sábado, 24 de dezembro de 2011

A campanha da pós-verdade:: Paul Krugman

Se Mitt Romney for o candidato republicano, ele falará mentiras descaradas sobre o presidente Obama

Imaginemos que o presidente Barack Obama dissesse o seguinte: "Mitt Romney acredita que apenas os ricos devem ter direitos. Ele quer reduzir a classe média a servos, forçados a aceitar os salários que as grandes empresas escolherem pagar, por mais baixos sejam."

Como essa declaração seria recebida? Acredito, e espero, que ela seria quase universalmente condenada. É verdade que Romney é a favor de políticas que seriam boas para os ricos e ruins para a classe média, mas dizer que ele quer introduzir o feudalismo é exagero.

Mas considere, agora, o que Romney falou de fato na terça-feira: "O presidente Obama acredita que o governo deveria criar resultados iguais. Aquilo que é ganho por alguns com seu esforço próprio é redistribuído para os outros."

Isso é tão descabido quanto a declaração imaginária de Obama. O presidente, na realidade, faz questão de louvar o livre empreendimento e dizer que não há nada de errado em enriquecer.

Ao todo, as posições de Obama sobre política econômica lembram as de republicanos moderados do passado. No entanto, Romney retrata o presidente como a segunda encarnação de Fidel Castro e parece confiar que não terá que pagar preço algum por inventar coisas.

Bem, ele já se safou com uma série de ataques igualmente fraudulentos. Na realidade, ele mais ou menos baseou sua campanha inteira na estratégia de atacar Obama por fazer coisas que o presidente não fez e ter posições que o presidente não defende.

Em outubro, por exemplo, Romney prometeu que, como presidente: "Vou reverter os maciços cortes na defesa promovidos por Obama". O orçamento da Defesa não parou de crescer constantemente desde que Obama chegou ao poder.

E há a sugestão frequente feita por Romney de que o presidente vem percorrendo o mundo "pedindo desculpas pela América". Essa é uma fantasia montada a partir de frases tiradas de contexto.

Há uma temática comum nessas declarações de Romney: retratar o presidente como personagem suspeito, alguém que não compartilha os valores americanos.

E, como Obama não fez nem disse nada que justifique essa representação dele, Romney simplesmente inventa coisas.

Mas não vai haver alguma consequência negativa? Está na cara que Romney pensa que não, e receio que ele possa ter razão.

A julgarmos pela experiência, a maior parte da mídia vai achar que, cada vez que denuncia uma mentira de um republicano, precisa publicar uma acusação comparável contra um democrata, mesmo que esse tenha dito a verdade.

Se Romney for de fato escolhido como candidato republicano, ele fará declarações descaradamente falsas sobre Obama e, de vez em quando, será criticado por isso. Mas a imprensa vai comparar isso com ofensas que o presidente faz quando, por exemplo, erra por um ponto quando cita a parcela da renda nacional pertencente aos 1% mais ricos.

O resultado final será que não será imposta uma penalidade real por uma campanha totalmente fraudulenta. Bem-vindo à política da pós-verdade.

Tradução de Clara Allain

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

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