domingo, 17 de julho de 2011

Opinião - Raimundo Santos: Itamar Franco e a política

"O seu nome vem sendo associado, como a nenhum outro político brasileiro, à idéia de República. Quando ultimamente ouvia os seus posicionamentos, vinha-me à mente uma imagem de que estava diante de um emedebista, mesma impressão tida às vezes ao ler opiniões de Roberto Freire sobre temas brasileiros. Também guardo uma imagem de que o curto governo de Itamar foi um ”governo do MDB”. MDB aqui entendido como "um partido sem economia”, segundo disse há muito tempo atrás um sociólogo do Rio de Janeiro, referindo-se ao partido da resistência democrática por agir através da política, mesmo tendo algumas áreas de interesses econômicos. Um partido que punha, como objetivo comum à frente de qualquer outro, alcançar as liberdades, nisso difundindo um modo de equacionar problemas e conflitos sob o registro da política, em âmbito mais abrangente. O próprio Real, que nasce de uma emergência no seu governo e depois enseja outras transformações, não perde sua marca política, por isso se tornando valor nacional."


Raimundo Santos, professor da UFRRJ.

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO


UPAs de lata no Rio custam mais caro do que hospitais
Um resgate da cidade antiga e perdida
Corrupção não é o único mal dos Transportes
Luiz Fernando Pezão

FOLHA DE S. PAULO

8em cada 10 têm oferta para mudar de emprego
Anac autoriza companhias aéreas a cortar comissários
Interino, Passos elevou contratos mais que titular
Dilma mata as baratas, mas não dedetiza a casa


O ESTADO DE S. PAULO

Estoques crescem e levam indústrias a antecipar férias
Governo abre brecha para aparelhamento nos Correios
Brasil negocia gestão junto ao governo sírio
Falta funcionário em unidades de conservação ambiental

ESTADO DE MINAS

Um código para a saúde
Classe C tem 29 milhões de votos jovens

CORREIO BRAZILIENSE

A queda do império americano...
...E a ascensão do império brasileiro
A cara do Brasil que elegerá o próximo presidente

ZERO HORA (RS)

Cofres públicos esperam R$ 578 milhões desviados
Para onde cresce a capital

JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Os vizinhos do medo
Usuário do SUS terá cartão de identificação

UPAs de lata no Rio custam mais caro do que hospitais

Tempo de construção é o mesmo e preço, 25% maior

O uso de contêineres em Unidades de Pronto Atendimento 24 horas (UPAs) virou uma febre no Rio, e em cinco anos já foram construídos 42 postos com a estrutura pré-moldada. Mas, apesar do sucesso, uma UPA de lata custa 25% mais caro do que um hospital em alvenaria, e o tempo de construção dos dois é exatamente o mesmo: 90 dias, informam Fábio Vasconcelos e Natanael Damasceno. Segundo informações oficiais, o custo do metro quadrado do contêiner é de R$ 2.385, bem maior do que os R$ 1.900 pagos, por exemplo, pela prefeitura paulista de São Carlos na construção do hospital escola municipal. Já a prefeitura do Rio paga R$ 3 mil o metro quadrado da Clínica da Família, cuja construção combina alvenaria e aço. O Ministério Público estadual investiga suspeita de superfaturamento nos contêineres. A Secretaria de Saúde diz que 95% dos pacientes aprovam as UPAs, e a prefeitura, que o custo de construção inclui a urbanização do entorno.

Solução contraindicada

UPAs feitas com contêineres ou pré-moldados custam 25% mais que hospitais de alvenaria

Fábio Vasconcellos e Natanael Damasceno

Na lógica de gastos do poder público do Rio, a menor diferença entre custo e benefício nem sempre é o melhor preço. Um comparativo feito pelo GLOBO mostra que a utilização de contêineres ou módulos pré-moldados de aço para erguer as Unidades de Pronto-Atendimento 24h (UPAs) custa, em média, 25% mais caro que construir um hospital inteiro de alvenaria. Apesar da diferença, o uso das estruturas metálicas virou uma febre no estado, desde que o governo inaugurou a primeira UPA na Maré, em 2007. Desde então, já foram instaladas mais 41 unidades com esse tipo de material. Outras secretarias, como as de Governo e Segurança, além de municípios do interior, da prefeitura da capital e da Guarda Municipal, passaram também a adotar os pré-moldados metálicos.

Os custos de instalação das UPAs já chamaram a atenção dos promotores da área de saúde do Ministério Público estadual. Eles investigam suspeitas de superfaturamento na compra das estruturas de aço. Nos tribunais de Contas do Estado (TCE) e do Município (TCM), tramitam processos nos quais os técnicos questionam os valores e os processos licitatórios de instalação das UPAs.

Pelos dados fornecidos pelo governo estadual e pela prefeitura, os módulos de aço das UPAs têm um custo de R$2.385 por metro quadrado. O preço supera em 25% os R$1.900 que a prefeitura de São Carlos, em São Paulo, investe na construção do Hospital Escola Municipal. A unidade, que está parcialmente pronta, tem mais de 30 mil metros quadrados. No custo total de R$58 milhões estão incluídas as despesas com paisagismo, instalações elétricas e hidráulicas, além de sistema de refrigeração. A obra conta ainda com a assinatura do arquiteto João Filgueiras Lima (Lelé), responsável pelos projetos dos hospitais da Rede Sarah Kubitschek.

UPA fica pronta, mas faltam funcionários

Das 42 UPAs já inauguradas no estado, 22 foram feitas a partir de contêineres e 20 com módulos metálicos. Cada UPA de contêiner custou cerca de R$3 milhões. Para aquelas de maior porte (1.300 metros quadrados), o valor do metro quadrado foi R$2.300. Para fazer a comparação com os custos das obras de alvenaria, O GLOBO levou ainda um engenheiro do Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura (Crea-RJ) à UPA da Tijuca. O projeto de alvenaria para a unidade, já com sistemas elétricos e hidráulicos, jardinagem e sistema de ar-condicionado, poderia ser executado por até R$1.750 o metro quadrado. Assim, o valor pago pelo estado e pela prefeitura é 36% mais alto. No caso da prefeitura, as Clínicas da Família, feitas parte de alvenaria e parte de módulos metálicos, são ainda mais caras: R$3 mil o metro quadrado.

- A estrutura (da UPA de metal) é aparentemente simples, com um espaço para recepcionar os pacientes, consultórios e salas de laboratório. Nesses termos, mesmo considerando os custos com os encanamentos de água e gás e estrutura elétrica, o metro quadrado de uma unidade semelhante feita em alvenaria seria de R$1.170. Se incluirmos jardinagem e refrigeração, o valor poderia chegar a 1.460. A esse valor devemos acrescentar mais 20% do remuneração da construtora (num total R$1.750) - explica Abílio Borges, que trabalha como assessor da presidência do Crea.

O engenheiro do Crea utilizou como parâmetro de cálculo a tabela de Custo Unitário Básico da construção, definida pela Norma Técnica da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) e que serve de referência para o Sindicato das Empresas de Construção do Rio (Sinduscon).

Numa comparação do quanto os projetos de alvenaria poderiam gerar de economia, os dados são ainda mais evidentes. Na tomada de preços feita pelo governo do estado em 2009 - ou seja, quando informou ao mercado a disponibilidade de comprar até 264 mil metros quadrados em módulos de aço -, a despesa total, caso todos fossem adquiridos, seria de R$629 milhões. Com o metro quadrado a R$1.750 da alvenaria, o custo passaria para R$462 milhões, uma economia de R$167 milhões.

Duas das principais alegações apresentadas pela Secretaria estadual de Saúde para o uso das estruturas de ferro no lugar de obras de alvenaria são a mobilidade e a rapidez com que as unidades ficam prontas - em média, em 90 dias. Mas este é também o mesmo prazo, segundo o Crea, para erguer uma unidade semelhante feita de alvenaria. E a pressa ao utilizar os módulos de aço nem sempre é uma variável que favorece os usuários do sistema de saúde. A UPA de Nilópolis, por exemplo, ficou pronta no fim do ano passado e, segundo moradores, até hoje continua sem uso. Um atraso no cronograma de contratação de funcionários por parte do município emperrou o projeto. A unidade só deve ser aberta ao público em agosto.

