terça-feira, 2 de agosto de 2011

Opinião – Luiz Werneck Vianna: a questão nacional

 Com tais registros históricos anteriores, apesar da excitação retórica de alguns debates parlamentares, o tema especificamente agrário, sob a forma com que nos retorna no projeto atual de reforma do Código Florestal, consiste numa forte evidência de como e quanto, nestas duas últimas décadas, foram domesticados conflitos que antes estiveram no limiar de conhecer desenlaces dramáticos. Com efeito, a própria inversão de papéis no contencioso agrário de agora é o melhor indicador do novo estado de coisas reinante: a iniciativa política passou para as mãos da grande propriedade, em particular do agronegócio, que se faz representar como portador do interesse geral, garante da expansão da economia e da boa saúde das contas externas do País.

Tal reviravolta, com o resultado inesperado de promover o agronegócio a uma posição de centralidade na chamada questão nacional, tal como sustentam defensores do novo Código Florestal, em detrimento das atividades industriais, que, desde os anos 1930, vinham sendo detentoras desse lugar na imaginação social brasileira, especialmente nas suas correntes de esquerda, mais do que exprimir a sua vitalidade econômica já traduz a sua importância política. Em quase duas décadas de governo de estilo social-democrata, a ala do PT sucedendo à do PSDB, a modernização do campo, contra as promessas de ambos em favor de uma reforma agrária, enveredou na trilha aberta pelo regime militar de favorecimento do agronegócio. O governo do PT instalou seus próceres e os partidos que os representam no núcleo estratégico do seu Ministério, e por pouco um dos empresários mais bem-sucedidos do setor não veio a ocupar, no governo Dilma Rousseff, a pasta dos Transportes — não afeta, por tradição, à cota destinada às elites agrárias.

Luiz Werneck Vianna, professor-pesquisador de PUC-Rio. Os agrários, a questão nacional e os sindicatos. O Estado de S. Paulo, 13/7/2011.

PPS lamenta morte do prof. Joel Teodósio

Perda de um intelectual engajado

Faleceu, no Recife-PE, nesta segunda-feira, dia 1º de agosto, o professor Joel Regueira Teodósio, após longa e delicada enfermidade, oriunda de um AVC. Ex-pró-reitor de Planejamento de Desenvolvimento da Universidade Federal do Rio de Janeiro, na primeira etapa da gestão Aloisio Teixeira, fora também professor titular do Departamento de Engenharia Metalúrgica e de Materiais (DMM), da Escola Politécnica e do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação em Engenharia (Coppe) da UFRJ.
Filho dos doutores Bianor e Naíde Teodósio, nomes de muito prestígio em Pernambuco e em várias partes do país, Joel foi dedicado militante comunista, desde os bancos estudantis, na capital pernambucana, e posteriormente, na capital fluminense, para onde se transferiu logo após o golpe militar de 1964. Filiado ao PPS, com a mudança de nome do PCB, foi seu combativo dirigente, tanto no estadual do Rio, como no Diretório Nacional.
Em meu nome pessoal e no da direção nacional do PPS, desejamos à família enlutada, principalmente aos seus irmãos Marta e Ricardo, aos amigos e companheiros, nossos fraternos votos de muita paz para que possam suportar tão dificil ausência.
Roberto Freire, presidente nacional do PPS

Denúncia contra PMDB tem resposta diferente

Diante das denúncias de que há corrupção no Ministério da Agricultura, comandado pelo PMDB, a presidente Dilma decidiu não agir de imediato, como ocorreu com o PR no Ministério dos Transportes. Mas o PMDB terá de provar que as acusações feitas pelo irmão do líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), são apenas briga interna. O partido vai levar o ministro Wagner Rossi, que nega irregularidades na Agricultura, para se explicar na Câmara. Jucá pediu desculpas a Dilma pelas denúncias do irmão, e ela aceitou

Contra o PMDB, cautela

Jucá pede desculpas a Dilma por seu irmão ter denunciado corrupção na Agricultura

Gerson Camarotti, Cristiane Jungblut e Adriana Vasconcelos

Temerosos de que uma nova avalanche de denúncias recaia agora sobre o Ministério da Agricultura, sob o comando do PMDB, a cúpula do partido e a presidente Dilma Rousseff chegaram ontem a um entendimento: o governo não agirá de imediato como agiu no Ministério dos Transportes, mas dirigentes e líderes do partido precisam provar que as acusações envolvendo o ministro Wagner Rossi (Agricultura) são apenas resultado da disputa interna. E que essa briga seja resolvida o quanto antes, pediu Dilma, sem disposição, no momento, para enfrentar o PMDB.

Ontem mesmo o PMDB decidiu levar o ministro à Câmara dos Deputados, para que ele possa rebater as acusações de Oscar Jucá Neto - irmão do líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR) - de que haveria corrupção generalizada no Ministério da Agricultura. À noite, o Planalto foi avisado por caciques peemedebistas de que a legenda já se acertou internamente. A primeira demonstração foi dada pelo líder Jucá à presidente Dilma, quando ele refutou e condenou as declarações do irmão.

O líder do PMDB na Câmara, Henrique Eduardo Alves (RN), orientou que o requerimento para convidar Wagner Rossi seja apresentado hoje na Comissão de Agricultura:

- O PMDB vai propor que o ministro vá à Comissão de Agricultura e ele já manifestou interesse em ir. É para mostrar que não tem nada a ver, que as acusações não procedem, são absurdas e que foi um comportamento irregular dele (Oscar Jucá Neto) que causou sua demissão - disse Eduardo Alves, que afirmou não acreditar que o episódio prejudique a permanência de Romero Jucá como líder do governo no Senado.

Ontem, a palavra de ordem no Planalto era de "cautela" em relação às novas acusações de irregularidade nos ministérios das Cidades e da Agricultura, comandados respectivamente pelo PP e pelo PMDB. Nas palavras de um interlocutor da presidente Dilma, é preciso ter um pouco de calma, antes de fazer uma "limpeza" ampla.

- O que tiver que ser investigado será. Mas nem todas as denúncias são graves a ponto de demitir todo mundo. Não há devassa e nem caça às bruxas, como já foi dito - resumiu um ministro sobre a disposição da presidente Dilma.

