segunda-feira, 6 de junho de 2011

Opinião – Fernando Henrique Cardoso

Quando o governo da presidente Dilma parecia dar passos certos para ajustar a política internacional e começava a permitir que o debate sobre as grandes questões nacionais se deslocasse do plano miúdo das divergências eleitorais, vem de novo "seu mestre" (que prometera ficar calado como ex-presidente) e joga em solo corriqueiro as questões políticas. Em vez de se preocupar com a veracidade do que transpareceu, acusa irresponsavelmente o PSDB pelo vazamento de informações relativas à evolução patrimonial do principal ministro do governo. E passa a operar a disputa por cargos e troca de votos no Congresso, ofuscando sua sucessora. Em vez de um passo à frente, mais um passo atrás no amadurecimento da sociedade e da política, que volta a se apequenar no jogo rasteiro de chantagens e pressões. No lugar de o líder sustentar valores, temos o retorno da metamorfose ambulante operando com o costumeiro desdém aos princípios.

Assim será difícil uma nação com tantas virtudes alcançar a maturidade que as condições materiais começam a tornar possível. É preciso ter lideranças à altura se quisermos jogar na grande cena mundial. Presidente Dilma: não desperdice sua chance!

Fernando Henrique Cardoso, Sociólogo, foi Presidente da República. Novos desafios. O Globo, 5/6/2011

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO

Aliados cobram de Dilma a solução sobre Palocci
Ministro diz que imóvel nos Jardins é para investimento
Bombeiros de gabinete vão substituir presos
Projeção dá vitória a nacionalista no Peru
Em Portugal, a derrota socialista

FOLHA DE S. PAULO

Aliados temem estender desgaste com Palocci
Dilma depende mais do PMDB do que gostaria
Pesquisa dá vitória a esquerdista em disputa no Peru

O ESTADO DE S. PAULO

Dilma decidirá futuro de Palocci após parecer do procurador-geral
Humala vence eleição no Peru, diz boca de urna
Obras em rodovias não saem do papel
Brasil libera entrada de carros argentinos

VALOR ECONÔMICO

Investidores acham brechas para escapar do IOF maior
Aeroportos vão competir nas regiões
Exploração de gás se aproxima de Abrolhos
Futuro de Palocci na Casa Civil divide governo e PT

ESTADO DE MINAS

Governo paga R$ 4 bi ao ano a filhas de militares
Livro didático preocupa estudantes

CORREIO BRAZILIENSE

Brasileiros dão calote de R$ 59 bi em bancos
Grata, Dilma reluta sobre Antonio Palocci

ZERO HORA (RS)

Descontrole de bombeiros acende alerta

JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Porto e aeroporto novos para o Estado
CPI de Palocci

Aliados cobram de Dilma a solução sobre Palocci

Aliados do PMDB e do PT cobraram da presidente Dilma Rousseff um desfecho para a situação do ministro da Casa Civil, Antonio Palocci, até quarta-feira, quando o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, deve dar seu parecer sobre o caso. A avaliação dos interlocutores do Palácio do Planalto é que a situação de Palocci é insustentável, sob pena de aprofundar a crise e os problemas na relação com o Congresso. Dilma conversou ontem sobre o assunto, por telefone, com o ex-presidente Lula, que é esperado amanhã em Brasília. Uma das alternativas discutidas é a de que Palocci peça licença até o esclarecimento do caso. Deputados admitem que há um grande problema em mexer na composição do governo e criar novas dificuldades com a escolha mal feita do substituto. Dilma teria preferência por uma pessoa com perfil mais técnico, como Graça Foster, diretora da Petrobras, ou a ministra do Planejamento, Miriam Belchior. Mas isso criaria um problema na articulação política

Aliados dão ultimato a Dilma

CRISE NO GOVERNO

Presidente consulta Lula sobre destino de Palocci após base cobrar decisão até quarta-feira

Cristiane Jungblut, Flávia Barbosa, Geralda Doca e Isabel Braga

Acabou o prazo para um desfecho político na crise provocada pela revelação da rápida evolução do patrimônio do ministro da Casa Civil, Antonio Palocci. O PMDB e o PT, os dois maiores partidos da base aliada, passaram a cobrar da presidente Dilma Rousseff uma definição pública da situação de Palocci até quarta-feira, sob pena de se aprofundarem a crise e os problemas na relação com o Congresso Nacional. Há a expectativa de que, quarta-feira, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, dê seu parecer sobre o caso. A avaliação dos interlocutores do Palácio do Planalto é que a situação de Palocci é insustentável, mas todos admitem que há um grande risco de mexer na composição do governo e criar novas dificuldades a partir da escolha mal feita de um substituto.

O recado foi transmitido ontem por políticos aliados a Dilma. A presidente decidiu conversar sobre o assunto com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ontem. A gravidade da crise levará a encontros hoje entre caciques do PT em São Paulo e Brasília. Lula é esperado amanhã na capital federal.

Para o PT e o PMDB, a presidente precisa tomar uma posição pública sob o risco de agravar ainda mais o momento e aumentar a sangria do ministro da Casa Civil, que não conseguiu reverter sua situação com as explicações dadas na entrevista à TV Globo e depois viu surgirem novas denúncias com a reportagem da revista "Veja" mostrando que ele aluga um apartamento em São Paulo de uma empresa de propriedade de laranjas.

Os deputados querem evitar um desgaste ainda maior na Câmara, já que o presidente da Casa, Marco Maia (PT-RS), terá que anunciar esta semana a anulação do pedido de convocação de Palocci pela Comissão de Agricultura. No Palácio, uma das alternativas discutidas é Palocci pedir licença até o esclarecimento do caso. A solução lembra o caso de Henrique Hargreaves, ministro da Casa Civil de Itamar Franco, que, alvo de denúncias, deixou o cargo e depois voltou.

Já Palocci disse a interlocutores do PMDB que tinha a esperança de que Gurgel decida até quarta-feira sobre o assunto. O procurador viaja na quinta-feira para o exterior.

