em contraste com os EUA, a percepção de que um líder doente mina a capacidade do partido de manter-se no poder ao longo do tempo.

Partidos ainda fazem pouca diferença no Brasil, como atesta o vulto majestoso da imagem de Lula, do mito de Lula, sobre o PT.
É esse mito, por sinal, que a notícia do câncer em sua laringe vem fortalecer.

Um tumor aparentemente tratável, como se informa e deseja, a três anos da eleição presidencial ajuda a empurrar as expectativas de alternância no poder para o final desta década -que apenas se inicia.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

O primeiro grande erro de Dilma :: Renato Janine Ribeiro

Nomeando ministro do Esporte o deputado Aldo Rebelo, artífice da maior derrota do seu governo no Congresso, a presidente Dilma Rousseff comete seu primeiro grande erro. Ela premia a indisciplina, pois deixara clara sua discordância do projeto pró-ruralista do Código Florestal, redigido justamente por Rebelo. Mas primeiro precisamos analisar melhor como a presidente vem lidando com os problemas ministeriais.

Com a troca no ministério dos Esportes, chegam a seis os ministros que Dilma substituiu, em poucos meses. Isso não é anormal. Demora, para um governante articular seus ministros. Fiquei sabendo que a presidente, ao nomeá-los, lhes explicou que este ano, devido aos cortes orçamentários que afetaram todas as Pastas, não cobraria performance. Em 2011, só sairia "quem fizesse bobagem". Mas em 2012 ela exigiria desempenho.

Assim tem sido. As críticas estridentes dos artistas à ministra da Cultura não a derrubaram. Mas, se um ministro não responde bem à conjuntura difícil, ele sai. Dilma não deixa aumentar o desgaste. Ele pode sair por indisciplina, como Nelson Jobim, ou por não esclarecer denúncias de corrupção. Não sabemos se é culpado. Sabemos que ficou insustentável sua permanência no poder.

Nomeando Aldo, Dilma premia a indisciplina

Até aí, está certo. Mas há um dado adicional. Nenhuma substituição surpreendeu a nação por seu impacto. Entrou só um peso pesado, Celso Amorim, mas no lugar de outro peso pesado, Jobim. Nos outros casos, entraram pessoas com menor destaque que o substituído - Gleisi Hoffmann é menos conhecida do que Antonio Palocci. Isso ainda é aceitável. A discrição pode ser uma virtude. Aliás, aqui Aldo Rebelo é exceção. Seu perfil é bem superior ao de Orlando Silva. Ele é o maior nome do PCdoB.

Mas o problema começa agora: pelo menos no Turismo e nos Esportes, ficou claro que a Pasta pertence ao partido. Há ministérios que são feudos. Sai o denunciado, mas a agremiação conserva a vaga. Pior: quando o novo ministro do Turismo decidiu nomear uma pessoa competente para uma secretaria, seu próprio partido exigiu uma indicação política. Ou seja, o partido não se responsabiliza pelos erros, talvez graves, cometidos numa Pasta que ele ocupa. O Executivo arca com o ônus de fazer a máquina funcionar. O partido, só com os bônus. Pois tem a garantia de que, por pior que seja o nome indicado, só terá de substituí-lo por outro, que lhe conserve cargos e convênios.

Isso enfraquece a presidência da República. O PCdoB, partido que viceja graças ao PT, impôs a Dilma o nome de Aldo Rebelo. É um político capaz. Presidiu a CPI da CGF. Também presidiu a Câmara. Foi um bom ministro. Conseguiu, pertencendo a uma legenda outrora radical, negociar com todo o espectro político - tanto que foi cogitado, no governo Lula, para o ministério da Defesa, sem que isso incomodasse os militares. Não recearam que Aldo mandasse investigar as mortes de seus correligionários na guerrilha do Araguaia. Em suma, mostrou-se hábil, moderado e até conservador.

Tão conservador que seu partido agora ocupa a secretaria de Esporte do prefeito de S. Paulo, aliado de José Serra; tão conservador que foi Aldo Rebelo quem montou a versão pró-ruralista do Código Florestal... Conseguiu que praticamente a Câmara inteira votasse contra os ambientalistas. Quem perdeu na ocasião foram o PV, mas também o PT e a presidente Dilma. (O PSDB votou com os ruralistas, apesar de ter querido namorar Marina Silva no segundo turno presidencial, em 2010). Trazer Aldo para o governo é esquecer tudo isso, o que não condiz com a imagem exigente e severa da chefe de Estado.