"Meu irmão agiu errado", diz Romero Jucá

Desconfortável após as acusações feitas pelo irmão sobre corrupção no Ministério da Agricultura, Romero Jucá desculpou-se, e Dilma aceitou suas desculpas. No fim da reunião de coordenação, Jucá procurou Dilma e Michel Temer - que indicou o ministro Wagner Rossi - para reiterar que foi pego de surpresa.

- Pedi desculpas por esse absurdo todo. Meu irmão agiu errado e sou solidário ao ministro. Estou no meio dessa confusão apenas por ser parente. Até agora não sei por que ele fez isso. Minha posição é clara, considero que ele agiu equivocadamente. Mas não tenho culpa de meu irmão ter falado besteira - contou Jucá, depois.

O PMDB quer tratar as denúncias do irmão de Jucá como algo de alguém magoado por ter sido exonerado, mas Dilma determinou ontem a Rossi que averiguasse as denúncias de Jucá Neto - após ser demitido do cargo de diretor da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), subordinada à pasta da Agricultura, Jucá Neto disse à "Veja" que a corrupção está espalhada lá.

Num discurso diferente dos demais líderes do PMDB, o presidente em exercício da legenda, Valdir Raupp (RO), defendeu a extinção de alguns órgãos federais, inclusive a Conab:

- Tem alguns órgãos que, se forem extintos, ninguém sentirá falta. É o caso da Conab e outros como a Valec. Melhor seria usar o orçamento desses dois e investir em áreas que mereçam.

À tarde, em coletiva, Rossi voltou a negar as acusações de corrupção de Oscar Jucá Neto e as classificou de "mentiras deslavadas":

- Ele quer pôr todo mundo no mesmo saco. Vou tomar as providências jurídicas no tempo adequado.

Rossi afirmou que havia resistências ao nome de Jucá Neto para o cargo de diretor da Conab, mas que pesou a indicação do irmão:

- Acho absolutamente normal que um irmão peça pelo irmão, mesmo que ele estivesse numa situação de dificuldade. Então, eu respeito nisso uma coisa que, para mim, tem muito valor, que é família. Eu não fiz, não faria, mas respeitei muito esse sentimento de fraternidade.

Rossi disse que a Controladoria Geral da União (CGU) analisa o caso e que a Advocacia Geral da União (AGU) também acionou a Justiça para bloquear a verba repassada irregularmente pelo ex-diretor Jucá Neto a uma suposta empresa de fachada - ele autorizou o pagamento de R$8 milhões de programas de apoio a agricultores para a conta geral da Conab e, em seguida, depositou o dinheiro para uma empresa.

FONTE: O GLOBO

Oposição planeja convocar cinco ministros para depor no Congresso

E também pretende fazer superaudiência pública com órgãos de controle

Adriana Vasconcelos, Cristiane Jungblut e Isabel Braga

BRASÍLIA. Como já era previsto, o governo não terá vida fácil neste segundo semestre legislativo. Pelo menos cinco ministros estão na mira da oposição e podem ser convocados para prestar esclarecimentos no Senado sobre denúncias de corrupção e irregularidades nos ministérios dos Transportes, da Agricultura, de Minas e Energia, do Desenvolvimento Agrário e das Cidades. Na Câmara, o PSDB propõe ainda realização de superaudiência pública com representantes de cinco órgãos de controle para discutir as denúncias.

A audiência pública teria a presença do procurador-geral da República ou seu representante; do diretor-geral da Polícia Federal; do procurador junto ao TCU; de um representante do Ministério Público no DF; e ainda do ministro da CGU, Jorge Hage.

- As irregularidades estão acontecendo. E a oposição vai apoiar todas as medidas no sentido de limpar o Estado brasileiro - disse o líder do PSDB, deputado Duarte Nogueira (SP).

Se não quiserem ser surpreendidos, os governistas terão de se dividir em várias frentes para monitorar a votação dos requerimentos da oposição. O líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP), assegurou que não apresentará dificuldades a convites, desde que os ministros sejam chamados para falar sobre sua área. Ele admitiu, porém, que serão analisados caso a caso. A ida do ministro Paulo Sérgio Passos, por exemplo, passou a ser vista como ponto positivo, para que ele fale das providências nos Transportes.

- Nos Transportes, houve denúncias, e a presidente Dilma tomou uma decisão política de fazer mudanças. Desde o primeiro semestre, a oposição está falando que vai convocar ministros. Não vamos colocar nenhuma dificuldade a convite. Mas que seja para defender as suas pastas - afirmou Vaccarezza.

Já o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), poderá ficar em situação mais delicada quando a oposição tentar votar o requerimento convocando o ministro da Agricultura, Wagner Rossi, para que ele esclareça denúncias feitas por Oscar Jucá Neto, irmão do líder. Após ser demitido da diretoria financeira da Conab, Jucazinho, como é conhecido, denunciou a existência de suposto esquema de corrupção na pasta comandada por Rossi, indicado ao cargo pelo vice-presidente Michel Temer.

Outro assunto que pode dar dor de cabeça ao governo é um requerimento do senador Aloysio Nunes (PSDB-SP) propondo convocar o petista Expedito Veloso, que poderá ressuscitar o escândalo dos aloprados e está na pauta da Comissão de Constituição e Justiça no Senado.

Diante de tantas denúncias, a oposição tentará conseguir mais quatro assinaturas de senadores e chegar às 27 necessárias para criar uma CPI.

FONTE: O GLOBO

Planalto tenta apaziguar ânimos e chama o PR para conversar

"Ideli, tem de liberar isso (emendas) logo", ordena Dilma

Maria Lima, Luiza Damé e Demétrio Weber

BRASÍLIA. Passada a fase mais aguda da faxina no Ministério dos Transportes, a presidente Dilma Rousseff e a ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, entraram em campo ontem para apaziguar os mais raivosos, reduzir prováveis sequelas na base aliada e tentar conter rebeliões em votações importantes nessa volta do Congresso do recesso parlamentar. As duas comandaram reuniões, acenaram com liberação de emendas de parlamentares ao Orçamento e pediram união aos líderes e vice-líderes, especialmente ao comando do PR do ex-ministro Alfredo Nascimento.