Temor de substituto sem expressão

Um dos dilemas de Dilma ontem era encontrar um substituto para Palocci. O temor é que um nome sem expressão política ou alvo de denúncias só aumentasse a crise. O próprio Palocci confidenciou a interlocutores que já tinha feito o que podia, dado as explicações e que a decisão era da chefe.

- A solução agora é da presidente, a partir da dimensão que ela avalia ter o problema. Se vai dizer que (o impacto negativo) já está precificado e vamos em frente com Palocci ou se a crise começará a contaminar o governo, esse custo é inaceitável e vamos trocar - afirmou um político que conversou ontem com o ministro.

O temor é que a crise acabe afetando o andamento do governo. Ministros já reclamam que há falta de diretrizes devido às indefinições.

- A semana é decisiva para Dilma, ela tem que tomar decisão, se fica ou dá tchau ao Palocci. Ela não pode permitir que dúvidas pairem sobre o seu ministro mais importante, que comanda a Casa Civil. Ela tem que encerrar esse debate para não deixar que a crise tenha mais impacto sobre ela. Caso contrário, dará incentivo ao bombardeio - disse um cacique do PT.

Dilma, segundo interlocutores, não gostou do desempenho de Palocci nas entrevistas, no sentido de que não trouxeram novos esclarecimentos sobre o faturamento de R$20 milhões de sua empresa de consultoria, a Projeto. Mas a informação sobre problemas no aluguel do apartamento onde mora serviu para aumentar o desgaste.

O PMDB mantém a estratégia de defender Palocci. Mas os líderes enfatizam que embora reconheçam a importância do ministro para o governo e para a própria presidente, desde a campanha eleitoral, o ministro é do PT e o PMDB não teve qualquer influência em sua indicação, uma escolha de Dilma.

Ela analisava ontem vários rituais para sair da crise. Caciques do PMDB apostavam num tempo até quarta. Já membros do governo e petistas apostavam na saída de Palocci por ser insustentável sua permanência.

O líder do PMDB na Câmara, Henrique Eduardo Alves (RN), disse que as explicações legais e jurídicas dadas por Palocci foram "suficientes", mas reconheceu o desgaste diário:

- Não é uma posição confortável, a imprensa publicando matérias todos os dias, a oposição fazendo disso um cavalo de batalha. Só a presidente pode decidir o que fazer com ele. Da parte do PMDB, daremos apoio ao ministro, pela importância dele no governo. É decisão exclusiva da presidente, que contará com o respeito e o apoio do PMDB, qualquer que seja ela.

- Quem tem o poder de decisão é a presidente. Houve a fala de Palocci, surgiu um novo agravante, mas pode ser explicado. Se ela não quiser contaminar o governo, tem que tomar uma decisão: ou ele fica e ela banca, ou não fica. Acho que ela deve anunciar (a decisão) e, se decidir que ele não fica, deve anunciar o sucessor no ato - disse o deputado Devanir Ribeiro (PT-SP).

FONTE: O GLOBO

Aliados temem estender desgaste com Palocci

Numa operação que sujeita o Planalto a danos adicionais, deputados aliados terão de derrubar amanhã a convocação para que o ministro Antonio Palocci fale na Câmara. A oposição promete recorrer ao Supremo.

Deputados fazem pressão para que o governo evite esse novo desgaste, e os principais ministros acham difícil sustentar Palocci. A presidente ainda deve discutir com Lula o destino do seu ministro

Medo de desgaste amplia pressão para afastar Palocci

Catia Seabra, Fernanda Odilla, Márcio Falcão, Natuza Nery e Valdo Cruz

OS NEGÓCIOS DO MINISTRO

Deputados pedem que Dilma defina futuro de ministro logo para encerrar crise

Esforço para anular convocação para depor na Câmara teria custo político muito alto para aliados da presidente

BRASÍLIA - Aliados da presidente Dilma Rousseff expressaram preocupação no fim de semana com o desgaste político que ela poderá sofrer se mantiver por muito tempo indefinido o futuro do ministro da Casa Civil, Antonio Palocci.

Os principais ministros consideram a permanência de Palocci perto do insustentável. Ele perdeu apoio na cúpula do PT e entre os dirigentes de partidos aliados ao Planalto. As relações do governo com o Congresso estão sem comando.

Amanhã haverá mais uma operação com potencial de alto risco político para o Planalto. Os deputados da base governista terão de sustentar em público a derrubada de uma convocação de Palocci para depor na Comissão de Agricultura da Câmara.

O Planalto dispõe de energia para derrubar essa convocação, mas será inútil se Palocci depois acabar sendo demitido. Deputados têm pressionado o Planalto nos bastidores para que se evite prolongar o desgaste provocado pela crise, que já dura mais de três semanas.

Apesar da escalada da crise, Dilma passou o dia ontem sem se manifestar sobre sua decisão. Alguns ministros e assessores da presidente dizem que é uma questão de tempo apenas para que ela dispense Palocci, mas ninguém se atrevia a fazer essa afirmação em público.

A presidente tem avaliado sobre se deve demitir seu principal auxiliar ou se espera a manifestação da Procuradoria-Geral da República a respeito do caso. Ela pretendia discutir o tema ontem à noite com o ex-presidente Lula num jantar em Brasília.

Conforme antecipou ontem a Folha, Dilma tomará a decisão final sobre a permanência de Palocci junto com Lula. A presidente tem ouvido argumentos de Palocci e de alguns poucos petistas que julgam mais prudente aguardar a resposta do procurador-geral, Roberto Gurgel, que já recebeu explicações do ministro.

Se Gurgel optar por não abrir uma investigação, o ministro ganharia uma sobrevida. O problema é que não se sabe quando o procurador-geral vai se pronunciar e a lei não impõe prazo para a manifestação.

A Folha revelou em 15 de maio que Palocci multiplicou seu patrimônio 20 vezes nos últimos quatro anos. Em 2010, ele faturou R$ 20 milhões com uma empresa de consultoria, a Projeto.

Na sexta-feira Palocci deu entrevistas, mas não revelou quem foram seus clientes nem o que ofereceu como serviços a essas empresas.