Para o vice-presidente da Comissão de Saúde do Rio, vereador Paulo Pinheiro (PPS), as UPAs ajudaram a desafogar as emergências dos hospitais. Mas a rapidez para construir essas unidades não é sinônimo de boa prestação de serviços:

- Há um problema mais urgente para resolver, que é a falta de profissionais para trabalhar nas UPAs.
Estado alega outras despesas

A Secretaria estadual de Saúde informou que os custos do metro quadrado das UPAs levam em conta as despesas com as "instalações elétrica e hidráulica, mais a rede de gases e a rede lógica - internet, telefonia e dados -, aparelhos de ar-condicionado e paisagismo da área externa". Segundo o órgão, também estão incluídos os gastos com a construção de rampas e pistas de acesso para as unidades, além de um ano de seguro. O órgão acrescentou que mais de 95% dos pacientes que vão às UPAs aprovam as instalações.

Já a prefeitura do Rio explicou que o metro quadrado das Clínicas da Família, que também têm áreas feitas de alvenaria, envolve despesas com a urbanização do entorno das unidades. O município ressaltou ainda que as suas UPAs foram construídas a partir da adesão feita ao registro de preços realizado pelo estado em 2009, que estabeleceu o preço do metro quadrado em R$2.385.

FONTE: O GLOBO

Corrupção não é o único mal dos Transportes

Além das denúncias de corrupção, o Ministério dos Transportes padece do mal do atraso no Brasil: nada menos que 87% das estradas não são pavimentadas, o que entrava o crescimento do país.

Além da corrupção, o atraso

GASTOS PÚBLICOS

Brasil ainda tem 87% das estradas sem pavimentação

Marcelle Ribeiro

Enquanto o Ministério dos Transportes passa por uma crise, com denúncias de corrupção, superfaturamento de obras e demissão de ministro e diretores do Departamento Nacional de Infraestrutura e Transporte (Dnit), a situação das estradas brasileiras continua caótica, num retrato do atraso no setor. Esburacadas, sem acostamento e, em sua maioria, sem asfalto, são um dos gargalos para que o país cresça em condições de competir com seus concorrentes entre os países emergentes.

Em 2010, do 1,5 milhão de quilômetros de estradas brasileiras, apenas 212 mil quilômetros, ou 13%, eram pavimentados, de acordo com o Dnit. Os outros 87% não têm qualquer tipo de pavimentação.

Uma pesquisa feita ano passado pelo instituto Ilos, com cerca de 15 mil profissionais de logística das maiores empresas do Brasil, revelou que 92% deles apontaram a má conservação das estradas como o principal problema de infraestrutura do país. A malha rodoviária insuficiente foi citada por 68% dos entrevistados. A duplicação da BR-101, assim como as dragagens portuárias, são os projetos da primeira etapa do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

Segundo o Ilos, para que as estradas atuais sejam avaliadas como boas ou ótimas, é preciso investir R$64,7 bilhões em recuperação e R$747 bilhões em pavimentação das estradas já existentes. A soma, que chega a R$811 bilhões, é 19 vezes maior que os R$43,5 bilhões previstos no PAC 1, de acordo com o instituto.

Investimento caiu, diz especialista

O estudo do Ilos mostra que, em relação à quantidade de quilômetros pavimentados em estradas, o Brasil está muito atrás da maioria dos outros países que compõem o bloco de emergentes Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul). A Índia, por exemplo, cuja extensão territorial representa 35% da brasileira, tem 1,5 milhão de quilômetros de rodovias pavimentados.

- No Brasil, a primeira estrada pavimentada foi a Rodovia Presidente Dutra, em 1950. Os outros países começaram a investir antes, no século XIX. A outra razão é que, até 1974, o governo investia de forma crescente em rodovias. Em 1974, os investimentos chegaram a 1,8% do PIB. Ano passado, o investimento foi de apenas 0,8% do PIB - explica o presidente do Instituto Ilos e professor da Coppead-UFRJ, Paulo Fleury.

A qualidade das rodovias brasileiras também deixa muito a desejar. Apesar de a última pesquisa da Confederação Nacional dos Transportes (CNT) - feita em 90 mil quilômetros de rodovias no ano passado - apontar que aumentou o índice de rodovias com estado geral considerado ótimo ou bom, em comparação com 2009, o percentual de vias ruins ou péssimas chega a 25%.

Segundo a CNT, na Região Norte do Brasil, 55% das estradas são consideradas ruins ou péssimas.

- É muito buraco, estradas sem acostamento. A situação está de ruim a pior. Na BR-174, que liga Manaus a Boa Vista, tem crateras. Eu tive muita esperança quando colocaram um ministro de Transportes de Manaus (Alfredo Nascimento) e aconteceu o que aconteceu. O que a gente vai esperar agora? - pergunta o presidente da Federação dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários da Região Norte, Manoel Farias Rodrigues.

O Ministério dos Transportes alega que o investimento no sistema rodoviário tem aumentado anualmente e que, em 2010, investiu R$11 bilhões no setor. Até junho, foram aplicados R$4,4 bilhões, e a previsão é que mais R$13 bilhões sejam gastos.

Segundo o Dnit, cerca de 4,1 mil quilômetros de rodovias federais estão sendo pavimentados e 915 quilômetros passam por duplicação. Além disso, 27 mil quilômetros estão sendo recuperados e 32 mil quilômetros serão recuperados até 2012.

Setor defende concessões

O vice-presidente da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), Ralph Lima Terra, diz que o governo tem investido mais, mas que as melhorias ocorrem em ritmo inferior ao necessário:

- A situação das rodovias ainda é absolutamente insuficiente em função das necessidades do país. Precisamos acelerar o processo de concessão das rodovias brasileiras e intensificar a aplicação de recursos nas estradas que existem e que não são administradas por concessionárias - diz.

FONTE: O GLOBO

Interino, Passos elevou contratos mais que titular

Aditivos em contratos do Dnit somaram R$ 787 milhões de julho a dezembro de 2010, quando o ministro Paulo Passos chefiou interinamente os Transportes. Em igual período de 2009, o total foi de R$ 309 milhões.

Ele diz que a alta seguiu os investimentos

Sob Passos, gastos extras dos Transportes subiram 154%

Contratos aditivos saltaram em 2010, quando ministro ocupou cargo interinamente

O suposto descontrole na elevação de despesas contribuiu para a queda de Alfredo Nascimento e parte da cúpula do Dnit

Breno Costa

BRASÍLIA - Incumbido pela presidente Dilma Rousseff de resolver a crise nos Transportes, o novo ministro Paulo Passos aumentou, em sua última passagem pelo cargo, o volume de contratos do Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) que tiveram o valor ampliado.

Levantamento da Folha mostra que o número de contratos dos chamados aditivos -termos que elevam o valor de obras e serviços em andamento- mais do que dobrou entre julho e dezembro de 2010 na comparação com o mesmo período de 2009.

Passos chefiou o ministério no segundo semestre de 2010, quando o ex-ministro Alfredo Nascimento, que exerceu o cargo no ano anterior, disputava a reeleição no Senado pelo PR-AM.

Em 2011, quando Nascimento voltou ao posto, o ritmo da liberação de verbas caiu para o patamar original.

Nos últimos seis meses de 2009, o Dnit assinou 53 termos aditivos, que ampliaram o valor de seus contratos em R$ 309 milhões.

Sob Passos, no mesmo período de 2010, os aditivos saltaram para 113, e a quantia extra liberada cresceu 154%, chegando a R$ 787 milhões.

No primeiro semestre deste ano, o volume de contratos turbinados voltou a cair: os aditivos recuaram para 53, no valor de R$ 353 milhões.

Em todos os casos, os recursos extras foram repassados a empreiteiras e consultorias que executam projetos do Dnit em rodovias federais.

A assessoria de Passos afirma que a ampliação maior de contratos em 2009, sob sua gestão no ministério, acompanhou o aumento dos investimentos da pasta (leia texto abaixo).

DESCONTROLE

O suposto descontrole na elevação de contratos foi um dos principais motivos usados por Dilma nas últimas semanas para afastar Nascimento e outros quatro dirigentes dos Transportes.

Apesar de não ser diretamente responsável pela assinatura dos aditivos, o ministro tem o poder para monitorar e, eventualmente, cobrar providências do Dnit.

O petista Hideraldo Caron, diretor de Infraestrutura Rodoviária e poupado até aqui da reformulação na pasta, é quem controla a assinatura de aditivos no Dnit.

Passos conta com a simpatia da presidente, mas sofreu resistência de congressistas do seu partido, o PR, antes de ser efetivado no posto.

