sexta-feira, 24 de junho de 2011

Opinião – Fernando Henrique Cardoso

O senhor então discorda do que disse o ex-presidente Lula, que a opinião pública morreu?

FH: Eu discordo. Se tivesse morrido, não teria acontecido tudo o que acontece, inclusive agora.

E como o senhor vê o papel da opinião pública?

FH: O que é a opinião pública aqui? Antigamente era quem lia a imprensa. Basicamente era isso. Agora é quem vê a televisão e a internet. E isso faz pressão. Não morreu, não, é o contrário.

O senhor identifica um novo momento na sociedade, nesse aspecto?

FH: Ah, não tenho dúvida. E crescentemente vai ser assim, você vai ter uma influência cada vez maior da sociedade conectada, que se manifesta cada vez mais. É curioso porque essa conexão pode produzir "derrubamentos", derruba alguém, mas não constrói, porque não tem como fazer a coisa funcionar. É para rupturas. Veja o que aconteceu agora no mundo árabe. Dá o contágio, pega, e se movimenta. Agora, isso não dispensa a ação institucional. O problema hoje é que você tem uma sociedade que está se conectando crescentemente, e o lado institucional não sabe se relacionar com isso. Dá a impressão de que algumas instituições envelheceram, não percebem que têm que mudar e não sabem para que lado vão.

Por exemplo?

FH: Qualquer pesquisa de opinião põe o Congresso em último lugar. É sintoma de que a instituição não está sendo aceita pela sociedade tal como é. E a sociedade não toma conhecimento do Congresso. Sofre as consequências de algumas decisões, mas não se preocupa; no dia a dia, se preocupa com outras coisas. Pode ver: quais são os temas debatidos na internet e quais os debatidos no Congresso? São dois mundos. Acho que esse é o sintoma de um problema grave na sociedade atual. Como o Congresso é indispensável e os partidos também, é um problema. Porque não vai ter jeito sem partido e sem Congresso.

Não se pode dizer que é porque o Congresso brasileiro é muito ruim?

FH: Não, porque é um fenômeno que acontece no mundo inteiro.

Fernando Henrique Cardoso, sociólogo e ex-presidente. Entrevista Especial. O Globo, 18/6/2011

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO

Governo desrespeita acordo e amplia gasto com terceirizados
Quadruplica cocaína que vai do Brasil para Europa
Prefeitura também dispensa licitações

FOLHA DE S. PAULO

Maioria dos senadores é contra sigilo de papéis
Sobe na Europa apreensão de cocaína que saiu do Brasil
STF e união gay viram alvo de evangélicos durante marcha
Cai a procura por cursos de direito e administração

O ESTADO DE S. PAULO

Governo prepara a concessão de 45 portos
Salário na Assembleia de SP supera teto do funcionalismo
Sites sofrem novos ataques de hackers
País se consolida como rota da cocaína

VALOR ECONÔMICO

Preço de exportação em alta limita déficit externo
China e Rússia enfrentam o Brasil no G-20
EcoRodovias quer operar em Santos e Viracopos
Pecuaristas buscam apoio dos sem-terra por Carajás
Brasil não está fadado a uma "escolha de Sofia"
Luciano Coutinho, do BNDES, prevê dois anos difíceis para o Brasil

ESTADO DE MINAS

Novos ataques de hackers a sites oficiais
Governo deve abrir 7 mil vagas em concursos

CORREIO BRAZILIENSE

Hackers fazem novo ataque e vazam dados
Marina quer partido
Caminho da cocaína

ZERO HORA (RS)

Procergs monitora ataque a sites no RS
UFRGS apura racismo em sala de aula

JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Indústrias puxam aumento das importações no Estado
Sites do governo sofrem ataque internacional

Governo desrespeita acordo e amplia gasto com terceirizados

Levantamento aponta contratações irregulares em 52 órgãos federais

Em desobediência ao Termo de Conciliação Judicial firmado com o Ministério Público do Trabalho em 2007, o governo federal voltou a contratar secretárias e supervisores administrativos, entre outras funções, por intermédio de empresas de terceirização. Os gastos com a contratação de funcionários terceirizados, que haviam diminuído após a assinatura do acordo, voltaram a crescer. Nos primeiros cinco meses de 2011, as despesas somaram R$ 1,33 bilhão, 21% a mais que R$ 1,1 bilhão do mesmo período de 2010. Levantamento do GLOBO revelou que há funcionários terceirizados em pelo menos 52 órgãos federais, vinculados a 23 ministérios e à Presidência da República. Até a Controladoria-Geral da União, que deveria fiscalizar os demais órgãos, está em situação irregular. "Muitas vezes, parece que está se tentando buscar brechas para terceirizar o que não é terceirizável", criticou Daniela Marques, procuradora do Trabalho.

Aumenta a farra dos terceirizados

Governo descumpre acordo com MP e eleva gastos com contratações irregulares em 52 órgãos

Regina Alvarez

Acontratação de pessoal terceirizado para áreas administrativas, em funções consideradas irregulares pelo Ministério Público do Trabalho, como secretariado e secretariado-executivo, é generalizada nos órgãos do governo federal. Levantamento feito pelo GLOBO nas notas de empenho de empresas que fornecem esses serviços mostra que em pelo menos 52 órgãos, vinculados a 23 ministérios ou à própria Presidência da República, existem funcionários contratados nessas condições.

Usada em larga escala no governo Lula, a contratação de mão de obra terceirizada foi mantida e até turbinada na atual gestão, de acordo com o que indicam os números da execução orçamentária. De janeiro a maio, as despesas com terceirização somaram R$1,33 bilhão, 21% acima do que foi gasto no mesmo período de 2010: R$1,1 bilhão.

O aumento dessas despesas contraria o discurso que é a marca do atual governo, de fazer mais com menos. Os valores consideram os gastos com dois itens da despesa orçamentária: "locação de mão de obra" e "despesas com pessoal decorrente de contratos terceirizados".

Irregularidade até na Controladoria

Essas contratações foram feitas, inclusive, por órgãos ligados à Presidência da República. A própria Controladoria-Geral da União (CGU), que fiscaliza os demais órgãos do governo, mantém terceirizados em funções que, segundo o Ministério Público do Trabalho, teriam que ser exercidas por funcionários concursados.

Um empenho orçamentário da empresa PH Serviços e Administração mostra que a CGU contratou auxiliares administrativos, secretárias e supervisores para a área administrativa. Segundo o Portal da Transparência, os gastos da CGU com serviços terceirizados foram de R$1,5 milhão até março.

Outros órgãos ligados à Presidência, como o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e o Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (ITI), também mantêm terceirizados em situação irregular. O Ipea contratou auxiliares de escritório e assistentes administrativos, enquanto o ITI recorreu a "auxiliares administrativos II".

O decreto presidencial 2.271, de 1997, que regulamentou a contratação de serviços na administração direta federal, autarquias e fundações, permite o uso de terceirizados para serviços de limpeza e conservação, copeiragem, segurança, vigilância, recepção, transportes, informática e outras atividades consideradas acessórias. Mas veda a terceirização em funções previstas nos planos de carreiras dos órgãos, à luz do que determina a Constituição - que prevê o ingresso no serviço público por meio de concurso.

Termo de Conciliação foi desrespeitado

Em 2007, o Ministério Público do Trabalho firmou um Termo de Conciliação Judicial com o Executivo para a substituição de terceirizados irregulares até dezembro de 2010, com base no decreto 2.271, e o governo promoveu a substituição da maior parte dos terceirizados enquadrados no termo.

Mas o levantamento mostra que outras contratações foram feitas à revelia do acordo, com base em uma interpretação elástica do decreto 2.271. O governo está usando as empresas prestadoras de serviços para contratar secretárias, digitadores e pessoal para serviços de apoio administrativo em geral, funções não previstas no decreto e que não podem ser terceirizadas, na visão do Ministério Público do Trabalho.