Esta é a primeira crise política enfrentada por Dilma, que não demitiu nenhum ministro desde o início de seu governo.

Por essa razão, vários assessores da presidente não sabiam dizer com exatidão como ela agirá se resolver dispensar Palocci -se vai mandar algum emissário falar com ele ou se vai preferir chamá-lo para comunicar o que foi decidido.

O desgaste político já é real. O governo teve acesso a pesquisas que mostram dano na imagem de Dilma após o caso Palocci.

Um estudo já concluído em São Paulo -e apresentado ao Planalto por um interlocutor do governo- aponta uma queda de 15 pontos percentuais na avaliação positiva de Dilma na capital.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Dilma decidirá futuro de Palocci após parecer do procurador-geral

Em conversa por telefone, a presidente Dilma Rousseff acertou ontem com Antonio Palocci que aguardará o posicionamento da Procuradoria-Geral da República a respeito das suspeitas que pairam sobre o chefe da Casa Civil antes de tomar uma decisão sobre o caso.

Existem duas razões para esperar pela manifestação do procurador-geral Roberto Gurgel – o que pode ocorrer na próxima quarta-feira. Primeiro, caso afaste Palocci de imediato, Dilma corre o risco de depois ser cobrada por uma atitude injusta, se a procuradoria não encontrar motivos para abertura de inquérito. Porém, se Gurgel apontar indícios de irregularidades, o afastamento de Palocci seria facilitado, para que não se atrapalhem as investigações. Há 22 dias, o ministro está sob ataques da oposição e de setores da base aliada por causa do rápido aumento de patrimônio. Nesse fim de semana, houve mais desgaste com a divulgação de que Palocci aluga um apartamento de 640 m², em bairro nobre de São Paulo, de uma empresa que usaria laranjas e endereços falsos.

Dilma diz a Palocci que só se decidirá após parecer do procurador-geral

Presidente teme ser acusada de injustiça caso demita ministro e, em seguida, Gurgel rejeite pedido de inquérito; se houver investigação, afastamento do chefe da Casa Civil será justificado sob argumento de que não se deve atrapalhar as apurações

Leonencio Nossa

BRASÍLIA - Em conversa por telefone, a presidente Dilma Rousseff acertou ontem com Antonio Palocci, pivô da primeira crise política do seu governo, que aguardará o posicionamento da Procuradoria-Geral da República (PGR) a respeito das suspeitas de tráfico de influência por parte do chefe da Casa Civil antes de divulgar qualquer decisão sobre o caso.

A espera pela manifestação do procurador-geral, Roberto Gurgel, o que pode ocorrer na próxima quarta-feira, tem dois motivos. Primeiro, Dilma avalia que, se afastar Palocci de imediato, corre o risco de ser cobrada por uma atitude "injusta", no caso de a procuradoria não instaurar inquérito. Na segunda hipótese, de Gurgel achar indícios e abrir investigação, o afastamento de Palocci seria facilitado, sob a alegação de que o governo não vai interferir nas apurações.

Há 22 dias, o ministro está sob ataques da oposição e de setores da base aliada por causa do rápido aumento de patrimônio, que levantou suspeitas de enriquecimento ilícito. De 2007 até o fim do ano passado, ele multiplicou seu patrimônio por 20, informação confirmada pelo ministro na entrevista que concedeu ao Jornal Nacional de sexta-feira, quando pela primeira vez deu explicações públicas sobre o caso.

No último dia 20, o procurador-geral pediu a Palocci esclarecimentos sobre o aumento do patrimônio pessoal. Números confirmados pelo ministro, na entrevista à TV, mostram que foi no final do ano passado que mais aumentou a renda de sua empresa de consultoria, a Projeto.

Justamente nesse período, Palocci comandava a equipe de transição de governo e, paralelamente, mantinha a empresa. Segundo ele, a Projeto já estava fechada quando assumiu a pasta da Casa Civil, em janeiro.

Ao informar que tinha pedido esclarecimentos a Palocci, Gurgel antecipou, porém, que não via como crime a prestação de serviços de consultoria. O procurador ponderou que o caso poderia ser questionado, isso sim, do ponto de vista ético.

A oposição encaminhou duas representações contra Palocci. A partir das respostas do ministro, Gurgel vai decidir sobre um eventual pedido de abertura de investigação.

No Planalto, parte da equipe de Dilma trabalha com a perspectiva de que Gurgel apresentará a sua decisão até quarta-feira.

Outra ala acha que não é possível prever um prazo - Gurgel pode adiar o anúncio de sua posição para as próximas semanas, o que esticaria a crise política vivida pelo governo.

Chávez. Auxiliares da presidente disseram que ela acertou com Palocci que os dois tentarão manter uma agenda normal nesta segunda-feira, quando o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, será recebido no Palácio do Planalto e no Itamaraty.

Dilma passou o fim de semana na residência oficial do Palácio da Alvorada, onde conversou com outros interlocutores por telefone. Já Palocci passou o domingo em São Paulo.

Neste fim de semana, Dilma e auxiliares diretos fizeram avaliações sobre a performance do ministro na entrevista ao JN. A presidente se sentiu incomodada ao ouvir o ministro dizer na entrevista que não podia divulgar a sua lista de clientes.

Neste fim de semana, houve mais desgaste político com a divulgação de que Palocci aluga um apartamento de 640 metros quadrados, em Moema, zona sul de São Paulo, de uma empresa que usaria laranjas e endereços falsos. Em nota, o ministro ressaltou que não tem responsabilidade sobre os atos do locador. O Estado esteve ontem no local, mas as informações eram de que ele não estava no apartamento.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Sócios na crise:: Ricardo Noblat

"Se nem eu governei com independência, por que Dilma haveria de governar?"
(Fernando Henrique Cardoso)

Dizer que o problema é só dele, que Dilma desconhecia os seus negócios e que nenhuma crise abala o governo foi, sem dúvida, a fórmula esperta encontrada pelo ministro Antonio Palocci para, nos próximos dias, sair de cena alegando ter prestado um último e relevante serviço à sua chefa e ao PT. Mas a fórmula não resiste a um exame superficial.

