sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Dilma não demite Lupi e cobra explicação da Comissão de Ética

Em vez de demitir Carlos Lupi do Ministério do Trabalho, como recomendou por unanimidade a Comissão de Ética Pública da Presidência da República, a presidente Dilma Rousseff preferiu ontem mantê-lo no cargo e pedir ao colegiado detalhes do julgamento da véspera. Até pedetistas apelaram abertamente pela saída de Lupi, mas Dilma viajou para a Venezuela deixando-o na pasta. Para a oposição, a presidente desmoralizou a Comissão de Ética, cuja função é zelar pela moralidade no governo. O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, disse que Lupi cometeu crime e que a recomendação da Comissão e "extremamente relevante" do ponto de vista ético

Sobrou para a Comissão de Ética

Presidente mantém Lupi e pede explicações ao colegiado sobre recomendação de demissão

Luiza Damé, Gerson Camarotti

A presidente Dilma Rousseff conseguiu causar constrangimento no meio político ontem ao manter no cargo o ministro do Trabalho, Carlos Lupi, mesmo após recomendação unânime da Comissão de Ética Pública para demiti-lo. Em vez de afastar Lupi, a presidente pediu detalhes da decisão da Comissão de Ética: quer conhecer o processo e os argumentos da relatora do caso, Marília Muricy. Nem mesmo pedetistas entenderam a decisão da presidente e pediram expressamente a saída de Lupi, para evitar ainda mais desgaste.

O ministro também recorreu da punição recomendada pela Comissão de Ética, mas a relatora do caso no colegiado afirmou que não mudará seu parecer. Interlocutores de Dilma afirmaram ao GLOBO que a presidente - que viajou ontem para a Venezuela - deve demitir Lupi na semana que vem.

A presidente decidiu pedir mais informações à Comissão ontem de manhã, depois de se reunir com os ministros Gilberto Carvalho (Secretaria Geral), Gleisi Hoffmann (Casa Civil) e Ideli Salvatti (Relações Institucionais). Dilma também recebeu, em seu gabinete, o ministro do Trabalho. Lupi chegou ao Palácio do Planalto antes da presidente, pouco depois das 9h.

- (A presidente recebeu a decisão) Com naturalidade, mas vai pedir elementos. Ela recebeu apenas um ofício curto e quer saber quais são os elementos e subsídios que embasaram a decisão da Comissão de Ética - afirmou a ministra da Secretaria de Comunicação Social, Helena Chagas.

Dilma teria temido perder poder

Mesmo com o desgaste político, Dilma adiou sua decisão para não ficar a reboque da Comissão de Ética, segundo explicação de auxiliares diretos da presidente. Por esse raciocínio, se tivesse demitido Lupi ontem, Dilma estaria abrindo um precedente que esvaziaria o seu poder presidencial. Mas a Comissão de Ética Pública é justamente um órgão de assessoramento da Presidência da República para zelar pela ética em todo o governo.

A melhor solução seria o próprio Lupi ter pedido demissão ontem mesmo, na avaliação de governistas. Como isso não aconteceu, Dilma optou pela decisão desgastante e constrangedora, mesmo pretendendo tirar o ministro semana que vem, após analisar todo o processo contra ele, como revelaram fontes do governo.

- A presidente Dilma é ciosa de seu poder e de suas responsabilidades. Não vai repassar suas atribuições para a Comissão de Ética - disse um dos interlocutores políticos da presidente. - Ela ficaria enfraquecida politicamente se tomasse a decisão a reboque da recomendação da Comissão de Ética. Isso seria muito ruim. Mas, a partir de agora, não. Ela terá tempo para analisar e tomar uma decisão que será dela.

Anteontem à noite, após o anúncio da recomendação da Comissão de Ética, além da expectativa de que o próprio Lupi se antecipasse e pedisse demissão antes que Dilma embarcasse para Caracas, esperava-se também que o PDT, partido de Lupi, tomasse essa decisão.

O problema é que o PDT é o próprio Lupi, que controla mais de 80% do partido, e o ministro resolveu enfrentar a Comissão de Ética, pedindo mais tempo a Dilma. Esse comportamento de Lupi surpreendeu não apenas os palacianos, mas até mesmo pedetistas.

Lupi resiste a deixar o cargo, e Dilma vem aceitando essa resistência, o que deixou de ser compreendido no meio político. Antes, a presidente alegava internamente que faria a mudança em janeiro. Mas, diante da recomendação da Comissão de Ética, sua negativa em aceitá-la de imediato não só surpreendeu como decepcionou setores aliados.

Segundo relatos, a conversa de Dilma com Lupi, ontem de manhã no Planalto, foi seca e protocolar, e durou cerca de 20 minutos. Os próprios auxiliares da presidente foram surpreendidos com a "ousadia" de Lupi de assegurar que daria as novas explicações solicitadas sobre mais uma denúncia envolvendo o ministro - a do duplo emprego público, na Câmara dos Deputados e na Câmara Municipal do Rio.

Ao ser informado do recurso, o presidente da Comissão de Ética, Sepúlveda Pertence, admitiu ontem que a decisão pode "em tese" ser revista. Adiantou, porém, que uma outra reunião do grupo, para nova decisão sobre o caso, só acontecerá no ano que vem. Já a relatora Marília foi taxativa quando informada de que o ministro vai recorrer:

- Não há nenhuma hipótese de mudança do relatório, e nem eu acredito que a presidente pretenda isso. Não está em cogitação. Se o ministro pede reconsideração, a Comissão pode fazer a reconsideração. Se a Comissão entender que a força dos meus argumentos já não é mais a mesma, e mudar de posição, será a Comissão. Do meu relatório, estou absolutamente convencida de que não há o que modificar - afirmou a conselheira.

A relatora disse não se sentir desconfortável com o questionamento da presidente, nem com o recurso de Lupi. Para ela, o recurso "faz parte do jogo institucional":

- Alguém que é atingido por aplicação de uma sanção se considera, digamos assim, carecedor de um outro tratamento e vai à luta. Faz parte do jogo democrático. Eu não me sinto absolutamente desconfortável. Sinto isso como parte do jogo e entendo que as razões que adotei em meu relatório são razões fortes, que convenceram a minha consciência e a consciência dos demais membros da Comissão - disse Marília.

Embora demonstrasse irritação, Sepúlveda evitou polemizar. Segundo ele, a presidente poderia simplesmente ter mandado arquivar a recomendação da Comissão de Ética, que não tem poder para demitir o ministro:

- É um fato novo e há de ser examinado com tranquilidade.

FONTE: O GLOBO

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