O Ministério da Fazenda, por exemplo, terceirizou a contratação de secretárias sêniores, secretárias-executivas e de nível médio, que trabalham em vários órgãos: na sede, na Receita Federal e na Superintendência de Seguros Privados (Susep), entre outros, segundo as notas de empenho das empresas prestadoras de serviço.

O Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi) contratou terceirizados para o exame de pedidos de registro de marcas, função diretamente ligada à atividade fim do órgão.

Já o Ministério dos Transportes contratou terceirizados para funções de "apoio técnico e organização de acervos" na Rede Ferroviária Federal (RFFSA). Embora a empresa tenha sido desestatizada em 1999 e extinta em 2007, entre janeiro e março foi gasto R$1,5 milhão com serviços terceirizados para atender à inventariança.

Sobre essas contratações não há qualquer controle externo, já que as listas de funcionários terceirizados são guardadas a sete chaves pelas empresas prestadoras de serviço que fornecem mão de obra.

No relatório de contas de 2010, divulgado na semana passada, o Tribunal de Contas da União (TCU) alertou para o problema dos terceirizados irregulares e para o aumento dos gastos com terceirização no governo federal, com base em um balanço concluído em abril pelo Ministério do Planejamento onde constam 18 mil terceirizados irregulares na administração pública.

"O maior aumento está na Educação"

Mas diversos órgãos que usam serviços de terceirizados em funções administrativas consideradas irregulares ficaram de fora da lista. Pelo levantamento, estão nessa situação os três órgãos ligados à Presidência da República e os ministérios do Turismo, Cidades, Pesca e Agricultura, além de quatro agências reguladoras.

O Ministério do Planejamento afirma que o aumento das despesas com os terceirizados decorre da expansão de estruturas de atendimento ao cidadão:

"O maior aumento está na pasta da Educação, onde a multiplicação de novas universidades e novos campi, além da criação de grande número de novas escolas técnicas, implicam em locação de mão de obra para vigilância, limpeza e conservação, apoio administrativo, serviços de copa e cozinha, etc."

De acordo com cálculos do Planejamento, essas despesas cresceram 13,7% e não 21% até maio, como informa o Siafi.

FONTE: O GLOBO

Governo planeja concessão de 45 portos

Empresa vencedora vai construir, administrar e operar o empreendimento; Manaus será o primeiro

Renata Veríssimo e Célia Froufe

Iniciado o processo de privatização dos aeroportos, o governo prepara, agora, as diretrizes para transferir ao setor privado a construção de novos portos marítimos no Brasil.

Com base na infraestrutura local e na demanda projetada de carga, a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) já identificou 45 áreas consideradas prioritárias para o recebimento de investimentos privados. O processo começará com a licitação de um novo terminal em Manaus, onde a situação portuária é considerada crítica.

O novo modelo tem uma filosofia de gestão diferente da que vigora atualmente nos portos brasileiros. Embora toda a operação dos terminais já tenha sido privatizada na década de 1990, os chamados portos públicos ou organizados são administrados por uma autoridade portuária pública, como as companhias Docas. "Quem vencer vai administrar e operar tudo dentro do porto, com a supervisão da Antaq", explicou ao Estado o diretor da agência, Tiago Lima.

A Antaq, segundo ele, gostaria de ter lançado o edital de licitação para o porto de Manaus em maio, mas ainda aguarda as diretrizes de outorga que estão sendo fechadas pela Secretaria Especial de Portos (SEP). As 45 áreas a serem licitadas nos próximos anos estão em 12 Estados, 7 deles nas Regiões Norte e Nordeste. As demais estão nas Regiões Sul e Sudeste.

Lima disse que foi identificada uma "demanda relevante de produtos" nessas áreas. "Teve uma primeira leva na década de 1990. Daí para frente não teve uma segunda geração. Essa pode ser a linha da segunda geração", disse o secretário de Acompanhamento Econômico (Seae) do Ministério da Fazenda, Antônio Henrique Silveira, que participa de um grupo sobre a modelagem das concessões. "A novidade agora é passar a conceder portos organizados para a iniciativa privada. Manaus é o primeiro."

Espera. A liberação das outorgas vem sendo discutida desde 2009. A demora da Secretaria de Portos na definição do Plano Diretor, que permitirá dar início ao processo, está sendo criticada pelo setor privado e investidores e já começa a incomodar o Palácio do Planalto. Está sendo cogitada a possibilidade de a presidente Dilma Rousseff estabelecer as diretrizes por decreto.

De acordo com os dados da Antaq, portos e terminais brasileiros movimentaram 200,6 milhões de toneladas no primeiro trimestre de 2011, alta de 7,7% em relação ao mesmo período do ano passado. Dois terços da carga são movimentados por terminais de uso privativo, nos quais, por meio de autorização do governo, as empresas movimentam basicamente carga própria. Pelos terminais privativos passam as cargas de maior densidade, como minério de ferro, combustíveis, óleos minerais e outros derivados de petróleo.

Apesar das críticas pesadas do PT contra as privatizações no governo Fernando Henrique Cardoso, Silveira não vê uma mudança de postura no governo Dilma. "Eu não acho que seja necessariamente uma mudança de filosofia. O governo Lula teve várias experiências na área de infraestrutura", disse o secretário, destacando as concessões em rodovias e ferrovias.

FONTE O ESTADO DE S. PAULO

Oposição exige explicação sobre viagens de Cabral

Paola de Moura

Rio - A tragédia do dia 17, em que, após a queda de um helicóptero na Bahia morreram sete pessoas, entre elas a mulher e o filho do empresário Fernando Cavendish, dono da construtora Delta, e a namorada do filho do governador do Rio, Mariana Noleto, promete abalar o conforto que o governador Sérgio Cabral tem na Assembleia Legislativa (Alerj). Deputados de oposição já estão na Justiça para obrigar o presidente da Casa a publicar um requerimento pedindo esclarecimentos sobre viagens não comunicadas de Cabral.

Eles também prometem ir à Agência Nacional de Aviação (Anac), se necessário, fazer um levantamento das viagens. Isto porque Cabral foi a Trancoso naquele dia, para participar da festa de aniversário de Cavendish num jatinho particular de outro empresário, Eike Batista. Além disso, o vice-governador, Luiz Fernando Pezão, estava na Itália. E o presidente da Alerj, Paulo Mello (PMDB-RJ), não foi convocado para assumir o cargo.

Só para se ter uma ideia da blindagem de Cabral na Casa, na eleição de Mello à presidência no início do ano, 66 dos 70 deputados votaram a favor do candidato. A base de Cabral conta com 23 partidos. Estão na oposição, o PSDB, o PR e o PSOL. "O governador conta com este apoio. Mas agora temos a opinião pública cobrando", diz o deputado estadual Luiz Paulo Corrêa da Rocha (PSDB).

Em 26 de abril, a deputada Clarissa Garotinho (PR-RJ) solicitou à mesa diretora que publicasse no diário oficial um requerimento no qual pede que a Casa Civil informe todas as viagens oficiais e extraoficiais realizadas pelo governador entre janeiro de 2007 e abril de 2011, os locais e as datas, o custo, o meio de transporte utilizado e quem o acompanhou. "Sempre ouvimos boatos sobre as viagens do governador", diz Clarissa. "Até hoje, o presidente da Alerj não publicou. Ele tinha cinco dias úteis. Reclamei três vezes. Em cada uma, ouvi desculpas diferentes".

No dia 17, antes mesmo do acidente ocorrer, como faz questão de destacar, a deputada entrou na Justiça com um mandado de segurança para obrigar Mello a publicar o pedido. Clarissa também o acusa de não ter publicado o projeto de emenda constitucional aprovado há duas semanas que dá anistia aos bombeiros. "O prazo venceu dia 16 de junho". Procurado pelo Valor, Mello não retornou as ligações.