Ele ocupava até a semana passada o cargo de secretário-executivo do ministério. No entanto, foi não só poupado, como promovido ao cargo máximo da pasta com a queda do senador Alfredo Nascimento (PR-AM).

Um dos afastados, que está oficialmente em férias, é o diretor-geral do Dnit, Luiz Antonio Pagot.

Anteontem, Passos anunciou o afastamento do substituto interino de Pagot, José Henrique Sadok, depois de o jornal "O Estado de S. Paulo" mostrar que a empreiteira que pertence à sua mulher assinou contratos para fazer obras do Dnit em Roraima.

O aumento dos contratos em 2010 coincidiu, também, com o período eleitoral. Do valor de aditivos concedidos no segundo semestre do ano, R$ 466,7 milhões (59%) foram para contratos com empresas que registraram doações para políticos ou partidos da base aliada.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Governo abre brecha para aparelhamento nos Correios

Mudança feita pelo governo no estatuto dos Correios permite ao PT aparelhar cargos de chefia da estatal, relatam Rui Nogueira e Leandro Colon. O partido, que comanda a empresa, poderá levar funcionários de carreira de outros órgãos para vagas estratégicas. Antes, as funções só podiam ser ocupadas por concursados da estatal.

Governo cria brechas que permitem aparelhamento político nos Correios

Decreto abre espaço para que o PT, que hoje tem o controle da empresa, transfira servidores de outros órgãos para "funções gerenciais e técnicas"

Rui Nogueira e Leandro Colon

Uma mudança cirúrgica no estatuto dos Correios, feita em maio deste ano, permite ao Partido dos Trabalhadores aparelhar os principais cargos de direção, chefia e gerência da estatal. "Dono" dos Correios no governo da presidente Dilma Rousseff, após uma longa hegemonia do PMDB na era Lula, o partido poderá agora levar funcionários de carreira de outros órgãos do governo para assumir vagas de presidentes de comissões de licitação, diretores regionais, superintendentes executivos, diretores regionais, chefes de departamento, coordenadores de negócios e de operações, entre outros cargos.

Até então, essas funções só podiam ser ocupadas por servidores concursados da estatal. A partir de agora, o governo está livre para tirar os funcionários de carreira e trocá-los por apadrinhados políticos.

A manobra está no Decreto 7.483, assinado no dia 16 de maio pela presidente Dilma Rousseff e pelos ministros Paulo Bernardo (Comunicações) e Miriam Belchior (Planejamento). A decisão, que não precisou passar pelo crivo do Congresso, criou dois artigos que não existiam antes, os de número 43 e 44.

Os artigos permitem aos Correios requisitar, da administração pública direta e indireta, funcionários para ocupar "funções gerenciais e técnicas" na estatal. Serão atingidas as unidades regionais e as vinculadas à diretoria executiva da empresa.

A estatal foi palco de grandes escândalos no governo passado, incluindo o do mensalão, em 2005, e a queda de Erenice Guerra da chefia da Casa Civil no ano passado. Erenice era o braço direito de Dilma quando a petista comandava a pasta.

Agora, no governo Dilma, o PT foi escalado para tentar mudar a fama ruim dos Correios.

Reação interna

As mudanças nos estatutos foram coordenadas pelo vice-presidente de Administração, Nelson Luiz Oliveira de Freitas, e abriram uma crise interna na empresa. Entidades ligadas a servidores de carreira da estatal apontam um aparelhamento por gente de fora, sem experiência com os Correios.

"Isso vai prejudicar a profissionalização da empresa e certamente atingirá o serviço à sociedade", diz Luiz Alberto Menezes Barreto, presidente da Adcap, associação dos servidores de nível superior dos Correios.

Para a entidade, cerca de 20 mil funções técnicas e gerenciais podem ser alvo da nova regra estabelecida por decreto.

A direção da estatal rebate a informação e alega que a mudança se restringe a 761 funções: "A cessão (de servidores de outros órgãos) é uma oportunidade de compartilhamento de experiência entre pessoas que são subordinadas ao mesmo patrão: o governo".

Segundo a assessoria dos Correios, pelo menos 15 pessoas já assumiram cargos na empresa pegando carona na mudança do novo estatuto.

Exemplos

Os artigos 43 e 44 abriram a brecha que permitiu, por exemplo, nomear Adeílson Ribeiro Telles chefe de gabinete do presidente dos Correios, o petista Wagner Pinheiro. Filiado ao PT, Telles também é dirigente da Central Única dos Trabalhadores (CUT).

Wagner Pinheiro chegou ao comando da estatal pelas mãos da presidente Dilma Rousseff depois de presidir o Petros, fundo de pensão dos funcionários da Petrobrás.

Três dirigentes do Instituto Federal de Santa Catarina foram deslocados para cuidar da Universidade dos Correios, que capacita seus funcionários.

Diretorias

Até o governo passado, as 27 diretorias regionais dos Correios só podiam ser ocupadas por funcionários de carreira. Agora, os cargos, estratégicos dentro da empresa, também poderão ser assumidos por servidores de outros órgãos públicos.

Os superintendentes executivos, que atuam abaixo dos vice-presidentes, também poderão ser requisitados de outras áreas. A empresa tem hoje pelo menos 230 gerentes espalhados pelo Brasil, todos agora enquadrados na nova regra, assim como coordenadores e assessores.

Os cargos abrangidos pelas mudanças foram especificados no Manual de Pessoal dos Correios, documentos elaborado por sua direção.

Hoje, a estrutura dos Correios só permite que o presidente e os vice-presidentes sejam de livre nomeação, ou seja, não precisam ter vínculo com órgãos públicos. Os demais funcionários são concursados.

Cada vice pode ter apenas dois assessores de livre nomeação, ou seja, não precisam de concurso público. No mais, os Correios não possuem em sua estrutura cargos de confiança. É por meio deles que os partidos políticos conseguem aparelhar órgãos públicos para comandá-lo.

Sem essa possibilidade na estatal, a saída foi permitir que petistas que trabalham em outros órgãos do governo possam assumir funções de chefia, de gestão, dentro da empresa postal.

A mudança no estatuto permitirá, por exemplo, que um carteiro seja alçado a um cargo vinculado à diretoria dos Correios. Foi o que ocorreu recentemente no Rio Grande do Sul.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Duda voltou a faturar no fim do governo Lula

NOVO CAPÍTULO DO ESCÂNDALO

Nos últimos dois anos da gestão do ex-presidente, contratos renderam R$60 milhões a marqueteiro réu do mensalão

Sérgio Roxo

SÃO PAULO. Réu no processo do mensalão, o publicitário Duda Mendonça aumentou o seu faturamento em contratos com o governo federal no fim da gestão do ex-presidente Luiz Inácio Lula Silva (PT). Após atravessar uma baixa no período seguinte ao escândalo, a empresa do marqueteiro recebeu 135% a mais no biênio 2009-2010 em comparação com os dois anos anteriores (2007-2008).

No último dia 7, a Procuradoria Geral da República, ao apresentar as alegações finais do processo do mensalão, pediu a condenação de Duda e de sua sócia, Zilmar Fernandes, a penas de 229 a 941 anos de prisão por lavagem de dinheiro e evasão de divisas.

Após escândalo, Saúde virou principal cliente de Duda

Após ser envolvido no maior escândalo da gestão Lula, Duda deixou de prestar serviço para a Presidência, mas viu aumentar o dinheiro recebido por contratos com o Ministério da Saúde. Em 2005, quando era o principal publicitário do governo, faturou R$51,9 milhões (em valores atualizados pela inflação) da União, segundo informações disponíveis no Portal da Transparência da Controladoria Geral da União (CGU). Dessa quantia, cerca de 75% eram referentes a compromissos diretos com a Presidência. O restante saíra de campanhas realizadas para a pasta da Saúde. Trabalhos para estatais não estão incluídos.

O envolvimento de Duda no mensalão veio à tona em agosto de 2005, quando ele confessou em depoimento à CPI dos Correios ter recebido R$10,5 milhões de caixa dois em conta nas Bahamas, como pagamento de dívida pendente pelo trabalho realizado na campanha presidencial de Lula em 2002.

Após ganhar os holofotes por causa do depoimento, a empresa do publicitário, a Duda Mendonça & Associados Propaganda, viu o faturamento em contratos com o governo cair 73,6% no ano seguinte (2006), para R$13,7 milhões. Menos de 1% dessa quantia se referia a serviços para a Presidência. Quase a totalidade veio dos cofres do Ministério da Saúde.