O problema de estar sob suspeita de ter enriquecido fazendo tráfico de influência seria só de Palocci se ele não fosse quem é — ex-arrecadador de recursos da primeira campanha presidencial de Lula, ex-ministro da Fazenda, ex-deputado federal, ex-coordenador da campanha de Dilma e chefe da Casa Civil da Presidência da República.

A velhinha de Ribeirão Preto pode até acreditar que Palocci não cometeu nenhum deslize. Mas, como homem público, ele deve satisfações à sociedade. Em vez de fazê-lo para preservar a própria reputação, preferiu preservar a identidade dos ex-clientes de sua empresa de consultoria, a natureza dos serviços que lhes prestou e o quanto ganhou.

Fez sua escolha. Por sinal, compreensível, levando-se em conta a certeza de que deixará o governo a qualquer momento. Uma vez que caia pela segunda vez (a primeira foi quando mandou quebrar o sigilo bancário do caseiro que o viu numa mansão de Brasília onde se faziam negócios e amor), Palocci voltará à procura dos antigos clientes. É justo...

Ao contrário do que possa ter imaginado, Palocci deixou Dilma em situação desconfortável ao dizer que ela ignorava os seus negócios. Primeiro porque é difícil acreditar que ele tenha dito a verdade. Segundo porque, se disse, tem-se que Dilma nomeia ministros sem ao menos reunir informações sobre sua vida pregressa.

Gente indicada pelo PMDB para postos do governo gostaria de ter merecido o mesmo tratamento conferido a Palocci. Se Dilma não soube antes e não procurou saber depois como Palocci enriqueceu de maneira tão súbita, foi duplamente relapsa, sinto muito. Faltou com odever de cercar-se de cuidados na escolha dos seus auxiliares.

Por omissão, acabou se tornando sócia de Palocci na primeira grave crise que abala seu governo. Sem essa, por favor, de que o governo funciona normalmente. O“fator Palocci” paralisa o governo há mais de 15 dias. Um governo, por sinal, que anda devagar, quase parando, e ainda repleto de cargos a serem preenchidos.

Diante do enfraquecimento do mais poderoso ministro do governo, recrudesceu o apetite dos partidos por mais espaços. No momento, com uma mão, o Congresso oferece a Dilma o que ela lhe pede— o veto a qualquer convocação de Palocci para ir depor ali. Com a outra, nega a aprovação de medidas e aprova projetos que a contrariam.

A crise protagonizada por Palocci serviu para iluminar pontos frágeis da administração Dilma até aqui tolerados com base no entendimento universal de que todo começo de governo é difícil. O principal ponto: o estilo Dilma de governar. Outro: sua inaptidão para a política. Outro ainda: o perfil baixo, quase rasteiro, da equipe que montou.

Dilma continua sendo a centralizadora de sempre. Nada se faz no governo sem o seu conhecimento prévio e concordância. Por temperamento ou falta de experiência, ou pela soma das duas coisas, não gosta e não sabe tocar o jogo rotineiro da política, indispensável para quem deseje manter os apoios conquistados.

Lula sabia fazer política, mas ao lado dele havia um time de ministros que também sabia. O governo de Dilma carece de ministros hábeis na articulação política. Quase todos os ministros morrem de medo de ser destratados por ela. São menos ministros e mais serviçais temerosos e obedientes. A Dilma serena é uma invenção da mídia.

Coitado do substituto de Palocci! É por isso que aos poucos se dissemina nos meios políticos de Brasília a opinião, por ora apenas sussurrada, de que a crise de fato atende pelo nome de Dilma. Talvez seja ainda muito cedo para se concluir isso.

FONTE: O GLOBO

O Delúbio da banca :: Fernando de Barros e Silva

Do blá-blá-blá de Antonio Palocci, deve-se reter a passagem em que ele afirma que Dilma Rousseff não sabia dos seus negócios: "Não entrei em detalhes sobre nomes dos clientes ou serviços prestados para cada um", disse à Folha. Nem os "clientes" nem os "serviços". No "JN", da Rede Globo, Palocci fez questão de delimitar o escândalo: "É uma coisa dirigida a mim. Não há crise no governo".

Nos dois trechos, o ministro não estava preocupado em fazer sua defesa -de resto pífia. Palocci buscava circunscrever a crise e fazer um cordão sanitário capaz de isolar Dilma de sua figura contaminada.

A preocupação profilática do ministro-sanitarista tem razão de ser. Palocci foi o coordenador da campanha presidencial de Dilma. Em 2010, sua empresa faturou R$ 20 milhões, metade deles nos últimos dois meses, depois que Dilma estava eleita e ele já era cotado para o cargo mais cobiçado do governo.

A investigação sobre a origem e as motivações dessa dinheirama provocaria, muito provavelmente, um estrago muito maior do que o disponível até agora. Que tipo de contratos -e com quem- o coordenador da campanha presidencial vitoriosa fez em 2010?

Nesse sentido, a entrevista evasiva, lacônica e cínica de Palocci se justifica plenamente como estratégia de defesa. Entre a opinião pública e os clientes, optou pelos últimos. Entre afundar sozinho (é o que ele agora espera) e comprometer o governo e a presidente, a primeira opção parece menos ruim.

Se abrisse o jogo, Palocci sabe que estaria espalhando dinamite pelo Planalto. Cairia do mesmo jeito que deve cair, mas provocaria danos muito maiores. Embora seja mais homem de mercado que de partido, Palocci lembra e repete Delúbio, aquele que tombou sem piar. Palocci é o Delúbio da banca. Delúbio é o Palocci do bingo.

Há, pois, ciência nessa queda muito provável. Se tudo der certo, Dilma ainda terá uma dívida de gratidão com o ministro milionário.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Variação patrimonial :: Melchiades Filho

A desintegração de Antonio Palocci atingiu em cheio o PT. Acirrou rixas internas, expôs fragilidades das novas lideranças e comprometeu o trabalho de ocupação de espaços na máquina federal.

De pouco adiantou o partido ter reagido rapidamente às revelações sobre a incrível escalada patrimonial de seu principal ministro.

