terça-feira, 10 de maio de 2011

Reflexão do dia – Roberto Freire

O controle da legalidade dos atos de execução orçamentária, com verificação prévia dos atos, tornou-se um comando inócuo pela característica do acesso ao cargo de controlador-geral: a indicação simples, nua e crua. É ele um refém da própria atuação; se controla, pode incomodar e ser posto para fora.

O ápice da demonstração de fraqueza de atuação vem pela própria constatação, por parte da imprensa e da sociedade, de que as controladorias podem escolher quais procedimentos de despesa serão auditados, em detrimento de outros em que a atenção se vê adormecida pelo sonífero dos interesses políticos. Nesse aniversário da LRF, é hora de dar um basta às despesas públicas falsas e fantasmas. E também à mentira, ao faz-de-conta e à fraqueza institucional.

Roberto Freire, deputado federal e presidente do PPS. Responsabilidade fiscal, conquista do cidadão . Brasil Econômico, 6/5/2011

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO

Inflação faz governo pressionar Petrobras a baixar a gasolina

FOLHA DE S. PAULO

Depressão e álcool tiram mais anos de vida do brasileiro

O ESTADO DE S. PAULO

Governo quer abater dívida rural de quem reflorestar

CORREIO BRAZILIENSE

A ladainha do consumidor - Devo, não nego. E Vou gastar mais

ESTADO DE MINAS

Governo joga duro com os médicos dos planos

ZERO HORA (RS)

Metade das cidades gaúchas ignora o Código de Trânsito

JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Recife vai derrubar casas em área de riscos

VALOR ECONÔMICO

Tesouro quer limitar gastos com custeio administrativo

BRASIL ECONÔMICO

Governo abandona construção de novas hidrelétricas na Amazônia

Inflação faz governo pressionar Petrobras a baixar a gasolina

Para segurar a inflação, o governo decidiu usar a BR Distribuidora, subsidiária da Petrobras, para forçar a queda dos preços dos combustíveis aos consumidores. O ministro Edison Lobão disse que a pressão sobre a BR, que tem 7 mil postos no Brasil (18% do total) e controla 47,8% do volume de combustíveis vendidos, tem como objetivo acirrar a competição, em um setor que, para ele, vive um processo de cartelização. "O governo vai pressionar a BR para baixar o custo. Se os outros (revendedores) não seguirem a queda, a BR vai vender mais", disse Lobão. Entre janeiro e abril, o álcool subiu 31 % e a gasolina, 9,58%. A federação que representa os donos de postos classificou as declarações de Lobão de "irresponsáveis e infundadas". Nas usinas, os preços de álcool hidratado e anidro (misturado à gasolina) caíram na semana passada, pela segunda vez consecutiva, mas a queda ainda não chegou ao consumidor.

Posto de chapa branca

SOB PRESSÃO

Ministro diz que governo vai usar a BR para forçar queda nos preços dos combustíveis e deter inflação

Mônica Tavares e Ramona Ordoñez

Ogoverno decidiu utilizar a BR Distribuidora - subsidiária da Petrobras que tem cerca de 7 mil postos no Brasil (18% do total de revendedores) e 47,8% do volume de combustíveis vendido - para forçar a queda dos preços dos combustíveis aos consumidores finais. O ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, afirmou ontem ao GLOBO que o objetivo será acirrar a competição, em um ambiente que, para ele, está passando por um processo de cartelização. Ainda assim, o ministro garantiu que preços do etanol começaram a cair ontem, refletindo o fim da entressafra da cana-de-açúcar. O etanol é o principal foco de pressão individual sobre a inflação nos últimos meses. Tem reflexo ainda no preço da gasolina, que, no Brasil, é comercializada com 25% de álcool combustível.

- O governo vai pressionar a BR Distribuidora, da Petrobras, para baixar o custo, ela tem uma cadeia de postos. Se os outros (revendedores) não seguirem a queda, a BR vai vender mais combustível - afirmou o ministro, sem adiantar em que fase estão as conversas com a Petrobras.

Não será a primeira vez que a estatal será usada, este ano, como instrumento para evitar a alta dos combustíveis. Na visão da empresa, a escalada acentuada da cotação do barril do petróleo no mercado internacional desde janeiro, há mais de um mês justificaria um reajuste da gasolina nas refinarias. O presidente da Petrobras, José Sergio Gabrielli, fez esta ponderação mais de uma vez em público, e sofreu ataque incisivo tanto de Lobão quanto do ministro da Fazenda, Guido Mantega. Prevaleceu a decisão da presidente Dilma Rousseff de segurar ao máximo o repasse. A preocupação é com a inflação. Entre janeiro e abril, o álcool subiu 31,09%, mais de nove vezes e meia a inflação acumulada no período pelo IPCA, que ficou em 3,24%. A gasolina aumentou três vezes a variação média dos preços da economia, 9,58%.

Preço nas usinas cai; nos postos, não

Lobão credita parte da alta duradoura dos preços dos combustíveis nas bombas a uma suposta formação de cartel no setor. Lembrou que a Agência Nacional do Petróleo (ANP) - que agora fiscaliza não só a gasolina mas também o etanol - foi chamada a participar do combate às práticas anticompetitivas e fazer as denúncias ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). O ministro garantiu que, caso sejam constatadas infrações, os postos serão multados e até fechados. Para ele, haverá redução dos preços em consequência da ação.

- Estava havendo em Brasília e na minha terra, São Luís, um cartel e eu assumi a responsabilidade de pedir à ANP que se dirigisse ao Cade para que oficialmente o governo interviesse para que este descalabro fosse resolvido.

A Federação Nacional do Comércio de Combustíveis (Fecombustíveis) rebateu as críticas e classificou as declarações de "irresponsáveis e infundadas". Em nota, a entidade afirma que, se há casos comprovados de formação de cartel, "é dever do governo agir e aplicar as sanções cabíveis para todos aqueles que infringem a lei e prejudicam o mercado".

Esta semana, segundo Lobão, a sociedade já começará a verificar queda nos preços dos combustíveis.

- A partir de hoje (ontem), nós poderemos perceber nitidamente a redução dos preços do etanol na bomba.

Nas usinas, os preços do álcool hidratado e anidro (misturado à gasolina) caíram na semana passada, pela segunda semana consecutiva. O anidro foi vendido a R$1,8817 o litro, sem impostos, 20,98% menos que o valor de R$2,3815 da semana anterior. Já o hidratado ficou 20,35% mais barato: o preço foi de R$1,3374 na semana anterior para R$1,0652.

O presidente da Fecombustíveis, Paulo Miranda, também prevê que a redução chegue aos postos esta semana. Ele diz que o recuo nos preços das usinas leva em torno de três semanas para chegar às bombas, por causa da logística e dos estoques em poder das distribuidoras e dos postos revendedores.

- Muitos postos começaram hoje (ontem) a receber álcool com alguma redução de preços. Então, só a partir desta semana é que podem começar a cair nas bombas - disse Miranda.

No Rio, no posto Jurema (bandeira BR), na Tijuca, o gerente Flavio Calafara disse que recebeu ontem gasolina com o preço normal. Ele acredita que amanhã ou quinta-feira receberá o combustível com preços menores. Com os altos preços, seu movimento caiu cerca de 15%. Já no posto Modelo (Shell), em Botafogo, a gasolina deverá ficar mais em conta a partir de amanhã, quando haverá entrega de combustível. Ontem, o litro da gasolina custava R$3,099, e do etanol, R$2,499.

FONTE: O GLOBO

Serra amplia arsenal digital contra Dilma

Blog estreia criticando governo

Flávio Freire

SÃO PAULO. Depois de usar o Twitter para criticar o governo federal, o tucano José Serra resolveu ampliar sua rede virtual em oposição aos governos de Dilma Rousseff e de seu antecessor Luiz Inácio Lula da Silva. O tucano estreou ontem um blog com críticas generalizadas sobre a política antidroga do governo, geração de emprego e gargalos de infraestrutura, além de carências em saneamento, educação e saúde.

Serra ironizou o lançamento, no Rio, da campanha de desarmamento, pois, segundo ele, trata-se de uma cidade a 1.500 quilômetros da fronteira por onde entram as armas que vão parar nas mãos dos traficantes. O Ministério da Justiça informou que se trata de uma campanha para todo o país e que o Rio foi escolhido por ter sido palco de um massacre nunca antes registrado no Brasil.

No artigo "A prática desmente o discurso", Serra atacou a falta de investimento no combate ao tráfico de armas. "Sem recursos básicos nem efetivo suficiente na fronteira, a polícia não tem como conter a entrada da cocaína pelo estado", diz ele, citando problemas nas fronteiras do Acre.

E seguiu:

"Mesmo que não houvesse corte de orçamento da PF, a vigilância das fronteiras seria, como é, precária, em face do abandono do setor. O corte, neste caso, termina sendo uma manifestação sádica da falta de consideração pela segurança e a saúde na população." Procurada, a Secretaria Nacional Antidrogas não se manifestou.

Em outro artigo, intitulado "Uma realidade pouco animadora", Serra critica a política de geração de empregos. "A maior necessidade no Brasil nos próximos dez anos é criar muitos empregos de boa qualidade, que proporcionem melhor padrão de vida para as famílias, mais acesso a bens materiais e culturais, mais saúde, mais futuro."

Por fim, Serra disse esperar que as coisas deem certo no país: "Minha torcida, como a de todo brasileiro, é para que as coisas deem certo, ou o prejuízo será, como já tem sido, coletivo. Para tanto, é preciso que se tomem as providências adequadas. Não é o que está em curso ainda, infelizmente".

FONTE: O GLOBO

Prefeitos fazem marcha por verbas

Cerca de 4 mil prefeitos estarão hoje em Brasília para pressionar a presidente Dilma Rousseff e o Congresso por verbas. Os pedidos alcançam R$ 27,9 bilhões.

Prefeitos apresentam a Dilma conta de quase R$ 28 bilhões na 14ª Marcha

Legião de prefeitos, que têm no horizonte a disputa eleitoral de 2012, chega a Brasília nesta terça para reivindicar mais repasses à União e forçar o Congresso a votar temas de interesse municipal

Edna Simão

BRASÍLIA - No ano em que antecede as eleições municipais, mais de quatro mil prefeitos desembarcam nesta terça-feira, 10, em Brasília com uma lista de desejos que alcança pelo menos R$ 27,9 bilhões. Participantes da 14.ªMarcha a Brasília em Defesa dos Municípios, que começa nesta terça e termina na quinta-feira, os prefeitos pretendem pressionar a presidente Dilma Rousseff e o Congresso Nacional.

Do governo federal, os prefeitos querem sobretudo impedir o cancelamento de recursos para obras e dividir a arrecadação das chamadas contribuições com a União. No caso dos restos a pagar (verbas que o governo ainda não liberou), segundo estudo preliminar divulgado na segunda-feira, 9, pela Confederação Nacional dos Municípios (CNM), pelo menos R$ 1,24 bilhão em compromissos assumidos dos anos de 2007 a 2009 será cancelado por decisão do governo federal.

Os ministérios do Planejamento e da Fazenda preferiram não comentar as reivindicações dos prefeitos. A presidente Dilma Rousseff, no entanto, realizou nesta segunda uma reunião com o ministro de Relações Institucionais, Luiz Sérgio, para avaliar os pedidos dos prefeitos.

Os municípios não abrem mão do pagamento integral dos restos a pagar, que é de R$ 7,9 bilhões, e vão atuar no Planalto para que haja mudanças nas regras estabelecidas em abril. A estimativa foi elaborada com base em levantamento feito em 9.963 dos 22.835 processos de empenhos feitos entre 2007 e 2009.

No final de abril, a União divulgou o decreto 7.468 cancelando os repasses das obras e serviços que não foram iniciados até 30 de abril deste ano e estavam inscritas como restos a pagar de 2007 a 2009. No caso de obras e serviços referentes ao exercício de 2009, foi estabelecido o prazo de até 30 de junho de 2011 para o início da execução.

Segundo o presidente da CNM, Paulo Ziulkoski, o prazo estabelecido pelo governo não é suficiente para que os prefeitos consigam iniciar obras. Ele alegou que, em muitos casos, os prefeitos não conseguem empenhar os valores por conta de bloqueio de recursos feito pelo próprio governo, inadimplência dos municípios, falta de contratos de qualidade, mudança de prefeitos, assim como a falta de infraestrutura da Caixa Econômica Federal. "O drama do prefeito é que ele não sabe se continua ou não a obra", afirmou.

No que diz respeito ao compartilhamento das chamadas contribuições federais, como é o caso da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) ou ainda a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide), que incide sobre os combustíveis, não há uma proposta específica, mas a CNM quer as negociações sejam iniciadas.

A confederação alega que o governo federal tem optado por criar contribuições em vez de tributos nos últimos anos para não ter que dividir a fatia arrecadada com estados e municípios.

Atualmente, o governo federal compartilha com municípios apenas a arrecadação de tributos como o Imposto de Renda e o Impostos sobre Produtos Industrializados (IPI).

Para mostrar a necessidade de mudança, estudo divulgado nesta segunda pela CNM mostrou que a carga tributária bruta brasileira atingiu 35,53% do Produto Interno Bruto (PIB), o que representa um aumento de 0,49 ponto porcentual em relação a 2009.

O crescimento foi verificado, principalmente, nos tributos e contribuições arrecadados pelo governo federal. No caso dos Estados e municípios, o recolhimento dos impostos ficou praticamente estável.

Da demanda direcionada ao Congresso, a principal será a regulamentação da Emenda Constitucional n.º 29, para ter mais recursos para saúde. Pedirão aos parlamentares, ainda, que derrubem vetos que impedem uma distribuição igualitária dos royalties de petróleo e gás, além da troca do índice de correção de dívidas previdenciárias. Estimativas mostram que só a Emenda 29 traria um acréscimo de R$ 24,8 bi aos municípios. Os royalties do petróleo poderiam ampliar as receitas repassadas aos municípios em R$ 890 milhões.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

No pós-guerra, o PCB caiu no samba:: Ana Amélia M.C. de Melo

Valéria Lima Guimarães. O PCB cai no samba: os comunistas e a cultura popular (1945-1950). Rio de Janeiro: Arquivo Público, 2009.

A presença e importância do Partido Comunista na vida política brasileira têm sido um tema recorrente nos estudos de historiadores ou cientistas sociais que há algumas décadas vêm sendo publicados no Brasil. Uma revisão bibliográfica facilmente arrolaria cinquenta títulos fundamentais, excluídos autores memorialistas e a produção considerada pecebista. Atualmente, estes estudos têm convergido para uma abordagem renovada que implica necessariamente um levantamento das dinâmicas culturais e das relações recíprocas com a política, como foram expostas por René Remond na década de 1980, cujo livro, publicado no Brasil quase dez anos depois, tem contribuído para enriquecer os enfoques sobre a história política brasileira [1].

Este livro de Valéria Lima Guimarães se inscreve nessas novas perspectivas. Trata-se de pensar qual a política cultural do PCB e, mais especificamente, a apreciação do partido sobre a cultura popular — dois temas de grande envergadura. Como deixa claro a autora, ela quer fugir da história institucional do partido, sem deixar de enfatizar a importância desta na delimitação de seu estudo. Ao circunscrever sua análise da cultura popular à questão do samba, a autora busca primeiramente delinear o espectro de autores que contribuem, no seu estudo, para pensar as relações culturais.

Três autores são escolhidos para sua definição de cultura popular: Mikhail Bakhtin, Carlos Ginsburg e Roger Chartier, apontando para uma noção de hibridismo, de trocas, que não poderia ser esgotada numa oposição binária entre erudito e popular. Arrematando este esforço analítico, a autora lembra a noção thompsoniana de cultura, fundamente arraigada na concepção da experiência concreta de lutas sociais. Se bem que o estudo não pretenda deter-se nesta discussão, sentimos a ausência de uma menção a Gramsci, autor que foi central na conformação do conceito de cultura popular dos historiadores por ela elencados. A alusão ao pensador italiano é feita, quando autora se detém na análise da compreensão que alguns intelectuais do partido tinham a respeito das tarefas que deveriam cumprir, apropriando-se nesse momento da categoria de “intelectual orgânico”.

O cuidado em esclarecer os usos de categorias que serviram de base para sua análise estende-se ao capítulo 2, no qual situa as apropriações do samba nos anos 1940 pelo Estado Novo, transformando-o em ritmo tipicamente nacional. A autora detém-se na análise, apontando as críticas, muitas vezes nostálgicas, que consideravam a transformação do samba como um processo de perda de suas tradições ou raízes. A transformação do samba em símbolo nacional não se fazia sem a consequente padronização e enquadramento num modelo de cultura considerado, na época, adequado e de bom tom. Vargas buscava investir no carnaval, subvencionando as recém-criadas escolas e patrocinando concursos. Será precisamente na década de 1940 que, segundo a autora, mais se produziram enredos de samba ufanistas.

Os dois primeiros capítulos, como se vê, darão suporte para compreender o contexto em que o PCB procura uma aproximação com as massas. Qual seria a estratégia política do partido, especificamente quando este registra um momento de intensa atividade? Com o fim do Estado Novo, desfrutando de uma curta e relativa liberdade, visto que as perseguições a militantes em protestos e manifestações seriam frequentes, o partido teria uma expansão significativa, tornando-se uma das maiores organizações comunistas da América Latina. A sua legalidade dará impulso à mutação, ampliando suas bases sociais. O desempenho dos intelectuais aqui será marcante especialmente quando lembrados os nomes daqueles filiados mais proeminentes do mundo intelectual, como Jorge Amado, Graciliano Ramos, Raquel de Queiroz, Carlos Drummond de Andrade, Caio Prado Jr., Oscar Niemeyer, etc. A eles será dada a função de desenvolver um projeto cultural entre as massas, colocando-se a serviço da educação política do povo, como a autora bem intitula um dos tópicos do texto: “Intelectuais e artistas a serviço da educação política do povo”.

O papel dos comunistas em relação ao domínio da cultura é analisado, por um lado, a partir da ação dos intelectuais e de uma forte campanha nos diversos meios de comunicação, e, por outro, a partir da atuação da bancada eleita para a Constituinte de 1946. No primeiro exemplo, vale chamar atenção tanto para a importância do projeto do PCB de desenvolvimento de uma política cultural, quanto para o significado que teria este projeto em relação aos intelectuais, ao lhes proporcionar um espaço de atuação.

Este processo, entretanto, seguia também as diretrizes internacionais estabelecidas a partir de 1934 no I Congresso de Escritores Soviéticos por Andrei Zdanov. Tratava-se de imprimir uma perspectiva, na produção artística, de total comprometimento em torno das causas do Partido e sua orientação, seguindo o que era considerado uma cultura genuinamente proletária. O que ficou conhecido como realismo socialista significou, antes de tudo, censura e patrulhamento, ao qual alguns escritores, artistas e intelectuais em geral se negavam, como no caso, citado pela pesquisadora, de Graciliano Ramos. O escritor alagoano recusava abertamente a oposição entre uma suposta arte proletária e outra burguesa.

A ampliação do Partido Comunista nos anos 1940 reflete-se claramente na expressiva votação que seus candidatos obtêm nas eleições de dezembro de 1945. Elegem-se o senador Luiz Carlos Prestes e mais 14 deputados; além disso, o PCB obtém cerca de 10% dos votos para presidente, com Yedo Fiúza. Não obstante esse avanço, a participação da bancada será constantemente barrada, movendo-se num terreno bastante instável e sob forte pressão.

A autora chama a atenção também para a estratégia construída pelo partido de conquistar as massas através da difusão de escritos e periódicos. Tratava-se de ampliar a circulação dos jornais, especialmente com o sentido de difundir uma educação política de base marxista, atribuindo dessa forma ao intelectual funções essenciais. De forma inédita, cria-se a partir das bases do partido uma ampla malha de difusão com a utilização, além da imprensa, da edição de livros, panfletos, cartazes, comícios e palestras públicas.

Chegar às massas era, portanto, o objetivo central dessa campanha de difusão, e, nesse sentido, as escolas de samba se apresentavam como um espaço reconhecidamente importante de aproximação à cultura popular. Note-se que a pesquisadora retoma a discussão sobre as formas de apropriação da cultura popular pelas elites, aqui procurando confrontar, na sua análise da experiência do PCB, as categorias usadas tanto pela direita quanto pela esquerda para entender o que era considerado como símbolo de brasilidade.

Os comunistas vão identificar o sambista “como retrato de um povo sofrido, porém feliz, criativo e talentoso [...] e portador de um enorme potencial revolucionário” [2]. O diagnóstico seria o ponto de partida para o espaço que o samba ocupará no jornal a Tribuna Popular, que terá uma coluna intitulada “O povo se diverte”. O ano de 1946 seria também bastante particular, como fica demonstrado na pesquisa. Em termos das festividades carnavalescas, seria o ano da Vitória, com o fim da Guerra.

Com ampla documentação, a autora demonstra como o partido, atuando na legalidade, procura ir em busca daquele povo tantas vezes mencionado e cuja bandeira procura defender. O encontro da foice e do pandeiro é também construído em mão dupla. Se o partido faz uso de todos os recursos para difundir seus ideais e alcançar credibilidade junto à população, esse movimento não se faz possível sem a arte e a cultura, que teriam função educadora, promovendo os valores políticos através de uma considerável valorização da cultura popular. Era necessário consolidar uma identidade política, só possível de alcançar, segundo se afirmava, a partir de um movimento de maior aproximação e empatia com as simbologias e práticas culturais populares.

Finalmente, podemos afirmar que a autora, como muito bem afirma em suas conclusões, procura pensar as relações culturais a partir de um processo de trocas, de definições e redefinições, e nesse sentido indaga sobre o lugar e maneira como o Partido Comunista construiu um estreitamente de laços entre as agremiações sambistas e a entidade política, demonstrando os complexos meandros dessa troca sempre dialética.

Ana Amélia M.C. de Melo é professora do Departamento de História da Universidade Federal do Ceará.

Notas

[1] Refiro-me ao livro Por uma história política, publicado pela primeira vez no Brasil em 1996 pela editora da Fundação Getúlio Vargas.

[2] O PCB cai no samba, p. 124.

Fonte: Especial para Gramsci e o Brasil.

Uma realidade pouco animadora :: José Serra

A maior necessidade no Brasil nos próximos dez anos é criar muitos empregos de boa qualidade, que proporcionem melhor padrão de vida para as famílias, mais acesso a bens materiais e culturais, mais saúde, mais futuro.

Basta lembrar que até 2021 cerca de 20 milhões de pessoas precisarão de novos postos de trabalho e que no último biênio houve o saldo negativo de 800 mil empregos formais com remuneração acima de dois salários mínimos!

Para enfrentar esses desafios é preciso que a economia cresça de forma rápida e sustentada.

Desde o último terço do século XIX até aos anos setenta do século passado, o Brasil saiu-se excepcionalmente bem no quesito crescimento. Estivemos muito à frente da economia mundial. Nos últimos trinta anos, porém, essa vocação saiu de moda.

Durante o mandato de Lula, graças ao seu talento de animador e à publicidade massiva, criou-se a impressão de que a era do crescimento dinâmico havia voltado para ficar. Impressão, infelizmente, sem fundamento.

Como mostrou o professor Reinaldo Gonçalves, o desempenho da economia brasileira nos últimos oito anos foi inferior à média mundial, ocupando a 96ª posição no painel de 181 países. E, em matéria de PIB per capita, o país passou da 66ª posição para a 71ª posição.

Em termos de índice de desenvolvimento humano, o IDH, caímos de posição no cenário mundial, de 65ª em 2003 para 73ª em 2010. Isso tudo apesar de o Brasil desfrutar da maior fase de bonança externa já observada.

O mais preocupante, em todo caso, não é esse desempenho modesto, mas as travas que o governo Lula legou ao crescimento futuro do país:

1. O perverso tripé macroeconômico: carga tributária mais alta do mundo em desenvolvimento; maior taxa de juros reais de todo o planeta e taxa de câmbio megavalorizada; uma das menores taxas de investimentos governamentais do mundo.

2. O gargalo na infraestrutura: energia, transportes urbanos, portos, aeroportos, estradas, ferrovias, hidrovias e navegação de cabotagem. Um gargalo que impõe custos pesados à atividade econômica e freia as pretensões de um desenvolvimento mais acelerado nos próximos anos.

3. As imensas carências em Saneamento, Saúde e Educação, que seguram a expansão do nosso capital humano.

O novo governo promete que vai enfrentar os desafios, mas mostra falta de convicção e de rapidez, além de falta de prioridades, cujo símbolo maior é o trem-bala.

A falta de convicção apareceu na crise do sistema aeroportuário, onde depois de anos demonizando as privatizações o PT e a presidente Dilma concluíram que melhor mesmo é privatizar.

E a falta de rapidez fica visível no atraso das providências para a Copa do Mundo. Assunto no qual em vez de resolver os problemas o governo prefere terceirizar responsabilidades.

Minha torcida, como a de todo brasileiro, é para que as coisas deem certo, ou o prejuízo será, como já tem sido, coletivo. Para tanto, é preciso que se tomem as providências adequadas. Não é o que está em curso ainda, infelizmente.

Sombras do passado :: Merval Pereira

A festança em Buriti Alegre para comemorar o retorno oficial do ex-tesoureiro do mensalão Delúbio Soares ao quadros do PT colocou o tema novamente na ordem do dia da política, para desgosto dos outros 37 réus do processo que tramita no Supremo Tribunal Federal.

Ontem, o site Congresso em Foco revelou que, no último dia 17 de abril, o procurador da República do Rio Grande do Sul, Manoel Pastana, encaminhou ao procurador-geral da República representação em que responsabiliza o ex-presidente Lula pela existência do mensalão.

Dificilmente ela será aceita, pois no processo original não existe qualquer referência a Lula, embora, na mesma situação, o ex-governador mineiro, hoje deputado federal, Eduardo Azeredo tenha sido incluído pelo próprio Supremo como coautor do chamado "mensalão mineiro".

O que menos queriam os réus do processo era tanta marola em torno do assunto às vésperas de uma decisão. O mensalão, que deve ser julgado nos próximos meses, será, até o resultado final ser anunciado, uma fonte de ataques oposicionistas.

A reabilitação triunfal de Delúbio Soares, sem que nada tenha acontecido que justificasse a mudança de atitude do PT, será tema de uma campanha do PSDB na próxima semana, trazendo para o presente político memórias nada agradáveis de corrupção eleitoral.

Tema incômodo que parecia esquecido, o mensalão reaparece junto com a recuperação de prestígio político de vários de seus principais protagonistas.

O então presidente do PT, José Genoino, não apenas foi nomeado assessor especial do Ministério da Defesa como condecorado pessoalmente pelo ministro Nelson Jobim, com seu peso político específico de ex-presidente do Supremo, numa simbólica absolvição pública que procura influenciar no resultado do julgamento oficial que se aproxima.

E o ex-ministro José Dirceu, considerado pelo procurador-geral da República o "chefe da quadrilha" que se organizou a partir do Palácio do Planalto, assumiu de fato o comando do partido que está no poder, indicando para presidi-lo o deputado estadual paulista Rui Falcão depois de ter ameaçado lançar-se ele próprio à disputa do cargo.

A ameaça tinha tanta probabilidade de concretizar-se que o governo - leia-se a presidente Dilma Rousseff e o ex-presidente Lula - preferiu aceitar seu indicado a passar o constrangimento de ter o próprio Dirceu na presidência do PT.

O poder de fato, porém, está em suas mãos, e seu preposto, Rui Falcão, já anunciou que é chegado o momento de o PT ser recompensado pelo esforço que fez para a eleição de Dilma a presidente. "2010 foi o ano da Dilma, 2011 é o ano do PT", anunciou Falcão, explicitando o que seu chefe político Dirceu já antecipara em uma palestra para sindicalistas durante a campanha presidencial: a vitória de Dilma é muito mais do PT, ao contrário da de Lula, que se deveu mais a seu carisma do que ao apoio partidário do PT.

A frase é uma redução do que realmente aconteceu, mas tem seu fundo de verdade. Lula impôs ao PT o alargamento das alianças partidárias para poder vencer a eleição presidencial em 2002 e, em vez de vices ideologicamente ligados a ele, como Mercadante ou Brizola, foi buscar no empresariado brasileiro um vice que agregasse apoios políticos.

Para eleger Dilma, essa aliança política teve que ser ampliada ainda mais, para compensar a falta de dotes populares da candidata Dilma Rousseff.

A tal ponto que o PMDB foi alçado a parceiro político primordial. A oposição, fragilizada por disputas internas e com dificuldades de criticar o governo desde a campanha presidencial do ano passado, parece cada vez com menos espaço para agir.

Ao mesmo tempo, porém, esse gigantismo governamental no Congresso dificilmente será mantido até a campanha presidencial de 2014, o que alimenta a esperança de recuperação dos partidos oposicionistas.

Da mesma maneira que se aproximou do governo com interesses imediatos, a maioria dos partidos da base aliada se afastará dele se a expectativa de poder que representa hoje a quase certeza de reeleição de Dilma se desfizer diante de problemas que afetem sua popularidade, como uma previsível crise econômica ou uma disputa de espaço político impossível de ser solucionada.

A oposição continua com a posição delicada de não poder torcer pelo pior, mas já tem espaço de ação diante da alta da inflação e da crise de gestão pública que ameaça transformar as obras necessárias para a realização da Copa do Mundo em 2014 e das Olimpíadas em 2016 em focos de escândalos.

Paradoxalmente, a crise política que envolveu o PSDB e o PSD, nascido da costela do DEM em São Paulo, pode ter desatado um dos nós da sucessão tucana.

Ao ir para o PSD e ter sido exonerado da secretaria que ocupava no governo Alckmin, o vice-governador Afif Domingos deixou de ser uma opção viável para ocupar o governo caso o governador Geraldo Alckmin tentasse concorrer novamente à Presidência da República pelo PSDB.

Seria impensável deixar à frente do governo um dirigente do PSD, com Kassab candidato à sucessão de Alckmin.

O governador paulista está, portanto, preso à disputa da reeleição, deixando o caminho livre para os eternos candidatos naturais do partido, o ex-governador José Serra e o senador Aécio Neves, que hoje aparece com mais capacidade de unir apoios, não apenas internos, mas também em outras legendas.

Caberá a eles, mais uma vez, superar divergências para viabilizar uma candidatura tucana capaz de ser competitiva em 2014. Se conseguir ultrapassar desentendimentos internos na eleição da futura direção nacional, reelegendo o hoje deputado federal Sérgio Guerra com uma boa margem majoritária, o partido poderá passar a tratar de seu futuro, que hoje parece incerto.

FONTE: O GLOBO

Apropriação indébita:: Dora Kramer

Um acordo entre governo e oposição na Comissão Mista que aprovou o Orçamento da União para 2011 elevou em R$ 100 milhões - de R$ 165 para R$ 265 milhões - o montante reservado para os partidos políticos.

Levantamento publicado ontem pelo Estado revela que o "reajuste" atende de modo especial ao PT e ao PSDB, cujos déficits relativos às campanhas eleitorais de 2010 correspondem exatamente à diferença entre as quantias que recebiam e as importâncias que passam a receber do fundo partidário.

O PT, que fechou as contas do ano passado com um rombo de R$ 16 milhões, em 2011, receberá do fundo R$ 16,8 milhões a mais. O PSDB, que registrou um déficit de R$ 11, 4 milhões, terá direito a um extra no mesmo valor.

Mais claro impossível: os líderes do governo e da oposição usaram suas prerrogativas parlamentares para, com o dinheiro público, urdir uma conta de chegar ao molde das necessidades dos respectivos cofres partidários.

O Poder Executivo viu, mas consentiu. A presidente Dilma Rousseff, "alertada" sobre os riscos de eventual veto à manobra para futuras votações de interesse do governo no Congresso, deixou passar.

Afinal, devem ter argumentado os conselheiros, todos os partidos participaram do acerto e R$ 100 milhões a mais ou a menos não valeriam a confusão.

Nessas horas e diante de atos como esse é que a gente percebe algumas das razões pelas quais a oposição no Brasil é tão branda. Quando compactua com um truque de natureza tão mesquinha com vistas a arrumar suas finanças partidárias, perde autonomia para exercer a delegação que recebeu das urnas para fiscalizar a atuação dos governistas, dentro e fora do Congresso.

Os críticos, muitos, falam em "financiamento público disfarçado". Acertam no substantivo - é financiamento público sim, uma vez que o fundo partidário pode ser usado como os partidos bem entenderem, inclusive se entenderem que devem usar o dinheiro para financiar campanhas.

Mas erram no adjetivo - não há nada de "disfarçado" nisso. A prevaricação é explícita.

Dissimulação existe é na defesa que os partidos e políticos fazem da instituição do financiamento público oficial, com reserva de verbas específicas no Orçamento sob a rubrica "campanha eleitoral", com o argumento de que é a única maneira de regularizar, baratear e moralizar a "área".

Além do fundo partidário, temos hoje a renúncia fiscal proveniente dos horários ditos gratuitos de propaganda no rádio e na televisão, assegurados anualmente haja ou não eleições.

A recente divulgação das prestações de contas da campanha de 2010 feitas à Justiça Eleitoral, revelaram um pouco do imenso descalabro: partidos grandes cooptando legendas menores mediante repasses de recursos, doações fora do limite regular tanto de pessoas físicas como de pessoas jurídicas para os partidos e ocultação dos nomes de beneficiados e benfeitores.

E nisso estamos tratando do lado legal da história. Se tantas irregularidades são cometidas no âmbito do que é permitido por lei, imagine o que não ocorre - e continuaria a ocorrer uma vez oficializado o financiamento público - no mundo do caixa 2.

Sempre que um episódio desse tipo vem à tona suas excelências aludem ao excesso de hipocrisia no trato da questão e à carência de transparência no sistema.

Nada mais hipócrita. O que acontece é exatamente o contrário: um caso como o do acerto entre governo e oposição para saldar dívidas de partidos mediante aumento do valor dos repasses do fundo partidário, mostra a falta de lisura e a tendência à manipulação do dinheiro público, reduzindo as chances de a sociedade apoiar a instituição do financiamento oficial.

Urgente não é o Congresso aprovar a obrigatoriedade de o Estado financiar as campanhas eleitorais. Urgente é o Congresso perceber a necessidade de fazer antes a sua parte, reconhecendo o quanto são abusivas práticas consideradas normais pelos partidos, mostrando disposição de alterar essas condutas e oferecendo garantias mínimas de integridade no uso do bem público.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

"Her Majesty the President of Brazil":: Marcus André Melo

O que têm em comum o Afeganistão, Gibraltar e a Vanuatu, na Melanésia? O regime eleitoral. O Brasil poderia adentrar esta liga caso adote o chamado distritão. Seria junto com o Afeganistão o único país - não protetorado ou ilhota - a adotar o Voto Único Não Transferível. O exotismo de um sistema eleitoral para muitos é razão suficiente para sua não adoção, mas o sistema já foi utilizado no Japão no pós-guerra, e há uma unanimidade na sua avaliação: atomiza, elitiza e corrompe a representação. O Brasil utiliza um sistema incomum: a votação proporcional com lista aberta (RPLA). Em geral, ignoram-se as razões que levaram o país a adotar este sistema no início da década de 30.

Ao contrário do que se poderia pensar, a RPLA não resultou de uma inovação aleatória, e sim de um cálculo deliberado das elites políticas progressistas da República Velha. Afinal o que se queria derrotar e se possível varrer do mapa com esta reforma? Na realidade, o sistema foi criado para barrar o poder discricionário do poder executivo no nível federal e estadual. Sua introdução tinha um duplo alvo: o sistema de partido único nos estados - o reinado de 25 anos de Borges de Medeiros no Rio Grande fariam inveja a Sarney - e o poder pessoal do presidente no plano nacional. O propósito fundamental da reforma era garantir o pluralismo e a competição política, garantindo a voz das "minorias". Juntamente com outras inovações que surgiram na mesma época - o voto secreto e a justiça eleitoral - buscava-se garantir a "verdade eleitoral". A reforma mirava na "mexicana" onipotência dos presidentes na República Velha que assentava-se em uma brutal hegemonia. O sistema majoritário - o voto cumulativo em distritos de 3 a 5 representantes - em vigor embutia uma colossal vantagem pró-governo de turno. E também se assentava nas "degolas" dos deputados eleitos pela Comissão Verificadora dos Poderes. Os constituintes de 45 completaram a tarefa de engenharia institucional de controlar o poder presidencial, proibindo as agremiações partidárias estaduais e introduzindo o preceito constitucional do caráter nacional dos partidos políticos, até hoje vigente. Na Argentina onde este preceito nunca foi introduzido e a RP foi adotada só em 1963 os governadores mandam e desmandam e o bipartidarismo degenerou em sistema de partido único!

Afonso Arinos foi talvez o primeiro a analisar revolução eleitoral. Em 1949 escreveu: " os partidos nacionais, a representação proporcional, e os ministros congressistas fizeram do nosso presidencialismo algo de muito diferente do que conhecemos daquele presidencialismo morto em 1930... Grande tirano aquele que só se manterá legalmente na base da coligação dos partidos dentro do Congresso, tal e qual nos regimes parlamentares do continente europeu!" O poder pessoal foi solapado e o super presidente teria agora que barganhar com os partidos, inclusive oposição.

A escolha de sistema eleitoral não ocorre em um vazio: ela é feita a partir de um cálculo de perdas e ganhos com as regras futuras. Colomer captou o dilema político dessa escolha com a regra que intitulou "micromega": "o grande prefere o pequeno e o pequeno prefere o grande". Grandes partidos dominantes defendem assembleias pequenas, distritos eleitorais uninominais ou de com poucos membros, e ausência de representação proporcional; os pequenos partidos e a oposição defendem o oposto. Isto nos dá a chave da questão das posições adotadas pelos partidos na atual reforma: porque o PMDB defende o distritão? E o que quer o PT com as listas fechadas? Para o PMDB, o distrito uninominal "a la Afeganistão" lhes permitiria uma forte hegemonia no Brasil interiorano, onde seus milhares de prefeitos tem posição dominante. As "minorias" seriam brutalmente afetadas de uma forma não prevista pelos melhores publicistas críticos do sistema da República Velha.

Quanto ao PT busca fundamentalmente controlar suas facções internas com mão de ferro. Mas o que é essencial é como estas novas regras impactariam o presidencialismo brasileiro. Os presidentes brasileiros detêm muitos poderes. Na América Latina só poucos países tem presidentes com instrumentos tais como medidas provisórias, áreas estratégicas de iniciativa exclusiva (como o orçamento e a tributação), controle de uma vasta máquina pública, e da agenda parlamentar. O sistema não degenerou em autocracia devido ao enorme fortalecimento do Judiciário, do ministério público e tribunais de contas na constituição de 1988. E mais importante: devido a fragmentação partidária e ao fato de que há espaço para o dissenso e a contestação no plano interno dos partidos. A competição política robusta no plano federal e a independência da mídia tem sido ingredientes essenciais para evitar uma mexicanização da política (se os governadores passarem a controlar a lista ocorrerá na realidade a argentinização da política). O principal beneficiário da transformação dos partidos em máquinas hiperdisciplinadas - a taxa de disciplina já é superior a 80% - será o presidente o qual governa através dos líderes partidários. Se os partidos irão tornar-se mais verticalmente disciplinados, será necessário reduzir os poderes do presidente. Afinal lhes foi delegado superpoderes em 1988 porque os partidos eram paroquiais e punham em risco a governabilidade. Se vingar quaisquer das duas atuais propostas (distritão ou lista fechada), teremos que chamá-lo de: "Her Majesty the President of Brazil", como fez, em 1934, Sir Hambloch, cônsul do Reino Unido, no Rio de Janeiro, em livro com este título instigante.

Marcus André Melo é professor da UFPE, foi professor visitante da Yale University e do MIT e é colunista convidado do Valor.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

De novo, a Europa:: Míriam Leitão

A Grécia não vai conseguir honrar seus compromissos no acordo de ajuda que a Europa deu. Ontem, sua dívida foi rebaixada e já começou o trabalho de reforma do pacote de resgate: mais dinheiro e mais prazo. A Irlanda quer mais facilidades. Portugal entrou na lista dos socorridos pela Europa, mas já se sabe que terá que amargar dois anos de recessão antes de atravessar esse mar.

O que a Europa não quer ver é o inevitável. Em algum momento os países mais fragilizados financeiramente do continente terão que renegociar suas dívidas, dando calote parcial nos bancos. Esses pacotes de ajuda repetem um roteiro que para nós da América Latina tem sabor de filme antigo.

A ajuda à Grécia foi de US$158 bilhões para uma economia de pouco mais de US$300 bilhões, no meio de uma recessão, com um déficit de mais de 12% do PIB, em grande parte produzido por manobras contábeis que esconderam o rombo até onde fosse possível. A ideia do Fundo de Estabilização Financeira da Europa, de cerca de US$630 bilhões ( 440 bilhões), era que a Grécia recebesse esse socorro de emergência, depois reorganizasse suas finanças, reconquistasse a confiança do mercado, e captasse recursos via mercado para rolar sua dívida. Assim, poderia começar a pagar o dinheiro emprestado pelos vizinhos.

O projeto já fracassou. Numa reunião não prevista, os ministros de finanças dos países europeus admitiram o que já se sabia, mas que dito por eles tem mais força: é preciso reformar o pacote de ajuda porque a Grécia não conseguirá tomar dinheiro no mercado no ano que vem. Foi o que disse o ministro de Luxemburgo Jean Claude Juncker, que está na presidência do conselho de ministros da Zona do Euro. O britânico George Osborne disse que mudanças no plano de resgate são inevitáveis.

Todos já sabiam que isso seria necessário, mas é diferente quando os próprios ministros numa reunião não prevista afirmam isso. O ministro grego George Papaconstantinou disse que o país está revendo todos os itens do pacote de ajuda para saber o que propor, mas autoridades europeias, como Juncker e o presidente do Banco Central Europeu, Jean Claude Trichet, disseram que uma reestruturação da dívida pode causar mais problemas do que solução. Por reestruturação, entenda-se dar um calote parcial nos bancos: sentar com eles e renegociar valores e prazos da dívida do país. A S&P calculou que as perdas poderiam ser de 50% a 70% da dívida grega. Isso distribui as perdas com os bancos, que emprestaram irresponsavelmente, mas o que as autoridades temem é o efeito dominó, porque os débitos estão muito interligados. Bancos de países hoje com problemas, mas com crédito na praça, podem ter rombos exatamente se tiverem que pagar uma parte da conta.

O quadro atual mostra que dificilmente alguns desses países poderão arcar com os custos do saneamento financeiro sem que os bancos aceitem uma redução do valor da dívida. A Grécia recebeu uma ajuda de cerca de 50% do PIB e agora está negociando um novo socorro, mais facilidades, e já sabe que ela tem um papagaio vencendo de 30 bilhões no ano que vem que não vai conseguir levantar dinheiro no mercado para renovar os títulos. Esse é o grande entrave da crise europeia. A Irlanda, que foi ajudada em novembro passado com 85 bilhões, já disse que qualquer facilidade dada à Grécia terá que ser dada a ela também. Portugal resistiu a receber qualquer ajuda, até que na semana passada fechou o pacote de 78 bilhões. Isso tudo apenas para ajudar três economias pequenas, que juntas representam apenas 7% do PIB da Zona do Euro. O Fundo de Estabilização foi formado com 440 bilhões. Imagine o que será se um país como a Espanha, que sozinho é 12% do bloco, precisar de ajuda. A Espanha tem seus próprios problemas e seus bancos são os maiores emprestadores para Portugal.

A dívida de longo prazo da Grécia foi rebaixada pela Standard & Poor"s de BB- para B, e a de curto prazo, de B para C. Isso significa que a dívida no nível C já está no nível especulativo. Quando uma dívida é classificada nesse patamar, inúmeros investidores institucionais não podem comprar papéis do emissor. Mesmo merecendo todas as críticas que são feitas a elas, as empresas de classificação de risco tomam decisões que se refletem em reações concretas de aversão aos papéis do devedor rebaixado.

A economista Monica de Bolle, da Galanto Consultoria, não vê vantagem para a Grécia em sair da Zona do Euro, porque o país teria dívidas em euro e ativos em dracma. Ela acha que o país e o bloco terão que esgotar as possibilidades de rolagem antes de tomar uma solução mais abrupta:

- O caminho é tentar gerar alívio de caixa. Se conseguir fazer isso voluntariamente, para tirar o país do mercado em 2012 e 2013, não há urgência para fazer mais nada até lá e não precisaria anunciar nada mais dramático - disse Monica.

Roberto Padovani, economista do banco WestLB do Brasil, também acha que os gregos receberão novo aporte, para ganhar tempo e evitar tanto a reestruturação quanto uma saída da Zona do Euro.

- É cedo para falar em reestruturação e a ruptura agora seria um fracasso para o euro e aumentaria os riscos para a região como um todo - disse.

A situação na Europa é crítica. Não há saídas fáceis pela frente. Tudo ainda é consequência da crise que atingiu o mundo desenvolvido em 2008 e que representou o estouro da bolha especulativa que havia se formado com o excesso de liquidez que garantiu o crescimento dos anos anteriores. A Europa ainda não sabe como sair da crise. Está indo no caso a caso.

FONTE: O GLOBO

Outra vez, a Grécia :: Celso Ming

Toda a área do euro ficou mais uma vez abalada por informações cujos veementes desmentidos não convenceram ninguém.

Na última sexta-feira, a edição digital da revista alemã Der Spiegel não só avisou que a Grécia estudava voltar à moeda própria, a dracma, mas também que no fim de semana passado seria realizada em Bruxelas uma reunião emergencial dos ministros de Finanças da zona do euro, para examinar a rápida deterioração das finanças do país.

A saída da Grécia foi enfaticamente desmentida pelo governo de Atenas, porém a reunião aconteceu. E ontem a agência de classificação de risco Standard & Poor"s rebaixou os títulos da dívida grega que, se tudo correr bem, alcançarão, no final de 2011, 152,3% do seu PIB, previsto em US$ 310,4 bilhões. Esse rebaixamento alerta que o risco de calote cresceu. E, ainda ontem, outras duas grandes agências, a Moody"s e a Fitch, avisaram que estão colocando os mesmos títulos da Grécia na marca do pênalti.

O problema imediato está no seu enorme déficit público, que, em 2010, estava nos 10,5% e cuja reversão a sociedade grega não quer assumir, pelos sacrifícios que está impondo em perda de renda e de empregos. Não há saída fácil. A partida da Grécia da área do euro é impensável. Seria inevitável uma forte desvalorização em relação ao euro, o que elevaria em ao menos 100% a dívida (que está em euros) e agravaria tudo. O reescalonamento (aumento de prazo) de pagamento não refrescará nada se as más condições orçamentárias não forem atacadas. E a reestruturação da dívida (imposição de certo calote) tende a criar mais problemas do que soluções, pois os bancos estão atolados com títulos gregos e teriam avarias em seus ativos.

Mas, ainda que se alcance alguma solução para a delicada situação financeira do país, a questão de fundo - os frágeis fundamentos do euro - segue malparada.

São 17 países desiguais, em disciplina fiscal e crescimento, que partilham uma mesma moeda, com um só banco central e juros básicos unificados.

Apesar dos tratados de compromissos recíprocos, não há obediência a acordos que garantam um déficit público anual abaixo de 3% do PIB e uma dívida menor que 60% (veja tabela). O desequilíbrio orçamentário, por sua vez, conduz à inobservância dos limites para a dívida, já que o rombo fiscal tem de ser coberto com aumento do endividamento.

A indisciplina nas despesas públicas, em boa parte dos países do euro, acaba turbinada por outro problema: a falta de mecanismos automáticos de transferência de recursos entre os membros.

É uma deficiência que não afeta países que têm moeda própria, ainda que algumas de suas províncias não tenham equilíbrio financeiro, pois o governo central dispõe de mecanismos de transferência. Nos Estados Unidos, por exemplo, Nova York, Flórida, Louisiana e Califórnia estavam ou ainda estão em maus bocados, mas esses problemas não atingem o dólar, pois as regulagens internas funcionam.

A falta de uniformidade fiscal da área do euro não é tampouco o problema principal. É a ausência de unidade política. O bloco não dispõe de um poder central que consiga impor a observância dos tratados nem definir regras para transferências mais ou menos automáticas de recursos.

CONFIRA

O euro e os preços das ações negociadas nas bolsas da Europa mergulharam diante do aumento do risco de calote na dívida da Grécia. É o que vai no gráfico acima.

Sem solução

O pacote de socorro à Grécia, de 110 bilhões de euros, aprovado em maio de 2010, não está funcionando. Isso sugere que a saída para casos assim não está resolvendo. A Grécia não está sozinha. A mesma encrenca ronda a Irlanda e pode atingir em cheio também Portugal (cuja dívida acaba de ser equacionada com um pacote de resgate) e Espanha.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Desafios da presidente Dilma:: Yoshiaki Nakano

Entramos no quinto mês com a presidente Dilma. Qual avaliação podemos fazer de seu governo? A impressão geral superou as expectativas, por ser um governo menos estridende que o antecessor, mais racional e técnico e demonstrar um esforço de gestão sem demagogia. As primeiras decisões devem ser aplaudidas. Primeiro, a decisão de corte de R$ 50 bilhões nos gastos previstos no orçamento deste ano. Todos concordam também que foi acertada a decisão de estabelecer, como uma das prioridades do governo, a erradicação da pobreza. Na sua relação com o Congresso Nacional, a aprovação do salário mínimo, de acordo com a regra pré-estabelecida, sem convertê-lo num balcão de negócios, foi também muito positiva e poderá trazer importante avanço no relacionamento do executivo com o legislativo, como poderes autônomos. Entretanto, o momento é de grandes incertezas e está requerendo novas definições, reformas e mudanças. Nesse quadro, é preciso dar um rumo claros às políticas e ações que o governo vai desencadear para enfrentar as grandes questões colocadas, para que o setor produtivo possa vislumbrar o futuro do país. Neste sentido, faltou ousadia e coragem.