Em 2007, quando Duda se tornou réu no processo do mensalão no Supremo Tribunal Federal, os valores faturados caíram ainda mais e chegaram a R$11,7 milhões, a menor quantia na gestão Lula. A partir de então, Duda só recebeu verbas do Ministério da Saúde e nenhum centavo da Presidência da República.

Mas em 2008, após as notícias sobre o mensalão perderem destaque na mídia, a situação começou a mudar para o publicitário. A sua empresa recebeu 17,9% a mais naquele ano e embolsou R$13,8 milhões. A situação melhorou em 2009. A Duda Mendonça & Associados engordou o faturamento com contratos com o governo em 108% e ficou com R$28,7 milhões.

Ano passado, o último do governo Lula, Duda obteve o seu maior faturamento na era pós-mensalão e embolsou R$31,3 milhões. Um aumento de 9,1%.

O Ministério da Saúde informou que a Duda Mendonça & Associados foi selecionada em uma licitação em 2005 com outras três agências. A pasta alega que em todos os anos a empresa de Duda foi a que menos recebeu entre as quatro contratadas. De acordo com a pasta, o contrato exigia que cada uma das agências ficasse com pelo menos 15% da verba publicitária disponível em cada ano. Informa que em 2006, 2007, 2008 e 2009 a empresa recebeu menos do que isso.

Mas no ano passado, o último da gestão Lula, a quantia embolsada pela agência de Duda atingiu 21% da verba.

Questionada se não poderia impedir a contratação da agência dirigida por Duda, a pasta informou que seria "ilegal" restringir a participação. O ministério também disse que o contrato com o marqueteiro terminou ano passado e que em 2011 ele não receberá mais nada. Porém, o Portal da Transparência indica que a agência de Duda já recebeu R$2,8 milhões este ano.

Os números do Ministério da Saúde sobre os gastos com publicidade nos últimos cinco anos não são os mesmos que constam no Portal da Transparência por causa de diferença na forma de contabilizar os restos a pagar. Mas os dados da pasta também indicam um crescimento superior a 100% da quantia recebida pelo publicitário no último biênio do governo Lula em relação aos dois anos anteriores. Procurada, a Duda Mendonça & Associados se limitou a dizer que não possui mais contratos com o governo federal.

FONTE: O GLOBO

PT teme efeito do mensalão na eleição de 2012

NOVO CAPÍTULO DO ESCÂNDALO

Partido está preocupado, já que o julgamento do caso vai ocorrer no mesmo ano das disputas municipais

Gerson Camarotti e Maria Lima

BRASÍLIA. A estratégia é insistir até o fim na tese de que o mensalão nunca existiu, que foi uma farsa montada pela oposição e que tudo não passou de caixa dois. Mas o PT já admite que terá desgaste nas eleições municipais de 2012 com os efeitos do julgamento, no Supremo Tribunal Federal (STF), dos envolvidos no escândalo, que deverá ocorrer no primeiro semestre de 2012. Por isso, o partido já trabalha para tentar diminuir as sequelas e o desgaste eleitoral.

A ordem é tentar restringir o fato a um problema de caixa dois. A principal arma dos candidatos petistas, que podem ter que dividir a campanha com o banco dos réus, será usar a força eleitoral do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para compensar o prejuízo. Principalmente nas grandes cidades. No final do ano passado, Lula prometeu a José Dirceu, deputado cassado e ex-ministro da Casa Civil, que viajaria o país inteiro para desmontar "a farsa" do mensalão. Na sexta-feira, sem citar o mensalão, Lula disse que voltará "a andar pelo país".

Há preocupação especial na disputa de prefeituras como a de São Paulo. No estado, está concentrado o maior número de mensaleiros: além de Dirceu, o ex-presidente da Câmara deputado João Paulo Cunha (PT-SP); o ex-líder do governo Professor Luizinho; o ex-presidente do PT José Genoino; e o secretário-geral do PR (ex-PL) deputado Valdemar Costa Neto.

- Esta é uma preocupação real. Dependendo do desfecho do julgamento, isso será usado na campanha eleitoral. E pode influenciar as eleições municipais. Temos que ter cuidado, pois a disputa do próximo ano será o primeiro passo das eleições de 2014 - disse o senador Delcídio Amaral (PT-MS), que presidiu a CPI dos Correios, em 2005.

FONTE: O GLOBO

Petista se queixa de data marcada pelo Supremo

Dirigente do partido diz "estranhar" a coincidência de data

BRASÍLIA. Ainda não há consenso no PT sobre a unificação das estratégias para barrar os efeitos do mensalão nas campanhas do próximo ano. Há forte incômodo no partido com o cronograma do julgamento pelo STF. O secretário de Comunicação do PT, deputado André Vargas (PR), é um dos que se queixam.

- Acho estranha essa coincidência do julgamento na véspera da eleição. O STF deveria ter feito um cronograma para não coincidir com o calendário eleitoral. É um absurdo! Atrapalha o processo democrático. Vai dar a entender que o PT está sendo julgado. O julgamento poderia ser esse ano. Mas vamos enfrentar esse debate. Foi um problema eleitoral de recursos não contabilizados - reclama Vargas.

PT ameaça oposição com mensalão do Arruda

Para criar constrangimento para a oposição e tentar neutralizar o impacto negativo do mensalão petista, o PT também está disposto a resgatar escândalos envolvendo outros partidos, como o mensalão do DEM, que derrubou o ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda, e o chamado mensalão mineiro, que teve como alvo o governo do deputado tucano Eduardo Azeredo, em Minas.

- Se a oposição começar a associar nossos candidatos ao mensalão, também vamos recordar o mensalão do Arruda. Mas temos que enfrentar esse debate. Se o PT acha que tem que adiar esse julgamento para ganhar a eleição, já ficará prejudicado - pondera o senador Walter Pinheiro (PT-BA). - Pior do que julgar, é ficar com a imagem de um partido que tenta abafar, e que temos medo.

Berzoini aposta no efeito Lula na campanha

O deputado Ricardo Berzoini (SP), ex-presidente do PT, explica que o partido fará o enfrentamento político, mas restringindo o episódio a uma prática de caixa dois, numa tentativa de se igualar aos demais partidos. Praticamente todos já foram alvos de denúncias de recursos não contabilizados em campanha.

- O PT tem uma visão que, durante muito tempo, o país viveu um processo de arrecadação informal de campanha, que é ilegal. Mas já enfrentamos esse debate em 2006, na reeleição do presidente Lula, quando tivemos três CPIs. É claro que esse debate afeta. Mas numa eleição municipal o que a população quer saber é quem governa melhor. E, além disso, o Lula vai entrar nessa campanha. Agora, estará mais disponível do que nunca - afirmou Berzoini.

FONTE: O GLOBO

À sombra:: Merval Pereira

A impossibilidade de o ex-presidente Lula desencarnar da Presidência da República, do ponto de vista republicano - nada a ver com o partido do mesmo nome, mas de postura contrária -, deveria ser um sintoma de desfuncionalidade institucional: um ex-presidente deveria deixar o caminho livre para seu sucessor, recolhendo-se a um papel suprapartidário de "pai da pátria".

Não é assim, no entanto, que acontece no Brasil, e até mesmo os que, como Fernando Henrique Cardoso, não disputam cargo eletivo, têm papel importante no dia a dia da política sempre ligado a seu partido de origem.

Lula prometera "desencarnar" e não conseguiu, mas é perfeitamente legítimo que atue como "grande eleitor" dentro do Partido dos Trabalhadores.

Desse ponto de vista, nada há a estranhar que ele esteja, por exemplo, patrocinando abertamente a candidatura do ministro da Educação Fernando Haddad para a Prefeitura de São Paulo.

Se o PT paulista prefere a senadora Marta Suplicy, vai ter que enfrentar Lula, coisa que historicamente nunca aconteceu. Se acontecer, e Lula, porventura, perder a parada, será um sinal político importante a registrar.

Até mesmo a interferência nos assuntos do governo federal, o que não seria recomendável, torna-se aceitável pelo fato de que a própria presidente assim a considera.

Quando Lula apareceu em cena inopinadamente para resolver uma crise no governo, reunindo-se com líderes políticos, parecia que estava se intrometendo onde não deveria.

Depois, soube-se não apenas que a presidente Dilma gostara da intervenção, como também a opinião pública que, em larga maioria, considera importante que Lula ajude Dilma a governar.

