segunda-feira, 9 de maio de 2011

Reflexão do dia – Luiz Sérgio Henriques

Com seu instinto político aguçado, sempre muito hábil em demarcar o espaço político entre amigos e inimigos até o ponto da exasperação, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva não teve meias palavras para definir o que espera do seu partido já para 2012: caberia ao PT agregar mais uma vez os "diferentes", a começar pelo PMDB, e lançar-se decididamente contra os "antagônicos". Pelo visto, se tudo for deixado mais uma vez à mercê do cálculo partidário imediato, preparemo-nos para mais rounds de maniqueísmo explícito, aos quais, à moda de uma certa cultura política argentina, se aplicaria o dito "al enemigo, ni justicia".

Luiz Sérgio Henriques, tradutor e ensaísta, é um dos organizadores das obras de Gramsci em português site: http://www.gramsci.org/. A perspectiva social-democrata. O Estado de S. Paulo, 8/5/2011.

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO

Apenas 8% dos homicídios são solucionados no Brasil

FOLHA DE S. PAULO

Jovem adia procura por trabalho e estuda mais

O ESTADO DE S. PAULO

Rombo de partidos será coberto com verba pública

VALOR ECONÔMICO

Veículo brasileiro é dos mais caros do mundo

ESTADO DE MINAS

A perigosa viagem dos jovens de classe média

CORREIO BRAZILIENSE

Obama diz que Bin Laden teve ajuda no Paquistão

BRASIL ECONÔMICO

Governo negocia com os estados formas para baixar a conta de luz

ZERO HORA (RS)

Estádios para a Copa já estão 15% mais caros

JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Santa felicidade!

Mais uma denúncia contra Dirceu

Os ex-donos da empreiteira Sigma, José Augusto Freire e Romênio Machado, acusaram o deputado cassado José Dirceu (PT) de tráfico de influência em favor da Delta, construtora que mais recebeu recursos federais em 2010. A oposição quer ouvir os empresários.

José Dirceu é acusado de tráfico de influência

Empresários afirmam a revista que ex-deputado foi contratado para aproximar dono de empreiteira da elite do PT

BRASÍLIA e SÃO PAULO. O ex-ministro da Casa Civil José Dirceu está sendo acusado por dois empresários de tráfico de influência em favor da Delta Construções, a empreiteira que mais recebeu recursos de obras do governo federal em 2010. José Augusto Quintella Freire e Romênio Marcelino Machado disseram à revista "Veja", na edição desta semana, que Dirceu foi contratado para aproximar o presidente do Conselho de Administração da empresa, Fernando Cavendish, de pessoas influentes do PT. Os líderes da oposição no Senado querem ouvir Cavendish, Freire e Machado, para que eles falem sobre o suposto tráfico de influência de José Dirceu.

O líder do DEM no Senado, Demóstenes Torres (GO), vai procurar o PSDB e o PPS para, numa ação conjunta da oposição, apresentarem requerimento de convite aos empresários.

"Com alguns milhões, seria possível comprar um senador"

Freire e Machado eram donos da Sigma Engenharia, comprada pela Delta em 2008. Durante as negociações de fusão, houve um desentendimento entre eles e Cavendish. Os dois empresários afirmam que o presidente do Conselho de Administração da Delta não pagou o valor combinado pelo negócio. O caso está hoje em disputa na Justiça.

Ainda nas palavras de Freire e Machado à "Veja", Cavendish contratou a JD Assessoria e Consultoria, de Dirceu, por meio da Sigma para encobrir a relação. Machado afirmou que, quando recebeu as notas fiscais da consultoria prestada pela empresa do ex-ministro, decidiu não pagá-las porque não sabia do que se tratava. Mas depois o pagamento, no valor de R$20 mil, acabou sendo feito por ordem de Cavendish. Oficialmente, a JD foi contratada para ampliar a participação da Delta em negócios no Mercosul. Mas Machado afirmou que o verdadeiro trabalho da consultoria do ex-ministro era "tráfico de influência, aproximar o Fernando Cavendish de pessoas influentes do governo do PT".

A reportagem afirma ainda que Cavendish teria dito que, "com alguns milhões, seria possível comprar um senador" para conseguir um bom contrato com o governo.

Para a "Veja", a Delta informou que, quando a Sigma foi comprada, o contrato com a empresa de Dirceu já havia sido firmado, e o grupo só manteve o compromisso, que depois foi rescindido, porque a promessa de ampliar os negócios no Mercosul não tinha sido cumprida. Freire nega e disse que nunca viu o ex-ministro.

De acordo com reportagem publicada ontem pelo GLOBO, a Delta recebeu R$758,2 milhões por obras federais no ano passado, o maior valor entre todas as construtoras do país. O crescimento da empresa tem chamado a atenção do mercado.

Procurada ontem pelo GLOBO, a assessoria de imprensa da Delta não retornou a ligação. Dirceu também foi procurado por meio de sua assessoria, que também não respondeu. Em seu blog, o ex-ministro negou que o crescimento da Delta tenha relação com o trabalho de consultoria que prestou para a empresa. "Meu contrato com a Delta, de R$20 mil, durou quatro meses e foi como os demais do mercado, firmados por qualquer consultoria com seus clientes. Prestei um serviço profissional. Portanto, é pura má-fé atribuir a alta no faturamento da Delta ao meu trabalho de quatro meses, quando o setor em que ela atua se expandiu muito nos últimos anos", escreveu o ex-ministro.

Dirceu promete ir à Justiça.

FONTE: O GLOBO

Governo paga R$ 141 milhões a empresas que foram vetadas

Empresas que cometeram irregularidades em licitações e estão proibidas de ter contratos com o poder público receberam R$ 141 milhões do governo desde janeiro de 2010. As 46 firmas estão na "lista suja" da Controladoria-Geral da União, informam Silvio Navarro e Flávio Ferreira.

Órgãos públicos dizem que parte dos desembolsos teve amparo em pareceres da própria CGU.

Governo ignora lista de fornecedores vetados

Órgãos federais contratam empresas acusadas por controladoria interna

Ministério da Justiça manteve pagamento a empresa considerada inidônea após operação da Polícia Federal

Silvio Navarro e Flávio Ferreira

SÃO PAULO - Um grupo de 46 empresas proibidas de obter contratos e pagamentos do poder público recebeu R$ 141 milhões do governo federal de janeiro de 2010 a abril deste ano.

Essas empresas integram a chamada "lista suja" elaborada pela CGU (Controladoria-Geral da União) para impedir a participação de prestadores de serviços que cometeram irregularidades em licitações e convênios.

O cruzamento desse cadastro, que reúne 4.200 pessoas físicas e empresas, com pagamentos feitos pelo governo desde 2010, segundo o Portal da Transparência do Executivo, mostra que vários ministérios e órgãos federais ignoram a lista da CGU.

A Folha identificou cinco casos de empresas consideradas inidôneas, punição mais grave prevista pela legislação, que continuaram recebendo pagamentos normalmente após entrar no cadastro da controladoria.

De acordo com a CGU, os órgãos públicos só podem manter contratos com empresas inidôneas nos casos em que a interrupção dos serviços é mais prejudicial à administração pública do que sua continuidade.

Alguns órgãos questionados pela Folha usaram esta brecha legal para justificar a manutenção dos contratos.

Duas empresas declaradas inidôneas, a Fortesul Serviços e a BSI (Brasília Soluções Inteligentes) foram alvo de uma operação da Polícia Federal que desmontou um esquema de fraude em licitações em 2006.

Com base nas investigações da PF, a CGU incluiu as empresas na lista de inidôneas em janeiro de 2009, por prazo indeterminado.

O esquema apontado pela polícia incluía servidores que combinavam o resultado de concorrências. O dono da BSI chegou a ser preso na época.

Mesmo assim, o Ministério da Justiça, ao qual a PF é subordinada, manteve seus contratos com a Fortesul. Órgãos vinculados ao ministério pagaram R$ 33 milhões à empresa desde 2010.

Na última terça-feira, após a reportagem questionar a CGU e os ministérios sobre os contratos, o nome da Fortesul foi retirado da "lista suja". A controladoria argumentou que não havia mais motivos para punir a empresa após dois anos.

A BSI recebeu R$ 2,9 milhões do governo em 2010. Do total, R$1,2 milhão foi pago pelo Ibama, ligado ao Ministério do Meio Ambiente.