O deputado Marcelo Freixo (PSOL) que, com os parlamentares Luiz Paulo Corrêa da Rocha, Flávio Bolsonaro (PP), Janira Rocha (PR), Paulo Ramos (PDT) e Wagner Montes (PDT), enviou outro requerimento à Casa pedindo informações sobre os contratos do governo com a Delta e as empresas do grupo EBX, conta que, se necessário, vai pedir à Anac os registros de viagens de Cabral. "As suspeitas das ausências foram lamentavelmente confirmadas através de uma tragédia. Mas isto é uma questão pública. O governador viajava no avião de Eike Batista", argumenta o deputado.

Freixo destaca que as empresas do grupo EBX, de Eike Batista, receberam do Estado cerca de R$ 75 milhões em isenção de ICMS. "Além disso, o próprio empresário doou à campanha de Cabral R$ 750 mil". Em nota divulgada na terça-feira, o empresário confirmou que emprestou seu jato Legacy ao governador e afirmou que tinha orgulho de fazê-lo já que "Sérgio Cabral vem realizando seu trabalho com grande competência e determinação".

A oposição também quer explicações do relacionamento de Cabral com o dono da Delta. A construtora é a principal empreiteira a realizar obras no Estado, como a reforma do Maracanã, que começou orçada em R$ 400 milhões e agora está prevista em R$ 956 milhões. Em 2007, primeiro ano do governo Cabral, a Delta recebeu do Estado R$ 57,8 milhões em obras com licitação. Em 2010, foram R$ 426,178 milhões, um crescimento de 637%. "Também há um crescimento escandaloso das obras emergenciais, sem licitação", acusa Clarissa. Em 2007, foram R$ 10,2 milhões. No ano passado, R$ 127,3 milhões, 1.148% a mais. Em reportagem publicada ontem, o jornal "O Globo" mostrou que a Delta vem recebendo do Estado por projetos que não foram executados, apresentam falhas ou ainda não saíram do papel.

FONTE VALOR ECONÔMICO

Prefeitura também dispensa licitações

Contratos emergenciais com a Delta na gestão de Paes cresceram 155%

A Delta Construções - suspeita de ser beneficiada pelo governo do estado - também tem obtido muita dispensa de licitações na prefeitura do Rio. No governo Paes, já chega a R$ 36,6 milhões o valor dos contratos sem licitação, enquanto na gestão de César Maia (entre 2002 e 2008) ficou em R$ 14,3 milhões - um aumento de 155%.

Emergência também na prefeitura

Contratos sem licitação do município com a Delta mais do que dobraram na atual gestão

Ruben Berta

Com quase um quarto de seus empenhos no governo estadual obtido com dispensa de licitação este ano, a Delta Construções também vem tendo um desempenho de destaque nessa modalidade na prefeitura do Rio. Dados levantados pelo gabinete da vereadora Andrea Gouvêa Vieira (PSDB) mostram que entre os anos de 2002 e 2008, na gestão de Cesar Maia, a construtora conseguiu R$14,3 milhões em contratos emergenciais. Já no período Eduardo Paes (janeiro de 2009 a junho de 2011), segundo levantamento da própria prefeitura, foram R$36,6 milhões, mais do que o dobro. O crescimento foi de 155%. O valor corresponde a 11,4% do total da Delta na atual gestão (R$320 milhões).

No ranking das obras sem licitação da gestão de Eduardo Paes, enviado ao GLOBO pela prefeitura, a Delta aparece em terceiro lugar. A primeira posição é ocupada pela empreiteira OAS, com R$70,5 milhões. Em segundo lugar está o grupo Zadar, com R$44,8 milhões. Em quarto, vem a Carioca Engenharia, com R$34,5 milhões. Em seguida, aparece a Lo Graça, com R$22,7 milhões. Somada, a lista das dez primeiras construtoras com mais contratos emergenciais - que tem ainda Dimensional, York, Metalúrgica Valença, DAS e Queiroz Galvão - chega a R$276 milhões. O total de obras sem licitação de janeiro de 2009 até hoje, de acordo com a prefeitura, foi de R$417 milhões. Ou seja, a Delta teve cerca de 8%.

No valor total de obras contratadas, o desempenho da Delta também é crescente. Números enviados pela assessoria de imprensa de Paes mostram que, de 2001 a 2008, na era Cesar Maia, a empresa acumulou contratos de R$530 milhões. Ou seja, a média mensal foi de R$5,5 milhões. Se levada em conta a inflação do período, o valor subiria para R$673 milhões, ou R$7 milhões/mês, ainda segundo os cálculos da prefeitura. Na gestão de Paes, de 2009 até hoje, sem levar em conta a inflação do período, foram R$320 milhões acumulados, uma média de R$10,6 milhões por mês.

Fortes chuvas como justificativa

A assessoria de Paes justifica o crescimento da Delta através da própria quantidade de obras que o município vem realizando. Segundo a prefeitura, há contratos em execução na atual gestão de R$9,5 bilhões. Nesse universo, a Delta fica com 3,4% do total. Não foi informada a posição da empresa no ranking do total de obras.

Em relação às obras sem licitação, a prefeitura alega que a dispensa foi necessária, no ano passado, por causa das fortes chuvas no Rio. Somente para esse fim, foram aplicados mais de R$300 milhões. Outro ponto questionado é que o levantamento das contas de Cesar, feito pela vereadora, não contou a inflação acumulada.

Uma série de ações de prevenção de enchentes na Praça Seca foi a obra na qual a prefeitura mais gastou com a Delta, sem realizar concorrência: R$28 milhões. Outro exemplo é a contenção de encostas nos morros dos Prazeres e Fogueteiro, em Santa Teresa: R$5,4 milhões. Ontem, quando repórteres do GLOBO estiveram no local das obras, encontraram cartazes colocados pelos moradores no muro de contenção cobrando mais atenção das autoridades para as favelas.

Apesar de Paes ter enfrentado a forte enchente do ano passado, a gestão de Cesar também contou com momentos críticos, como em janeiro de 2006, quando um temporal deixou 11 mortos e alagou dezenas de ruas.

A Delta enviou nota em que diz que "não há como comparar oito anos de uma gestão com dois anos e meio de outra, em períodos diferentes da economia". A empresa afirmou "que sua atividade sempre foi pautada pela legalidade e as obras realizadas pela empresa foram executadas com qualidade técnica e dentro do prazo".

A Câmara já está se movimentando para apurar a participação da Delta na prefeitura. Líder do PSDB, Teresa Bergher vai solicitar ao Tribunal de Contas que faça inspeções em todos os contratos com a empresa.

FONTE: O GLOBO

Gráfica contratada por campanha de Cabral é alvo da PF

Polícia investiga se Soroimpress, que em 2010 forneceu material para 83 candidatos, é empresa de fachada

Segundo assessoria do governador, não é feita checagem de endereço de fornecedor; empresa não foi localizada

Italo Nogueira e Jean-Philip Struck

RIO/SÃO PAULO - A Polícia Federal investiga um dos fornecedores de adesivos para a campanha de reeleição do governador Sérgio Cabral (PMDB). A Soroimpress Comércio de Produtos Gráficos, com características de empresa de fachada, recebeu R$ 33 mil na eleição do peemedebista.

O inquérito tem como investigados apenas Cabral e a empresa -a relação entre ambos foi revelada pela Folha em outubro do ano passado. Mas a Soroimpress forneceu material de campanha para 83 candidatos e dois partidos. Recebeu, no total, R$ 5 milhões.

O Comitê Financeiro Único do PMDB-RJ, principal doador da campanha de Cabral, pagou R$ 523 mil à empresa. O principal cliente da Soroimpress foi o senador Lindberg Farias (PT), que pagou R$ 640 mil. Ele não é investigado no inquérito.

No endereço declarado como sede da empresa havia um prédio em construção.

As sócias que constavam no contrato social eram duas senhoras de 84 anos. Uma não foi localizada no endereço indicado à Junta Comercial. A outra pouco sai de casa, segundo funcionários do prédio onde ela vive.

Em março, a PF pediu esclarecimentos a Cabral, mas ainda não recebeu resposta.

A assessoria do governador manteve a resposta dada durante a campanha, quando afirmou que não faz "checagem de endereços" dos fornecedores de campanha.