Outro dia, a presidente desapareceu por várias horas, deixando várias autoridades esperando-a na Base Aérea do Galeão, no Rio. Soube-se depois que fora ao encontro de Lula para uma troca de ideias.

Sendo assim, cabe à oposição apenas estranhar esse tipo de co-governança e repisar a acusação de que a presidente não passa de um fantoche manipulado por Lula.

Nada disso seria grave, apenas estranho, se não começassem a surgir no horizonte divergências entre criatura e criador, o que pode introduzir nessa cogestão governamental fator de desequilíbrio institucional.

As aparências indicam que a presidente Dilma está em uma luta surda contra o Partido da República (PR) para desalojá-lo de seu feudo no Ministério dos Transportes.

Uso aparentemente por que não há explicações razoáveis para que a presidente mantenha no cargo um ministro que vem, desde 2004, fazendo parte não apenas do PR, mas também da cúpula do Ministério dos Transportes, e veja na sua indicação uma mudança radical dos hábitos e costumes da pasta.

Paulo Passos, o "Paulinho" da Dilma, pode ser de sua confiança mas, forçosamente, participou ou teve conhecimento de todas as maracutaias porventura ocorridas nesses últimos anos no ministério que agora chefia em caráter permanente. Caso contrário, não deveria ser indicado para o cargo por tratar-se de um "sem noção".

Também a própria presidente Dilma, em sua encarnação como chefe do Gabinete Civil, teve que acompanhar as obras do PAC que o ministério tocava e dificilmente deixaria de notar que aconteciam coisas estranhas nos seus órgãos e nos seus orçamentos de obras.

Mesmo assim, aceitou a decisão do então presidente Lula de manter por lá o mesmo Alfredo Nascimento que comandou o esquema do PR nos últimos anos.

Agora surgem denúncias, na Revista "IstoÉ", de que o "Paulinho", quando ministro interino, autorizara aditivos em diversas obras cujas empreiteiras colaboraram generosamente com campanhas eleitorais do PR.

Ao mesmo tempo, o presidente Lula, que foi o responsável primeiro pela manutenção do PR à frente do Ministério dos Transportes, aparentemente não participa da vontade da presidente Dilma de fazer tal limpeza.

Não apenas nunca abriu a boca para criticar Alfredo Nascimento ou a estrutura do ministério, como aceitou viajar no jatinho particular do deputado Sandro Mabel, presidente regional do PR em Goiás.

Essa postura, digamos, mais condescendente com os malfeitos de seus aliados, faz com que eles se sintam mais seguros sob as asas protetoras de Lula do que debaixo do, até agora, indecifrável temperamento da presidente "de direito", que pode jogar às feras um aliado apanhado no desvio, mas é capaz de recuar diante de uma pressão mais forte da base aliada.

A situação tende a se agravar com a disposição de Lula de voltar a viajar pelo país. Cada vez mais decidido a não "desencarnar", o ex-presidente também inaugurou um blog na internet de onde espera "poder conversar" com os brasileiros para "falar bem e falar mal dos outros".

Tudo indica que está em marcha a campanha para o retorno oficial de Lula em 2014. Com o consequente enfraquecimento da imagem da presidente.

O leitor Pedro Paulo Guerra envia uma proposta singela de combate à corrupção: os partidos políticos serão considerados responsáveis solidários pelos atos de corrupção praticados por seus filiados, quando em exercício do cargo para o qual foram eleitos.

Justificativa: Já que os partidos são os verdadeiros donos do mandato, o exercício do mandato é feito por quem foi eleito, em nome do partido.

Os atos desonestos praticados são, portanto, praticados em nome do partido. Como punição, o partido deixaria de receber uma percentagem do fundo partidário.

"Acho que, em assim sendo, o partido político seria o primeiro a fiscalizar a atuação de seus membros, contribuindo para diminuição da corrupção", diz ele.

Pode ser.

FONTE: O GLOBO

O bolo dos noivos:: Dora Kramer

O ensurdecedor silêncio do vice-presidente Michel Temer, durante a semana da crise nos Transportes, foi ouvido com desconforto no Palácio do Planalto.

Ficou a sensação de que foi proposital, que o vice prefere manter distância das bolas divididas para não atrapalhar os planos do líder do PMDB, deputado Henrique Eduardo Alves, cujo propósito primordial é se eleger presidente da Câmara em 2013.

Em nome desse objetivo, Alves faz qualquer coisa para agradar ao PT: até submeter-se à tola celebração da parceria entre os dois partidos com bolo e bonequinhos de Dilma e Temer presidindo os confeitos.

A impressão do Planalto sobre o mutismo do vice não é infundada. Mas digamos que seja incompleta.

O panorama visto sob a ótica do PMDB inclui outros fatores.

Apartado das decisões de governo a respeito das quais é no máximo comunicado, mas nunca chamado a debater, Temer na verdade não teria o que dizer sobre a confusão com o PR.

Em boa medida porque, se é mantido a distância, não detém todas as informações e tampouco sabe de onde a presidente Dilma Rousseff parte e aonde quer chegar.

Por exemplo, quando faz demissões a conta-gotas no Ministério dos Transportes e sempre pautadas não por um roteiro previamente delineado pelo governo, mas a reboque de denúncias da imprensa.

Outro aspecto que leva Temer a recolher-se à condição de coadjuvante silente diante do enrosco é a situação de seu partido, onde começa a vicejar a semente da discórdia.

Há insatisfação no Senado que resulta na tentativa de um grupo de peemedebistas de quebrar a hegemonia da trinca José Sarney, Renan Calheiros e Romero Jucá na interlocução com o governo e impedir que Renan venha a suceder a Sarney na presidência da Casa.

Há o grupo, ainda amplamente majoritário, que segue Henrique Alves na tarefa de manter as aparências para não provocar abalos no acordo sobre a troca de comando na Câmara, mas há também duas boas dezenas de insatisfeitos na bancada de 80 deputados do PMDB.

Gente que está enxergando crise à frente e, por isso, vendo a necessidade de as divergências serem tratadas com seriedade. De forma a impedir o acúmulo de passivos que venham a explodir mais adiante.

Com alguma força nas eleições municipais, que em muitas cidades colocarão em campos opostos os dois principais sustentáculos partidários do governo.

Com a intensidade de um terremoto na eleição para as presidências da Câmara e do Senado. É cedo para falar disso? A julgar pelo potencial de eventual estrago, já se faz tarde.

Pelo seguinte: PMDB e PT acertaram que este presidiria a Câmara agora e aquele a partir de 2013. O acerto, contudo, não inclui o Senado, onde o PMDB tem a maior bancada.

O PT deixará que o parceiro impere absoluto no Congresso? Claro que não, mas mais claro ainda é que o PMDB não abrirá mão. Está, portanto, montado desde já o cenário do esfaqueamento.

Briga de foice esta que se não for tratada na base da relativa franqueza, com as divergências sendo resolvidas à luz da maturidade - o que não inclui convescotes ao redor de um bolo de noivos -, tem tudo para degenerar em "bolo" no sentido de crise.

E aí vai ser preciso bem mais que fazer "uma social" de vez em quando com senadores e deputados oferecendo-lhes coquetéis, jantares e os chamados "afagos".

Além de não adiantar nada cria a falsa impressão de que o contraditório se resolve com agradinhos.

Vai ser necessário arbitragem por parte do fiador da aliança. Dilma ou Lula, a depender da disposição da presidente de transferir ou não o poder a ela conferido na eleição.

Seja como for, a bem do bom senso conviria à presidente, ao vice e companhia deixar de lado a hipocrisia e encarar a vida em uma coalizão como ela de fato é.

Em aberto. Luiz Inácio da Silva já falou de tudo um pouco desde que deixou a Presidência. Só não disse ainda como pretende "desmontar a farsa do mensalão", conforme anunciado.

Chance não faltou de rebater ponto por ponto a peça de acusação recentemente apresentada pelo procurador-geral da República.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Passos: dois pra lá, dois pra cá:: Eliane Cantanhêde

Afinal, qual é a do ministro Paulo Sérgio Passos?

Passos foi saudado como técnico, um funcionário de carreira preocupado e ocupado com a moralização dos Transportes, com o simpático detalhe de ser marido da cantora Rosa Passos, muito querida em Brasília. Mas as dúvidas começam a incomodar.

Passos se filiou ao PR em 2006 e agora quase tampa o nariz diante do partido. A filiação foi um mero ato oportunista, para lhe garantir espaço vip nos Transportes, feudo dos "republicanos"?

