segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Adeus à ilusão:: Ricardo Noblat

“Saio com a consciência do dever cumprido, da minha honestidade pessoal”. (Carlos Lupi, ex-ministro do Trabalho)

A faxineira ética foi uma ilusão que durou pouco. Seu ex-companheiro de luta contra aditadura de 64, único ministro que pode dizer “Dilma me ama”, Fernando Pimentel, do Desenvolvimento, meteu-se com consultorias nada ortodoxas. E como agiu Dilma? Mandou investigá-lo? Não. Mandou-o se explicar no Congresso? Também não. Ordenou: “Resista”.

Isso é lá comportamento de uma presidente que proclamou sua aversão a desvios de condutas antes mesmo de subir arampa do Palácio do Planalto pela primeira vez? Está no seu discurso de posse: “Não haverá compromisso com o malfeito, a corrupção será combatida permanentemente”.

Diante de indícios de que um auxiliar seu prevaricara, Itamar Franco, ex-presidente da República, primeiro o afastava do cargo. Segundo, mandava investigar os indícios. Caso eles ruíssem, chamava oauxiliar de volta. Dilma? Ela bem que se esforçou por manter no governo os ministros que pediram para sair,abatidos por denúncias de corrupção.

Na última sexta-feira,aodesembarcar em Buenos Aires para aposse da presidente Cristina Kirchner, Pimentel limitou-se a declarar aos jornalistas: “Já falei tudo o que tinha de falar. Todas as explicações foram dadas. Estou tranquilíssimo”. Não. Não falou tudo o que tinha de falar. Nem deu todas as explicações devidas.

Gilberto Carvalho, secretário-geral da Presidência da República, socorreu Pimentel.“Ogoverno está satisfeito comas explicações oferecidas pelo ministro até agora”, ditou. “Esclarecer o Congresso? Não vejo razão porque as denúncias são relativas a Belo Horizonte.” Como é que é? Tem nova jurisprudência na praça?

A intervenção de Gilberto soaria como piada se não tivesse sido feita a sério. Pimentel ganhou R$ 2 milhões em 2009 e 2010, dando consultorias em Minas Gerais e em Pernambuco. Quer dizer que os fóruns competentes para ouvi-lo seriam as Assembleias Legislativas dos dois estados? Por que não Câmaras Municipais? Menos, Gilbertinho!

“Se convocado,irei ao Congresso”, admitiu Pimentel. Que graça! Arrisca-se a ser preso quem ignora uma convocação do Congresso. Pimentel joga com as palavras para confundir o dis-tinto e distraído público. O governo joga com a sua força para evitar que o Congresso convoque Pimentel. Receia que ele se enrasque mais um pouco.

São tantas as perguntas a exigirem de Pimentel respostas convincentes... Por que, de início, ele revelou que tivera apenas três clientes? Depois citou um quarto. Que disse não ganhar o bastante para pagar consultoria.Mas que em seguida recuou e deu razão a Pimentel. Por que com três dos quatro clientes ele não assinou contratos?

Foram contratos de boca. Sabe como é... Por escrito, só o contrato de R$ 1 milhão com a Federação das Indústrias de Minas. Pimentel esqueceu quantas vezes esteve como cliente.Ganha um bolo de rolo quem tiver visto Pimentel dando consultoria em Pernambuco. As quatro consultorias não produziram sequer um esquálido documento.

Robson Andrade, ex-presidente da federação mineira, assim justifica a contratação de Pimentel: “Quanto vale um dia de conversa com uma pessoa que tem conhecimento estratégico sobre como trabalhar com o governo, discutir questões tributárias, ações de crescimento nas indústrias?” Convenhamos: faz sentido.

Na época, ex-prefeito de Belo Horizonte, Pimentel ambicionava o governo de Minas. O PT apoiou Hélio Costa, do PMDB. Pimentel foi então candidato ao Senado. Perdeu para Itamar. Estava destinado a ser ministro de Dilma. Foi um dos coordenadores de sua campanha. Quem não pagaria para tê-lo como conselheiro? Não pagaram a Palocci?

Lula foi tolerante com autores de malfeitos. Dilma também, mas fracassou até aqui. Nenhum dos ministros que abandonou o governo tinha com ela a íntima ligação que Pimentel tem. É razoável que Pimentel acabe ficando. Mas tudo na política cobra o seu preço. E algum será pago por ele, por Dilma ou pelos dois.

FONTE: O GLOBO

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