Disse que divulgou o interesse na compra de adesivos "no mercado" e recebeu a oferta da empresa. Alegou ainda que a Soroimpress estava ativa na Receita Federal à época da contratação.

A assessoria disse que o governador ainda não respondeu à PF porque ainda não foi "intimado pessoalmente a se manifestar".

Lindberg Farias afirmou, após a eleição, ter escolhido a empresa porque ela não apresentava pendências na Receita e ofereceu garantias de preço e prazo de entrega. A Folha não localizou representantes da empresa.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO


Disputa tecnológica:: Merval Pereira

Uma disputa interna na base aliada do governo, que volta e meia tem consequências externas, é a do PSB com o PT por espaços políticos. Ter perdido para o PT o Ministério da Ciência e Tecnologia, que era seu feudo partidário desde o início do governo Lula em 2003, é uma ferida que não está cicatrizada, e tem reflexos políticos.

A polêmica em que se viu envolvido o vice-presidente do PSB, Roberto Amaral, ex-ministro da Ciência e Tecnologia que recebeu R$280 mil reais como "indenização por demissão sem justa causa" mesmo tendo pedido para deixar o cargo de diretor-geral da Alcântara Cyclone Space-ACS, uma empresa binacional Brasil-Ucrânia para lançamentos de foguetes, tem a ver com uma polêmica maior envolvendo o programa espacial brasileiro, que ele havia criticado dias antes da denúncia em uma comissão da Câmara em Brasília.

A principal crítica que fez, a de que o programa espacial não está sendo tratado como questão estratégica, nem como política de Estado, já estava explícita em um documento que preparou ao deixar o cargo, intitulado "Programa espacial brasileiro: impasses e alternativas".

Roberto Amaral foi o primeiro ministro da Ciência e Tecnologia da fase pessebista, que teve depois o próprio presidente do partido, o hoje governador de Pernambuco Eduardo Campos, e Sérgio Rezende, um técnico ligado a ele, que já fora secretário do seu avô, Miguel Arraes.

Nacionalista convicto da velha guarda, Amaral ficou conhecido pela declaração polêmica de que o Brasil deveria pesquisar todo o ciclo atômico para dominar a técnica da bomba atômica.

Suas críticas à falta de prioridade que o governo vem dando ao programa espacial parecem refletir o pensamento de parte da oficialidade envolvida nesses projetos, cujos representantes também fizeram críticas à atuação do petista Aloizio Mercadante no Ministério da Ciência e Tecnologia.

A chegada de Mercadante para ocupar o ministério quebrou a tradição do PSB, e criou antagonismos.

No documento que deixou como sua contribuição ao novo governo de Dilma Rousseff, o ex-ministro defende que "qualquer política de ciência e tecnologia deve compreender o desenvolvimento da atividade espacial como plataforma indispensável para que o país (...) desempenhe sua projeção na comunidade internacional".

Amaral diz que o Brasil "é uma teimosa exceção" num mundo em que "todas as grandes potências e aquelas que têm justificadas expectativas de se tornar potência nos próximos 50 anos", dispõem de programa espacial avançado.

Ele adverte que o Brasil apresenta problemas que dificultam a incorporação de novas tecnologias, sendo o mais grave "a fragilidade do nosso sistema de administração do programa espacial (...) distribuído em vários órgãos, sem coordenação, agindo de forma dispersa, com ações e projetos superpostos e, em muitos casos, até, conflitantes".

Para ele, a questão crucial é "a inexistência de uma Agência Central, coordenadora e reguladora, como por exemplo a NASA, nos EUA, ou o CNES na França, ou o ISRO da Índia".

Roberto Amaral elogia o fato de a Estratégia Nacional de Defesa elevar o programa espacial à categoria de política estratégica, mas lamenta que a criação de uma secretaria diretamente subordinada à Presidência, coordenando os programas cibernético, nuclear e espacial, não tenha sido concretizada.

Mas, ressalta Amaral em seu documento, "independentemente do organograma que integre o PEB não pode ficar à mercê do voluntarismo burocrático, tocado por políticas erráticas, dependentes de recursos escassos e intermitentes, ausente de um planejamento governamental de longo prazo".

Investir na área espacial é desafio que tem de ser assumido pelo Estado, defende o ex-ministro da Ciência e Tecnologia. "Sem essa decisão fortemente instituída, os esforços ficarão desconexos; os resultados, desalinhados; a eficiência, altamente comprometida".

Não é acaso, diz ele, que os projetos estratégicos nacionais como as políticas espacial, nuclear e a cibernética padeçam solução de continuidade, "enquanto somos superados tecnologicamente por parceiros como os indianos, os chineses e os sul-coreanos. E pelos iranianos e os coreanos do Norte".

Ele sugere no documento que seja criado um grupo de trabalho interministerial com a incumbência de propor a execução de um planejamento estratégico de Estado.

"Com credibilidade interna e externa, os recursos poderão ser mobilizados: os governos poderão tomar as medidas em sua esfera de competência; a indústria poderá investir; os jovens buscarão as carreiras de C,T&I, porque nela enxergarão a possibilidade de realizar sonhos sem abdicar do atendimento às necessidades básicas da vida".

O fato objetivo, diz Roberto Amaral em seu texto, é que na segunda década do século XXI não dispomos de satélites completamente brasileiros (à exceção dos pioneiros SCD-1 e 2), nem de veículos lançadores.

Nossos satélites são construídos em cooperação com a China, lançados de Centro Espacial chinês, com foguete chinês, o Longa-marcha. "A questão não se reduz ao uso unicamente comercial de nossos lançadores, nem à produção de satélites meteorológicos ou de sensoriamento, mas, sim, que já somos objeto da espionagem via-satélite, e, neste contexto, depender de satélites de terceiros é renunciar à garantia de seus serviços".

Se não tivermos capacidade de lançar, de solo brasileiro, com foguete brasileiro, nossos satélites, sejam eles quais forem, não teremos condições de garantir a soberania de nosso país, adverte.

FONTE: O GLOBO

Antes da queda:: Dora Kramer

No fim do ano passado, o então presidente Luiz Inácio da Silva vetou o novo sistema de distribuição de royalties do petróleo aprovado pelo Congresso, que tira receita dos Estados produtores e redistribui o dinheiro, descontada a parte da União, para todos os Estados do País.

O veto está na gaveta do presidente do Senado, José Sarney, aguardando um acordo que impeça uma votação que hoje seria derrota certa para o Palácio do Planalto, pois a posição da maioria é pela derrubada que teria como consequência, já anunciada pelo governo federal, a transferência da decisão para o Supremo Tribunal Federal.

A expectativa é que a situação seja definida antes do próximo dia 13, quando o Congresso entra em recesso. Para evitar o exame e a consequente derrubada do veto, os governadores Eduardo Campos, de Pernambuco, e Marcelo Déda, de Sergipe, vão buscar um acordo com os governadores dos Estados produtores (Rio de Janeiro, Espírito Santo e São Paulo) em reunião na quinta-feira que vem em Brasília.

A eliminação do veto recuperaria o texto original da chamada emenda Ibsen que representa pesadas perdas aos estados produtores, notadamente o Rio.

Em tese, os outros Estados teriam tudo para apoiar a derrubada: imporiam uma derrota aos governadores Sérgio Cabral, Renato Casagrande e Geraldo Alckmin e teriam a garantia da participação na distribuição dos royalties segundo as regras do Fundo de Participação dos Municípios.

O problema é que isso significa, de um lado, um revés político para a presidente Dilma Rousseff e, de outro, leva o tema à incerteza de uma decisão do Judiciário.

Ou seja, a vitória numérica de hoje pode não ser a vitória judicial de amanhã e acabar resultando numa "bomba política", na expressão de um governador do Nordeste, para todos.

A ideia é produzir uma solução intermediária: convencer os governadores dos Estados produtores a apoiarem uma proposta em que percam menos, mas percam alguma coisa em relação à situação atual, deixando uma parcela dos royalties para ser rateada entre todos os outros estados e municípios.