Como secretário-executivo, era o segundo homem na hierarquia e, em tese, tudo passava por ele. Dá para se dizer chocado com o que acontecia sob suas barbas?

Ocupou a vaga de ministro em 2006 e 2010, quando o titular Alfredo Nascimento saiu para disputar eleições. O grosso das liberações e dos desvios não costuma ocorrer justamente em anos eleitorais?

Os leitores estão aflitos, uns, e curiosos, outros. Questionam, como o meu colega Ricardo Melo no quadrado aí de cima: se não viu e não sabia, Passos é incompetente? E, se viu e sabia, é conivente?

Para a cúpula do PR, atingida em cheio pelas denúncias que não param de jorrar dos Transportes e de empresas de filhos e mulheres do seu alto escalão, o problema de Passos não é incompetência nem conivência. É jogo duplo.

Ele caiu nas graças do PR por se filiar ao partido e conviver passivamente com as tramoias durante todos esses anos. Agora cai nas graças de Dilma por virar informante?

Quem serve a dois senhores acaba se queimando com ambos. O PR riscou o fósforo, alertando que Passos pode usar a vassoura, mas varrendo a sujeira para debaixo do tapete. Dilma, porém, é quem tem o maçarico e exige faxina bem feita. Se falhar, o varrido -e esturricado- vai ser o próprio Passos.

PS - Um must: Lula, do congresso chapa-branca da UNE para o jatinho de um mandachuva do... PR.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Como matar baratas:: Fernando de Barros e Silva

Cada vez que uma barata surge na sua frente, Dilma Rousseff não pestaneja -dá-lhe logo uma chinelada mortal.

Tem sido assim há duas semanas, desde que vieram à tona os escândalos no Ministério dos Transportes. Diante das denúncias de cobranças regulares de propinas e obras superfaturadas, a presidente já no dia seguinte acertou quatro. Entre eles, Luiz Antonio Pagot, o poderoso diretor-geral do Dnit.

Três dias depois foi o próprio ministro Alfredo Nascimento quem recebeu uma sapatada e caiu. Anteontem, a presidente se viu obrigada a tirar o calçado pela terceira vez para acertar mais dois.

Um deles, José Henrique Sadok, braço direito e substituto interino de Pagot no Dnit. Soube-se que sua mulher, dona de empreiteira, recebeu R$ 18 milhões em contratos com o órgão que o marido chefiava.

O outro a cair era uma espécie de assessor fantasma da direção do Dnit, onde estava a serviço do deputado Valdemar Costa Neto. Pagot o chamou de "boy" e de "estafeta".

Em todos os casos, Dilma agiu com rapidez e determinação, coisa que Lula jamais fez. Mas Dilma, em todos os casos, só mostrou o chinelo depois que a imprensa trouxe à luz as baratas. Ela pisa e torce o pé, mas a reboque do noticiário. Sua ação saneadora é tão veemente quanto pontual e limitada.

Dilma talvez gostasse de realizar o desejo da personagem de Clarice Lispector no famoso conto: "Agora eu só queria gelidamente uma coisa: matar cada barata que existe". Mas ela sabe que não tem condições de dizer: "Esta casa foi dedetizada". Com o ninho, destruiria os alicerces do sistema que a sustenta.

Os gestos de repulsa à corrupção são, em grande medida, responsáveis pelo acolhimento da presidente nas classes médias mais ou menos alérgicas ao PT. Mas é essa mesma intransigência que mantém as baratas de antenas ligadas, desconfiadas do estilo da nova dona da casa. Não está claro ainda o desfecho da luta de Dilma com suas baratas.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Dilma roda o mesmo filme de Lula:: Elio Gaspari

O primeiro grande escândalo do governo Lula estourou em fevereiro de 2004, 13 meses depois de sua posse. Custou o cargo a Waldomiro Diniz, subchefe da Casa Civil de José Dirceu. Ele fora filmado num achaque ao tempo em que dirigia as loterias do Rio de Janeiro. Até o dia em que deixou o Planalto, em janeiro passado, Nosso Guia foi perseguido por escândalos que se sucederam em intervalos regulares.

O governo Dilma Rousseff foi mais veloz. Seu primeiro escândalo estourou cinco meses depois da posse e custou o cargo ao chefe da Casa Civil, Antonio Palocci. Um mês depois, Dilma perdeu o ministro dos Transportes e o diretor do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes, o Dnit. (Em julho de 2003, quanto Lula tinha sete meses de Palácio, o mesmo Dnit deu-lhe uma pequena crise, com o ex-diretor financeiro acusando o ministro Anderson Adauto de favorecer a empreiteira Queiroz Galvão e sendo acusado de embolsar propinas.)

Deixando-se de lado o varejão da roubalheira, onde ficam contratos de serviços, de publicidade, ou despesas com cartões de crédito, mordomias e viagens, a crônica de nove anos incompletos de governo petista revelam que há nele uma engrenagem blindada, metódica e articulada de corrupção. Não há novos escândalos, há apenas novas erupções, beneficiadas por uma rotina em que uma crise só se exaure quando é substituída por outra, na qual estão personagens que passaram despercebidos na anterior.

O centro dessa rede fica no Palácio do Planalto, ora na Casa Civil, ora na coordenação política e sempre na coleta e repasse de doações. Quando Waldomiro Diniz foi apanhado, pouca gente sabia quem era Delúbio Soares. (Em janeiro de 2003, o tesoureiro do PT organizou uma festa numa fazenda de Buriti Alegre. Entre os convidados estava o deputado Valdemar Costa Neto, do PR, atual marquês do Ministério dos Transportes.)

Desde fevereiro de 2004 sabia-se que Delúbio pagava mesadas a deputados do PTB. Entre a crise de Waldomiro Diniz e a seguinte, com o vídeo de um pagamento de propina a um diretor dos Correios, passaram-se 15 meses. Bastaram mais quatro meses para que daí surgisse a palavra que mudaria a história do PT e do comissário José Dirceu: "mensalão".

O novo escândalo expôs o loteamento, pelo Planalto, de cargos nos Correios, Banco do Brasil, Instituto de Resseguros do Brasil, Furnas, bem como a manipulação, pela Casa Civil, dos fundos de pensão de estatais. Nos governos anteriores aconteceram episódios semelhantes, mas não tiveram a articulação e a blindagem conquistada pelo comissariado. Trinta e dois parlamentares acusados de ter participado do "mensalão" e de roubalheiras nas verbas da saúde tiveram um crescimento patrimonial de 32% entre 2002 e 2006.

O "mensalão" ainda não saíra no noticiário quando puxaram-se as pontas da administração do ministro da Fazenda, Antonio Palocci, na Prefeitura de Ribeirão Preto. Era mais do mesmo. Negociando contratos de loterias na Caixa Econômica, Waldomiro Diniz propusera a empresários o serviço da consultoria de Rogério Buratti, ex-secretário de governo de Ribeirão, ex-sócio do chefe de gabinete do ministro da Fazenda. Incriminado por Buratti, Palocci agonizou durante um ano. Trazido de volta ao Planalto por Dilma, aguentou 23 dias de crise e saiu de cena sem contar quem eram os clientes que o tornaram milionário.

Burattis, Waldomiros, Delúbios, Erenices e até mesmo Pagots foram peças acessórias de uma máquina. Isso pode ser entendido quando se vê como saíram de cena. Delúbio, reintegrado recentemente à família petista, ensinou: "Faz parte da minha integridade não delatar ninguém". Na semana passada, o doutor Luiz Antonio Pagot fechou suas oito horas de silencioso depoimento com uma frase: "Sou um leal companheiro".

O escandaloso enriquecimento de Palocci foi substituído pelas propinas do Ministério dos Transportes. Como acontece desde o caso de Waldomiro Diniz, será esquecido, diante do próximo.

Come-se e bebe-se

Há breves episódios que contam tudo. Faz pouco tempo, o deputado Eduardo Cunha (PMDB -RJ) casou a filha com uma festa para mil convidados nos salões do Copacabana Palace. Na terça-feira a base aliada do governo organizou dois eventos.

Num, as lideranças do PMDB e do PT comeram um bolo (horrível) de nozes simbolizando o amor que os une. Noutro, o PR manifestou seu desconforto com a faxina na área dos transportes recusando-se a comparecer a um almoço de próceres governistas. No dia seguinte foram todos ao Alvorada, para um coquetel com a doutora Dilma.