Líderes do PR foram chamados ao Planalto para um encontro reservado com Ideli. E os dirigentes do PMDB, receosos de serem o próximo alvo por causa das denúncias de corrupção no Ministério da Agricultura, foram acalmados por emissários da presidente Dilma. Mas foi o PR - que viu o ex-ministro Alfredo Nascimento e mais 21 pessoas ligadas ao partido despejados do setor de Transportes - que cobrou tratamento igual para todos.

Justamente para evitar esse clima na base, provocado pela faxina nos Transportes, é que Ideli chamou o líder do PR na Câmara, Lincoln Portela (MG), e o vice-líder do governo, Luciano Castro (PR-RR). Hoje, Alfredo Nascimento faz o aguardado discurso no Senado, onde reassume seu mandato.

- A reunião foi para fazer um alinhamento depois do que aconteceu. Não adianta querer tapar o sol com a peneira. Há uma preocupação com o PR. O partido foi alvo de todo esse processo. Ela pediu que continuemos unidos. Somos base, continuamos base e vamos tocar a vida - disse Lincoln, salientando que as denúncias envolvendo o Ministério da Agricultura são graves. - A partir do momento em que há uma balança, que ela pese para todos. (...) Que a presidente tenha um só comportamento em relação a todos os ministros.

Na reunião de coordenação de governo, Dilma chamou a atenção de Ideli quando o líder do governo no Congresso, deputado Mendes Ribeiro (PMDB-RS), lembrou que era preciso cumprir o prometido e liberar emendas:

- Ideli, cadê esse negócio das emendas? Você foi lá na Câmara, prometeu, queimou o Marco Maia, que anunciou a votação da emenda 29, e nada? Tem de liberar isso logo!

FONTE: O GLOBO

Investigação do TCU revela descontrole de gastos da Agricultura

Auditoria do tribunal diz que o ministério não fiscaliza adequadamente operações milionárias em seus órgãos

Pasta informou que está adotando desde meados de julho procedimentos para melhorar controle das despesas do setor

Breno Costa

BRASÍLIA - Novo foco de acusações de corrupção no governo, o Ministério da Agricultura, comandado pelo PMDB, não exerce controle adequado sobre operações milionárias, abrindo brecha para desvios de verba, revela auditoria do Tribunal de Contas da União.

A investigação, aprovada em junho pelos ministros do tribunal, foi realizada no ministério e em órgãos a ele vinculados, como a Conab (Companhia Nacional de Abastecimento).

"[Verifica-se] a inexistência de uma sistemática efetiva de controles internos no ministério, o que se mostra temerário por tratar-se de um órgão que exerce a fiscalização de transações de grande valor econômico, com poderes de aplicação de multas, apreensão de mercadorias, interdição de estabelecimentos", diz o relatório.

O ministério é comandado desde abril de 2010 por Wagner Rossi (PMDB-SP), indicado ao cargo pelo vice-presidente Michel Temer (PMDB).

Rossi, também por indicação de Temer, presidiu a Conab de junho de 2007 a março de 2010, antes de assumir o ministério. Ele também já havia sido responsável pela gestão do porto de Santos.

O ministério foi alvo recente de ataques do ex-diretor financeiro da Conab Oscar Jucá Neto, irmão do senador Romero Jucá (PMDB-RR), líder do governo no Senado.

Em entrevista à "Veja", Jucá Neto diz que no ministério só há "bandidos" e insinua que Rossi tentou oferecer dinheiro para que ele ficasse calado após deixar o cargo.

Rossi diz que a acusação é infundada e decorre de sua demissão (leia texto na pág A6). Jucá Neto foi exonerado após a revelação de que ele ordenou o pagamento de R$ 8 milhões a um armazém em nome de laranjas.

O mais grave dos problemas apontados pelo TCU envolve as fiscalizações do ministério e da Conab. Cabe a eles fiscalizar estoques privados de alimentos, além de condições sanitárias e processos de importação e exportação de alimentos.

Dependendo da situação encontrada, os órgãos podem aplicar multas ou determinar outras sanções. Só neste ano foram arrecadados R$ 17,6 milhões em multas.

"A insipiência na área de controles internos do ministério é particularmente preocupante no que se refere a atividades de fiscalização, em que existe contato direto entre servidores do ministério e os fiscalizados", diz o relatório da auditoria.

Outro problema ocorre nas liberações de créditos do Funcafé (Fundo de Defesa da Economia Cafeeira), que tinha R$ 2,1 bilhões de recursos para a safra 2010/2011.

Ainda hoje não há um sistema informatizado para controle das operações do fundo: tudo é feito manualmente, aponta o TCU.
Também foram constatadas falhas na emissão de laudos de perdas agrícolas, que servem de base para a liberação de pagamentos do seguro rural para produtores.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Fala de Nascimento na volta ao Senado preocupa Planalto

Ex-ministro reassume mandato de senador e diz a aliados que ligará gastos da pasta à disputa presidencial em discurso

Ministros chamaram integrantes do PR para reunião e pediram que senador evite colocar "gasolina na fogueira"

Catia Seabra, Gabriela Guerreiro e Maria Clara Cabral

BRASÍLIA - O ex-ministro dos Transportes e senador Alfredo Nascimento (PR-AM) avisou a aliados que, no discurso de hoje em retorno ao Senado, associará o aumento de gastos da pasta com obras do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) à corrida presidencial de 2010.

Magoado com a "fritura" a que foi submetido na pasta, contou a parlamentares que dirá que a previsão de gastos do PAC com obras de transportes subiu R$ 16 bilhões no ano da disputa presidencial.

Ele lembrará que a responsabilidade inicial pela coordenação do programa era da presidente Dilma, que antes era chefe da Casa Civil.

Nascimento deixou o cargo em julho diante de suspeitas de irregularidades na pasta. Mais de 20 pessoas foram demitidas, a maior parte ligada ao PR, seu partido.

Ele contou a aliados que hoje irá listar os Estados em que houve inclusão de mais obras no PAC. Deve citar como exemplos São Paulo, Minas, Paraná e Santa Catarina.