Isso torna ainda mais vulnerável o ministério do Meio Ambiente, um dos menos prestigiados pelos governos petistas. Não são poucas as dificuldades que a atual ministra tem enfrentado, embora conte com o apoio dos ambientalistas. A primeira titular petista da Pasta, a senadora Marina, acabou rompendo com Lula e, em 2010, teve uma votação impressionante. Portanto, se os verdes têm pouca bala na agulha no plano institucional, se agora Marina e o PV se digladiam, se desde a eleição ela e eles foram esquecidos e quando se fala em oposição se pensa apenas na mais tradicional, o PSDB, nem por isso eles carecem de poder de fogo. Podem mobilizar a opinião, nacional e internacional. Um projeto consistente e empolgante para o futuro do Brasil passará, necessariamente, pela questão ambiental. Os ambientalistas, estejam no Meio Ambiente, na Ciência e Tecnologia, em ONGs ou na oposição, desempenharão um papel importante em nosso futuro próximo.

O que fará Aldo Rebelo, no ministério, ao se tornar colega de pessoas que enfrentou, em decidida oposição a nosso futuro? Político capaz, possivelmente será um gentleman com a colega do Meio Ambiente. Evitará confrontá-la no que disser respeito ao Código Florestal, até porque sua missão agora é outra. Mas tudo isso está longe de ser uma boa saída.

Há uma saída que poderia reduzir os danos. Ela é improvável. Mas consistiria em Aldo, por iniciativa própria ou por determinação presidencial, aproveitar o enorme cabedal de simpatias que construiu junto aos ruralistas para convencê-los a recuar, a ceder. Até o momento, quem perdeu foram os ambientalistas. Se o novo ministro agir no plano politico para desfazer parte pelo menos do que ajudou a montar, em termos de descaso com o meio ambiente, pode ser que neutralize vários aspectos negativos que apontei. Mas continuam valendo minhas outras críticas. Dilma premiou a indisciplina, garantiu a um minipartido seu feudo ministerial e não responsabiliza os parlamentares pelos erros de seus indicados. Ela devia ter sido firme. Não foi.

Renato Janine Ribeiro é professor titular de ética e filosofia política na Universidade de São Paulo.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

O ouro do Pan :: Melchiades Filho

Se a queda em série de ministros acusados de corrupção já provoca uma autocrítica sobre o arranjo partidário herdado por Dilma Rousseff, imagine o que acontecerá se esclarecidas as fraudes e a matriz política do socorro ao banco PanAmericano, o episódio mais nebuloso do ocaso da era Lula.

Ninguém do governo, atual ou anterior, explicou de modo convincente por que, no final de 2009, o Planalto autorizou a injeção de R$ 740 milhões de dinheiro público num banco para lá de encrencado.

A rigor, ninguém nem tentou explicar, na expectativa de que o silêncio ajudasse a circunscrever o caso às áreas técnicas da Caixa Econômica Federal, de onde partiram os recursos, e do Banco Central.

O roteiro mudou, porém, após a Folha publicar o conteúdo de e-mails interceptados pela polícia ao apurar o rombo de R$ 4,3 bilhões.

Os diálogos confirmaram o imaginado: os executivos inflavam balanços financeiros e maquiavam dados de clientes, com o objetivo de engabelar a fiscalização.

Mas os e-mails produziram uma extraordinária revelação: o banco serviu de base a um esquema de desvio de dinheiro para políticos.

Nas mensagens, diretores festejam "a ajuda dos amigos" do governo Lula -uma teia de influência que "deixou boquiaberto" Silvio Santos, o dono do PanAmericano. Mencionam, entre outros, Guido Mantega (Fazenda) e os ex-ministros Luiz Gushiken e Antonio Palocci. Discutem o acesso a fundos de pensão, doações a partidos e a pressão para empregar gente do Planalto.

Ao menos R$ 100 milhões evaporaram -para o bolso dos executivos e para o caixa dois eleitoral.

Diante do noticiado, a polícia não teve opção senão a de abrir inquéritos específicos. O potencial de dano é similar ao da Castelo de Areia, investigação que aterrorizou palácios e empresas até ser convenientemente engavetada pelo Judiciário.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

A travessia, ainda :: Aécio Neves

Nesta semana, chegou ao circuito nacional de cinema o filme "Tancredo - A Travessia", que completa a trilogia do documentarista Silvio Tendler, cujo olhar já havia percorrido os densos anos JK e Jango.

Como nos trabalhos anteriores, o cineasta permite a diferentes gerações de brasileiros a oportunidade de visitarmos nossa própria história. Pelas imagens, descortina-se um país surpreendente, distante do Brasil do nosso tempo em um aspecto fundamental: a nítida aliança então existente entre a política e a sociedade.

Se não há como comparar um momento ao outro, pois cada um tem as suas próprias circunstâncias, é inevitável nos remetermos ao crescente divórcio existente hoje entre a política e os cidadãos. Denúncias seguidas e repetidas de corrupção e impunidade cansam o país e anestesiam parte da população, para quem a política passa a ser irremediavelmente território da má intenção e do malfeito.