Manuel Bandeira sabia de tudo:

"Os cavalinhos correndo,

E nós, cavalões, comendo."

A conta da base

De uma víbora:

"O Planalto pode resolver todos os problemas de contabilidade de sua base, mas não vai fazê-lo.

Para resolver, basta dizer ao sujeito que está pedindo cem que se contente com dez. Ele dirá que não aceita e ameaçará romper com o governo. Uma semana depois estará de volta, aceitando os dez. Se o governo oferecer cinco ele fecha negócio. Para que esse mecanismo funcione, o cidadão jamais poderá argumentar que a banda petista recebeu os cem que pedia em outro balcão. Como esse argumento continuará de pé, o Planalto irá de crise em crise. Não se esqueça que ninguém do PR ou do PMDB defendeu a entrada do BNDES no negócio do Pão de Açúcar/Carrefour."

Avatar

Pelo andar da carruagem, o Palácio do Planalto começou a ficar pequeno para Dilma Rousseff e o secretário-geral da Presidência, Gilberto Carvalho. Se o problema fosse só esse, a solução seria simples, mas Carvalho é um avatar, de Lula.

Partir para cima

O repórter Ilimar Franco narrou uma cena ocorrida na sala da Câmara em que depunha Luiz Antonio Pagot, ex-diretor do Dnit, depositário de esperanças e segredos de petistas e empreiteiros. O líder do PT, Paulo Teixeira, aproximou-se do deputado Anthony Garotinho (PR-RJ) e disse-lhe: "Vê lá o que você vai falar aí. Não vai vir com essa história de mensalão de novo, se não a gente vai partir pra cima de você".

Madame Natasha

Natasha tem carinho pelo uso do idioma a serviço das boas maneiras. A senhora incomoda-se quando vê mensagens eletrônicas de pessoas que não conhece, encerrando o texto com um seco "aguardo retorno", ou numa versão mais radical, "aguardo pronto retorno". Ela acredita que o "aguardo" pode ser usado em relações hierárquicas e funcionais. Fora daí, conviria usar o velho e bom "agradeço o retorno".

Os papéis de 1961

A morte do almirante Faria Lima, que passou pelo governo do Rio e pela presidência da Petrobras como exemplo de honorabilidade, poderá liberar um tesouro.

Em 1961, quando o país esteve à beira da guerra civil, durante a crise resultante da renúncia do presidente Jânio Quadros, Faria Lima era subchefe do Gabinete Militar. Na ocasião, o vice-presidente João Goulart estava no exterior e os ministros militares não queriam empossá-lo.

Foi montada uma operação que grampeou os telefonemas dados a Jango por aliados como Juscelino Kubitschek e Tancredo Neves. As degravações dessas conversas foram conservadas pelo almirante. Em 1986 ele contou que ainda as guardava consigo, mas não os mostrava: "É coisa para meus netos".

FONTE: O GLOBO

O que os vizinhos pensam do Brasil :: Sergio Fausto

O protagonismo do Brasil na América do Sul não é uma questão de escolha. Tornou-se um dado da realidade, com o declínio relativo da Argentina e a perda de influência dos Estados Unidos na região. Deve até aumentar no futuro previsível, dadas as tendências expansionistas da economia brasileira. A questão é saber se esse protagonismo se traduzirá em liderança e se ela será positiva para a região em seu conjunto.

Em síntese, essa foi a visão da maioria dos líderes políticos sul-americanos presentes em mesa-redonda organizada recentemente pelo Instituto Fernando Henrique Cardoso (iFHC) para discutir o papel do Brasil na América do Sul. Participaram da discussão o ex-presidente da Bolívia Carlos Mesa, o senador chileno e ex-chanceler Ignacio Walker, a senadora uruguaia Constanza Moreira, o ex-ministro da Justiça do Peru Fausto Alvarado, além de vários brasileiros, como os embaixadores Sergio Amaral e José Botafogo Gonçalves e o ex-chanceler Celso Lafer. Uma amostra representativa da centro-esquerda democrática sul-americana.

Apesar de uma percepção em geral positiva sobre o Brasil, detectam-se incerteza e mesmo inquietude em relação ao "gigante sul-americano".

Existe receio de que a expansão das exportações e dos investimentos brasileiros em outros países da América do Sul prejudique a capacidade de produção e geração de empregos de suas economias. E que isso leve mais água para o moinho de governos, partidos e/ou movimentos adeptos de um nacionalismo retrógrado com inclinações populistas e autoritárias. Em países menores, sobretudo naqueles onde há ressentimento histórico em relação ao Brasil, como a Bolívia e o Paraguai, é bem vivo o temor de que o extravasamento da economia brasileira acabe por levá-los a uma situação de subordinação política ao colossal vizinho. Mesmo no Uruguai, o mais desenvolvido dos pequenos países fronteiriços, observa-se um incipiente nacionalismo antibrasileiro, em reação à compra de terras em quantidade crescente por empresas brasileiras naquele país.

Algumas características do investimento brasileiro na região reforçam o sentimento descrito. O fato de grandes companhias brasileiras receberem apoio do BNDES para a aquisição de empresas locais acentua a percepção de que nosso país conta com um poder excessivo, derivado não apenas do porte e da eficiência de seus maiores grupos empresariais, mas também da estreita associação entre eles e o Estado brasileiro. A propósito, em entrevista recente ao jornal Valor Econômico, o presidente da União Industrial Argentina afirmou, com exagero característico: "Só quando tivermos um BNDES poderemos abaixar a guarda".

A reação à crescente presença brasileira na América do Sul poderia ser atenuada se fossem os investimentos feitos em parceria com grupos locais, mas as joint ventures são raras, predominando o controle do investidor brasileiro sobre o negócio. São raros também os fornecedores locais que se beneficiam dos empréstimos concedidos pelo BNDES a governos vizinhos, em financiamentos vinculados ao pagamento de obras e serviços realizados pelas grandes empreiteiras brasileiras nos países da região.

Em suma, à constatação de assimetria na relação com o Brasil soma-se o sentimento de que se está diante de uma competição desleal contra um poder cujo funcionamento parece opaco. De fato, não há nada similar na região à aliança entre grandes grupos empresariais privados, fundos de pensão públicos, empresas estatais e banco de desenvolvimento. Com frequência o investimento e o crédito chineses surgem como alternativas bem-vistas diante do temor de se tornar muito dependente do Brasil, apesar de as relações entre Estado e empresas serem na China muito mais opacas do que aqui.

Além de pouco transparente, o Brasil é visto como "soberanista", isto é, relutante em ceder parcelas de sua autonomia decisória em benefício do fortalecimento de instituições de governança coletiva da região. Desse "soberanismo" faria parte a resistência a pagar o custo financeiro, em favor da integração, correspondente ao tamanho de sua economia, como a Alemanha na Europa.

O Brasil é também considerado ambivalente quanto à importância que sua política externa atribui à região. Embora a centralidade da América do Sul esteja claramente definida no discurso, resta muita dúvida sobre se o Brasil de fato considera que o fortalecimento de sua liderança regional é mesmo necessário à realização de suas ambições como global player. Critica-se o governo brasileiro por supostamente não consultar os governos sul-americanos antes de tomar iniciativas no plano internacional, ao mesmo tempo que invoca a sua condição de líder regional quando lhe interessa fazê-lo nas negociações internacionais.

É nítido o contraste entre a percepção de que o Brasil é autocentrado e até certo ponto voraz em relação aos vizinhos e a opinião que no geral se tem aqui dentro a respeito da atitude do governo brasileiro em relação à região, normalmente percebida como muito generosa com as demandas de alguns países e tolerante com eventuais desmandos contra empresas brasileiras que operam na vizinhança.

Para o Brasil, não se trata, é claro, de moldar o figurino de sua política externa sul-americana à opinião média de seus vizinhos, que, aliás, varia de país a país. Trata-se, isso sim, de constatar que nos faz falta - na sociedade e no governo - um pensamento sobre a América do Sul que leve na devida conta a percepção dos outros países da região a nosso respeito, sem perder de vista os interesses brasileiros. Precisamos de uma visão abrangente e de longo prazo, que não se deixe levar por simpatias ideológicas episódicas nem por ilusões de que o peso econômico do Brasil se traduzirá automaticamente em maior liderança política. À medida que cresça a nossa presença na região, essa visão será cada vez mais indispensável.