Os dirigentes petistas logo perceberam o potencial de dano do episódio, daí a escassa solidariedade ao titular da Casa Civil.

Poucas semanas antes, vale lembrar, essas mesmas pessoas haviam desafiado a opinião pública e decidido reintegrar o tesoureiro do mensalão. Por que outro peso e outra medida para Delúbio Soares?

Há quem diga que a militância aceita proteger quem se desvia para fortalecer o PT, mas não aqueles que agem em causa própria.

Pode ser. Mas parece haver, mais do que isso, cálculo político.

Para o partido, a vitória de Dilma significou uma chance imperdível de crescer e se multiplicar. Ao contrário de Lula, ela não intimida os correligionários. Antes da posse da presidente, nomes como Zé Dirceu e Fernando Pimentel já ensaiavam o slogan do "agora é pelo PT".

Não obstante as queixas de alas sindicalistas e a falta de diálogo com Dilma no dia a dia, o fato é que o PT se deu bem mesmo. Bateu recordes de cargos e verbas. Ficou com o Planalto todo, por exemplo.

Cada escândalo que abalar o governo, portanto, será uma ameaça a esse arranjo. Daí o desapego petista em relação a Palocci. Melhor sacrificá-lo do que correr o risco de precisar renegociar espaços.

A mesma lógica, apenas invertida, leva o PMDB a hipotecar apoio público ao ministro: quanto mais o Planalto sangrar para justificar o que Palocci insiste em esconder, maior e melhor o naco que os peemedebistas deverão abocanhar na hora de repactuar a aliança.

Os 20 dias de silêncio do ministro, e de Dilma, desequilibraram a balança em favor do PMDB.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

O vice mais forte de nossa história:: Renato Janine Ribeiro

Nunca antes na história deste país, tivemos um vice-presidente poderoso quanto Michel Temer. Outros alcançaram poder depois da Vice-Presidência, como João Goulart, José Sarney e Itamar Franco, que se tornaram presidentes graças à renúncia, morte ou impeachment do titular. Mas Sarney e Itamar, como vices, foram apagados. No final da ditadura militar, Jô Soares nos divertia com um sketch em que um político se recusava terminantemente a ser vice. Indagava: "Alguém já viu uma avenida Vice-presidente Fulano? Uma praça Vice-presidente Beltrano?" Dizia-se que era uma piada com Marco Maciel, ex-governador nomeado de Pernambuco que, como presidente da Câmara dos Deputados, ajudara o ditador Geisel a redigir as emendas constitucionais baixadas com o nome de "pacote de abril", em 1977.

Assim, quando Sarney aceitou a Vice-Presidência, ele provavelmente não esperava ser sequer nome de rua. Encerrava sua carreira. A ironia é que, com a morte de Tancredo Neves, esse vice conseguiu uma sobrevida de três décadas, bem como a continuidade de seu mando no Maranhão, acrescido do Amapá, enquanto Marco Maciel veio a ser vice-presidente, sim, mas de Fernando Henrique Cardoso - um vice honrado e inexpressivo.

Na verdade, antes de Temer, o único vice importante como vice foi João Goulart. Em 1955, ele se elegeu com o presidente Juscelino, do PSD, trazendo-lhe os votos dos sindicatos e do PTB. Nesse mandato, foi influente. Mas em 1960 ele se elegeu vice de Jânio, sem ser seu parceiro de chapa. Só que, em sua segunda vez, ele foi o contrário de Michel Temer. Longe de ter poder, Goulart foi um vice esvaziado.

O que temos hoje com Temer? Há fatos e há rumores. Os fatos são que ele conseguiu manter a bancada do PMDB coesa, a favor de Dilma quando se votou o salário mínimo, contra ela quando se aprovou o código do desflorestamento. Os rumores são que Dilma ameaçou demitir todos os ministros do PMDB - ameaça que, não sendo cumprida, corre o risco de desmoralizar a Presidência - e que Temer e Palocci mantiveram um bate-boca. São quatro vitórias para o vice. O que não tivemos, nos vices eleitos pelo povo em nossa história, foram personagens que, de seu cargo pouco destacado, mostrassem uma capacidade de articulação tão grande quanto a sua.

Some-se que um vice pode ser isolado, excluído, o que se quiser; mas não pode ser demitido. Ele, na pior das hipóteses, é o nada que pode virar tudo. Collor tentou reduzir Itamar a um nada. Itamar acabou presidente. Portanto, se Dilma rompesse com Temer, demitindo por exemplo todos os ministros pemedebistas, ela não poderia ficar doente, viajar nem, muito menos, ter uma moléstia grave, renunciar ou morrer. Veja-se, a título de comparação, José Alencar, nosso último vice. Sabíamos todos que ele discordava completamente da política econômica de Lula, mas jamais mexeu com ela, em suas muitas interinidades. Já Temer, se presidente, fará o governo que ele quiser.

Daí, seguem-se duas consequências. A primeira é que o PMDB pode mudar de perfil. Não é provável, mas se torna remotamente possível. A força do PMDB, desde o fim da ditadura, esteve em não ter identidade. Ele reúne gente digna e gente interesseira, políticos de direita e de esquerda. Mas Temer está conseguindo articular esses líderes tão distintos entre si. Até agora, o PMDB se mostrou poderoso na medida em que renunciou, há 20 anos, a lutar pela hegemonia que representa a Presidência da República, investindo em vez disso em bancadas numerosas no Congresso e numa vasta população de governadores e prefeitos. O que os une não tem sido nenhum ideal, mas o interesse: ele é um amplíssimo lobby. Hoje, porém, começa a ser possível, embora ainda muito improvável, uma disputa do PMDB pela hegemonia política.

A segunda é que Dilma Rousseff precisa, mais que nunca, tornar-se uma imagem de marca, imprimir seu estilo à política. Comentei, meses atrás, que ela não mostrava um estilo, ao contrário de seus dois antecessores, ambos políticos sedutores. Fernando Henrique conquistava pela fala racional - ainda, ressalva ele com humor, que fosse uma razão "no nível do senso comum". Lula chegava aos corações e mentes pelas metáforas e pela linguagem da experiência cotidiana. Talvez Dilma não precise, tanto quanto eles, de um estilo - porque eles, a despeito de suas diferenças, fizeram o trabalho que tinha de ser feito, consolidando a democracia, mudando a economia, tornando prioritárias as políticas sociais.