Segundo integrantes do PR, ele dirá que, coincidentemente, são Estados onde Dilma enfrentava maior dificuldade eleitoral. A Folha apurou que esta correlação será apenas insinuada.

Ministros do Planalto chamaram ontem à noite integrantes do PR para conversar. Pediram que convençam Nascimento a não jogar mais "gasolina na fogueira". Hoje, haverá uma outra reunião.

Mas Nascimento prometia ser duro. Disse a correligionários que vai declarar independência do governo e que acha "ótima" a ideia de CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) nos Transportes.

Defenderá seu filho, cuja evolução patrimonial é alvo de investigação, e repetirá que o atual ministro e ex-secretário-executivo, Paulo Sérgio Passos, estava à frente do ministério quando houve maior volume aditivos em contratos.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Filha de superintendente ganha promoção no Dnit

Sebastião Ribeiro, responsável pelo órgão no Piauí, é pai de Thame de Castro Ribeiro, nomeada em meio à crise para vaga na Diretoria Executiva

Mayara Martins

TERESINA - Poucos dias antes de o ex-ministro dos Transportes, senador Alfredo Nascimento (PR), entregar sua carta de demissão à presidente Dilma Rousseff, a filha do superintendente do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) do Piauí, Sebastião Ribeiro, assumiu um cargo na Diretoria Executiva do órgão, em Brasília.

A engenheira civil Thame de Castro Ribeiro foi alçada à função de coordenadora-geral de Custos de Infraestrutura da direção do Dnit, responsável pela análise dos custos de projetos para a liberação de recursos.

O Dnit no Piauí firmou nos últimos anos contratos milionários com a Construtora Jurema, empreiteira que pertence à família do deputado Marcelo Castro (PMDB-PI), tio de Thame e cunhado do superintendente do órgão no Estado. Ribeiro foi indicado para o cargo pelo cunhado peemedebista.

De janeiro de 2009 até 30 de junho deste ano, a empreiteira recebeu pelo menos R$ 55,5 milhões do Dnit, sendo R$ 36 milhões somente em 2010 e R$ 5,5 milhões em 2011. No período, foi a segunda empresa com contrato com o Dnit-PI que mais faturou, ficando atrás apenas da Construtora Delta (R$ 112,9 milhões). Conforme registro na Junta Comercial, a Jurema está em nome de João Costa e Castro e Humberto Costa e Castro, irmãos do deputado.

A Superintendência do Dnit no Piauí é uma das várias regionais do órgão no País que estão sob investigação. No Estado, o Ministério Público Federal (MPF) instaurou pelo menos seis processos, entre ações civis públicas e autos administrativos, questionando obras realizadas pela Superintendência Estadual. As investigações buscam constatar a existência de irregularidades em licitações de obras em estradas.

Antes de assumir o novo cargo de coordenação, Thame de Castro ocupava o posto de coordenadora-geral de Desenvolvimento e Projetos da Diretoria de Planejamento e Pesquisa no Dnit, em Brasília. Ela pertence ao quadro permanente, como analista de infraestrutura, e ganhou nova função de confiança. Sua nomeação foi confirmada em portaria publicada no dia 22 de junho.

Defesa. O Dnit do Piauí divulgou nota em que afirma que o contrato com a Jurema se encerra em dezembro deste ano e a empresa tem um saldo a ser faturado de R$ 3,3 milhões, num total faturas de R$ 337,6 milhões. Ao Estado, Ribeiro admitiu que assumiu o cargo de superintendente por indicação do deputado Marcelo Castro e confirmou que a construtora da família do cunhado venceu duas licitações durante sua gestão, iniciada há oito anos.

"Se a lei dissesse que, se eu fosse chefe, a empresa não poderia entrar (na concorrência), ou eu não aceitava (o cargo) ou a empresa não entrava", disse. "Toda indicação de superintendente é uma indicação política. É uma coisa normal."

Conforme o superintendente, a Jurema foi vencedora dos editais para obras de restauração e manutenção da BR-343 por apresentar menor preço. Ele também se defendeu afirmando que o processo licitatório foi concluído em Brasília. "As licitações foram acompanhadas pela Procuradoria Federal Especializada junto ao Dnit."

Ribeiro contestou as suspeitas de irregularidades e disse que encaminhou ao MPF a relação de todas as licitações da regional do órgão. Ele defendeu a filha, observando que ela é funcionária de carreira e assumiu o cargo de confiança por "mérito". "Como um superintendente do Dnit que não é do PR pode indicar a filha?", questionou.

Thame de Castro foi procurada na Diretoria Executiva do Dnit em Brasília, mas não respondeu à ligação da reportagem.

 Colaborou Eduardo Kattah

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Siglas temem que prévia contagie eleição

Para especialistas, temor com consequências da disputa interna e falta de tradição no Brasil explicam indefinições sobre tema no PT e PSDB

Julia Duailibi

A pouco mais de um ano das eleições municipais, PT e PSDB estão em polos distintos, e com papéis inversos, ao criticarem ou defenderem as prévias para a escolha do candidato a prefeito de São Paulo.

O uso das prévias para definir o nome que representará determinada legenda numa disputa pode causar rachas internos e levar à derrota na eleição. Na avaliação de especialistas, embora seja um instrumento "saudável" de mobilização, a campanha intrapartidária é arriscada, principalmente para as siglas que estão no poder.

Instrumento tradicional na história do PT, as prévias têm sido criticadas pela cúpula do partido, que quer engavetá-las e emplacar o ministro da Educação, Fernando Haddad, como candidato.

O PSDB, que nunca abriu esse tipo de consulta para os filiados, passou a defender as prévias como o mecanismo legítimo de escolha de seu candidato, num cenário em que não há um nome natural para concorrer à Prefeitura - o ex-governador José Serra tem dito que não pretende ser candidato a prefeito.

"É uma questão muito mais conjuntural do que programática. Quando há um candidato muito forte, a prévia é vista como algo que pode pôr em risco uma vitória quase certa. Quando não tem uma liderança muito clara, a tendência é que se opte pela prévia", afirma o cientista político e diretor do Centro de Pesquisas e Análises de Comunicação Cepac), Rubens Figueiredo.