Diretor executivo do IFHC, é membro do GACINT-USP

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Lula recorre a FHC para montar memorial

Instituto que petista quer criar será em SP e vai ter acervo sobre ditadura e redemocratização

Roldão Arruda

Planejado inicialmente para abrigar o acervo dos dois mandatos presidenciais de Luiz Inácio Lula da Silva e contar a história do primeiro governo petista no País, o memorial que o Instituto Cidadania planeja erguer nos próximos anos começa a ganhar contornos mais precisos - e ambiciosos. Curiosamente, representantes de Lula visitaram recentemente o Instituto Fernando Henrique Cardoso, em São Paulo, e conversaram com o ex-presidente tucano - a quem Lula atacou sucessivas vezes quando presidente, apesar de terem atuado juntos pela redemocratização do País. O objetivo foi conhecer a estrutura daquela entidade, tanto do ponto de vista da organização do acervo quanto da estrutura jurídica.

Já está praticamente acertado que o Memorial da Democracia, nome ainda provisório da instituição que abrigará o acervo de Lula, deve abranger a história dos movimentos e das lutas sociais desde a Proclamação da República, com ênfase na resistência à ditadura militar - especialmente o fim dos anos 70, quando Lula aparece na cena política do País como líder sindical dos metalúrgicos do ABC e se aproxima de FHC.

Ao receber os interlocutores de Lula, o ex-presidente tucano falou de maneira entusiasmada do sistema de organização de documentos adotado no instituto e que demorou quase cinco anos para ficar pronto. O que mais chamou a atenção dos aliados do petista foi a capacidade de produção de estudos, seminários e debates do Instituto FHC.

Em outra vertente, além desse diálogo envolvendo as duas principais referências políticas no recente processo de consolidação da democracia brasileira, já está praticamente acertado que o Memorial da Democracia não será instalado em São Bernardo do Campo, na região metropolitana da capital paulista. Contrariando as expectativas das lideranças sindicais e petistas daquela cidade, o endereço deverá ser algum edifício no centro de São Paulo, na região da Nova Luz.

Vocação. A escolha estaria ligada à vocação da região para se tornar um polo de museus e casas de cultura.

Por ali já funcionam a Sala São Paulo, sede da Orquestra Sinfônica de São Paulo (cujo conselho de administração é presidido por Fernando Henrique), a Pinacoteca do Estado e o Museu da Língua Portuguesa. Também está sendo erguido na região o futuro Teatro de Dança.

Nas conversas com assessores, Lula tem solicitado com insistência que o memorial dê atenção aos espaços interativos, destinados a oferecer aos visitantes a sensação de participação nos eventos históricos. O modelo mais citado é o do Museu do Futebol, realizado pela Fundação Roberto Marinho, com exposições projetadas por Daniela Thomas e Felipe Tassari.

Em uma de suas salas mais concorridas, o visitante parece estar no meio de uma torcida num estádio repleto. Outra referência é o Museu da Língua Portuguesa.

Doações. A forma jurídica da futura instituição ainda está sendo analisada. Já se sabe que aceitará colaborações de empresas e pessoas, a exemplo do que acontece com o Instituto Fernando Henrique Cardoso, uma sociedade civil sem fins lucrativos.

Segundo informações do site oficial da instituição, "as atividades ligadas ao tratamento técnico do acervo presidente Fernando Henrique Cardoso e às suas atividades têm recebido recursos captados ao amparo da Lei Rouanet".

No caso do Memorial da Democracia, Lula também gostaria de associá-lo a alguma instituição de ensino universitário, segundo amigos do petista. Estuda-se até a participação de centrais sindicais em sua estrutura.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

PMDB tenta manter domínio nas cidades

Detentor de 1.239 prefeituras em todo o País, partido se move para não ceder espaço ao PT, que cresce rápido e pode ameaçá-lo em 2012

Christiane Samarco

BRASÍLIA - Acossado pelo poder de fogo do PT, que completa uma década de domínio na política nacional, avança sobre os grotões e trabalha para ampliar o poder nos grandes centros urbanos, o PMDB já começou a se mexer para manter o status de líder em número de prefeitos nas eleições de 2012.

Mais do que um título ou uma soma, o que está em jogo para o PMDB é a "marca" de partido municipalista, de partido com "maior capilaridade" no País.

Desde que bateu recorde na corrida municipal, elegendo 1.256 prefeitos ao final do governo Fernando Henrique Cardoso, o PMDB vem perseguindo esse número. Passou perto em 2008, quando venceu em 1.239 cidades, mas esse total acabou minguando com a migração de alguns quadros para outras legendas. Já o PT, que saiu das urnas com 578 prefeitos nas últimas eleições, só fez crescer de lá para cá - das eleições de 2000 para as 2008, o número de prefeituras do PT aumentou 209%.

"Estão todos dizendo que 2012 é o ano do PT, mas nós ainda não temos uma conta nem fizemos estimativas", diz, misterioso, o secretário nacional de Organização do PT, Paulo Frateschi. Bem diferente do PMDB, cujo presidente e senador Valdir Raupp (RO) apregoa a previsão de manter a marca do partido com 2 mil novo prefeitos e 10 mil vereadores. O líder na Câmara, Henrique Eduardo Alves (RN), aposta na vitória em 1.500 municípios.

A despeito da cautela de Frateschi, o PT está animado com a repercussão do crescimento da votação do partido em pequenas e médias cidades do interior nas eleições do ano passado, quando a presidente Dilma Rousseff ultrapassou a performance do padrinho Luiz Inácio Lula da Silva na reeleição de 2006. "Mas o prestígio que tivemos em nível nacional não teremos, necessariamente, na eleição municipal. E só agora começamos a fazer levantamentos nas capitais e cidades com mais de 200 mil eleitores", pondera o dirigente petista.

Quadro pulverizado. Nos bastidores do PMDB, parlamentares mais experientes reconhecem que não será fácil ir além das 1.250 prefeituras, sobretudo com um quadro partidário cada vez mais pulverizado - e, de quebra, com um cenário marcado pelo fortalecimento de legendas menores, como PSB, PR e PP.

Além disso, o partido entende que agora tem menos instrumentos de ação política do que tinha no governo Lula, pois perdeu ministérios que atuam mais fortemente nos municípios e mantêm contado direto com eleitores das diferentes regiões. É o caso da Saúde e das Comunicações, ambos nas mãos do PT. E os peemedebistas lembram que toda cidade tem sempre uma agência dos Correios, um posto de saúde e uma ambulância, pelo menos.

O PMDB nordestino ainda contabiliza um "prejuízo grande" com a transferência da pasta da Integração Nacional para o PSB. O líder Henrique Alves admite que a transferência foi justa, já que o PMDB só elegeu o governador do Maranhão. Pondera, contudo, que as políticas públicas da Integração, voltadas para esses Estados, davam projeção às ações do PMDB. "Não se trata de manipular os ministérios, mas de dar visibilidade ao PMDB na execução das políticas nacionais", explica. "Só se faz torcida entrando no jogo e só se faz militância mostrando a cara e disputando."

Preocupados com a repercussão dessas disputas na aliança nacional, os presidentes do PMDB, Valdir Raupp, e do PT, Rui Falcão, estão há dois meses conversando sobre 2012. No primeiro almoço para tratar do assunto em Brasília, os dois concordaram que a briga pela Prefeitura de São Paulo é inevitável. "É importante termos isso claro desde já, para ninguém dar caneladas no primeiro turno", observou Falcão.

E é neste contexto que a Fundação Ulysses Guimarães, do PMDB, decidiu tornar obrigatórios os cursos para prefeito e vice-prefeito para quem quiser se candidatar a esses postos. No sistema de ensino à distância, o curso é oferecido em convênios com os institutos e departamentos de Ciência Política das Universidades de Brasília (UnB) e a Federal do Rio Grande do Sul.

O ex-deputado Eliseu Padilha (RS), que comanda a fundação, diz que o curso tem dois objetivos: "Qualificar os candidatos do PMDB e preparar uma nova geração de agentes públicos". Os alunos terão aulas sobre gestão pública, Lei de Responsabilidade Fiscal, normas que regem o orçamento público, as licitações e informações sobre as penas para quem descumpre as regras.

PREFEITURAS

Cidades governadas pelos dois partidos pelo País

Eleições de 2000

PMDB = 1.256

PT = 187

Eleições de 2004

PMDB = 1.070

PT = 414

Eleições de 2008

*PMDB = 1.239

*PT = 578

(*) As totalizações incluem eleições suplementares

Fonte: TSE, sem computar trocas partidárias depois da apuração

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO