terça-feira, 18 de outubro de 2011

Quando a indignação pega:: Clóvis Rossi

Os protestos ganham ouvidos importantes, mas agora precisam apresentar alternativas

Os indignados  estão conquistando adeptos para seus gritos nos mais insuspeitados rincões. Que o presidente Barack Obama tenha endossado a inquietação da moçada é até compreensível, dada sua origem de esquerda, pelo menos o máximo de esquerda a que se permitem os EUA.

Mas o presidente continua pendurado no muro: disse que "o dr. King [Martin Luther King] gostaria que desafiássemos os excessos de Wall Street sem demonizar aqueles que lá trabalham".

Não creio que o "Ocupe Wall Street" considere trabalhadores os gatos gordos da banca que são o principal alvo de seus protestos.

Mais significativa é a mudança de posição de Eric Cantor, líder da maioria republicana na Câmara de Representantes, que rotulara os manifestantes de "máfia sem lei", mas agora prefere admitir que há, sim, uma excessiva desigualdade de renda no país e, também, que há gente demais sem emprego.

Consequência, sempre segundo Cantor: uma crescente -e compreensível- frustração.

Nem Obama nem Cantor parecem dar-se conta de que a frustração é também -ou principalmente- com o funcionamento da democracia representativa, de que são produto.

Não é fenômeno novo. Aparecia, nos anos 90, nos protestos contra o tipo de globalização dominante, que favorece as corporações e o sistema financeiro e marginaliza mortais comuns, especialmente jovens.

Que há essa frustração, basta ler anúncio publicado no "Corriere della Sera" por Diego della Valle, dono da fábrica de sapatos Tod"s e sócio da editora do próprio jornal.

Nele, Della Valle desanca os políticos italianos como "pessoas incompetentes e despreparadas, que não têm a menor percepção dos problemas do país nem da gravidade do momento e menos ainda uma visão global dos cenários futuros".

Você pode até alegar que a política italiana abusa de escândalo, mas não diria o mesmo de nove de cada dez políticos brasileiros? Ou, talvez, de 11 de cada 10?

Constatado o óbvio, ou seja, a crise global da democracia representativa, a questão seguinte é saber o que pôr no lugar. Ditaduras? A América Latina é a melhor demonstração de que, livre delas, vive muito, muitíssimo melhor.

As tais democracias populares, tipo Cuba, fracassaram miseravelmente. Democracia direta? Talvez seja falta de imaginação minha, mas não consigo enxergar, por exemplo, como se poderia elaborar uma nova Constituição, como a Tunísia se prepara para fazer a partir de domingo, por meio de discussões de massa na praça pública.

O futuro do movimento de protesto parece condicionado, pois, a caminhar em "uma linha fina entre ação violenta e não violenta", como escreve para "Foreign Affairs" Rory McVeigh, diretor do Centro para o Estudo de Movimentos Sociais da Universidade Notre Dame (EUA).

Completa McVeigh: "O poder do protesto vem de sua capacidade de perturbar o "business as usual". Sem tal perturbação, não dá aos oponentes nenhum incentivo para fazer concessões nem dá à mídia razões para prestar atenção".

Quanto tempo os indignados precisarão ficar nas praças e parques para manter a atenção dos Obamas, Cantors, Della Valles e da mídia?

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

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