O cientista político David Fleischer conta uma experiência que teve em Honduras, na eleição presidencial de 1989. "Uns deputados falaram para a gente: "Professor, perdemos a eleição por causa de vocês, americanos". Os consultores aconselharam a fazer prévia. Havia quatro candidatos. Ficou tão dividido que perderam a eleição. O outro partido não fez e ganhou", explica. "É um risco, porém a vantagem da prévia é uma pré-mobilização eleitoral. Isso divulga o partido e mobiliza filiados."

As prévias tornaram-se mais comuns nos países com tradição democrática na segunda metade do século 20. A primeira realizada no Brasil foi em 1982, quando Jair Soares, Octávio Germano e Nelson Marchezan disputaram a indicação para o governo do Rio Grande do Sul, pelo PDS, que dava sustentação ao regime militar. Soares ganhou a indicação e, depois, a eleição.

"É extremamente saudável ter prévia. Mas ela é também uma faca de dois gumes. Se a prévia funcionar como uma cisão, aí o partido, em vez de se fortalecer com a democracia, se enfraquece, porque os grupos não vão unidos para a disputa eleitoral", afirma Figueiredo.

A Justiça Eleitoral considera a matéria uma questão interna dos partidos e não impõe realização de prévias - só determina que o candidato escolhido seja chancelado pelos delegados da legenda, em convenção.

Tradição. A tradição brasileira tem sido o acordo entre os pré-candidatos, promovido pela cúpula partidária. As únicas experiências do PSDB com prévias foram no Acre, nas eleições de 2006 e 2008. Detalhe: tiveram um colégio eleitoral restrito, que contou apenas com uma centena de integrantes dos diretórios estadual e municipal.

O PT promoveu campanhas internas para escolher candidatos a prefeito, governador e presidente em 2002, quando Eduardo Suplicy e um contrariado Luiz Inácio Lula da Silva disputaram as prévias. Com o discurso de que a disputa intrapartidária causa racha, o partido debate agora a reforma do estatuto que prevê limites para o uso das prévias. "O PT não quer mostrar rachas. Por ser governo, quer manter a imagem de partido unido", observa Fleischer.

Em defesa das prévias, o exemplo americano é sempre citado. Para os especialistas, porém, são realidades distintas. "Nos Estados Unidos, a democracia está mais consolidada, o bipartidarismo passa para a sociedade uma noção clara do que representam os candidatos", diz Fleischer.

No Brasil, os próprios líderes partidários admitem que as prévias podem ser manipuladas. "Os candidatos vão usar todo o seu caixa 2 para ganhar as prévias", ironiza Fleischer.

PERGUNTAS PARA...

Edinho Silva, presidente estadual do PT

1. Por que líderes do PT querem evitar prévias?

Temos que trabalhar para o PT se unificar e evitar as prévias, que são um processo de disputa que sempre deixa sequelas. Se for possível construir um ambiente de diálogo que unifique o PT, é mais construtivo que prévia.

2. Isso não vai contra a tradição do partido?

Ninguém é contra a prévia, ela é um dos maiores avanços estatutários do PT. Agora, a prévia é última instância. Se for possível, por meio do diálogo, construir a unidade, é evidente que é a melhor saída.

Pedro Tobias, presidente estadual do PSDB

1.Por que o PSDB resolveu defender as prévias?

Caciques fundadores e respeitáveis já estão morrendo, só sobrou o Fernando Henrique. Eu acho que precisamos acostumar o partido a disputar prévias, ganhar e perder. É saudável. Precisamos democratizar essa decisão.

2.Tem gente que diz ser jogo de cena essa defesa de prévias no PSDB.

Podem achar o que querem, mas estou defendendo em todas as cidades. Para o partido, nós somos passageiros. Mas não é fácil. Quem tem o poder na mão, quem decide, por que vai dividir com a base?

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Limitações:: Merval Pereira

A presidente Dilma começou a utilizar os mesmos métodos que o seu tutor, o ex-presidente Lula, usava quando não queria resolver os problemas. Quando recebeu a denúncia da existência do mensalão, feita pessoalmente pelo então líder do PTB, Roberto Jefferson, o presidente Lula, em vez de acionar a Polícia Federal ou mandar abrir uma investigação através da Corregedoria Geral da União (CGI), pediu que o líder do PT na Câmara, Arlindo Chinaglia, e o ministro das Relações Institucionais, Aldo Rebelo, do PCdoB, investigassem o assunto.

Como era de se esperar, os dois não encontraram qualquer indício do fato, e o assunto morreu até que Roberto Jefferson denunciasse o esquema em uma entrevista à "Folha de S.Paulo".

No caso do Ministério da Agricultura, feudo do PMDB, onde haveria uma "central de negócios" montada sob a chefia do ministro Wagner Rossi, a mudança de estilo em relação às atitudes que tomou contra a "central de negócios" montada pelo PR no Ministério dos Transportes foi significativa.

Até o momento, a presidente Dilma Rousseff vinha sendo mais diligente com as denúncias de corrupção: prometeu uma faxina "sem limites" no Ministério dos Transportes, dominado pelo PR, e garantiu que qualquer denúncia seria rigorosamente apurada.

É verdade que nenhum dos casos envolvendo corrupção naquele ministério foi descoberto pelos órgãos fiscalizadores do governo, embora a Polícia Federal viesse tratando do assunto há muitos meses, já no governo Lula, quando o esquema dos Transportes foi montado.

A inépcia do governo chegou ao ponto de nomear Marcelino Augusto Rosa para coordenador-geral de Operações Rodoviárias do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), ele que já respondia a processo disciplinar da Controladoria Geral da União (CGU), acusado de favorecimento de empreiteiras, e cuja mulher, Sônia Lado Duarte Rosa, representava empreiteiras em grandes obras.

Os dois eram conhecidos em Brasília como "casal Dnit", mas foi preciso que O GLOBO denunciasse o escândalo dentro do escândalo para que Marcelino fosse demitido horas depois de ter sido nomeado.

De qualquer maneira, o governo vinha agindo rápido, até que o PMDB e, mais que isso, um ministro designado pelo vice-presidente Michel Temer entrassem na roda de denúncias.

Ontem pela manhã, na reunião dos líderes do governo, a presidente não se referiu publicamente às denúncias de que haveria um esquema de corrupção e cobrança de propina no Ministério da Agricultura, comandado pelo ministro Wagner Rossi, apadrinhado de Temer.

A denúncia, no entanto, tem a chancela de um Jucá, sobrenome ilustre do governo, dizem os desafetos que de qualquer governo.

Em vez de explicações, a presidente ouviu pedidos de desculpas do seu líder no Senado, Romero Jucá, que chamou as denúncias do irmão, Oscar Jucá Neto, de "besteiras".

A conversa de Romero Jucá com Dilma e Temer aconteceu no final da reunião de coordenação do governo, no Palácio do Planalto. A presidente aceitou as desculpas, assim como o vice Temer, e disse que pediria ao próprio ministro da Agricultura que apurasse as denúncias.

Naquele ministério, segundo as denúncias de Jucazinho, o PMDB montou uma "central de negócios". Seria o mesmo fenômeno constatado no Ministério dos Transportes e que obrigou o governo a fazer a tal "faxina" ilimitada.

Só a postura do governo está sendo diferente. Essa mudança, aliás, já havia sido anunciada dias antes pelo ministro Gilberto Carvalho, talvez o mais ligado ao ex-presidente Lula de todos os remanescentes do antigo governo.

Como se sabe, o ex-presidente Lula vem tentando convencer a presidente Dilma a refrear seu ímpeto moralista em troca da "governabilidade".

A conversa de Carvalho com os dirigentes petistas tinha o objetivo de acalmá-los diante do que se prenunciava uma lavagem generalizada no Ministério.

Ele garantiu que não haverá "caça às bruxas", e nem a presidente se deixará levar por denúncias da imprensa. Mas disse que a corrupção não será tolerada.

Evidentemente tinha que dizer algo parecido com isso, se não, ficaria explícito o recado que ele, implicitamente, levou às lideranças petistas e certamente levará aos demais parceiros influentes da aliança governamental, como o PMDB: o governo não pretende atear fogo às próprias vestes, e, portanto, os aliados terão a garantia de não serem atingidos por "fogo amigo" do Palácio do Planalto.

Mas não é possível controlar o "fogo amigo" vindo de dentro da própria base aliada, ou até do mesmo partido, como é o caso agora de Jucazinho, que, posto pelo irmão num feudo do PMDB, agora está fazendo "besteiras" que colocam o irmão em situação delicada.

Interessante nesse episódio é que Romero Jucá, com todo o seu prestígio, não tenha conseguido proteger o irmão.

Tudo indica que a fase da "faxina" está se dissipando como estratégia de governo, ou pelo menos não será utilizada indiscriminadamente em todos os casos de corrupção que surgirem.

O que reforçará a estratégia da oposição, que pretende desconstruir essa ação governamental mostrando-a como apenas uma jogada de marketing e não uma incompatibilidade desta administração com a corrupção ou a impunidade.

Afinal, se a presidente Dilma era realmente a grande controladora da gestão pública no governo Lula, sabe perfeitamente quem é quem no governo e onde estão os problemas que fazem o Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) não andar.

Ao contrário, as obras tiveram um rendimento menor nos primeiros meses de governo Dilma, piorando o que já era ruim.

FONTE: O GLOBO

Camarote cósmico:: Dora Kramer


Oposição, numa concepção celebrada pelo ex-presidente Luiz Inácio da Silva, é um conjunto de seres mal-intencionados residentes em uma espécie de camarote cósmico de onde observam a cena e torcem impunemente pelo quanto pior, melhor.

No caso de o País afundar, os oposicionistas não teriam o que temer, pois estariam imunes aos efeitos do desastre pela simples razão de que têm posição política, pensamentos e modo diferente de ver as coisas em relação aos que momentaneamente ocupam o poder.

Por essa visão, só governistas vão ao supermercado. Só eles pagam mensalidades escolares, são usuários de serviços, compram roupas, pagam contas de luz, água, gás, condomínio, telefone, TV a cabo e internet.

Outro dia em mais um de seus discursos baseados em argumentos da "quase-lógica do senso comum" apontada já nos primórdios do primeiro mandato pela cientista política Luciana Veiga, Lula exortou a plateia a considerar "mentira" qualquer coisa que digam seus adversários porque, segundo ele, torcem para que a inflação volte furiosa e o desemprego vá à estratosfera.

Desse modo, teriam caldo de cultura para fomentar ambiente desfavorável ao governo e construir um discurso eleitoral eficaz.

Dito assim até faz sentido, mas na prática as coisas não funcionam de maneira tão simples. Às vezes, quanto mais difícil é a situação, mais medo o eleitor tem de mudar o leme de mãos.

Um exemplo disso aconteceu em 1998, quando Fernando Henrique Cardoso se preparava para disputar a reeleição e as crises internacionais sucessivas não apontavam para um cenário eleitoral favorável ao governo. Isso durante os primeiros meses daquele ano.

FH acabou vencendo outra vez em primeiro turno justamente porque o eleitorado preferiu não arriscar, reconhecendo no governo e não na oposição, mais capacidade de lidar com as dificuldades.

Ademais, quando a coisa aperta sobra para todo mundo. Muito mais até para quem porventura venha a suceder a um governo de fracassos, porque perde tempo na reconstrução antes de conseguir começar a realizar.

Se torcida tivesse poder de fazer acontecer, o Plano Real teria dado errado, o Brasil ainda estaria às voltas com a hiperinflação, os mais pobres continuariam a pagar a conta da subida diária de preços e o Brasil ainda estaria condenado ao isolamento mundial.

Felizmente, tudo saiu bem melhor que a encomenda contratada pelo PT quando era oposição. Na época atuava na base do quanto pior, melhor. Essa régua Lula usa para medir seus adversários de novo agora quando retoma a campanha para fortalecer seus partido em 2012 nos municípios e aumentar o capital para disputar com Dilma ou consigo mesmo a Presidência em 2014.