O noticiário político se confunde com o policial. Com o anedotário. Esse fenômeno se dá de tal forma que nem mesmo as oposições têm o que comemorar. A decepção, o distanciamento e a indiferença da população atingem a legitimidade da representação política como um todo. Cada vez mais, perdemos a confiança da população e banaliza-se a injusta ideia de que todos na política são iguais.

Em qualquer lugar, um governo que em dez meses é obrigado a demitir cinco ministros de Estado por suspeitas de corrupção seria obrigado a ir além das cândidas justificativas do tipo "eu não sabia". É hora de mudar o paradigma, sobretudo a natureza da política de coalizão que, em troca de apoio congressual, cede à apropriação dos partidos e seus próceres extensas áreas da administração pública.

É preciso apurar com rigor os desvios, punir os responsáveis e sustentar a autonomia das áreas de controle (principalmente as auditorias preventivas) para que não tenham mero papel decorativo e sejam instadas a agir só quando há denúncia na imprensa.

É urgente o caminho da profissionalização do serviço público e um corajoso ajuste no tamanho da máquina política incrustada na máquina administrativa, adequando-a aos limites praticados em outros países, infinitamente mais modestos do que aqueles vigentes aqui. O país precisa e deseja uma legislação mais rigorosa, com dinâmica mais ágil e punições mais severas.

O filme de Silvio oferece, sobretudo aos desiludidos com a política, um inestimável presente: memória.

No caso, a memória de um tempo, nem tão distante, em que a ação das lideranças políticas era um tributo à ética, à dignidade e ao comprometimento com o Brasil. Memória de um tempo em que elas sabiam ouvir as ruas. E a própria consciência.

Aécio Neves, senador (PSDB-MG)

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Milícia planeja matar deputado, dizem documentos

Marcelo Freixo, presidente de CPI que investigou criminosos em 2008, deixará país a convite da Anistia Internacional

Cássio Bruno

A Coordenadoria de Inteligência da Polícia Militar, o Ministério Público e o Disque-Denúncia registraram, em pouco mais de um mês, sete denúncias de que várias milícias estão preparando o assassinato do deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL). Presidente da CPI das Milícias, que, em 2008, provocou o indiciamento de 225 pessoas, entre políticos, policiais militares e civis e bombeiros - boa parte do grupo está presa -, Freixo vai deixar o Brasil amanhã, com a família, a convite da Anistia Internacional.

O parlamentar vai para a Europa, mas o país de destino e o tempo de permanência no exterior estão sendo mantidos sob sigilo. Em reportagem publicada ontem, O GLOBO revelou a atuação de milicianos em pelo menos 11 estados, segundo dados fornecidos por Ministérios Públicos e Ouvidorias de Polícia.

Em alguns casos, como o da Bahia, as milícias agem com as mesmas características das do Rio em bairros de Salvador. Elas exploram o transporte alternativo e a distribuição de serviços de internet, de TV a cabo e de gás. Há suspeita também da participação de políticos.

Em entrevista ao GLOBO, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, admitiu o problema das milícias. Já a corregedora Nacional de Justiça, a ministra Eliana Calmon, afirmou à reportagem que milicianos estão por trás da maioria dos casos de violência contra os magistrados brasileiros. Por isso, ela iniciou uma força-tarefa nos 27 estados para tentar identificar e punir grupos paramilitares.

- A Anistia ficou preocupada com a minha segurança devido ao acirramento das denúncias feitas contra mim. A Patrícia foi ameaçada e, na época, todos diziam que ninguém iria matá-la. Mesmo assim, mataram - disse Freixo referindo-se à juíza Patrícia Accioli, executada a tiros por milicianos na porta de casa, em Niterói, na Região Metropolitana, mês passado.

Maioria das denúncias é de milícias de Zona Oeste e Ilha

As informações sobre os planos de execução de Freixo envolvem, na sua maioria, milicianos da Zona Oeste do Rio e da Ilha do Governador. Em uma delas, do último dia 13, enviado à Coordenadoria Institucional de Segurança da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), um grupo de 50 milicianos fortemente armados se reuniu em um conjunto habitacional de Campo Grande para planejar o assassinato de Freixo. No mesmo dia, um outro bando do bairro de Cosmos chegou a fazer churrasco para tramar a morte do deputado.

No dia 3 deste mês, outro caso envolveu um policial do 18 ª Batalhão da Polícia Militar, em Jacarepaguá, acusado de pertencer a uma milícia. O PM atuaria no bairro Gardênia Azul, até então dominada pelo ex-vereador do Rio Cristiano Girão, denunciado pela CPI das Milícias, condenado e preso. O GLOBO mostrou, no último dia 10, a articulação para assassinar Freixo. Um ex-policial foragido do presídio da PM receberia cerca de R$400 mil para matar o parlamentar.

