terça-feira, 8 de novembro de 2011

OPINIÃO DO DIA – Fernando Henrique Cardoso : partilha do saque

Dessa forma, as "bases" dos governos resultam mais da composição de interesses materiais que da convergência de opiniões. Com isso perdem sentido as distinções programáticas, para não falar nas ideológicas: tanto faz que o partido se diga "de esquerda", como o PC do B, ou centrista, como o PMDB, ou de centro-direita, como o PR, ou que epíteto tenham, todos são condôminos do Estado. Há apenas dois lados, o dos condôminos e o dos que estão fora da partilha do saque. O antigo lema "é dando que se recebe", popularizado pelo deputado Cardoso Alves no governo Sarney, referia-se às nomeações, ao apadrinhamento, que, eventualmente, poderiam levar à corrupção, mas em si mesmo não o eram. Tratava-se da forma tradicional, clientelista, de fazer política.

Hoje é diferente. Além da forma tradicional - que continua a existir -, há uma nova maneira "legitimada" de garantir apoios: a doação quase explícita de ministérios com as "porteiras fechadas" aos partidos sócios do poder. Digo "legitimada" porque desde o mensalão o próprio presidente Lula outra coisa não fez senão justificar esse "sistema", como ainda agora, no caso da demissão dos ministros acusados de corrupção, aos quais pediu que tivessem "casca dura" - ou queria dizer caradura? - e se mantivessem no cargo.

Fernando Henrique Cardoso, sociólogo, foi presidente da República. Corrupção e poder. O Globo, 6/11/2011.

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