Graças ao fato de que torcida contra não faz verão, o PT pôde governar com relativa tranquilidade, incorporar como suas realizações sedimentadas ao longo dos quase 20 anos desde a redemocratização e até avançar no quesito inclusão social.

Na tentativa de desqualificar o contraditório chamando de "mentirosas" todas as críticas, na prática acusando os adversários do grave crime de lesa-pátria na medida em que seriam todos arautos do caos, Lula falta com a verdade e calunia uma parcela da opinião pública e política do País que, como em toda democracia, exercita a discordância.

Durante seus oito anos de governo e, ao que tudo indica também agora com Dilma Rousseff, o PT teve a oposição mais amena com a qual jamais poderia sonhar. Nem sempre isso funcionou para o bem. Fez mal quando permitiu que se consolidasse a falta de ética como hábito.

Sempre que pôde, o PT zombou da ineficácia, da desarticulação e do medo que os oposicionistas têm da popularidade de Lula e de sua falta de pudor de aniquilar moralmente quem lhe faz oposição em suas diatribes de palanque.

Buscando sempre mostrar que oposicionistas são brasileiros de segunda classe, insidiosos conspiradores a quem a população não deve dar ouvidos, a fim de que não se corra o risco de quebrar a hegemonia das forças representadas pelo PT, PMDB, PTB, PR e companhia, com Lula à frente como se fora o detentor do monopólio do bem.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Planos e obstáculos de José Dirceu:: Raymundo Costa

Após anos de intrigas e disputas encarniçadas, desde que chegou ao poder federal, a corrente Construindo um Novo Brasil (CNB), atual denominação do antigo Campo Majoritário do PT, realizou no último fim de semana um seminário de fazer inveja aos do tempo em que a sigla frequentava o noticiário da política e não o da polícia. Foram dois dias, sábado e domingo, em São Paulo, nos quais reapareceu um José Dirceu menos aflito com os desdobramentos do processo do mensalão e mais preocupado com o projeto político de longo prazo do PT. Uma espécie de reencontro com as raízes.

Dirceu não foi a única surpresa do seminário preparatório do CNB ao Congresso partidário a ser realizado em novembro. Outra foi a decisão da maioria do PT de não acabar com as prévias, como muito cacique andava defendendo nos últimos dias. Mas elas serão restringidas, haverá critérios para se submeter ao colegiado petista a lista dos pré-candidatos. Há tucanos pensando em revitalizar o PSDB, a partir da cidade de São Paulo, por meio de prévia. Não deixaria de ser uma ironia.

Talvez por estar de chegada de um seminário no Uruguai, Dirceu impressionou com um discurso globalizado e defendeu uma articulação dos partidos de esquerda da América Latina. Fez comentários sobre a China - um tanto preocupados -, a crise europeia, especialmente Grécia e Portugal, o desemprego nos EUA e a possibilidade de um calote norte-americano, como se especulava àquela altura.

Dirceu demonstrou um bom conhecimento do governo Dilma, do que está sendo feito e do que se planeja fazer, como deixou claro, em seguida, ao analisar os seis meses da presidente. O ex-todo-poderoso ministro da Casa Civil (sucedido por Dilma) do primeiro governo Lula classificou o governo de Dilma como sendo efetivamente de "continuidade" e se mostrou seguro de que a presidente saberá enfrentar a atual crise internacional como Lula enfrentou a crise financeira de 2008.

Segundo Dirceu, assim como Lula, a presidente Dilma está preparando tudo o que é necessário, para o caso de a atual crise contaminar o Brasil. Mas usou uma imagem curiosa ao tratar dos dois casos: talvez o que fosse necessário para um fazer (Lula), não fosse o mesmo para o outro (Dilma). Dirceu tem razão - o país é hoje muito mais exposto a um eventual calote americano do que aos papéis tóxicos que em 2008 levaram à quebradeira bancária.

Palavras de Dirceu, de acordo com um ouvinte atento, que em outros seminários já havia se desinteressado e deixado de prestar atenção ao que dizia o ex-ministro: assim como o presidente Lula conseguiu fazer com que a crise de 2008 não fosse sentida - ou pouco sentida - a presidente Dilma também vai fazer com que o país se saia tão bem, muito embora as duas crises sejam de natureza diferentes.

Dirceu está com Dilma. E quer que o PT esteja com a presidente. E na atual conjuntura, entende que o partido deve olhar para seu projeto mais duradouro, de longo prazo. O partido já domina com maestria as questões eleitorais. Sabe fazer coalizões eleitorais, às quais era pouco afeito, sabe fazer frente e agora precisa ter um projeto político que tenha mais preocupações filosóficas de longo prazo do que ficar no rame-rame eleitoral.

Em resumo, fechar uma proposta política que compreenda a realidade a que o partido está submetido. O PT teme a adesão em escala, como ocorreu com o PSDB, por exemplo, quando a sigla esteve no poder. São em geral carreiristas pensando em conquistar o poder por meio de uma sigla que se tornou popular, mas não na próxima eleição, nem na seguinte. Mas em 20, talvez 30 anos.

É curioso o desempenho e a atenção que José Dirceu despertou no seminário do CNB. O ex-ministro, na realidade, nunca é personagem ignorado na sigla, mas passou boa parte desses anos, desde que saiu do governo em 2005, alternando momentos de euforia e depressão. Algumas vezes era o Zé Dirceu "arrogante", dono do governo ao qual as pessoas estavam acostumadas. Em outras, queixava-se de que sua simples presença deixava constrangidos velhos amigos. Sábado era o Dirceu das utopias que tanto encantam o PT.

Nos chamados meios jurídicos de Brasília, os advogados que frequentam os tribunais superiores, em sua maior parte, dizem que ele será absolvido no processo do mensalão, por falta de provas, se o julgamento for eminentemente jurídico. É verdade que o procurador-geral da República, Antônio Gurgel, carregou nas tintas nas alegações finais contra Dirceu. O que eram algumas páginas na denúncia do procurador Antonio Fernando - que o classificou de "chefe da quadrilha" -, se transformaram em mais de 100 no parecer de Gurgel.