Dificilmente Dilma, ou qualquer outro político sensato, terá hoje a propor algo tão inovador em nossos costumes quanto seus predecessores. A grande mudança já ocorreu. Seu papel é o de dar continuidade. Mas, mesmo assim, o estilo lhe faz falta. Num comício na Bahia, ela só foi (muito) aplaudida quando mencionou Lula. Entende-se que, perto do mais carismático de nossos presidentes, Dilma empalideça. Lula ofuscaria qualquer um. Mas ela não pode se empalidecer diante de seu próprio vice, Michel Temer. Se Dilma jogar o papel da técnica competente na Presidência, ajudada no Congresso pelos operadores que temos visto, sem ter por trás algo como o apelo de FHC à opinião pública ou de Lula ao povo, ela pode perder. Temer conhece muito melhor do que ela o Parlamento. O que fortaleceu Fernando Henrique e Lula foi a capacidade que demonstraram de ir além do Executivo e do Legislativo, para falar com a sociedade. Respeitaram os poderes constituídos, mas souberam cultivar o povo soberano. Como Dilma vai fazer isso, como vai conseguir ser líder, não sei. Mas, se a liderança presidencial ficar vazia, alguém a ocupará.

Renato Janine Ribeiro é professor titular de ética e filosofia política na Universidade de São Paulo.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

A estratégia é desafiar o público ou debochar dele? :: Marco Antonio Rocha

O governo do Brasil mostra-se empenhado em enfrentar, desafiar e provocar a opinião pública. É uma antipolítica que se manifesta em diversos ministérios, espalha-se por vários órgãos públicos e dela não se exime nem a Presidência da República. Sinais do fenômeno emanam desde pequenas decisões quase imperceptíveis, locais ou regionais, ou se agigantam com espalhafato nas manchetes, mas sempre com o viés de provocação e desafio ao público.

Muita gente talvez não perceba, por não ligar lé com cré - como se diz - nem atinar com fatos aparentemente desconexos que se casam no contexto maior do enfrentamento que a classe governamental está promovendo contra a população, principalmente contra o eleitorado.

Vamos a alguns.

Fato 1 - Um ministro da Educação destrói sistematicamente a credibilidade dos exames de avaliações do ensino, de estudantes e de escolas. Deixa passar por entre as pernas, como frangueiro, patacoadas de uma administração inepta povoada de energúmenos, tais como cartilhas que consideram que o falar e o escrever errado é que são o certo, a pretexto de tornar a cultura mais "acessível"; ou kits de pretensa propaganda contra a intolerância, mas que na prática encerram intolerância com sinal trocado; ou propostas de reformas curriculares que deixam perplexos os educadores sérios e que não podem ser levadas a sério. Mas nada, absolutamente nada, acontece com o desastrado e desgastado ministro. Ao contrário, o governo não só o defende contra tudo e contra todos, como o estimula a engendrar mais provocações.

Fato 2 - Um projeto descabelado, perdulário e hostil sob todos os pontos de vista, mas principalmente sob os aspectos ambiental e social, tecnicamente absurdo, de uma hidrelétrica cuja produção consumirá três vezes mais recursos para ser transportada até onde possa ser usada, é descartado até por empreiteiras que poderiam encher os bolsos com ele - pois seus donos temem terminar atrás das grades, quando algum governo sério resolver reexaminar o assunto. No entanto, o atual governo e o principal órgão de proteção do meio ambiente batem o pé, numa atitude que parece de pura birra, e se acham a ponto de empurrar o projeto goela abaixo da Nação, à custa do erário e da paciência do público.

Até a Anistia Internacional entrou no circuito, pedindo a suspensão da tresloucada obra. Mas o governo faz ouvidos moucos. Por que será? Só porque a padroeira da obra é a nossa presidente? Não pode ser. É a síndrome do desafio que infecta o governo brasileiro desde que o PT ascendeu (já apresentara um surto bravo no tempo dos militares). É interessante ver quanto o governo do PT se assemelha, e não só nesse aspecto, ao dos militares.

Fato 3 - Para não alongar, temos agora o caso do mais bem-sucedido consultor de empresas do planeta. O ministro que multiplicou 20 vezes o seu patrimônio pessoal em apenas um ano e em cuja defesa se envolve todo o governo, não para pedir a ele alguma explicação plausível para o fenômeno, e sim para tentar descobrir quem foi que dedou o malsinado, se foi gente do PSDB ou do próprio PT, ou até do PMDB. Embora constasse da notícia original, da Folha de S.Paulo, que a grande mandracaria se dera em quatro anos, o seu autor esclareceu que foi no último ano do período que ocorreu a multiplicação de pães e peixes, quando seus clientes, afinal, pagaram seus serviços. Portanto, na prática, segundo suas próprias palavras, o tsunami de dinheiro entrou em um ano apenas. O que nos conta, a respeito, a solerte Receita Federal? Nada. Os dados do contribuinte são sigilosos, a não ser quando ele é adversário do governo. Quem sabe o poderoso ministro já não foi notificado para se apresentar à Receita e dar explicações? E por que nós não estamos sabendo? Porque as explicações também são sigilosas?

Mas, afinal, o que realmente importa tanto nesse episódio quanto nos anteriores não é a explicação que o ministro alinhave sobre o seu estranho enriquecimento. Seja qual for essa explicação, ninguém acreditará mesmo. O fato é que uma montanha de dinheiro entrou nas contas da sua empresa - que até então tinha faturamento medíocre - justamente no ano em que ele funcionou como tesoureiro da campanha da candidata à Presidência. O ministro não precisa, pois, explicar nada, todo mundo já entendeu. Quem deve explicações é o governo: por que manter, preservar e defender um alto funcionário que está sob profunda suspeita de todos, até de aliados? Só para desafiar os adversários? Mas o desafio aos adversários toma agora o lugar da satisfação ao público?