Parlamentar entregará dossiê ao governo do estado

Em 28 de setembro, mais um relato sobre a intenção de praticar um atentado contra Freixo. Um grupo paramilitar, liderado por um policial lotado na unidade do Grupamento de Policiamento em Áreas Ambientais (Gpae), se reuniu na Cidade de Deus com o objetivo de acertar os detalhes.

- Vou deixar o país, mas não é um recuo. Não é um arrependimento por ter denunciado as milícias. Vou voltar e continuar a luta contra os milicianos - ressalta Freixo, pré-candidato a prefeito nas eleições de 2012.

Atualmente, o deputado só anda escoltado por seguranças. A quantidade, porém, não é revelada por ele. Freixo utiliza ainda um carro blindado para os seus deslocamentos na cidade. Hoje, o parlamentar pretende entregar um dossiê detalhando todas ameaças sofridas à Secretaria Estadual de Segurança Pública e ao Ministério Público, além de pedir providências.

- O emocional da minha família está abalado. A milícia é um problema de todo o país. Trata-se de uma máfia que já matou uma juíza e não medirá esforços para matar um deputado. Até agora não recebi qualquer informação sobre as investigações da Secretaria de Segurança - afirmou Freixo.

Procurada pelo GLOBO, a Secretaria estadual de Segurança Pública não quis comentar as denúncias contra Freixo e a saída dele do país.

Concluída em dezembro de 2008, o trabalho da CPI das Milícias revelou o domínio territorial de grupos paramilitares. Um dos focos das investigações foi em Campo Grande, onde os irmãos Natalino e Gerônimo Guimarães, respectivamente, ex-deputado estadual e ex-vereador, chefiavam a maior milícia da região.

A CPI, associada aos inquéritos abertos pela Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (Draco), resultaram nas prisões dos políticos e dos milicianos.

FONTE: O GLOBO

Poesia :: Carlos Drummond de Andrade (31/10/1902-17/8/1987)

Gastei uma hora pensando um verso
que a pena não quer escrever.
No entanto ele está cá dentro
inquieto, vivo.
Ele está cá dentro
e não quer sair.
Mas a poesia deste momento
inunda minha vida inteira.


Carlos Drummond de Andrade nasceu em Itabira do Mato Dentro - MG, em 31 de outubro de 1902. De uma família de fazendeiros em decadência, estudou na cidade de Belo Horizonte e com os jesuítas no Colégio Anchieta de Nova Friburgo RJ, de onde foi expulso por "insubordinação mental". De novo em Belo Horizonte, começou a carreira de escritor como colaborador do Diário de Minas, que aglutinava os adeptos locais do incipiente movimento modernista mineiro.

Ante a insistência familiar para que obtivesse um diploma, formou-se em farmácia na cidade de Ouro Preto em 1925. Fundou com outros escritores A Revista, que, apesar da vida breve, foi importante veículo de afirmação do modernismo em Minas. Ingressou no serviço público e, em 1934, transferiu-se para o Rio de Janeiro, onde foi chefe de gabinete de Gustavo Capanema, ministro da Educação, até 1945. Passou depois a trabalhar no Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional e se aposentou em 1962. Desde 1954 colaborou como cronista no Correio da Manhã e, a partir do início de 1969, no Jornal do Brasil.

O modernismo não chega a ser dominante nem mesmo nos primeiros livros de Drummond, Alguma poesia (1930) e Brejo das almas (1934), em que o poema-piada e a descontração sintática pareceriam revelar o contrário. A dominante é a individualidade do autor, poeta da ordem e da consolidação, ainda que sempre, e fecundamente, contraditórias. Torturado pelo passado, assombrado com o futuro, ele se detém num presente dilacerado por este e por aquele, testemunha lúcida de si mesmo e do transcurso dos homens, de um ponto de vista melancólico e cético. Mas, enquanto ironiza os costumes e a sociedade, asperamente satírico em seu amargor e desencanto, entrega-se com empenho e requinte construtivo à comunicação estética desse modo de ser e estar.

Vem daí o rigor, que beira a obsessão. O poeta trabalha sobretudo com o tempo, em sua cintilação cotidiana e subjetiva, no que destila do corrosivo. Em Sentimento do mundo (1940), em José (1942) e sobretudo em A rosa do povo (1945), Drummond lançou-se ao encontro da história contemporânea e da experiência coletiva, participando, solidarizando-se social e politicamente, descobrindo na luta a explicitação de sua mais íntima apreensão para com a vida como um todo. A surpreendente sucessão de obras-primas, nesses livros, indica a plena maturidade do poeta, mantida sempre.