Gurgel, aparentemente, não tinha saída: havia o parecer de Antonio Fernando, e dias antes dele dera um parecer dizendo que Antonio Palocci não cometera tráfico de influência ao prestar consultorias milionárias, na condição de ex-ministro e de deputado influente no governo petista. Mas ao carregar nas tintas contra Dirceu, contra quem muitos advogados nâo vêem provas concretas, pode ter aberto a porta de sua absolvição e dos outros acusados de integrar a quadrilha do mensalão.

O que não está claro é se será pior ou melhor para José Dirceu ser julgado num ano eleitoral (2011 tem eleição municipal), quando as paixões em geral prevalecem à razão. O certo é que Dirceu tem planos e projetos para o futuro, o que será facilitado por uma eventual absolvição. Caso contrário, alguns juristas acreditam que ele cai na "ficha limpa" e só poderá disputar uma eleição em 2018.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

O câmbio e suas controvérsias:: Luiz Gonzaga de Mello Belluzzo

Entregue às expectativas (como diria?) benfazejas dos mercados, nosso real prosseguiria - se é que não vai prosseguir - em sua trajetória de valorização diante do dólar e de outras moedas. A moeda americana dobra os joelhos sob o peso das injeções de liquidez inoculadas pelo Federal Reserve (para não falar das incertezas desatadas pelo acordo precário celebrado entre democratas e republicanos para encaminhar a elevação do teto da dívida). Desaçaimados em sua incessante busca de rendimentos, entre crispações e redemoinhos, os gestores de portfólios globais aprestaram-se a rearranjar suas carteiras de ativos. No rol dos preferidos, aqueles denominados pela moeda brasileira.

Na semana passada, o governo reagiu de forma mais contundente às ameaças de novas rodadas de valorização da moeda nativa. Como de hábito, em sua caducidade tediosa, renovou-se a discussão sobre a efetividade das intervenções no mercado de câmbio spot e futuros. Desde a desditosa aventura do câmbio semi-fixo dos anos 90, a opinião dos mercados sobre o câmbio reproduz os mesmos argumentos, tão acerbos quanto monótonos. Prodigiosas e religiosas teorias levaram a finança global ao colapso. Mas os autores da façanha não se vergaram ao peso do fracasso. Muito ao contrário. Com fé redobrada, os crentes devotam-se a afastar seus acabrunhamentos. Nessa quadra da vida e nesse espaço do mundo, reconfortam suas certezas com abluções agônicas na liquidez produzida abundantemente pelo Quantitative Easing do dr Bernanke.

Não julgue mal o leitor: os operadores dos mercados de câmbio são obrigados a se refestelar na arbitragem financeira e na especulação de mão única. Contritos em sua crença na infalibilidade dos mercados, os fiéis tomam, sim, decisões racionais no âmbito microeconômico. A racionalidade microeconômica, é verdade, só realiza seus desígnios enquanto mergulhada no "consenso altista" que induz os protagonistas privados a acreditar na valorização continuada da taxa de câmbio. Diria um keynesiano de boa cepa que no mercado de câmbio brasileiro as expectativas altistas são largamente predominantes.

Os servos da Razão engordam seus cabedais à sombra da cumplicidade da consciência ingênua incumbida de desempenhar uma dupla função: a de "naturalizar" o fenômeno da valorização cambial e, melhor ainda, a de suportar os efeitos de uma eventual "parada súbita", sempre acompanhada das desventuras da desvalorização violenta.

As consequências são conhecidas, mas quase sempre ignoradas: os fluxos de financiamento externo dos últimos dois anos e meio constituíram um alentado passivo bruto em moeda estrangeira. Esse passivo - direitos denominados em moeda estrangeira sobre a riqueza e a renda gerada no Brasil - se distribuem entre aplicações de portfólio, empréstimos intercompanhias e endividamento dos bancos e das empresas. Os descuidos da macroeconomia da poupança e do investimento, sem bancos nem finança, ocultam as transformações impostas pelos fluxos de capitais à composição dos balanços das instituições financeiras e das empresas.

As alterações nascem e se multiplicam nos períodos em que o crédito externo fácil e barato faz aliança com uma taxa de juro apetitosa. Salvo nos casos raros de hedge perfeito, não há como neutralizar os efeitos de uma desvalorização mais forte do real nos balanços contaminados pelo "descasamento de moedas". Os surtos eufóricos de liquidez fácil e de endividamento externo - acompanhado de elevação dos preços dos ativos (inclusive do câmbio) - são seguidos de "crises de confiança" e ajustamentos recessivos. Infelizmente, os movimentos de capitais são e sempre foram pró-cíclicos, para desgosto dos que acreditam em Papai Noel ou em modelos mais tolos do que inúteis.

Enquanto seu lobo não vem, as exportações brasileiras de manufaturados se debilita rapidamente. A derrocada exportadora faz parceria com a invasão das importações de produtos manufaturados, prenhes de incentivos e subsídios oferecidos generosamente pelos competidores espertos. Sob as delícias do câmbio valorizado cresce a ameaça da peste holandesa que promete transformar a economia urbano-industrial brasileira em escombros.

Do outro lado do mundo, graças a estratégias eficazes, os chineses não só crescem acima da média mundial, como ainda sustentam o crescimento com o dinamismo das exportações e uma elevada taxa de investimento. O yuan está na alça de mira dos capitais nervosos, mas sofreu lenta valorização nos últimos doze meses, protegido pelas intervenções do Peoples Bank of China que não só compra agressivamente divisas como exerce um efetivo controle e direcionamento quantitativo do crédito. Como demonstra o economista Patrick Artus, as autoridades chinesas conseguem ultrapassar de forma original as contradições entre o movimentação de capitais, a taxa de câmbio administrada e a independência da política monetária.

Eles colhem altas taxas de investimento na indústria e na infraestrutura e rápida escalada no gradiente do horizonte tecnológico. No caso da China, a política de defesa do yuan e a oferta ilimitada de mão de obra barata se juntam para esfolar o que resta das estruturas industriais nos parceiros/concorrentes incautos e desavisados da periferia.

Luiz Gonzaga de Mello Belluzzo, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda é professor titular do Instituto de Economia da Unicamp.

FONTE: VALOR ECONÔMICO