Por que essa desesperada tentativa de salvação do desastrado, com mobilização do ex-presidente e de um poderoso trio de zaga - Temer, Sarney, Calheiros - "de inenarrável beleza moral", como diria Assis Chateaubriand?

Por que tirar os holofotes desse assunto, providenciando um factoide de lançamento de um repeteco do Bolsa-Família - durante o qual o ministro é fotografado embaixo do slogan "Brasil sem Miséria"?

Isso é desafiar os adversários? Ou já é, simplesmente, debochar da opinião pública?

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Derradeira oportunidade :: Paulo Brossard

Faz alguns dias, a nação foi surpreendida com notícia divulgada por grande jornal, segundo a qual prócer da administração federal, nada menos que o ministro-chefe da Casa Civil, ou seja, a autoridade federal que tem as chaves da Presidência da República, tivera súbito e volumoso enriquecimento, R$ 20 milhões em quatro anos. E pior foram os comentários feitos pela feliz personagem. Esses comentários, longe de esclarecer, turvaram o cenário. A tal ponto, que a senhora presidente entrou em cena para dar o assunto por encerrado e, nada menos que o ex-presidente foi chamado, para drenar o chão da presidência, mas, a despeito da linguagem de ambos, o caso, antes de mermar, foi crescendo, dia após dia.

Foram igualmente vãs as várias e ilustríssimas autoridades que se manifestaram, todas no sentido de acentuar as virtudes angelicais do preclaro ministro. Desse cortejo de louvores, participou a aristocracia oficial, petista e aliada. A solidariedade tornava-se expressa e pública. Com tudo isso, e a despeito do recato a que se recolheu o envolvido, depois de algumas declarações desastrosas, longe de minguar o efeito constrangedor foi crescendo, um dia sim e outro também. Estou em dizer que, se fosse feita uma consulta popular a propósito, o resultado seria devastador. Mas, é claro, trata-se de impressão minha.

Ora, não há quem não saiba que há um momento para adotar uma solução, ainda que não seja a ideal. Estou convencido de que esse momento não foi aproveitado, antes diria que foi perdido. Vou além. Algumas declarações do protagonista foram lamentáveis, para dizer o menos. Começou por dizer que possuir dinheiro não é crime, e realmente não é, mas pode ser. Disse coisa pior, ao afirmar que quem passa pelo Ministério da Fazenda tem valorizada sua cotação no mercado. Mas não disse com que e para que, e isto poderia ser fundamental. Honni soit qui mal y pense. Porém, o dito ainda ficou pior. Para defender-se, citou uma série de antigos ministros que teriam feito o mesmo. Mas alguns deles, pelo menos, bradaram o Aqui Del Rey... Antes de serem ministros da Fazenda eram possuidores de uma relação de funções relevantes que autorizavam suas escolhas para ministro, e não obtiveram a credencial depois de passarem pelo ministério... Eu mesmo me lembro de vários que foram ministros exatamente por seus títulos e não alcançaram algum porque ocuparam o ministério, cuja valia, impõe-se salientar, é duvidosa. Enfim, temendo a necrose que avançava, número crescente de partidários do ministro manifestou-se contra seu olímpico desprezo pela opinião do país, sendo que cada vez mais se cristaliza em desfavor do silente ministro da Casa Civil. E este dado parece ter sido mais eficaz do que a bengala que lhe foi emprestada por dois presidentes e mais a corte, e o calado teria dito que falaria a respeito do que dissera não falar. É possível que, quando este artigo seja publicado, já tenha falado. Talvez possa ser feliz nesse momento derradeiro, mas tudo pode acontecer.

No momento em que escrevo, leio que o conturbado ministro pretenderia dar explicações sobre o caso pela TV. Se exata a notícia, a emenda pode sair pior que o soneto. Seria um monólogo. E isto pode custar a recrudescência de uma situação que já é penosa. Aliás, já apareceram alguns "lavando as mãos".

Um amigo, de larga experiência e sadio critério, chegou a dizer que, nesta altura, permanecer no cargo não seria bom, e sair dele era ruim. Em todo o caso, em matéria de engordar o seu patrimônio ele já mostrou que foi feliz. Pode sê-lo agora, explicando convincentemente suas qualidades especulativas em matéria fazendária tanto quanto a negócios particulares.

*Jurista, ministro aposentado do STF

FONTE: ZERO HORA (RS)

No Rio, bombeiros seguem acampados em frente à Alerj

RIO - Bombeiros que protestam por aumento de salário e melhores condições de trabalho passaram a madrugada desta segunda-feira acampados em frente à Alerj. Eles também querem a libertação dos 439 militares presos. Os manifestantes improvisaram uma cozinha na rua, armaram barracas e espalharam faixas pelo local. Cerca de 30 manifestantes passaram a noite na Alerj. Segundo alguns manifestantes, os próprios bombeiros pediram que os companheiros fossem para suas casas descansar, tomar banho e se alimentar. A segurança foi feita por dois seguranças da Alerj e quatro patrulhas da Políca Militar.

As manifestações de oficiais do Corpo de Bombeiros do Rio por melhores salários ganharam força no domingo. Por volta das 21h30m, um grupo de aproximadamente 50 bombeiros iniciou um ato na altura do vão central da Ponte Rio-Niterói. Os manifestantes desceram de um ônibus e chegaram a caminhar em uma das quatro faixas de rolamento da via, sentido Rio.

Munidos de faixas e cartazes, os oficiais caminharam por aproximadamente dez minutos. Depois, retornaram ao ônibus e seguiram viagem.

Muitos motoristas passaram pelo local buzinando em apoio à manifestação. Quando chegou um veículo da concessionária que administra a via, os bombeiros interromperam o protesto. Muitos revelam ainda ter medo de represálias ou mesmo de novas prisões. Porém, prometem novas ações, enquanto houver colegas presos.