Com isso, Sarney não poria o veto em votação, o governo não se exporia ao malogro diante da própria base parlamentar, o assunto não iria ao Supremo e tudo se resolveria na base do entendimento em torno de um projeto de lei já em tramitação na Câmara.

Resta saber se quem hoje tem a vantagem, os Estados produtores e a maioria favorável ao veto, aceita trocar um ganho certo agora pela ainda duvidosa hipótese de uma perda adiante.

Depois do vendaval. Primeiro foi a Caixa Econômica Federal que apontou Antonio Palocci como responsável pela quebra do sigilo do caseiro Francenildo Costa, depois de o STF recusar denúncia contra o ex-ministro por falta de provas.

Agora é o ex-diretor do Banco do Brasil e atual funcionário do governo petista de Brasília, Expedito Veloso, quem aponta o ministro Aloizio Mercadante como mentor do dossiê engendrado para prejudicar a candidatura do tucano José Serra ao governo de São Paulo em 2006.

Isso depois de o STF ter arquivado ação contra Mercadante por falta de inícios que indicassem a participação do então senador candidato do PT ao governo paulista.

Se o propósito era lícito - o esclarecimento dos fatos - as acusações deveriam ter sido apresentadas quando poderiam gerar consequências.

Feitas depois de assegurada a impunidade, sugerem a mera intenção de criar constrangimento político, considerando a dificuldade de os casos serem reabertos e a possibilidade de os acusados alegarem que foram absolvidos pela instância máxima da Justiça.

A isso é que se dá o nome de politização (no mau sentido) de escândalos sem solução.

Desacato. Virou moda: toda hora aparece uma figura de destaque se recusando a fazer o teste do bafômetro. Total falta de responsabilidade social. No lugar de contribuir para a consolidação da Lei Seca, são os primeiros a tentar desmoralizá-la.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Saindo das cordas :: Eliane Cantanhêde

Parece sina: Dilma vive enroscada com a antipática palavra "sigilo". Primeiro, o sigilo dos negócios do homem forte de seu governo, depois o sigilo eterno dos documentos oficiais, enfim o sigilo nos contratos de obras para a Copa e para a Olimpíada.

Presidentes, porém, têm caneta, recursos e "Diário Oficial". E Dilma aprendeu com o padrinho que é melhor isolar as crises políticas como assunto de minorias e ir tocando o barco, ou melhor, os governos.

Por isso, Dilma foca as faixas de baixa renda, que nem sabem quem é esse tal de Palocci, e as classes médias, que, se ouviram falar em Palocci, Código Florestal e sigilos, não deram tanta bola assim. O importante é o que bate no bolso.

No setor de telecomunicações, Dilma vai anunciar na próxima semana telefone fixo a R$ 9,50 (sem o ICMS) para a baixa, baixa, baixa renda, telefones individuais e orelhões para a área rural e banda larga a R$ 35. Só coisa boa.

No de atendimento médico, a ANS (Agência Nacional de Saúde) deu um chega pra lá nos planos de saúde, definindo prazos para consultas, que eram a perder de vista.

No de educação, a presidente anunciou 75 mil bolsas de estudo para alunos de graduação e de pós-graduação e entregou, toda sorridente, medalhas para campeões da olimpíada de matemática.

No de moradias, a União doou 200 mil m2 em terrenos para projetos de interesse público em Minas Gerais e no Paraná, a maior parte para casas populares.

Então, que Palocci que nada! Crise com a base aliada, o que é isso? Documentos sigilosos, eu, hein?!

É assim que Dilma vai deixando o episódio Palocci para trás, contando com Lula para controlar o PT, jogando as negociações políticas para Ideli Salvatti e se reservando para dar boas notícias a quem interessa de fato - e dá retorno.

Agora, é torcer para não haver outros casos Palocci voando por aí. Senão começa tudo de novo.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Pior que está, sempre fica:: Cláudio Gonçalves Couto

Como já pude observar noutra ocasião neste mesmo espaço, a ideia de uma reforma política, qualquer que seja, parece ter-se tornado uma preocupação nela mesma, desvinculada de modificações bem determinadas, que pudessem efetivamente aprimorar o nosso sistema político. A percepção amplamente difundida de que nossa política vai muito mal teve o condão de estimular um clamor indefinido pela mudança, proveniente de setores da mídia, da academia, do empresariado e, por fim, de segmentos da própria classe política profissional.

O risco que uma tal situação enseja é o de emergirem propostas que, em vez de aprimorar o sistema político, acabem por piorá-lo, seja mediante a introdução de inovações de validade duvidosa, seja ao deitar por terra avanços institucionais que tivemos nos últimos anos e que sequer foram plenamente experimentados. Ainda pior, algumas das propostas reformistas surgem para resolver questões atinentes a conveniências de certas lideranças, embora sejam apresentadas ao debate público como moralizantes medidas saneadoras. É este, claramente, o caso da tentativa de acabar com a reeleição. Embora se proclame o abusivo "uso da máquina", não se apresenta um único dado que permita comprovar que tal uso aumentou depois da emenda da reeleição. Será mesmo que chefes do Executivo no exercício do mandato precisam abusar mais de seus cargos para se reelegerem (quando se beneficiam da inércia) do que quando pretendem transferir seu prestígio a um afilhado político, muitas vezes menos conhecido do eleitorado? O que pudemos assistir nas últimas eleições sugere o contrário.

Uma reforma política pode piorar o que já é ruim

As propostas desastrosas de reforma política oriundas do Senado, contudo, parecem não ter fim. Inicialmente, além do fim do pouco testado instituto da reeleição, propôs-se também mudar o tempo de mandato, esticando o do presidente para cinco anos e, ao mesmo tempo, mantendo em quatro anos a duração das legislaturas. Com isto, descasar-se-iam as eleições legislativas e executivas, tornando mais difícil e custosa a construção das coalizões indispensáveis à governabilidade, as quais perderiam o impulso dado pelo alinhamento eleitoral e requereriam um processo de barganha de cargos ainda mais tumultuado do que este a que hoje assistimos.

Agora, a nova insensatez institucional oriunda de nossa Câmara Alta foi a proposta de unificar todas as eleições num único ano: de vereador a presidente da República. Se vigar na versão mais unificada, nossos eleitores terão de fazer até oito escolhas eleitorais distintas de uma única vez (vereador, prefeito, deputado estadual, governador, dois senadores, deputado federal, presidente da República). Já no caso de viabilizar-se a proposta mais moderada, teríamos as eleições municipais num semestre e as estaduais e nacionais no outro: ou seja, passaríamos um ano inteiro, de janeiro a dezembro, em campanha eleitoral. Haja fôlego!

O nosso atual calendário eleitoral, ao qual se chegou depois de um longo e gradual processo de amadurecimento institucional, é bem melhor e mais equilibrado do que essa bizarra proposta senatorial. Ele permite a circulação de nossas elites políticas entre os níveis local, estadual e federal, com a intercalação dos pleitos; propicia a intensificação do debate político a cada dois anos, com uma saudável pausa entre cada processo; separa a discussão dos assuntos de natureza nacional e local e reduz a complexidade do voto a que deve ser submetido o eleitor, pois diminui o número de escolhas que ele deve realizar.

Se fosse para aprimorar de fato esse sistema, faria mais sentido desdobrar as eleições nacionais (para a Presidência e o Congresso) das disputas estaduais e municipais (para governador, prefeito, Assembleias e Câmaras Municipais), mas isto sem abrir mão da bianualidade hoje existente. Ademais, tal calendário permite incluir na pauta eleitoral eventuais consultas populares (plebiscitos e referendos) sem a necessidade de organizar toda a parafernália eleitoral apenas para isto. A bianualidade também beneficiaria a positiva mudança proposta de alteração do atual modelo de suplência dos senadores, adotando-se eleições complementares para substituir os senadores que não terminam seus mandatos.