As outras três "inidôneas" são a gráfica mineira Sigma, a empresa de vigilância Aliança, com sede no Rio, e a loja de autopeças baiana Acesso. Os demais 41 casos encontrados pela Folha são de empresas "suspensas", sanção que pode ser mantida por dois a cinco anos.

Segundo a CGU, quando uma empresa é declarada impedida de contratar com a União, todos os contratos devem ser interrompidos e pagamentos só podem ser feitos por serviços já executados.

Na opinião da CGU, a regra vale até para outras esferas administrativas. Se uma empresa é punida por descumprir um contrato com a União, governos estaduais e prefeituras ficariam impedidos de contratá-las.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Governo arrecada R$ 16 bi com taxas na conta de luz

O pacote de dez encargos embutidos na conta de luz rendeu R$ 16,3 bilhões ao governo no ano passado. É dinheiro para fiscalização e geração de energia em pontos isolados. A carga de impostos representa 45,6% da despesa com luz.

Encargos pesam R$ 16 bilhões na conta de luz

Diluída em 68 milhões de contas, essas cobranças, somadas aos impostos, somam 45% do que o brasileiro paga pela energia

Renato Andrade e Karla Mendes

O consumidor de energia gastou no ano passado R$ 16,3 bilhões para bancar um pacote de dez encargos que o governo embute na conta de luz, para garantir desde serviços de fiscalização até a geração de eletricidade em pontos isolados do País.

Diluída em 68,8 milhões de contas, essa cobrança de taxas especiais passa despercebida pela maioria da população. Mas, somada aos impostos, já representa 45,6% do custo para acender a luz da sala, ligar o chuveiro ou colocar uma máquina industrial para funcionar.

A existência dessa carga tributária setorizada é vista com naturalidade por especialistas, uma vez que é preciso ter recursos para garantir a execução de alguns serviços. O problema é que o governo tem prorrogado encargos que já deveriam ter sido extintos e usado o dinheiro para outros fins. "De pouquinho em pouquinho, os encargos e impostos já dão metade da conta. Isso gera um problema de distorção muito grave", pondera Elena Landau, consultora do escritório de advocacia Sérgio Bermudes.

O efeito mais claro desta distorção é a perda de competitividade da indústria, especialmente daquelas em que a energia é parte importante do custo do produto, como alumínio e aço. Mas o consumidor arca com a elevação do custo de vida. "É ruim para todo mundo: para o consumidor que paga mais caro e para a indústria que perde competitividade", alerta Reginaldo Medeiros, presidente da Associação Brasileira de Comercializadores de Energia (Abraceel).

Na visão de Cláudio Sales, presidente do Instituto Acende Brasil, todo e qualquer sistema tributário deveria atender a cinco propriedades: eficiência, simplicidade, transparência, equidade e flexibilidade. "No que diz respeito ao volume de encargos cobrados na conta de luz, essas prioridades estão longe de ser atendidas", diz.

Transparência. Uma das maiores reclamações de especialistas é a falta de transparência, por parte do governo, na hora de explicar onde o dinheiro arrecadado está sendo usado. O exemplo mais gritante envolve a Reserva Geral de Reversão (RGR), cobrada desde 1957. O encargo foi criado para garantir uma espécie de poupança para a União, que seria usada para pagar, por exemplo, por hidrelétricas construídas caso não houvesse uma renovação da concessão pública cedida para uma empresa. Essa reversão, entretanto, nunca aconteceu. Ainda assim a cobrança continua sendo feita.

Para piorar a situação, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva resolveu incluir a prorrogação da RGR, por mais 25 anos, no texto de uma Medida Provisória encaminhada ao Congresso na virada do ano. Uma das justificativas para a decisão foi que o encargo bancava parte do programa Luz para Todos. "A RGR não é para isso", pondera Elena Landau, ao lembrar que a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) já cumpre essa função.

A Conta de Consumo de Combustíveis (CCC) é outra que deveria ter sido extinta, mas acabou prorrogada. O dinheiro arrecadado é usado para bancar as usinas termoelétricas que geram energia para os moradores do Norte do País. Mesmo com a conexão do Acre e Rondônia ao Sistema Interligado Nacional (SIN) de energia - o que diminui o uso das térmicas - o governo esticou até 2022 a cobrança da CCC e ainda aumentou o peso de outro encargo para "compensar perdas eventuais" dos dois Estados do Norte.

"A palavra-chave aqui é transparência. O consumidor precisa saber o que está pagando, para onde o dinheiro está indo e quanto custa, efetivamente, a energia no País", afirma Landau. "Como não tem transparência, o consumidor reclama que está pagando muito, mas não sabe para quem. Ele não entende a conta, culpa a distribuidora, mas não sabe que menos de um terço do que paga vai para a Light ou Eletropaulo".

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Maldades do Barão de Itararé

Barão, ainda adolescente:

“No colégio, em outra ocasião, ele voltou a dar mostra de um raro talento para o desacato à autoridade. Durante uma aula de Português, um dos professores, Oswaldo Vergara, que mais tarde se tornaria importante advogado, pediu um exemplo de conjugação de um verbo no mais-que-perfeito. O jovem Aparício não resistiu à tentação e levantou o dedo:

- O burro vergara ao peso da carga.

Apesar da brincadeira, o mestre acabou aprovando o aluno e comentou depois com os outros professores: “Sim, ele realmente foi desaforado, mas revelou ter o mais importante: conhecimento. Não havia razão para massacrá-lo. O mundo se encarregará dele”, profetizou o professor.

A despeito das demonstrações de irreverência, era estimado pelos professores, provavelmente por suas boas notas. “

FONTE: Claudio Figueiredo. As duas vidas de Aparício Torelly: O Barão de Itararé. Editora Record, Rio de Janeiro, 1987.

Radicais do meio-termo:: José de Souza Martins

Crescimento dos pardos no Censo confirma tradição brasileira de se garantir pela média, seja nas reivindicações sociais, seja na cor da pele

A divulgação dos primeiros dados do Censo 2010 constitui o esboço de um retrato do brasileiro, sua cara e mesmo sua mentalidade, suas identificações e vacilações. As primeiras notícias dizem que os brasileiros ficaram "mais escuros" ou "menos brancos", o que é improvável, pois este país se constituiu sobre a escravidão indígena e a escravidão negra e só nas décadas finais do século 19 tivemos a imigração maciça de propriamente brancos. A tendência provável seria a do aumento da mestiçagem, já que o Brasil desde as origens é essencialmente um país de mestiços, ainda que culturalmente preconceituoso. Se politicamente estimulada ao branqueamento, em decorrência de uma deliberada política de imigração de trabalhadores brancos, histórica e culturalmente a sociedade brasileira criou e disseminou valores que justificam e favorecem a mestiçagem. Somos um país mameluco e mulato.

O Censo 2010 parece confirmar essa tendência histórica. Parece porque a consciência da diferenciação de cor entre nós é tênue, limitada à pigmentação da pele e distante de distinções propriamente raciais. Os brancos perderam a consciência da diferenciação de brancuras que há entre originários da imigração eslava, da latina, da germânica. Os negros também perderam a consciência de sua diferenciação étnica, originários de distintas nações africanas. Os amarelos são os que ainda mantêm a consciência das diferenças profundas entre japoneses, chineses e coreanos.

O grande número dos que não indicaram a respectiva cor nos últimos três censos demográficos é um enorme problema para decifrar a autoclassificação por cor. Em 1991, eram 534,9 mil, quase tanto quanto os amarelos e quase o dobro da população indígena. Em 2000, a coisa ficou pior: 1,2 milhão não se definiram quanto à cor, quase tanto quanto a soma de indígenas e amarelos. Em 2010, esse número caiu para 315 mil, o que afeta menos a classificação por cor, mas ainda afeta. Essa redução de algum modo tem a ver com a campanha entre os afrodescendentes para que se identificassem no censo como pretos.

A campanha parece que deu parcialmente certo no caso da população preta, que dobrou de 1991 para cá e saltou de 10,6 milhões, em 2000, para 14,5 milhões, em 2010. No entanto, o salto foi proporcionalmente modesto nos últimos dois censos, de 6,2% da população brasileira para 7,6%, cerca de 4 milhões de pessoas, o mesmo tanto do intervalo censitário anterior. Enquanto isso, o grupo assumidamente mestiço dos pardos, teve sua proporção aumentada de 38,5% para 43,1%, 17 milhões de pessoas, a taxas bem desiguais, respectivamente 1,4% e 4,6%. O grupo branco, que havia tido um grande crescimento entre 1991 e 2000, de mais de 15 milhões de pessoas, diminuiu quase 250 mil pessoas entre 2000 e 2010. Se levarmos em conta a campanha em favor da autoidentificação dos mestiços como negros, tanto a modesta redução do grupo branco quanto o acentuado crescimento do grupo pardo sugerem que a campanha não sensibilizou os destinatários. O significativo crescimento do grupo negro parece dever pouco a essa campanha e muito mais a seu próprio crescimento vegetativo. Mesmo sendo o grupo com maior crescimento do que os outros grupos, nos últimos 20 anos, esse ritmo de crescimento caiu em 6,5% na última década. Não se pode deixar de considerar que campanhas para afirmação de identidade em favor de um grupo, como o negro, sempre motivam os grupos não abrangidos a também afirmarem a sua, coisa que acabou favorecendo os brasileiros identificados com a ideologia difusa, mas consolidada e tradicional, da mestiçagem.

Se considerarmos que o período entre os dois últimos censos foi o de algum êxito da reivindicação de políticas compensatórias restritas à população negra e de um significativo acolhimento da demanda de racialização da sociedade brasileira durante o governo Lula, através da política de cotas, os resultados do censo dão muito que pensar. Eles sugerem a opção pela tradição brasileira do meio-termo em relação a tudo, nas opções mornas pelas médias e na recusa dos extremos. Estamos vendo isso em outros campos, no declínio dos movimentos sociais de confronto, como os relativos à questão agrária, os estudantis e o próprio movimento operário.

No caso da cor da pele, a opção preferencial pela categoria intermediária dos pardos indica um esforço consciente para evitar classificações estigmatizadoras, como a de negro (mas, também, a de branco, já que ser branco passou a ser politicamente incorreto). A aceitação da política compensatória das cotas e mesmo de outras políticas de ação afirmativa pode estar levando à manifestação da nossa cultura do preconceito, não como preconceito contra o negro, embora o seja, mas preconceito contra os beneficiados por favorecimentos que anulam a ideologia da valorização do trabalho e da competição entre nós disseminada com o fim da escravidão negra. Os dados indicam que a aceitação de compensações raciais não significa a aceitação da identidade racial.

José de Souza Martins, professor emérito da Universidade de São Paulo, é autor de A sociabilidade do homem simples (Contexto)

FONTE: ALIÁS/O ESTADO DE S. PAULO

As duas faces do lulopetismo :: A.P.Quartim de Moraes

Num mesmo dia, 4 de maio último, os principais jornais brasileiros estamparam duas notícias distintas, aparentemente sem nenhuma relação uma com a outra, que revelam claramente o que significaram para o Brasil os oito anos de lulopetismo. A primeira: a pobreza no País caiu 50,64% entre dezembro de 2002 e dezembro de 2010, período dos dois mandatos de Luiz Inácio Lula da Silva. A segunda: os quatro filhos e três netos de Lula recusavam-se até então a devolver os passaportes diplomáticos que lhes foram concedidos irregularmente nos últimos dias do governo do chefe do clã, levando o Ministério Público Federal a cogitar de recorrer à Justiça para corrigir a anomalia.

Quem se sentir chocado com a colocação dessas duas notícias num mesmo nível de importância para efeito de avaliação do governo Lula deve atentar para o seguinte: o sentido de justiça que impele os bons governantes a lutar pela diminuição das desigualdades é inspirado pelos mesmos valores humanos universais que estabelecem que não pode haver justiça enquanto houver regalias e privilégios aos quais, por definição, só poucos podem ter a oportunidade de acesso. Por mais bem-sucedido que tenha sido no combate à pobreza - e em grande medida realmente o foi -, Lula deixou a obra pela metade ao não ter tido capacidade, ou preparo, para entender que ele próprio é e continuará sendo beneficiário dos mesmos direitos e submisso aos mesmos deveres, nem mais nem menos, do mais humilde dos cidadãos que seu trabalho como presidente resgatou da pobreza. É a igualdade perante a lei, fundamento da organização de qualquer sociedade minimamente civilizada.

Mas não é apenas a atitude antiética de agir como se fosse "mais igual" do que o cidadão comum que compromete o desempenho de Lula como chefe de governo e o coloca muito distante da condição de estadista. Muito piores, do ponto de vista do bem comum, são as consequências da generalização desse comportamento, por contaminação, pelos quadros da administração estatal, estimulados, pelo exemplo que vem de cima, a cultivar privilégios e regalias. Se o chefe pode, por que não eu? É assim que os desmandos e a corrupção prosperam, na razão inversa em que, inevitavelmente, decai a eficiência da máquina governamental.

Lula e o PT sabem perfeitamente disso, pois durante mais de 20 anos combateram ferozmente os privilégios das "elites", acusaram todos os governos, mesmo depois da redemocratização do País em 1985, de se colocarem a serviço de interesses de potências ou do capital internacional e das castas e dos estamentos sociais que o dominavam, em prejuízo da grande maioria da população. Pois bastou chegar lá para o lulopetismo pôr em prática tudo o que sempre combateu. Desde aliar-se às mais retrógradas oligarquias regionais e envolver-se - segundo denúncia da Procuradoria-Geral da República ao Supremo Tribunal Federal - em esquemas de compra de votos de deputados federais em troca de apoio político até promover um aparelhamento do Estado como nunca antes visto neste país e emascular completamente as grandes organizações sindicais, com a criação de um neopeleguismo alimentado a fundos de pensão.

É claro que esse novo tipo de apropriação privada do poder público teve reflexos negativos, que, com toda a certeza, prejudicaram o desempenho do próprio governo Lula. Não estivessem os coronéis que dominam o Congresso Nacional, os partidos que manipulam a máquina do Estado e os neopelegos deslumbrados com seu novo status social - não estivessem todos tão completamente envolvidos na defesa de seus próprios interesses, como a ampliação de suas regalias e de seus privilégios -, certamente os dois mandatos de Lula teriam um saldo de realizações concretas muito mais amplo a apresentar.

Não é à toa que os mais expressivos resultados desses oito anos se concentram nos programas que representam bandeiras históricas e prioritárias do PT - e, não por acaso, se traduzem em votos -, como a incorporação ao mercado de consumo de milhões de brasileiros antes marginalizados. Contudo metas com menores visibilidade e implicação eleitoral imediata, como todas aquelas que dizem respeito à infraestrutura indispensável ao desenvolvimento - estradas, aeroportos, saneamento básico, geração de energia, etc. -, sem falar no descontrole fiscal decorrente da gastança de recursos públicos, o que hoje começa a ameaçar o controle da inflação, quase todas essas ações, cujo implemento depende não apenas de investimentos adequados, mas também de gestão eficiente, ficaram a dever no governo Lula e hoje constituem uma verdadeira herança maldita para Dilma Rousseff.

Assim, a arrogância da família Lula da Silva na recusa a devolver os passaportes diplomáticos que obteve, indevidamente, ao apagar das luzes do "seu" governo não é um fato isolado e "da maior irrelevância", como já declarou um dos mais notórios aduladores do chefe, Marco Aurélio Garcia. Trata-se de mais um triste exemplo da falta de compostura ética e moral que caracterizou e prejudicou oito anos de lulopetismo no comando da República.

Se Lula não conseguiu, ou não soube, ou não quis transmitir certos valores éticos a seus descendentes, não é de admirar que não se tenha preocupado em fazê-lo em relação a seu partido e, principalmente, à enorme massa de seus eleitores. O que importa é ser "pragmático", levar vantagem. Daí a leniência com que ele próprio sempre passou a mão na cabeça dos seus "aloprados", com que o PT absolve um corrupto confesso como Delúbio Soares, com que todos juntos proclamam descaradamente que o mensalão nunca existiu.

Claro, é uma invenção das "elites". Nas quais, hoje, Lula e o PT, e suas duas faces, estão confortavelmente instalados. Ou não?

Jornalista e editor

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Democracia e pesquisas de opinião :: Denis Lerrer Rosenfield

O jogo político em sociedades democráticas passa pela formação da opinião pública. Ideias, concepções e valores fazem parte do contexto de lutas públicas, partidárias ou não, em que diferentes propostas se confrontam. Começam, dessa maneira, a se formar determinados apoios majoritários ou mesmo consensuais a certas ideias, que passam, então, a ser consideradas "normais" - precisamente por serem tidas por mais usuais, como se sua frequência fosse indicativa de sua "normalidade".

Eis por que surgem distintas maneiras de legitimar decisões, recorrendo aos mais diferentes instrumentos, tendo como objetivo ganhar a adesão dos cidadãos. Decisões que não passem por esse "ritual" correm o risco de ser ineficazes. Pesquisas de opinião, dos mais distintos tipos, cumprem, também, essa função.

Observe-se que muitas notícias e manchetes de jornais e revistas estampam que teria havido uma mudança de comportamento dos brasileiros em relação a determinados hábitos, sem que sejam expostas as condições mínimas a partir das quais tais pesquisas foram realizadas. Qual foi a margem de erro dessas pesquisas? Qual o rigor de sua amostragem ou do uso de sistemas de cotas, como gênero e região do País, e modo de entrevistas? Surge, simplesmente, a notícia como se ela retratasse a realidade, sem que indagações ou precauções mínimas sejam tomadas.

Há pouco tempo, o Ministério da Saúde divulgou uma pesquisa com 55 mil pessoas, feita por telefone, sobre os hábitos de brasileiros referentes a fumo, bebidas alcoólicas e obesidade. Imediatamente foram divulgados os resultados, a partir de certas correlações com pesquisas anteriores que indicariam aumento ou queda de certos comportamentos. A margem era tão estreita entre uma e outra que nem se poderia falar de uma mudança de hábito. Qual a sua credibilidade?

Algumas perguntas deveriam impor-se. Qual era a margem de erro dessas pesquisas? Qual a confiabilidade de uma pesquisa desse tipo, na medida em que não há uma listagem pública de telefones celulares no País? Quem não tem telefone fixo não poderia, por princípio, ser entrevistado? Não convém esquecer que o número de celulares no País ultrapassa atualmente o de convencionais.

Notícias, no entanto, foram apresentadas como se esses comportamentos, já tidos valorativamente como nocivos, devessem ser ainda mais controlados. Era evidente o propósito de que tais "pesquisas" servissem de antessala para novas medidas restritivas. Para que elas possam ser tomadas, porém, torna-se necessária uma preparação preliminar, que seria preenchida precisamente pela pesquisa de opinião. O objetivo reside no convencimento, e não numa radiografia fiel da realidade. O mais surpreendente ainda é que outras pesquisas não sejam feitas justamente para contestar ou ao menos equilibrar, do ponto de vista da formação pública, tal tipo de expediente.

Outro caso bastante em voga, e que se acentuará nos próximos meses, é o da campanha do desarmamento. As pesquisas aqui em pauta têm igualmente um forte componente retórico, feito para o convencimento dos cidadãos. Depois do referendo que terminou com a acachapante vitória do não, em inequívoca decisão favorável à liberdade de escolha, toda a política governamental consistiu em desconsiderar o resultado da vontade do povo. O povo, em eleições livres, decidiu pela liberdade de escolha. O que fez o governo? Decidiu estabelecer tal número de restrições à compra de armas que acabou por inviabilizá-la. Se tal tivesse sido o resultado da consulta, nada haveria a objetar. Como não o foi, a pergunta concerne ao próprio respeito a procedimentos democráticos.

Com o intuito de dar legitimidade a esse desrespeito a uma decisão democrática, o subterfúgio usado consistiu em produzir supostos estudos que estabelecem correlações estatísticas tendo como pressuposto que o "povo decidiu mal". A pesquisa visaria, então, a corrigir tal "anomalia". Assim, estudos são produzidos dizendo que a violência diminuiu graças ao desarmamento da população civil. Ora, correlações estatísticas podem ser feitas entre os mais distintos fatores, não indicando necessariamente uma relação causal. Por exemplo, a violência pode ter diminuído por outras causas, como maior eficiência da polícia, decisões judiciais, maior apreensão de armas de bandidos, políticas sociais para populações de baixa renda, unidades pacificadores em morros e favelas, e assim por diante. Privilegiar o desarmamento de pessoas de bem carece de qualquer base científica. No entanto, é essa aparência que procura ser "vendida" à sociedade, em nome de uma suposta "cientificidade" do estudo ou de uma pesquisa.

Outro caso que já povoa as páginas de jornais é o de pesquisas de opinião eleitoral relativas à apreciação dos graus de satisfação com os atuais governadores e prefeitos, além de outras ainda que já procuram medir o potencial dos candidatos às eleições municipais do próximo ano.

A margem estimada de erro de pesquisas de opinião se faz segundo o universo dos entrevistados. Assim, se uma pesquisa de opinião pública for feita com mil entrevistas, sua margem de erro é de 3 pontos porcentuais para mais ou para menos (total de 6 pontos). Se for com 600 entrevistas, a margem de erro sobe para 4 pontos para mais ou para menos (total de 8 pontos). Neste último caso, se se analisar apenas o comportamento das mulheres, metade aproximada da amostra por gênero, o problema se agrava. A margem de erro sobe, então, para 6 pontos para cima ou para baixo (total de 12 pontos).

Eis por que se deve ter o maior cuidado na leitura de certas notícias, pois pode acontecer que seu objetivo seja meramente retórico, o convencimento do outro, e não um retrato, embora momentâneo, da realidade. Contudo esse é, do ponto de vista público, o processo mesmo de formação da opinião pública.

Professor de Filosofia na UFRGS.

FONTE O GLOBO

A agonia de um partido:: Renato Janine Ribeiro

Dez anos atrás, analistas conservadores previam que um terceiro partido, grande e ideológico, se somaria ao PSDB, do centro, e ao PT, de esquerda. Seria o PFL (atual DEM), pela direita. Na ocasião, ele já havia perdido seu presidenciável por excelência, Luis Eduardo Magalhães, precocemente falecido. Mas Roseana Sarney, então filiada a ele, no começo de 2002 despontou como candidata favorita ao Planalto. Com o poder de ACM, na Bahia, e a inteligência de Cesar Maia, no Rio, o partido parecia ter um futuro promissor.

Assistimos agora a sua possível agonia. Fala-se em sua fusão com o PSDB, mas ela cheira mais a incorporação ou anexação do que a uma união em condições de igualdade. Com 43 deputados eleitos em 2010, o DEM se manteve como a quarta bancada na Câmara - mas decaiu muito desde a eleição de 1998, quando com 105 deputados o então PFL compunha o maior grupo parlamentar, por sinal com um número de deputados que nenhum partido conseguiu de lá para cá. Há poucas semanas, ele foi também abandonado pelos próximos do prefeito de São Paulo. A situação é ainda mais grave, se lembrarmos que o DEM já não conta com nenhum governador (o último, José Roberto Arruda, teve de renunciar em condições vergonhosas), nem prefeito de cidade importante, depois de perder Gilberto Kassab. O PSDB pode ter eleito apenas dez deputados a mais que o DEM em 2010, mas governa vários Estados, inclusive os dois maiores, e dispõe de lideranças capazes de disputar a presidência do país.

Por que o DEM está se perdendo? Uma razão importante pode ser o realinhamento que o governo Lula promoveu do voto dos pobres, no Brasil. Durante muito tempo, eles votaram nos coronéis, na direita, no clientelismo. Mas, no governo Lula, os programas sociais fizeram que os pobres não organizados começassem a sufragar candidatos mais próximos de seus interesses econômicos e sociais. Isso certamente esvaziou o grande partido conservador. Outra causa pode ser a dificuldade de viver na oposição. Seus detratores diziam, maldosos, que o DEM tinha "500 anos no governo"; desde 2003, porém, ele se manteve corajosamente na oposição, mas talvez não estivesse muito preparado para isso. Porém, para analisar o esvaziamento do DEM, há cientistas políticos mais capacitados do que eu. Aqui, o que pretendo expor é por que ele não conseguiu ocupar o espaço ideológico que seria de uma direita inteligente e moderna, de um partido liberal consistente.

A visão que os liberais têm da sociedade não inclui simpatia por uma igualdade de resultados. Eles não consideram justo que pessoas que se empenharam pouco ganhem o mesmo que pessoas realmente dedicadas ao trabalho. Mas um liberal consistente defenderá, de maneira intransigente, a igualdade de oportunidades. O ponto de chegada é diferente e depende de cada um de nós. Já o ponto de partida requer ações, inclusive do Estado, para que ninguém tenha desvantagens excessivas - ou sequer vantagens exageradas. Jean-Jacques Servan-Schreiber, um dos grandes liberais do século XX, defendia até a abolição da herança. Mesmo liberais mais modestos procuram zerar as dificuldades com que muitos nascem. Por isso, a ação afirmativa e até as cotas sociais e étnicas podem se adequar bastante bem ao que chamo de liberalismo autêntico. Nada disso, porém, sequer se vislumbrou no PFL-DEM, que foi e é um partido, simplesmente, conservador.

Um liberal quer que todos comecem sem vantagens ou prejuízos imerecidos, mas com a finalidade de que cada um possa empreender o máximo possível. O verbo "empreender" tem tudo a ver com "empresário" - mas, cada vez mais, se liga a empreendedor. Há muito mais empreendedores do que empresários. Estes, geralmente, têm mais dinheiro e atuam essencialmente na economia. Já o empreendedor é com frequência um pequeno empresário e pode atuar em inúmeros setores, inclusive o social. Em outras palavras, um partido liberal de verdade deveria incentivar enormemente os pequenos empresários. Seria o partido do Simples. Não seria o partido dos ricos, das grandes empresas ou do PIB. Seria o partido dos pequenos que querem crescer com base na iniciativa e trabalho pessoais.

Mas essa categoria, ou talvez classe, social está politicamente órfã no Brasil, por assim dizer. Nenhum partido se interessa demais por ela - quando muito, o PSDB ou o PT no governo evitam prejudicá-la demais e tentam atraí-la um pouco - e ela também não se empenhou em se organizar do ponto de vista político.

Talvez o pior de tudo seja a incapacidade do DEM - e, por que não dizer, de nossos partidos - em assumir o empreendedorismo social como causa. Não, talvez me engane ao criticar todos os partidos: Ruth Cardoso, com suas ações na Comunidade Solidária, ia por aí; é possível que a franja empresarial da candidatura Marina Silva também tomasse esse rumo. Mas é digno de nota que justamente o partido que mais brandiu o termo "liberal" em nosso período republicano - o Partido da Frente Liberal, que com esse nome viveu de 1985 a 2007 - não se tenha interessado por isso. Se assim foi e assim é, lamento dizer que não se empenhou em promover o que seria seu diferencial específico, sua missão histórica.

Pode ser que o DEM sobreviva, sem fusão. Tudo indica, porém, que já perdeu seu lugar no Clube dos 4 Grandes que, a exemplo do futebol, define a política partidária brasileira. Curiosamente, parece que sua vaga foi para o PSB, que soma a uma bancada congressual não tão grande um elenco, esse sim, significativo de governadores. Mas o problema, com ou sem o DEM, é que continua nos faltando um partido autenticamente liberal.

Renato Janine Ribeiro é professor titular de ética e filosofia política na Universidade de São Paulo

FONTE: VALOR ECONÔMICO

Marco zero:: Melchiades Filho

A deterioração de expectativas na economia pegou de jeito o governo Dilma. Expôs não apenas divergências internas, mas a falta de inspiração e de projetos.

Basta conferir as mais recentes medidas anunciadas pelo Planalto no esforço de contragolpear e impor uma agenda positiva: não há ali nada de novo, que dirá inovador.

A começar pela estratégia para lidar com a inflação e a sobrevalorização do real. Depois de testar o "macroprudencialismo", o governo capitulou à velha cartilha do mercado. Deixou de lado a questão cambial, confirmou mais altas de juros e candidamente pediu aos brasileiros que adiem as compras.

Prioridade zero de Dilma, o plano contra a miséria nasceu a reboque do Bolsa Família -e tímido, com meta inferior à prometida.

E vem aí o Água para Todos, reembalagem do eficiente programa de cisternas no Nordeste, na tentativa de emular o sucesso marqueteiro do Luz para Todos.

O esperado choque de gestão? Por ora, somente o reagrupamento de 360 programas em 60 escaninhos. Nada comparável ao PAC, que ao menos tornou público o monitoramento de obras e mudou o fluxo de transferência de recursos.

O governo desperdiçou a chance de pactuar demandas históricas de produtores rurais e ambientalistas. Entregou ao Congresso o ônus e o bônus do novo Código Florestal.

Buscou na gaveta a "solução" para modernizar os aeroportos: um modelo de concessões que não havia sido adotado sob Lula apenas por (in)conveniências eleitorais.

E, na área da segurança, em vez de centrar fogo em iniciativas pioneiras (como um cadastro nacional do crime), lançou outra campanha de desarmamento. "Déjà-vu" total.

Ao final dos cem primeiros dias, especulava-se em que Dilma iria investir a aprovação e a popularidade acumuladas. Essas dúvidas persistem -e a comparação com Lula, até aqui favorável à sucessora, deverá começar a incomodar.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

O triunfo da força:: Ricardo Noblat

Frente à morte de um homem, um cristão jamais se alegra”. (Bento XVI, a propósito da morte do terrorista Bin Laden)

Ao longo da semana passada, a morte do terrorista Osama bin Laden foi contada e recontada pelo governo dos Estados Unidos. E corrigida a cada vez que foi contada. Amadorismo da parte dos autores de tantas versões? É possível. O atentado do 11 de Setembro só não foi evitado por excesso de amadorismo dos órgãos americanos de inteligência.

É possível tambémque a sucessão de versões para a morte de Bin Laden não passe de manobra do governo para esconder o que de fato ocorreu. Com o que já se sabe, porém, dá para

construir uma narrativa — e ela émuita feia à luz do Direito Internacional, dos Direitos Humanos e dos valores da democracia.

Em certa ocasião, candidato a presidente, Obama disse com todas as letras: “Nós vamos matar Bin Laden.” Não disse: “Nós vamos prender Bin Laden.” Muito menos: “Vamos prender, julgar e condenar Bin Laden.” Disse: “Nós vamos matar Bin Laden.” Poderia ter sido mais claro? Certamente, não.

Podia ter dito o que disse? À luz do Direito, a resposta outra vez é não. Porque numa democracia existe a separação de poderes. Não é o Executivo, encarnado pelo presidente da República, que julga econdena quem quer que seja. É a Justiça. No caso da americana, ela pode condenar à morte

A tropa de elite despachada para o Paquistão à caça de Bin Laden recebeu a ordem expressa de matá-lo. Não encontrou resistência. A versão de que houve um tiroteio de 40 minutos foi trocada depois pela versão de que apenas uma pessoa disparou contra os soldados. E logo morreu.

Bin Laden estava no andar superior de sua mansão —nisso concordam os relatos dos americanos e de uma filha dele, detida em um andar abaixo e agora sob custódia do governo paquistanês. Segundo os americanos, ali ele foi morto. Segundo a filha, o terrorista foi levado para o andar onde estavam outros parentes dele e executado.

O terrorista estava armado e resistiu — por isso foi morto (1a - versão). O terrorista estava desarmado, mas tentou resistir (2a - versão. Resistir como? No tapa? No grito? Invocando Alá?). O terrorista estava desarmado, mas havia um fuzil e uma pistola ao alcance da sua mão (3a - versão).

Poderiam tê-lo ferido na perna, por exemplo.

Não cabe a suposição de que ele escondesse explosivos junto ao corpo. Ninguém passeia dentro de casa carregando explosivos. De resto, não houve tempo suficiente, entre o início do

assalto à mansão e o disparo do tiro que omatou, para que Bin Laden munisse o corpo de explosivos.

Da mesma forma como Bin Laden morto foi transferido para um porta-aviões ede lá jogado no mar,também poderia ter sido levado vivo ao porta-aviões e de lá para os Estados Unidos.

Nos anos 50, um comando de Israel prendeu na Argentina o nazista e assassino de milhões de judeus Adolf Eichmann. Uma vez julgado, mataram-no.

Bush Jr ., que invadiu o Iraque sob ofalso pretexto de que o país armazenava armas de destruição em massa, derrubou o ditador Saddam Hussein eordenou sua captura. Saddam foi descoberto dentrode um buraco. Teria sido fácil matá-lo. Foi julgado pela Justiça do seu país sob o controle dos americanos. Acabou enforcado. As aparências foram salvas.

Em momento algum, Obama pareceu preocupado em salvar as aparências. Prometera durante acampanha fechar a prisão de Guantánamo, em Cuba, onde pessoas detidas ilegalmente são torturadas. Não fechou. A pista para a localização do esconderijo de Bin Laden foi obtida mediante a tortura de um terrorista.

Asoberania do Paquistão foi violada pelos Estados Unidos. E o mundo festejou um ato de justiça que não passou de vingança. Que me perdoem os realistas ou indiferentes: sou pai de três

filhos. Ganhei um neto há pouco. Não posso dizer a eles que tortura, assassinato e violação da soberania de um país são crimes justificáveis em certos casos.

Quem decide que casos são esses? Quem tem aforça. No 11 de Setembro foi Bin Laden. Agora, Obama.

FONTE: O GLOBO

Do mensalão aos aplausos

Além de festa para Delúbio em sua terra natal, fim de semana teve medalha militar para Genoino

Gabriel Manzano

Seis anos depois do mensalão, que abalou suas vidas e carreiras, os petistas José Genoino e Delúbio Soares atravessaram o fim de semana com um gostinho de volta por cima. Delúbio, há dez dias um tesoureiro expulso, que assumira em 2005 a culpa pelos "recursos não contabilizados", foi recebido em grande estilo pelo PT de Buriti Alegre (GO), numa festa de 200 pessoas, por seu retorno ao PT. Discursou como candidato.

A diversão dos amigos, à sua volta, era reinterpretar o passado. "Foi uma injustiça grande, mas o erro acabou reparado", festejou o presidente do PT local, Delmar Arantes. "O mensalão é parte da História", decidiu Darci Accorsi, ex-prefeito de Goiânia.

Genoino, que presidia o PT quando o escândalo de 2005 veio à tona, recebeu ontem, no Rio, a Medalha da Vitória - a primeira dada pelo Ministério da Defesa a um ex-guerrilheiro. Em pleno 8 de Maio, que pelo mundo afora é saudado como o fim da Segunda Guerra Mundial - em que se varreu da história o autoritarismo nazista -, o assessor especial de Nelson Jobim entrou numa lista de 284 pessoas agraciadas por terem contribuído para a democracia e a paz.

"O que o Brasil deseja fazer é um grande ajuste de contas com seu futuro. O Brasil não quer retaliar seu passado", justificou Jobim, ao dar a medalha ao antigo adversário do regime militar, que nos anos 70 o desafiou integrando a Guerrilha do Araguaia.

O petista não esconde a surpresa com as viradas da História: "Olha, tem acontecido tanta coisa na minha vida e na história do Brasil que a gente só tem que acreditar no Brasil e no futuro, porque muita coisa surpreendente vem acontecendo positivamente".

Genoino não ficou sozinho nessa hora. Na lista dos outros 283 medalhados estavam quatro ministros petistas - Antonio Palocci (Casa Civil), José Eduardo Cardozo (Justiça), Luíza Barros (Igualdade Racial) e Maria do Rosário Nunes (Direitos Humanos).

Na contramão. Mais poderoso petista depois do presidente Lula, nos idos de 2005, e tido como "chefe da quadrilha" do mensalão, José Dirceu teve um fim de semana menos brilhante. Em reportagem, a revista Veja traz uma acusação contra ele feita pelo empresário Fernando Cavendish. Este atribui a Dirceu a frase: "Com alguns milhões seria possível até comprar um senador para conseguir um bom contrato com o governo". Dirceu negou e avisou, ontem, que vai processar os autores da acusação. PSDB e DEM querem convidar o denunciante a depor no Senado.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Propaganda oficial dobrou na eleição

Governo concentrou nos meses decisivos da campanha pagamentos de verbas publicitárias a veículos de comunicação

Secom afirma que serviços prestados no início do ano podem ter sido pagos com atraso durante a campanha

Breno Costa e Márcio Falcão

BRASÍLIA - A Presidência da República repassou verbas de publicidade para o dobro de rádios, TVs e jornais durante a campanha eleitoral de 2010, que elegeu a candidata do governo, Dilma Rousseff (PT), em comparação com o mesmo período de 2009.

Foram 2.921 os veículos de comunicação que receberam pagamentos da Secom (Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República) somente entre julho e outubro do ano passado. Em 2009, nesse mesmo período, foram 1.492 os beneficiados.

A Folha levantou os números na execução dos contratos firmados pela Secom com agências publicitárias. Os dados incluem nomes de veículos beneficiados, mas não discriminam valores.

Entre janeiro de 2009 e julho de 2010, a média trimestral de veículos que receberam pagamentos da Secom foi de 1.148, entre rádios, TVs e jornais. No trimestre que antecedeu as eleições, de julho a setembro de 2010, o número subiu para 2.637.

Com Dilma eleita, a média caiu consideravelmente nos quatro primeiros meses do novo governo: apenas 844 veículos receberam pagamentos. Os contratos com as agências de publicidade foram mantidos.

Com R$ 150 milhões anuais, a Secom é dona do terceiro maior orçamento de publicidade do governo, atrás da Petrobras e da Caixa Econômica Federal, e empatando com o Banco do Brasil.

A verba é dividida entre três agências publicitárias que desde 2008 vêm renovando anualmente seus contratos: Matisse, Propeg e 141 Soho Square.
LEGISLAÇÃO

A legislação eleitoral proíbe veiculação de propaganda do governo a partir de julho, início oficial da campanha, mas não impede que sejam feitos pagamentos por serviços de publicidade prestados meses antes.

Essa é a justificativa apresentada pela Secom aos questionamentos feitos pela Folha (leia texto abaixo). No entanto, não foi explicada a razão do acúmulo de repasses de verba oficial nos meses da campanha.

O levantamento aponta que, na campanha, rádios e TVs de políticos ou seus parentes receberam pagamentos de publicidade. Na base aliada, foram beneficiados veículos do empresário Fernando Sarney e do senador Edison Lobão Filho -filhos, respectivamente, do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP) e do ministro Edison Lobão (Minas e Energia)-, além do senador Fernando Collor (PTB-AL).

Veículos controlados por oposicionistas como José Agripino Maia (DEM-RN) e Tasso Jereissati (PSDB-CE) também receberam recursos.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

PSDB tenta solucionar impasse em São Paulo

Partido busca acordo para renovar direção

SÃO PAULO -Em meio à crise pela debandada de vereadores na capital paulista, o PSDB terá que resolver esta semana o novo impasse que suspendeu a eleição de sua cúpula estadual em São Paulo.

A escolha estava prevista para o último sábado, mas foi adiada para esta quinta-feira por falta de acordo sobre a secretaria-geral do partido.

Numa tentativa de solução, tucanos ofereceram ao atual ocupante do cargo, César Gontijo, o posto de secretário -um andar abaixo na hierarquia da sigla.

Mas ele ainda resiste a abrir mão de sua vaga para instalar o deputado federal Vaz de Lima, próximo ao ex-governador José Serra.

Gontijo é ligado ao deputado federal José Aníbal, que tenta mantê-lo no cargo para reforçar sua pré-candidatura a prefeito em 2012.

O presidente do diretório será o deputado estadual Pedro Tobias, do grupo do governador Geraldo Alckmin.

A convenção de sábado deixou clara a divisão dos tucanos. Para aparentar união, Serra e Alckmin foram ao ato no mesmo carro, com o ex-governador ao volante.

Pouco depois, deram opiniões opostas sobre a criação do PSD do prefeito Gilberto Kassab -aliado de Serra que, segundo Alckmin, participa de uma ação para "dizimar a oposição" no país.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Inflação corrói rentabilidade

O “surto inflacionário” está engolindo os rendimentos dos fundos de renda fixa, mesmo aqueles atrelados à taxa oficial de juros (Selic). A caderneta de poupança (2,3% nos quatro primeiros meses de 2011) ainda é uma das melhores opções, mas continua abaixo do IPCA (3,23% no ano).

Inflação em alta engole rendimento de poupador

Poupança rende de 0,55% a 0,68% ao mês, conforme o dia do aniversário, e continua batendo vários fundos de renda fixa. Com elevação do custo de vida, saída é acompanhar os investimentos e comparar o ganho líquido das diversas opções oferecidas pelos bancos.

Ana D"angelo e Victor Martins

Nem mesmo a alta da taxa básica de juros da economia, a taxa Selic, desbancou a caderneta de poupança entre as melhores aplicações financeiras neste ano. O investimento preferido do brasileiro está rendendo entre 0,55% e 0,67% ao mês, acima da rentabilidade líquida de vedetes do mercado, como diversos fundos de renda fixa DI para valores de aplicação mais baixos, em torno de R$ 100 a R$ 5.000. A má notícia é que, a exemplo do ano passado, quase todas as aplicações estão perdendo para a inflação nos primeiros quatro meses do ano.

O “surto inflacionário” que atingiu a economia brasileira, como denominou o ministro da Fazenda, Guido Mantega, está engolindo a rentabilidade de quase todos os investimentos de renda fixa. A caderneta de poupança, com aniversário no dia 1º, totalizou ganho de 2,3% nos quatro primeiros meses do ano. Bem abaixo da inflação medida pelo IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), calculado pelo IBGE, que acumula 3,23% de alta no ano. A estimativa para o INPC, também do IBGE, deve ficar em 2,9% de janeiro a abril.

A maior parte dos fundos de renda fixa dos bancos, mesmos os chamados fundos DI (atrelado à taxa Selic), rendeu entre 2% e 3,65% brutos de janeiro a abril, dependendo da instituição e da característica do fundo. Como essas aplicações pagam Imposto de Renda entre 22,5% (prazo de até seis meses) e 15% (se ficar aplicado por mais de dois anos), o rendimento míngua para algo em torno de 1,6% e 2,9%. Em abril, tiveram ganho líquido em torno de 0,58% e 0,60%, conforme pesquisa feita nos sites do Bradesco, Santander, Caixa e Banco do Brasil. Tal rentabilidade faz com que vários desses fundos estejam atrás também da poupança.

Só os grandes fundos, aqueles que exigem depósitos maiores, de R$ 20 mil para cima, ainda estão oferecendo ganho líquido igual ou pouco maior que a inflação. Mesmo assim, porque destinam parte dos recursos para o mercado de derivativos, de mais risco, como de commodities.

Nesse cenário de inflação em alta e aumento da Selic, o diretor da corretora Easynvest, Amerson Magalhães, aconselha concentrar os investimentos nos chamados fundos DI pós-fixados, ou seja, atrelados à variação do CDI (Certificado de Depósito Interbancário). “A Selic vai subindo, a rentabilidade também vai acompanhando”, afirma ele. É a saída para o poupador conseguir ganhar pelo menos igual à inflação.

“No quadro atual, a mais prejudicada é a poupança, que tem rentabilidade fixa”, diz ele, referindo-se aos 6% de rentabilidade ao ano, ou 0,5% ao mês, embora receba também a variação da TR (Taxa Referencial de Juros), que tem ficado entre 0,04% e 0,17% ao mês, menos de 1% ao ano. Segundo ele, com o aumento das taxas de juros, os fundos de renda fixa prefixados também sofrem, pois têm o rendimento calculado sobre uma taxa de juros anterior.

Magalhães alerta, no entanto, que o investimento mais interessante hoje é o Tesouro Direto, que é a compra de títulos públicos online pelo site da Secretaria do Tesouro Nacional, em especial daqueles atrelados à inflação, IPCA ou IGP-M (leia mais nesta página).

A economista Camila Beraldo, 30 anos, manteve suas economias na poupança desde a queda da Selic, em meados de 2009, mas agora está revendo a estratégia. “Investir diretamente nos títulos públicos, no Tesouro Direto, é mais garantido atualmente”, acredita ela.

A superintendente de investimentos do Santander, Sinara Polycarpo, recomenda também as aplicações pós-fixadas e que acompanham a taxa Selic. Ela considera a aplicação em CDB-DI uma excelente opção. “Garante um percentual da Selic e, dependendo do tempo que o dinheiro ficar aplicado, o cliente pode conseguir uma taxa ainda melhor”, observa. Em geral, os fundos DI que pagam mais exigem valores iniciais e novas aplicações maiores, a partir dos R$ 10.000.

Os CDBs estão entre as melhores aplicações, assegurando rendimento melhor — um percentual do CDI, que vai de 80% a 95%, conforme o tempo de aplicação.

IPCA e INPC

O índice reflete o custo de vida de famílias com renda mensal de 1 a 40 salários mínimos (R$ 21.800), residentes nas regiões metropolitanas de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Porto Alegre, Curitiba, Salvador, Recife, Fortaleza e Belém, além do Distrito Federal e do município de Goiânia. Já o INPC reflete a variação de preços de produtos e serviços consumidos por famílias desses municípios e DF até oito salários mínimos (R$ 4.360).

FONTE: CORREIO BRAZILIENSE

Impacto sobre salários deve ser forte

Sergio Lamucci

São Paulo - Com a alta mais forte dos índices de preços, os aumentos reais de salários neste ano estão mais modestos do que em 2010, quando não raro chegaram a superar a inflação em 3%. Esses reajustes reais menores, porém, tendem representar um ganho mais expressivo nos 12 meses à frente, quando a inflação deverá perder fôlego, como aponta o economista-chefe da corretora Convenção, Fernando Montero.

"Paradoxalmente, salários corrigidos pela inflação passada, mesmo sem nenhuma correção real, podem ter ganhos maiores nos 12 meses seguintes do que no ano passado", afirma Montero. Com isso, o rendimento do trabalho continuará a ser um impulso significativo para a demanda.

O economista compara a situação de reajustes no terceiro trimestre de 2010 com a do mesmo período deste ano, quando haverá a combinação de inflação ao consumidor rodando acima de 7% no acumulado em 12 meses com a concentração de dissídios de categorias importantes de trabalhadores, como os metalúrgicos do ABC.

No terceiro trimestre de 2010, a média do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), usado em geral como parâmetro para as negociações salariais, teve um aumento médio de 4,5% em 12 meses. Uma categoria que teve um aumento real de 3% nessa ocasião viu os salários subirem 7,6% em termos nominais. Nos 12 meses seguintes, porém, a inflação média se acelerou, chegando a 6,6%. "Com isso, o ganho real efetivo de salários foi de 1,1%", diz Montero.

Já no terceiro trimestre deste ano, a média do INPC deverá estar em 7,2% em 12 meses. Para mostrar o impacto significativo da inflação futura em queda sobre a renda, Montero dá um exemplo em que os trabalhadores conseguem apenas os 7,2%, sem aumento real. "Num cenário em que a projeção do mercado para a inflação média dos 12 meses seguintes será de 5,5%, o ganho real efetivo dos salários será de 1,5%", diz ele. Como algumas categorias devem conseguir aumentos acima da inflação passada, os ganhos reais nos 12 meses à frente podem ser ainda maiores. O mesmo vale se a queda da inflação futura for ainda mais significativa, observa Montero.

"Os dissídios no terceiro trimestre envolvem algumas categorias fortes e mobilizadas, que podem conseguir aumentos reais, ainda que as negociações devam ser mais difíceis do que no ano passado", diz o economista-chefe da Máxima Asset Management, Elson Teles.

Ele acredita que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que nos 12 meses até abril somou uma variação de 6,51%, deverá atingir 7,2% em agosto e 7,1% em setembro, nessa base de comparação. Nos meses seguintes, a expectativa é de que o indicador perderá força em 12 meses, até fechar o ano em 6,4% a 6,5%, praticamente no teto da meta perseguida pelo Banco Central, de 6,5%.

Montero nota ainda que algo na mesma linha do que ocorrerá com os dissídios vai se dar com o salário mínimo em 2012. No ano que vem, diz ele, o valor do piso salarial deverá passar de R$ 545 para R$ 625, devido à regra do reajuste que combina a variação de 6% do INPC de 2011 e do crescimento do PIB de 7,5% de 2010, além de um arredondamento do valor para um múltiplo de R$ 5.

Levando em conta que a inflação em 2012 será menor do que a deste ano e que em 2011 o piso valeu R$ 540 em dois meses (janeiro e fevereiro), o salário mínimo poderá ter um ganho médio real superior a 9%, diz Montero. "Somente o ganho real do salário mínimo resulta num aumento de quase 0,4% no PIB."

Essa situação traz algumas preocupações, diz Montero. Segundo ele, um mercado de trabalho com elevado grau de indexação tende a implicar mais custos salariais, menor competitividade das empresas e "uma combinação de tudo o que leva a realimentação inflacionária". Num momento em que há dificuldades para trazer a inflação de volta à trajetória das metas, é um quadro complicado.

O BC aposta que o IPCA voltará ao centro da meta, de 4,5%, em 2012. As projeções do boletim Focus apontam para um número de 5%, enquanto Teles vê algo mais próximo de 5,5%. "Haverá o forte aumento do salário mínimo e muita inércia inflacionária. Acho difícil que o IPCA caia mais do 1 ponto percentual no ano que vem."

FONTE: VALOR ECONÔMICO

BIS pede a emergentes freio na inflação para ajudar os países ricos

Assis Moreira

Basileia - O Banco Internacional de Compensações (BIS), espécie de banco dos bancos centrais, cobra dos países emergentes mais alta de juros e corte de gastos públicos para ajudar na contenção à inflação também nas nações desenvolvidas.

Na avaliação do banco, os emergentes estão exportando inflação para os desenvolvidos num momento em que esses países enfrentam recuperação econômica incerta e ainda sem força suficiente para agir no combater às pressões inflacionárias. EUA e Japão estão com juros próximos de zero e desemprego elevado. O Banco Central Europeu adiou na semana passada uma alta dos juros, apesar de temor de inflação.

O Brasil teria situação diferente de outros emergentes. É o único país destacado pelo BIS como a economia emergente onde as taxas de juros reais, o controle de capital e mudança na variação cambial caminham para um aperto monetário, apesar de o crédito continuar crescendo no país, segundo fontes em Basileia.

Documento que o BIS submeteu aos presidentes dos principais bancos centrais, reunidos desde ontem em Basileia para avaliar o estado da economia global, reitera a necessidade de uma sinalização forte dos BCs contra uma inflação que aumenta em nível mundial.

Analistas de bancos internacionais consideram ainda que alguns bancos centrais de emergentes não reagiram o suficiente contra a inflação A inflação nesses paises subiu para 6,1% em março, numa alta de 1,5 ponto desde o final de 2009, mas as taxas de juros subiram menos da metade em média.

Para o Banco Central da Suíça, a demanda sempre forte dos emergentes estimularia, no conjunto, a alta de preços das commodities.

Na avaliação de certos analistas, o fato novo e que pode ser permanente é que o ciclo de inflação não é mais resultado do ciclo economico dos desenvolvidos, e sim do ciclo dos emergente, refletindo também sua crescente participação na economia mundial.

"A inflação pode retornar nos países desenvolvidos quando eles estão no começo de um período de recuperação econômica e o desemprego é elevado, isso porque a alta nos preços das commodities e de outros produtos importados ocorre em razão do ciclo econômico dos países emergentes, cujo peso se tornou tão alto que agora eles conduzem o ciclo de inflação global", afirmou Patrick Artus, do banco Natixis, de Paris.

Isso significa que o aumento das taxas de juros pelos bancos centrais na Europa e nos Estados Unidos seria "provavelmente ineficiente [pois não é o ciclo econômico doméstico que causa inflação] e rejeitado pela opinião publica [porque ocorre numa situação de enorme desemprego]", acrescenta.

Abordando por outro ângulo, Phillip Poole, do HSBC, em Londres, nota que a diferença da "volta da feia inflação" desta vez é que os bancos centrais dos emergentes estão na verdade combatendo o Federal Reserve (Fed), o banco central americano. "Com os recursos do Fed a custos próximos de zero e mais flexibilização monetária, o Fed efetivamente está "deflacionando" o mundo emergente".

Ou seja, o aperto de juros nos emergentes eleva o risco de atrair mais liquidez criada pelo Fed, diz Poole, ilustrando a dimensão do problema.

O desafio é como fazer os bancos centrais aumentarem os esforços para resistir à pressão inflacionária, tomando o cuidado de não fazer isso ao preço de uma aterrissagem forçada (hard landing) da economia mundial.

O BIS destaca incertezas na expansão das economias desenvolvidas. Analistas notam que o aumento nos números de emprego nos EUA não reduziu a taxa de desemprego de 9%, um recorde. O choque no Japão, a terceira maior economia mundial, é destacado pelo banco.

Documentos de discussão não mencionariam o rumo das commodities, segundo uma fonte. Já no mercado, a questão agora é se a forte queda nos preços das matérias-primas na semana passada foi apenas uma correção ou o começo de um "crash", que afetaria sobretudo a Latina América.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

Estádios para a Copa já estão 15% mais caros

Custo para remodelar cinco arenas e construir outras sete já está em R$ 6,37 bi.

Obras 15% mais caras

Rodrigo Müzell

Custos subestimados e mudanças nos projetos fazem estádios da Copa custarem em média 15% mais do que o orçado – mesmo com obras ainda no início

Em janeiro de 2010, quando o Governo Federal finalmente produziu um documento listando as obras necessárias para realizar a Copa de 2014, a remodelação de cinco estádios e a construção de outros sete custaria R$ 5,54 bilhões. Pouco mais de um ano depois, a cifra que consta nos orçamentos chega aos R$ 6,37 bilhões.

E pode aumentar, temem analistas, já que algumas das obras mais caras, como a do Maracanã, ainda não têm seus projetos apresentados. A discrepância entre os orçamentos iniciais e as planilhas atuais pode ser explicada por dois fatores: custos subestimados e mudanças posteriores.

– Essas diferenças no orçamento não são normais. Indicam que o projeto básico não foi feito com o detalhamento necessário – diz o presidente do Sindicato da Arquitetura e Engenharia de São Paulo, José Roberto Bernasconi.

Para Gil Castello Branco, diretor da Fundação Contas Abertas, mesmo os estádios abaixo da previsão inicial não garantem sono tranquilo aos contribuintes. Muitas vezes, nos projetos não constam materiais e estruturas necessárias.

Adequar um estádio, em vez de construir um novo, pode não ser economia: a reforma do Maracanã deve superar a cifra de R$ 1 bilhão, enquanto a remodelação do Mineirão custará R$ 645 milhões – valor próximo ao da nova Arena do Grêmio e da reforma do Beira-Rio, somados. Na maior parte das sedes, é o governo estadual quem banca a reforma, podendo tomar empréstimo no BNDES.

Com 90% dos investimentos públicos, a preocupação não é só em relação ao custo e ao prazo das obras, mas também com o legado dos estádios.

Arenas precisam faturar R$ 9 mihões líquidos por ano

O Tribunal de Contas da União (TCU) já alertou mais de uma vez para o risco dos estádios de Brasília, Cuiabá, Manaus e Natal se tornarem elefantes brancos. Nas quatro capitais, as arenas vão ser utilizadas por times fora da primeira divisão do Campeonato Brasileiro.

– Vamos apostar na capacidade multiuso da arena, porque nosso futebol realmente não é suficiente – explica o gestor da Arena Amazônia, Ariovaldo Malísia.

Receber shows e abrigar shoppings são opções. Mas para o consultor Amir Somoggi, da BDO RCS, as arenas bem-sucedidas têm a maior parte do faturamento atrelada aos jogos. Para R$ 500 milhões se pagarem, é preciso faturar R$ 9 milhões líquidos por ano, por 20 anos.

As arenas consideradas a perigo pelo TCU não têm ainda um parceiro comercial. Para a consultora especializada em estádios Andressa Rufino, isso é um erro: o uso comercial deve ser pensado desde o projeto. Porém, a prioridade agora é construir os estádios a tempo. O chefe de gabinete do governo do Distrito Federal, Cláudio Monteiro, relata que o governo não tem uma estimativa de lucros e nem de custos de manutenção do estádio que está sendo erguido no lugar do Mané Garrincha, ao custo de R$ 696 milhões.

– Não conheço nenhum estádio que tenha feito essa estimativa – reconhece.

FONTE: ZERO HORA (RS)

Igual-desigual :: Carlos Drumonnd de Andrade

Eu desconfiava:

todas as histórias em quadrinho são iguais.
Todos os filmes norte-americanos são iguais.
Todos os filmes de todos os países são iguais.
Todos os best-sellers são iguais.
Todos os campeonatos nacionais e internacionais de futebol são
iguais.
Todos os partidos políticos
são iguais.
Todas as mulheres que andam na moda
são iguais.
Todas as experiências de sexo
são iguais.
Todos os sonetos, gazéis, virelais, sextinas e rondós são iguais
e todos, todos
os poemas em versos livres são enfadonhamente iguais.


Todas as guerras do mundo são iguais.
Todas as fomes são iguais.
Todos os amores, iguais iguais iguais.
Iguais todos os rompimentos.
A morte é igualíssima.
Todas as criações da natureza são iguais.
Todas as ações, cruéis, piedosas ou indiferentes, são iguais.
Contudo, o homem não é igual a nenhum outro homem, bicho ou
coisa.
Não é igual a nada.
Todo ser humano é um estranho
ímpar.