FONTE: GLOBO ONLINE E AGÊNCIA ESTADO

Bombeiros reacendem oposição no Rio

Paola Moura

Rio - A oposição do Rio de Janeiro ganhou neste fim de semana o primeiro grande fato político que pode usar como arma para atacar Sérgio Cabral (PMDB), depois de um início de segundo mandato em que o governador navegou sobre os 66,08% de votos obtidos no primeiro turno da eleição. A invasão dos bombeiros a seu Quartel Geral, na Praça da República, no Centro do Rio, e a necessidade de utilizar o Batalhão de Choque da Polícia Militar para enfrentá-los, jogando gás lacrimogêneo, não só sobre os militares invasores, mas sobre as mulheres e crianças que os acompanhavam, trouxe de volta ao cenário local políticos com pretensões majoritárias que ultimamente só apareciam envoltos em temas nacionais: o deputado federal Anthony Garotinho (PR) e o senador Lindbergh Farias (PT).

Após autorizar a ação contra os bombeiros - que reivindicam aumento salarial de R$ 950 para R$ 2 mil -, o governador Cabral convocou uma entrevista coletiva e partiu para o ataque: classificou a invasão como "ação inaceitável de vândalos". "Não negocio com vândalos. Eles irão responder administrativa e criminalmente". O governador atacou os manifestantes e os chamou de minoria dizendo que o Corpo de Bombeiros possui cerca de 17 mil oficiais, e a imagem da instituição não será abalada por conta de "seis centenas de indivíduos que não deveriam nem estar na instituição", que em comportamento de "desequilíbrio completo" ainda levaram crianças e mulheres.

O deputado federal Anthony Garotinho, acompanhado de sua filha Clarissa Garotinho, esteve na sexta-feira no ato que os bombeiros realizaram nas escadarias da Assembleia Legislativa, de onde partiram para invadir o QG no Centro. Desde então vem divulgando em seu blog, o passo a passo das manifestações. Desde que os protestos começaram em abril, Garotinho e sua filha deram apoio aos manifestantes. Mas agora que o protesto tomou dimensões nacionais, intensificaram o apoio.

Também em seu blog, Garotinho acusou o governador: "Cabral está cheio de ódio e quer expulsar os bombeiros que participaram da ocupação do Quartel Central e pressiona para que sejam processados criminalmente, de forma a pegarem uma pena de 14 anos de prisão, como se fossem perigosos marginais, e não bravos guerreiros que salvam vidas. Quer destruir a vida e a carreira dos bombeiros". Além disso, tornou-se porta-voz da corporação divulgando notícias diretamente de dentro do Batalhão da PM de Niterói, para onde 439 bombeiros foram levados na noite de sábado.

Outro político que voltou à carga é o senador Lindbergh Farias (PT). Com pretensões de se tornar o apaziguador, se ofereceu para ser intermediador entre a corporação e o governador Sérgio Cabral, de quem já foi inimigo político e concorrente, e, desde a campanha presidencial, se diz aliado. Ontem de noite, após deixar o quartel da PM em Niterói, reclamou do governo estadual. "O posicionamento intransigente não ajuda na solução do problema". E reforçou: "Este é um movimento legítimo da categoria, e não uma politicagem de A ou B". Lindbergh ressaltou ainda que "neste momento, os pontos mais importantes são o início de uma negociação salarial e o combate à ideia de criminalizar as lutas sociais". "Esses homens são heróis, não podem ser tratados como bandidos", defendeu Lindbergh, que, pela manhã, esteve na manifestação realizada na Alerj.

Como o fato teve grande repercussão na mídia, ontem, no início da tarde, o governador divulgou nova nota, voltando a chamar os bombeiros de irresponsáveis. "(...) Um grupo de manifestantes da categoria conduziu um gesto de imensa irresponsabilidade ao invadir, na noite de 4/6, o quartel central dos bombeiros - um bem público e santuário da corporação. Esse grupo qualificou de "manifestação pacífica" a invasão para a qual levou crianças junto a marretas, utilizadas em agressões. Ninguém planeja levar marretas para "manifestações pacíficas (...)".

FONTE: VALOR ECONÔMICO

A crise dos bombeiros no Rio :: Fernando Gabeira

Há alguma coisa errada com o Corpo de Bombeiros do Rio. Escrevi um texto sobre isso quando quatro oficiais foram presos, numa luta por melhoria salarial.

Fundado pelo imperador Pedro II, em 1856, o Corpo de Bombeiros do Rio é o mais antigo do Brasil. Sua luta é para aumentar um salário de R$950 para R$2 mil.

Vi e documentei algumas das intervenções dos bombeiros no meu bairro. Numa delas, era claro a precariedade do material. Assim que as mangueiras foram abertas todos viram como estavam furadas e perguntaram perplexos:

-Mas e a taxa de incêndio que pagamos, para onde está indo?

Este é o grande problema que os deputados cariocas não quiseram responder: para onde está indo a taxa de incêndio?

Está fazendo água por muitos lados

O governador Cabral teve problemas com os medicos e decidiu praticamente fundir o Corpo de Bombeiros com a Secretaria de Saúde. Militarizando o serviço medico ficaria mais fácil controlar a insatisfação.

Mas como dizia Freud com muita sabedoria o reprimido acaba aparecendo no repressor. Por exemplo, se você estuda matemática para reprimir seus impulsos sexuais, acabará seduzido pelas curvas da geometria.

O que está acontecendo no Rio é grave. Aqui de Lima, nos poucos instantes vagos, como esta madrugada tento acompanhar. Saúde é algo muito importante. Mas defesa civil também. É preciso mudar a política.

Lima, 4/6/2011 – 10, 20hrs.

Auto-Retrato :: Manuel Bandeira

Provinciano que nunca soube
Escolher bem uma gravata;
Pernambucano a quem repugna
A faca do pernambucano;
Poeta ruim que na arte da prosa
Envelheceu na infância da arte,
E até mesmo escrevendo crônicas
Ficou cronista de província;
Arquiteto falhado, músico
Falhado (engoliu um dia
Um piano, mas o teclado
Ficou de fora); sem família,
Religião ou filosofia;
Mal tendo a inquietação de espírito
Que vem do sobrenatural,
E em matéria de profissão
Um tísico profissional.