É preciso elevar o nível do debate sobre a reforma política, migrando do clamor desfocado por uma mudança qualquer para a elaboração de diagnósticos mais precisos acerca dos reais problemas de nosso sistema, de modo a tanto propor mudanças que efetivamente sejam necessárias, como evitar alterações que criariam o risco de tornar tudo pior do que já é. Em audiência pública de que participei na Comissão de Reforma Política da Câmara dos Deputados, ficou absolutamente claro que o ponto que mais aflige os parlamentares qualificados de nossa Câmara Baixa é o elevadíssimo custo das campanhas eleitorais, o qual expulsa da disputa aqueles que não se dispõem a fazer qualquer negócio para se financiarem e, inversamente, atrai para seu seio os muito endinheirados - ou, ao menos, os muito dispostos a obter o dinheiro do jeito que der.

O problema do custo das campanhas é real e fonte de boa parte das demais mazelas que afetam o funcionamento de nosso sistema político. Seria útil desviar os termos do debate da "reforma política" pensada genérica, indefinida e abstratamente, para a questão do financiamento de campanha e de todas as mudanças que, de alguma maneira, puderem afetá-lo, como o sistema de lista fechada, ou mesmo o voto distrital (mas não o "distritão", outra proposta esdrúxula, que apenas pioraria as coisas). Ou seja, sem uma discussão focada sobre problemas específicos corremos o risco de logo, logo, clamarmos por uma nova reforma política, que desfaça os estragos que a reforma anterior promoveu.

Cláudio Gonçalves Couto é cientista político, professor da FGV-SP.

Segredo é para quatro paredes :: Fernando Gabeira

Em duas formas diferentes e diferentes relações com o tempo, o sigilo entrou na agenda política brasileira. Na forma de segredo de Estado, ele aparece nas objeções de Sarney e Collor à divulgação de documentos depois de um prazo de 50 anos. É perfeitamente razoável que se oponham levantando questões de Estado. O surpreendente foi o recuo de Dilma Rousseff, uma vez que o projeto aprovado na Câmara sempre teve o apoio do governo. O outro sigilo classifico de mais indigesto: o dos gastos com as obras da Copa do Mundo. Com esse nem Sarney concorda.

Quando a maioria esmagadora das pessoas entende esse sigilo como sospechoso, torna-se inadequado dizer que foi mal interpretado. Como estamos no universo político, e não das ciências exatas, o razoável é afirmar que diante da interpretação majoritária o governo se explicou mal. São nuances.

Falando diretamente: não passará. Sobretudo num momento em que acaba de cair o chefe da Casa Civil e a Fifa e CBF são acusadas, na Suíça e na Inglaterra, de corrupção. Uma questão de tempo e bom senso para dizer: esqueçam, não está mais aqui quem propõe sigilo para os gastos nessa empreitada, com esses atores.

Já o projeto que estabelece o acesso aos documentos públicos é muito mais amplo do que eventuais vazamentos revelando que obtivemos terras da Bolívia, escalpelamos os paraguaios na guerra ou compramos o seu governo no projeto de Itaipu. A quebra desse sigilo é fundamental, reconheço, para os historiadores e a afirmação da maturidade democrática brasileira. O argumento que Dilma apresenta para justificar seu recuo, objeção do Itamaraty, é surpreendente. Nossos diplomatas não podem dizer, parodiando Drummond: os amigos não me disseram que havia uma comissão. E havia. O presidente era do PT, José Genoino; o relator, do PMDB, Mendes Ribeiro. Mais do que isso, o Itamaraty não poderia ignorar que o governo marchava nessa direção e que Dilma, já candidata, fez um discurso público a favor do projeto.

Quem faz pressão pública para que o governo volte atrás? Sarney e Collor. Um presidente que todos nós criticamos, outro que todos nós derrubamos. Mais fácil seria dizer a eles que a democracia brasileira vive um outro tempo, que suas observações são ponderáveis, mas seguiremos com nossos prazos para o sigilo. O problema é que o curto-circuito introduzido por Sarney-Collor obscurece a importância do projeto não só para a opinião pública, como também para o indivíduo.

A partir dele, o Estado terá de montar uma estrutura para atender às demandas de informação. Quando discutíamos o tema na Câmara, aprendemos que os EUA gastam US$ 300 milhões anuais para satisfazer às perguntas que chegam e honrar o compromisso de garantir acesso.

O primeiro obstáculo a ser vencido é do sigilo eterno. Mas, infelizmente, depois de vencido, a luta estará apenas começando. É mais fácil para o governo anunciar que aprovou a lei de acesso aos documentos públicos e afirmar que, nesse ponto, o Brasil se equipara a outras democracias.

Vai haver uma rápida celebração. Mas, e depois, quando as pessoas quiserem, realmente, utilizar o seu direito de saber? Estaremos preparados para isso?

Numa tentativa - desesperada, creio eu - de desqualificar o projeto, Sarney afirmou que o Brasil não se poderia expor ao WikiLeaks sobre sua História. Nada mais inadequado que essa comparação. O WikiLeaks obtém informações contra a vontade dos governos, sem se preocupar com a dimensão legal de sua obtenção. O projeto brasileiro prevê as formas legais de acesso, determina os prazos para a abertura dos arquivos. É, na verdade, um antídoto contra vazamentos, uma vez que oferece os documentos. Nos casos em que isso não for possível, a pessoa interessada ficará sabendo, claramente, quanto tempo falta para conhecer os dados.

Muitos não conhecem o poder da informação. Ou nem mesmo calculam como na sua vida, em determinado momento, pode ser essencial obter do governo um certo documento. Houvesse essa compreensão, certamente teríamos algumas marchas pelo acesso aos documentos oficiais.

A presidente Dilma tentou confortar a crítica ao seu recuo afirmando que os documentos sobre a ditadura militar não podem gozar de sigilo. Tudo bem, mas não devemos utilizar a ditadura como uma espécie de biombo. O que está em jogo não é apenas o conjunto de documentos sobre aquele período. É toda a vida do País, do fim até o começo.

Ditadura, Guerra do Paraguai, consolidação das fronteiras, tudo isso é muito interessante e vai dar excelente debate entre historiadores e acadêmicos. Mas a questão central é aqui e agora. São as demandas que os jornais fazem na Justiça para terem acesso a documentos que o governo esconde, são as dúvidas que um indivíduo, às vezes, tem para definir sua trajetória.

A história dos documentos secretos ligados às fronteiras nacionais ou mesmo às guerras do passado pode se transformar numa espécie de bode na sala.

No mesmo momento em se discute o sigilo com retórica de estadistas, a Câmara aprova o segredo nas contas da Copa do Mundo, o governo não diz quanto gastará para pôr o projeto de acesso em funcionamento, nem monta a estrutura necessária para que ele funcione no cotidiano.

Gravada também por João Gilberto, que faz 80 anos, uma canção popular brasileira diz que segredo é pra quatro paredes e o peixe é pro fundo da rede. Mas o segredo da canção é entre amantes que compartem a mesma casa. Não há segredos eternos nas questões públicas.

Por acaso, a ministra Ideli Salvatti deixou a Pesca e, ao assumir Casa Civil, comunicou o recuo de Dilma no caso do sigilo. Não sei se um dia ouviram a canção, mas, seguramente, estão em conflito com ela. O segredo para quatro paredes não é uma questão do governo. E o peixe no fundo da rede, bem, essa é mensagem mais inequívoca, mas parece que a ministra Ideli não a entendeu, a julgar pela sua passagem pelo Ministério da Pesca.

Jornalista

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Quem tem medo da História? :: Sílvio Tendler

"Infeliz é o povo que precisa de heróis." (Bertold Brecht)

Estamos assistindo, perplexos, à enorme conspiração contra a verdade, a História e a memória.

O Ministério da Defesa, o Ministério das Relações Exteriores, dois ex-presidentes da República, políticos de diferentes matizes, se unem para que o Brasil não conheça a sua verdade.

Já é difícil fazer filmes, livros e peças de teatro sobre personagens reais - mesmo os de vida pública -, sem autorização do próprio ou de familiares e herdeiros. Agora, a pá de cal chega com a intenção de trancafiar documentos para que a verdadeira História não se revele.