O primeiro grande problema econômico que está colocado e gera grande incerteza é como vamos, simultaneamente, enfrentar a inflação e um crescimento econômico de 5%? Com um único instrumento, a taxa de juros, para controlar a inflação, cuja aceleração tem múltiplas causas (choque externo de preços de commodities, excesso de demanda, expectativas e reindexação) será pouco eficaz. A não ser que se eleve a taxa de juros para a estratosfera, particularmente, quando o seu principal mecanismo de transmissão, a taxa de câmbio, anda obstruído.

Se levarmos a taxa de juros nessa magnitude, teremos recessão, mas não derrubará os preços das commodities, que são formados no mercado internacional e, com o canal do câmbio obstruído, a taxa de inflação cairá aos poucos, mas essa medida conflita, frontalmente, com o objetivo de crescimento do governo. Mas, para contrair a demanda agregada, é muito mais lógico reduzir o consumo do governo que, além de contrair a inflação, poderá resolver o nosso maior problema de longo prazo de elevar a taxa de investimento.

Isso nos leva ao segundo grande desafio do governo. Como vamos ampliar a taxa de investimento para atender às demandas da Copa do Mundo e da Olimpíada, desobstruir, minimamente, o estrangulamento imposto pela infraestrutura física e agora para ampliar a oferta de gasolina e etanol? O governo precisa explicitar quanto devemos investir para atendermos esses requisitos mínimos necessários, quanto cabe ao setor público, quanto cabe ao setor privado e como financiá-los. Mais do que isso é preciso urgentemente desenvolver um mínimo de capacidade de planejamento e de execução de projetos.

Pelas informações do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), pode-se inferir que até 2014 será preciso aumentar os investimentos em mais de R$ 1 trilhão, elevando a taxa de investimento de 18,4% do PIB, em 2010, para 23% do PIB. Isso significa ampliar em 5 pontos percentuais do PIB a taxa de investimento, o que implica em realocar nesse percentual recursos que hoje vão para consumo, para investimento até o final do mandato. Com a atual política fiscal transferindo recursos na direção inversa - para o consume - só resta recorrermos ao financiamento externo, mas isso significa que o déficit em transações correntes aumentará para mais do que 7% do PIB, o que com certeza não será sustentável por muito tempo e terminará em crise de balanço de pagamentos, como repetidas vezes aconteceu na nossa história, a mais recente em 1999.

Com a atual política de taxa real de juros elevada e taxa de câmbio apreciada, estamos destruindo a nossa indústria de transformação, inflacionando o setor de "non tradables", particularmente de serviços. Com o boom nos preços, o setor de commodities vai bem. Com essa política macroeconômica e sem planejamento estratégico de longo prazo, entramos num processo de especialização regressiva da nossa estrutura produtiva, e nos tornamos, de fato, um país periférico e totalmente dependente da China, o novo centro dinâmico da economia mundial. Basta verificar que a indústria de transformação passou a ter um enorme déficit na balança comercial, enquanto todo superávit vem do setor de commodities. Estamos exportando produtos primários, com valor agregado cada vez menor como a China exige, e importando cada vez mais manufaturados, desde têxteis, eletrônicos, máquinas e equipamentos. Será que o Brasil vai ser uma grande exceção no mundo, quando hoje até os Estados Unidos estão desenvolvendo um projeto de reindustrialização e de substituição de importações, depois da onda de transplante de fábricas para a China? Será que o aproveitamento dos elevados preços de commodities, que será transitório, maximizando o consumo de importados no curto prazo, com destruição da indústria de transformação, é a escolha do governo e do povo brasileiro?

Essa última questão de ausência total de um planejamento estratégico de longo prazo, de uma definição básica de onde queremos chegar e como, na verdade nos remete a um problema maior. Perdemos nos últimos anos a capacidade de pensarmos com a nossa cabeça o nosso país. Perdemos a capacidade de pensar o nosso futuro. Não sabemos quais são os interesses nacionais, o que realmente traz benefício permanente para o povo brasileiro. Cabe ao governo comandar e coordenar ações para recompor a ideia de nação, de um povo brasileiro com identidade nacional, com valores culturais e éticos que cimentem a ideia de destino comum, pois sem isso não vamos a lugar nenhum. Entretanto, o mais importante, o pré-requisito para compor a nação - os conflitos sociais foram reduzidos com o desenvolvimento. A coesão social já foi alcançada nos últimos vinte anos, com a democratizacão e o surgimento da chamada classe C. É só o governo construir um projeto voltado para as prioridades dessa classe, a dos trabalhadores brasileiros, que constitui a maioria da população, que estará construindo um projeto para a nação.

Yoshiaki Nakano, ex-secretário da Fazenda do governo Mário Covas (SP), professor e diretor da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas - FGV/EESP,

FONTE: VALOR ECONÔMICO

'Interventora' petista tentará abafar crise na área da Cultura

O governo nomeou uma "interventora" no Ministério da Cultura para conter disputas e preservar a ministra Ana de Hollanda, alvo de críticas, acentuadas com o uso de diárias em fins de semana sem agenda.

A secretária nacional de Cultura do PT, Morgana Eneile, se tornou assessora especial.

Planalto intervém para conter crise na pasta da Cultura

Dirigente do PT assume posto-chave no ministério para ajudar Ana de Hollanda a controlar disputa política

Divergências com antecessor, suspensão de convênios e uso de diárias de viagem desgastam ministra

Natuza Nery,  Fernanda Odilla e Catia Seabra

BRASÍLIA - O governo decidiu intervir no Ministério da Cultura para tentar controlar o bombardeio sofrido pela titular da pasta, Ana de Hollanda.

Com o apoio do PT, escalou uma "interventora" para o órgão com o objetivo de represar a disputa política e evitar que a situação chegue ao ponto em que a presidente Dilma Rousseff se veja obrigada a demitir a ministra.

A secretária nacional de Cultura do PT, Morgana Eneile, foi nomeada assessora especial da ministra com a missão expressa de ajudá-la a debelar a crise e construir uma agenda positiva.

Eneile apoiou a indicação de Hollanda para o ministério, em dezembro passado.

A ministra tornou-se alvo de críticas por várias razões.

Ela quis rever a reforma na lei de direitos autorais prometida por seu antecessor, Juca Ferreira, e suspendeu o pagamento de convênios com indícios de irregularidades.

Também eliminou do site do ministério o selo "Creative Commons", licença para uso livre de conteúdo na internet.

Em outra frente, fragilizou-se entre os petistas. Provocou isso ao cancelar a nomeação do sociólogo Emir Sader para presidir a Fundação Casa de Rui Barbosa, depois que ele declarou em entrevista à Folha que a ministra era "meio autista".

Todos esses episódios, somados ao uso de diárias de viagem em finais de semana sem agenda oficial, transformaram Ana de Hollanda na mais frágil residente da Esplanada dos Ministérios.

Dilma autorizou a operação para salvar sua auxiliar, mas espera que ela dê demonstrações de que consegue neutralizar os ataques.

"Ela está sob uma guerra psicológica pesada", disse ontem o ministro Gilberto Carvalho (Secretaria-Geral).

"A posição no Planalto é de apoio e respaldo a ela. Agora, tudo depende dela e da capacidade de sua equipe de cerrar fileiras em sua defesa."

CHORO

Em encontro com lideranças do PT ontem em São Paulo, Ana de Hollanda deu sinais de fragilidade.

Observada da plateia por Morgana Eneile, que estava com outros assessores, ela chorou no início de sua fala, pediu desculpas e disse que estava emocionada. Gaguejou ao explicar a estrutura da pasta e lamentou não ter tempo para responder perguntas.

Brevemente, comentou a crise: culpou a imprensa por publicar "intrigas" e afirmou em seguida: "Meus companheiros estão comigo".

Para interlocutores de Dilma, Ana de Hollanda sofre uma das campanhas mais "sórdidas" já protagonizadas por um ministro em apenas cinco meses de gestão.

No Planalto, o ex-ministro Juca Ferreira é visto como um dos interessados no enfraquecimento da sucessora, após ter feito intensa campanha para seguir no comando do ministério. A Folha não conseguiu localizá-lo para comentar o assunto.

Para demonstrar que, por enquanto, ela conta com a retaguarda do Planalto, Gilberto Carvalho visitará a colega amanhã. Nas palavras de um interlocutor da presidente, quando um técnico tira um jogador de campo antes do fim do primeiro tempo, é porque errou na escalação. Ou seja: por ora a demissão não interessa ao Executivo.

Dilma, contudo, não pretende segurar Ana de Hollanda a qualquer preço.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Cid Gomes diz que o ministro dos Transportes é "inepto e desonesto"

SÃO PAULO - O governador do Ceará, Cid Gomes (PSB), disse em um evento no sábado que o ministro Alfredo Nascimento (Transportes) é "inepto, incompetente e desonesto", ao criticar a situação das estradas federais no Estado.

"É um ministro inepto, incompetente e desonesto, que, à frente desse ministério já há vários anos, tem discriminado o Estado do Ceará e feito com que as nossas BRs tenham características absolutamente diferentes", disse em Sobral (CE). O áudio foi publicado pelo site Jangadeiro Online.

Cid Gomes ainda chamou o Departamento de Nacional de Infraestrutura de Transportes de "antro de roubalheira" e convocou a população para um "rally de protesto" na BR-222, considerada a estrada federal em pior estado no Ceará.

"Precisamos denunciar esse descaso do ministro dos Transportes e da sua laia do Dnit. Aquilo ali é uma laia, é um antro de roubalheira, aquele Ministério dos Transportes e o Dnit, para que a gente possa ter os investimentos aqui necessários para que a população enfim possa transitar em segurança", disse Cid.

A Folha tentou ouvir o ministro, mas não achou ninguém do ministério para falar.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Petrobrás contratou empresa doadora de líder do governo

Acordos com a Imetame somam US$ 145 mi; fundador admitiu ter dado R$ 1 mi a mais que o permitido a Vaccarezza

Fausto Macedo

A Imetame Metalmecânica Ltda., empresa cujo fundador doou na campanha do ano passado R$ 1 milhão a mais que o autorizado pela legislação eleitoral para o líder do governo na Câmara, deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), fechou pelo menos dois contratos milionários com a Petrobrás em 2010. Os acordos somam US$ 145 milhões.

Os contratos são referentes às obras de um terminal industrial em Barra do Sahy, junto ao estaleiro Jurong, em Aracruz (ES). A Imetame foi anunciada vencedora de duas licitações da estatal para construção de estruturas para plataformas de exploração de petróleo. Um contrato é de US$ 65 milhões e o outro, de US$ 80 milhões.

A Imetame é dirigida pelo empresário Étore Selvatici Cavallieri, que mantém relações de amizade com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Ex-torneiro mecânico da Aracruz Florestal, Étore fundou a Imetame em 1980, em sociedade com José Carlos Guastti, soldador de profissão.

A Imetame começou com um galpão de madeira de 72 metros quadrados. Expandiu-se rapidamente e hoje ocupa área de 131 mil metros quadrados. Mantém 4 mil empregos e é reconhecida pela execução de projetos de cunho social. Atua principalmente na fabricação, montagem e manutenção mecânica e industrial. Seus maiores clientes, além da Petrobrás, concentram-se nos setores de celulose e papel, siderurgia e mineração.

Sigilo. Benedito Cavallieri Sobrinho, de 77 anos, pai de Étore, é alvo de uma representação da Procuradoria Regional Eleitoral em São Paulo. A representação está sob análise do desembargador Alceu Navarro, do Tribunal Regional Eleitoral (TRE).

A multa pode chegar a R$ 5 milhões, mas o procurador pediu redução de um terço desse montante. Ele reconheceu que o empresário agiu de forma transparente e movido por boa-fé - o próprio Cavallieri, acompanhado do advogado Pedro Dallari, antecipou-se e admitiu à procuradoria ter cometido um erro.

Em seu site, a Imetame assinala que "esta digna atitude demonstra a transparência com que a família e a empresa quiseram tratar a situação, uma vez que procederam neste caso, como sempre o fazem, absolutamente dentro dos princípios da ética".

Por meio da assessoria de comunicação, a Imetame informou que a diretoria administrativa financeira não se manifestaria sobre os contratos com a Petrobrás. "Todos os contratos firmados pela empresa com seus clientes são protegidos por cláusulas de sigilo, razão pela qual estamos impossibilitados de prestar quaisquer tipos de informações", disse a assessoria. A Petrobrás decidiu não comentar o assunto.

PARA ENTENDER

Em SP, 3 mil ultrapassaram limite legal

O procurador eleitoral em São Paulo, Pedro Barbosa Pereira Neto, enquadrou o empresário Benedito Cavallieri, pai do fundador da Imetame, com base no artigo 23 da Lei Eleitoral, que estabelece teto para doações de pessoa física - até 10% do rendimento do exercício anterior. Para pessoa jurídica o limite é de 2% sobre o faturamento. [+ NOTÍCIAS]Rastreamento da Receita indica que em São Paulo 3 mil doadores estouraram esse patamar. A punição só alcança doadores. Políticos que se beneficiaram de repasses ilegais estão livres. O prazo legal para investigação contra eles é de até 15 dias após a diplomação, ocorrida em dezembro.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Inflação ameaça economia, diz Trichet

Segundo o presidente do BCE, a alta dos preços nos países emergentes é tão perigosa quanto a situação fiscal das nações ricas

Jamil Chade
Enviado especial/ BASILEIA

O superaquecimento nos países emergentes e a consequente inflação são ameaças tão grandes à economia mundial quanto a situação fiscal das economias ricas. O alerta é do presidente do Banco Central Europeu, Jean-Claude Trichet, que ontem falou em nome dos maiores banco centrais do mundo.

A avaliação é de que a pressão inflacionária gerada em economias como Brasil, Índia, China, Indonésia representa um perigo real à recuperação da economia mundial. Nos últimos dois dias, os principais presidentes dos BCs do mundo - entre eles o brasileiro Alexandre Tombini - estiveram reunidos em Basileia para debater a situação internacional. Trichet, porta-voz do grupo, alertou que a economia mundial, apesar de crescer, sofre ameaças preocupantes. "A mensagem principal (da reunião) é de que não é o momento de complacência. Se queremos consolidar a recuperação global e que ela seja sustentável, precisamos lidar com essas ameaças", disse.

Trichet não hesitou em apontar as dívidas dos países europeus como um desses riscos, freando investimentos e ampliando o desemprego.

Na zona do euro, a dívida vem provocando um caos no mercado financeiro e no valor da moeda única e, para muitos, os pacotes apresentados para salvar Grécia, Irlanda e Portugal não estão dando resultados. Trichet diz que esses governos devem promover cortes nos gastos para solucionar a crise.

O francês, porém, comparou a inflação nos emergentes à crise da dívida nos ricos, apontando que seria um "risco equivalente" para o sistema. "A situação fiscal, principalmente na Europa, é um assunto importante e terá de ser melhorada para combater as deficiências que enfrentamos."

Segundo ele, esse fenômeno é decorrente da recuperação das economias emergentes. Mas advertiu que deve receber o mesmo nível de atenção que a dívida nos mercados ricos. "O superaquecimento pede políticas que permitam um esfriamento. Sem isso, países estarão sempre em uma situação menos favorável", alertou Trichet.

Novo Ciclo. A reunião foi marcada pela cobrança dos países ricos aos emergentes em torno de um controle da inflação, o que irritou alguns dos governos. Europeus e americanos temem que uma pressão inflacionária nos emergentes acabe afetando suas próprias economias.

O problema é que, com uma taxa de crescimento baixo, europeus e outros países ricos não têm como elevar juros, sob o risco de abafar a tímida recuperação. Para os ricos, portanto, apenas uma ação por parte dos emergentes pode, agora, frear a inflação, tema que foi martelado pelos países ricos.

Analistas que participaram do encontro acreditam que a declaração dos países ricos é injusta. Mas apontam que seria um reconhecimento de que é o ciclo econômico dos emergentes que hoje determina em parte a situação mundial. Trichet garantiu que a reunião terminou com um "acordo de que é essencial ancorar as expectativa inflacionária no cenário presente".

Segundo ele, medidas fiscais e monetárias apropriadas são as políticas a serem adotados no caso de um superaquecimento. Para Trichet, os BCs de todo o mundo estão unidos. Tombini passou os dois do encontro sem dar declarações aos jornalistas.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Privilégio do mar ::Carlos Drumonnd de Andrade

Neste terraço mediocremente confortável,

bebemos cerveja e olhamos o mar.
Sabemos que nada nos acontecerá.


O edifício é sólido e o mundo também.


Sabemos que cada edifício abriga mil corpos
labutando em mil compartimentos iguais.
Às vezes, alguns se inserem fatigados no elevador
e vem cá em cima respirar a brisa do oceano,
o que é privilégio dos edifícios.


O mundo é mesmo de cimento armado.


Certamente, se houvesse um cruzador louco,
fundeado na baía em frente da cidade,
a vida seria incerta... improvável...
Mas nas águas tranqüilas só há marinheiros fiéis.
Como a esquadra é cordial!


Podemos beber honradamente nossa cerveja.