E quem orquestra essa trama contra o futuro do Brasil? Sim, porque povo sem memória é povo sem futuro, e estaremos sujeitos eternamente a sermos alimentados por contos da carochinha. Mas, afinal, o que querem esconder de nós? Quem bateu, torturou, mandou prender e arrebentar? Quem negou passaportes, quem expedia os tenebrosos atestados ideológicos, que impediam o acesso à escola ou ao emprego?

Querem nos impedir de saber a verdade sobre a Guerra do Paraguai, ao que parece, uma verdadeira carnificina praticada para atender a interesses de poderoso banqueiro inglês.

Resistirão almirantes, generais e marechais à lupa da História? Suas biografias corresponderão às narrativas descritas nas pinturas das grandes batalhas?

Os que nos negam conhecer a verdadeira História do país são cúmplices das carnificinas, dos torturadores, dos alcaguetes a soldo do Estado; dos que ordenaram censurar jornais, revistas, peças de teatro e músicas.

Não podemos nos calar e aceitar como fato consumado essa violência da censura que tentam nos impor. Construir um país livre representa lutar para conhecer a História. Não queremos cultivar falsos heróis e, a partir de hoje, personagens da História oficial estarão sob suspeita, enquanto não nos deixarem conhecer os documentos que abrigam verdades, que, mesmo dolorosas, devem ser reveladas.

Sílvio Tendler é cineasta.

FONTE: O GLOBO

O grande momento de FH :: Rogério Furquim Werneck

Exibindo invejável vitalidade física e intelectual, Fernando Henrique Cardoso chega aos 80 anos festejado Brasil afora, até mesmo por seus mais aguerridos adversários, pelo muito que fez pelo país. Acima das mesquinharias partidárias, seus méritos vêm sendo, afinal, amplamente reconhecidos. Já não se contesta a enorme importância que seus dois mandatos tiveram na consolidação da estabilização, na modernização da economia e na criação de condições propícias para um projeto mais ambicioso de crescimento e desenvolvimento social no país.

Nos oito anos em que ocupou o Palácio do Planalto, FH enfrentou longa sequência de grandes desafios. E não faltam bons exemplos de situações com que se defrontou entre 1995 e 2002, em que seus muitos talentos lhe foram de grande valia. Mas o melhor momento da admirável carreira política de FH se deu, na verdade, antes de ter sido eleito presidente. Foi como ministro da Fazenda do problemático governo Itamar Franco, em circunstâncias extremamente adversas, que FH mostrou a verdadeira extensão do variado leque de talentos que, com o sucesso do Plano Real, o conduziria à Presidência.

Defrontando-se com um quadro econômico delicado, com incertezas exacerbadas pelo impeachment de Collor, Itamar Franco deu-se ao luxo de nomear nada menos que quatro ministros da Fazenda diferentes nos seus sete primeiros meses de governo. Sua última escolha, em maio de 1993, recaiu sobre FH.

A taxa de inflação voltara a superar 30% ao mês e, mais uma vez, o Planalto se via pressionado a agir. Mas havia grande ceticismo sobre as reais possibilidades do governo Itamar Franco. Seu desempenho inicial havia sido deplorável. Faltavam-lhe apenas 19 meses de mandato e em menos de um ano o Congresso estaria totalmente mobilizado com as eleições de outubro de 1994. Parecia pouco provável que tivesse condições, tempo e espaço de manobra para conceber e implementar uma política econômica de mais fôlego.

A montagem de uma equipe econômica competente havia se tornado tarefa quase impossível. O tempo médio de permanência no cargo dos três primeiros ministros da Fazenda de Itamar Franco havia sido de 75 dias. Não é surpreendente que, nessas circunstâncias, tivesse ficado muito difícil encontrar nomes respeitáveis que se dispusessem a integrar a equipe econômica do governo. É notável, portanto, que, não obstante todo o desalento quanto às possibilidades do governo Itamar Franco, FH tenha conseguido quebrar esse círculo vicioso e montar uma equipe econômica de alto nível. Contribuíram para o êxito com que enfrentou esse primeiro desafio a estatura política do novo ministro, sua ascendência sobre o grupo de economistas que afinal compôs o núcleo de sua equipe econômica e a percepção de que FH teria melhores condições que seus antecessores de estabelecer uma relação mais estável com o Planalto.

O grupo levaria meses para desenvolver um plano completo e bem acabado. FH logo percebeu a importância de assegurar condições de trabalho adequadas, que facilitassem esse desenvolvimento. Evitou interferências indevidas nas discussões técnicas e aceitou que prevalecessem regras não hierárquicas, que conferissem mais legitimidade à depuração do livre fluxo de ideias no âmbito do grupo.

Mas, para conseguir que o Plano Real fosse lançado com sucesso, FH teria de mostrar seus talentos como negociador e sua capacidade de liderança e persuasão em várias outras esferas, bem além dos limites estreitos de sua relação com a equipe econômica: dentro do governo Itamar Franco, no seu próprio partido, na busca de apoio no Congresso e, sobretudo, no esforço de convencer a opinião pública de que o novo plano seria completamente diferente dos anteriores e teria boa chance de ser bem-sucedido.

Ter enfrentado com sucesso, em tão pouco tempo, todos esses desafios e assegurado condições adequadas para levar adiante uma operação da complexidade do Plano Real, foi, sem dúvida, o melhor momento de Fernando Henrique Cardoso, por mais notável que tenha sido seu desempenho posterior como presidente da República.

Rogério Furquim Werneck é professor de economia da PUC-Rio.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO/O GLOBO

Marina quer partido

Ex-candidata a presidente e seus aliados podem anunciar na terça-feira a saída do PV e a criação de uma legenda.

Marina prepara desembarque

A ex-senadora e seus aliados estudam anunciar na próxima terça-feira a desfiliação do PV

Vinicius Sassine e Paulo de Tarso Lyra

A ex-senadora Marina Silva e o grupo que a acompanha desde a saída do PT, em 2009, estão decididos a deixar o Partido Verde (PV), depois da fracassada tentativa de ampliar seu espaço político dentro da legenda. Já existe até mesmo uma ideia de data para a desfiliação do PV e o lançamento de um movimento culminando com a criação de um novo partido, após as eleições municipais de 2012. Uma reunião e uma entrevista coletiva à imprensa estão previstas para a próxima terça-feira, 28, em São Paulo, onde Marina Silva passou o feriado de Corpus Christi imersa em conversas políticas. A tendência é que ela e seu grupo anunciem a desfiliação nessa data, ou, pelo menos, digam quando farão isso. "Um entendimento (com a direção do partido) é improvável", diz João Paulo Capobianco, que coordenou a candidatura do PV na campanha presidencial do ano passado.

A ex-senadora ficou em terceiro lugar na eleição presidencial do ano passado, com 19,6 milhões de votos nas eleições de outubro. O resultado foi foi determinante para levar a disputa entre Dilma Rousseff (PT) e José Serra (PSDB) para o segundo turno. Agora, Marina faz as últimas consultas às lideranças verdes aliadas a ela, como o ex-deputado e ex-candidato ao governo do Rio Fernando Gabeira antes de sacramentar a saída do PV.

Depois da eleição, Marina empenhou-se em renovar o PV, o que, pelos seus planos, passava pela destituição do deputado José Luiz Penna (SP) da Presidência da sigla. Não conseguiu. Penna ignorou o acordo feito no momento da filiação da ex-petista que, além da revisão programática do partido, o fim da reeleição do presidente e o fim das comissões provisórias. A recondução de Penna à Presidência do PV, neste ano, levou Marina e seu grupo a criarem o movimento Transição Democrática.

A mobilização de Marina não conseguiu o efeito esperado, em razão da falta de interesse da militância — poucos compareceram aos eventos organizados pela ex-senadora. Menos de três meses depois de lançado o Transição Democrática, e com menos de dois anos de filiação ao PV, ela já não vê qualquer espaço dentro do partido, o que é corroborado por seus aliados. "Sabíamos que mudanças no ano eleitoral seriam difíceis, por isso esperamos que algo acontecesse nesse ano. Mas nada mudou e a relação tornou-se insustentável", diz o integrante da executiva do partido no Distrito Federal Pedro Ivo Batista.

Resistência

As chances do lançamento de um novo movimento, desta vez pavimentando a criação de um partido, têm oscilado nos últimos dias. Depois de ser considerado algo inexorável na quarta-feira, quando ela se reuniu com seu grupo em Brasília, as lideranças preferiram ontem ser mais cautelosas, evitando revelar detalhes sobre os planos para o evento previsto para a próxima terça-feira.

Persistem focos de resistência, porém, dentro do próprio grupo de apoio a Marina. Um deles é o deputado Alfredo Sirkis (PV-RJ), que publicamente afirma acreditar numa solução no âmbito do partido. "Não estamos pedindo a lua. Seria desastrosa para a direção do PV essa saída do grupo de Marina", afirma o deputado. Há cinco dias, Sirkis publicou em seu blog as condições para a permanência no PV: alterações estatutárias, por meio da convocação imediata de uma convenção nacional, e incorporação ao programa do PV das ideias defendidas por Marina na última campanha eleitoral.

O presidente da sigla, José Luiz Penna, continua sem dar qualquer indicação de que irá acatar as condições do grupo de Marina (leia texto abaixo). Essa resistência, na opinião de integrantes do grupo de Marina, faz com que a dissiência ganhe força e "capilaridade de um partido político", nas palavras de um dirigente que prefere não se identificar. A nova legenda não seria criada, porém, a tempo da disputa nas eleições de 2012.

A criação de um novo partido exige 500 mil assinaturas, em nove estados. Com grande número de jovens, usuários de redes sociais, e a pauta ambiental, os aliados de Marina Silva acreditam que não teriam dificuldades para recolher as assinaturas. A dúvida, porém, é se conseguiriam um resultado expressivo nas eleições municipais. Um eventual fracasso poderia ofuscar o sucesso de Marina na eleição presidencial do ano passado. Assim, a tendência do grupo de Marina é deixar a criação de um novo partido para 2013.

Racha no Distrito Federal

Filiados ao PV próximos a Marina Silva reclamam da falta de espaço na legenda. É o caso de integrantes da executiva no Distrito Federal, que dizem não ser chamados para as reuniões realizadas. O presidente do PV no DF, Eduardo Brandão, disputou o governo e hoje é secretário do Meio Ambiente no governo do petista Agnelo Queiroz. Brandão, passadas as eleições, tem procurado se distanciar de Marina Silva. Quando ela promoveu a reunião do Transição Democrática em Brasília, o secretário não compareceu.

FONTE: CORREIO BRAZILIENSE

Governo adia validade de emendas para agradar base

Aceno é tentativa de frear crise com aliados

Catia Seabra

BRASÍLIA - Na tentativa de aplacar a crise política que atravessa e para agradar aliados, o governo vai prorrogar por mais 90 dias o prazo para o pagamento de despesas não pagas herdadas de anos anteriores, os "restos a pagar".

A validade desses empenhos - a maioria para atender emendas de congressistas - seria extinta no dia 30.

Sem a prorrogação do decreto para pagamento de restos a pagar de 2007 a 2009, os gastos seriam cancelados.

Além de oficializar a decisão na semana que vem, o representante do governo na Comissão Mista de Orçamento, Gilmar Machado (PT-MG), avisou a aliados que, a partir de julho, o governo liberará recursos para emendas previstas no Orçamento deste ano que estão represadas.

O aceno é uma tentativa de aplainar o terreno para a votação da LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) até o dia 15, quando deputados e senadores entram em recesso.

Como o Planalto sonha em tirar férias de um mês da crise na base aliada -e o Congresso só pode parar após a aprovação da LDO-, o governo teme que congressistas comecem a impor condições em troca de voto.

Distribuição de royalties do pré-sal e regulamentação de MPs também podem ser usados para afagar o Congresso.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Tsunami à vista :: Alfredo Sirkis

A recente crise no Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro poderia ter sido evitada com um mínimo de previsão, bom senso e diálogo. O desvio de função, retirando-os da Defesa Civil para tapar buracos na Saúde, a persistência de um padrão salarial degradado e a falta de diálogo levaram à quebra de hierarquia e a formas de luta questionáveis. No final, fica um desgaste persistente que se refletirá na qualidade desse serviço vital para a população. Essa crise foi uma antecipação, em escala local, do potencial tsunami institucional que se avoluma no horizonte do Brasil resultante da má gestão político-institucional da PEC 300, que nivela os salários de policiais militares, civis e bombeiros do país aos da PM do Distrito Federal.

O Ministério do Planejamento adverte que isso custaria mais de R$50 bilhões, e que não só os estados não teriam condições de pagar, como o governo federal não conseguiria apoiá-los para tanto. Isso, porém, não impediu a base parlamentar do governo Lula de ter, em ano eleitoral, votado massivamente a PEC 300, aprovando-a nas duas casas legislativas com uma mudança no Senado que obriga a fazê-la passar novamente na Câmara - onde, agora, a bancada do governo está instruída a não deixá-la prosperar. Já se esboça uma forte mobilização de policias, existe no ar uma intensa sensação de frustração com acusações de traição ao governo e à sua base parlamentar. Os setores mais fisiológicos da base governista já saboreiam essa nova gota de sangue no mar de tubarões. Corremos o risco de mobilizações de rua de policiais civis, militares e bombeiros, confrontos, motins, numa escala inédita.

O governo não vai escapar de algum grau de concessão para pagar o preço de ter lidado com a questão de forma eleitoreira em passado recente. É de um cinismo sem limites terem votado por conveniência eleitoral o que hoje consideram algo "totalmente inviável". Detalhe: não o fizeram com aquela relativa irresponsabilidade facultada à oposição, mas como base de governo. Em política pública isso tem custo alto. Aqui se faz, aqui se paga.

Mas há um lado de oportunidade em qualquer crise. A inevitável explosão em torno da PEC 300 abre oportunidade para rediscutir a fundo a histórica desfuncionalidade da carreira policial no Brasil. A questão das "escalas de serviço", do duplo emprego, das nossas polícias de "bico", a part time, onde a segurança pública acaba ocupando a parte menor do tempo dos nossos policiais civis e militares, e a maior acaba dedicada a outra atividade remunerada frequentemente vinculada à segurança privada. Isso produz falta de efetivo, má qualidade de serviço e de adestramento e estimula toda espécie de desvios. Cabe uma discussão séria e um eventual sacrifício orçamentário de outros gastos de governo. Pequeno exemplo: acabamos de passar cerca de meio bilhão de reais de incentivo fiscal a usinas nucleares, na MP 517. O padrão disposto na PEC 300 teria como contrapartida a dedicação exclusiva dos policiais à segurança pública, com o fim do duplo emprego. O tempo livre, resultante dos atípicos horários de trabalho policiais, ficaria dedicado ao adestramento e à formação profissional permanente. Isso passaria também pela instituição de um fundo nacional de segurança mais abrangente que, à semelhança do Fundeb, possa complementar salários apoiando os estados. Nada disso será simples. Mas a qualquer momento periga virar urgência urgentíssima...

Aldredo Sirkis é deputado federal (PV-RJ).

Os ombros suportam o mundo:: Carlos Drumonnd de Andrade

Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus.

Tempo de absoluta depuração.
Tempo em que não se diz mais: meu amor.
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram.
E as mãos tecem apenas o rude trabalho.
E o coração está seco.


Em vão mulheres batem à porta, não abrirás.
Ficaste sozinho, a luz apagou-se,
mas na sombra teus olhos resplandecem enormes.
És todo certeza, já não sabes sofrer.
E nada esperas de teus amigos.


Pouco importa venha a velhice, que é a velhice?
Teus ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma criança.
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios
provam apenas que a vida prossege
e nem todos se libertaram ainda.
Alguns, achando bárbaro o espetáculo,
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação.