terça-feira, 11 de outubro de 2011

Opinião do dia – Ricardo Noblat : enaltecer ou cobrar?

"O que Dilma Rousseff tem de fato a enaltecer a menos de três meses de completar um ano de governo? A degola de quatro ministros, três deles por suspeita de envolvimento com malfeitos? E mais a troca imprevista de cadeira entre outros dois ministros para não ter que afastar mais um? Ou seria mais razoável nada cobrar de Dilma por enquanto? "

Ricardo Noblat, no artigo, Diga lá, Kassab!. O Globo, 10/10/2011

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO
Verba da Saúde paga pista de skate e vale-transporte
Rio quer R$ 3 bi até 2016 para segurança
Aeroportos privatizados terão 19 bi de investimentos
PMs podem pegar até 40 anos

FOLHA DE S. PAULO
Emenda financia produto hospitalar superfaturado
Promotoria de SP investiga o ex-ministro Antonio Palocci
Presidente deve sancionar aviso prévio de 90 dias

O ESTADO DE S. PAULO
Falta lembrar que só os investimentos geram PIB
Onde o Itamaraty acerta
Polícia Legislativa ou milícia?
Lucro em obra pública

VALOR ECONÔMICO
Cai índice de reajuste de salários
MPs darão incentivos para a cana
State Grid quer o linhão de Belo Monte

CORREIO BRAZILIENSE
Selvageria volta ao trânsito do DF
Ministros do STF condenam tribunal de exceção da Fifa

ESTADO DE MINAS
Juro em baixa é combustível para inflação
Fifa X Brasil: Ministros criticam lobby por tribunais de exceção

ZERO HORA (RS)
Presídio de Caxias expõe “fracasso” do sistema, diz Tarso
Fúria contra a burocracia
Boa notícia

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
Suape na mira do cartel da cocaína
Brasil lidera lista de países que mais combatem a fome

Verba da Saúde paga pista de skate e vale-transporte

Recursos destinados a hospitais são usados em gastos com servidores

Enquanto se discute a criação de um imposto para substituir a CPMF, recursos do Piso Nacional da Saúde, que deveriam ser destinados ao atendimento básico da população, estão sendo usados para custear a máquina pública. Essa verba está pagando despesas administrativas, como auxílio-transporte, planos médicos e odontológicos dos servidores da pasta, o que é proibido pelo Conselho Nacional de Saúde. O dinheiro que deveria ir para os hospitais também está financiando academias de saúde, espaços para atividades físicas espalhados pelo país, com playgrounds, quadras e rampas de skate. Com isso, assim como fazem muitos estados, o governo federal contabiliza como despesas de saúde gastos que, na verdade, deveriam ser custeados por outras áreas.

Saúde paga a conta dos outros

Verbas que faltam ao atendimento básico financiam academias e gastos de custeio

Regina Alvarez

No momento em que se discute a criação de mais um imposto para financiar a Saúde Pública, recursos destinados às despesas com o atendimento médico básico, universal e gratuito à população, em especial às parcelas de menor renda, estão sendo aplicados em outros fins. Assim como estados e municípios, que já foram acusados de maquiar os orçamentos da Saúde, o governo federal também contabiliza no Piso Nacional da Saúde despesas que deveriam ser custeadas por outras áreas e que, em alguns casos, são consideradas ilegais.

Um exemplo emblemático e questionado por especialistas são as duas mil academias de saúde que serão construídas com o mesmo dinheiro que vai para os hospitais públicos - onde pessoas ainda morrem nas filas e falta material.

O Ministério da Saúde reservou no orçamento deste ano R$143 milhões para o projeto das academias. E R$160 milhões na proposta de 2012 dentro do programa de Reestruturação da Rede de Serviços de Atenção Básica de Saúde. Até 2014, a meta é construir quatro mil academias.

Com os recursos do Piso, um orçamento que este ano soma R$71,5 bilhões, o governo federal só poderia custear despesas genuinamente de Saúde, conforme estabelecido na Emenda Constitucional 29, que definiu os gastos mínimos da União, estados e municípios com o setor.

Piso inclui despesas médicas de servidor

Outro dado que chama atenção no Orçamento da Saúde é o peso dos gastos administrativos para custear o funcionamento da máquina pública nessa área. Até setembro, já foram gastos R$5,4 bilhões com "apoio administrativo", a maior parte na sede do ministério, em Brasília, e nas sedes dos órgãos que estão sob o comando da pasta nos estados.

Dentro desses gastos com "apoio administrativo", estão embutidos despesas com assistência médica e odontológica aos funcionários da área e a seus dependentes (R$212,8 milhões), auxílio-alimentação (R$230 milhões), auxílio-transporte (R$50,9 milhões) e até assistência pré-escolar (R$5,9,7 milhões).

O médico Gilson Carvalho, especialista em Saúde Pública e consultor do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde, considera totalmente irregular a inclusão de despesas médicas com funcionários no piso da Saúde.

- Gastos com serviços próprios de saúde com o funcionário é um gasto, além de imoral, ilegal. Nada tenho contra a saúde dos trabalhadores, mas não posso diminuir dinheiro da saúde da população para pagar um sistema próprio de saúde para os trabalhadores. Além disso, tem resolução do Conselho Nacional de Saúde que proíbe isso - destaca o especialista.

Carvalho também considera indevido o piso constitucional custear as despesas com as academias de saúde. O programa é muito parecido com o das Praças do PAC, que tem cerca de R$300 milhões reservados no orçamento do Ministério da Cultura de 2012. Ou seja, as academias poderiam ser custeadas pelo dinheiro do PAC.

- É uma ação que entra no grupo dos condicionantes e determinantes de saúde, e não uma ação específica da Saúde. O papel da Saúde seria cobrar das outras áreas que investissem em academias, esportes e lazer para diminuir o risco de doenças - afirma Carvalho.

As academias são espaços para atividades físicas, esporte, cultura e lazer que o Ministério da Saúde pretende construir em parceria com prefeituras até 2012, com recursos do Sistema Único de Saúde (SUS). O governo alega que as academias são uma grande contribuição para a prevenção de doenças crônicas como diabetes e hipertensão. O desenho das academias prevê construção de playgrounds, quadras poliesportivas e até rampas para skate.

Pela regra do Piso Nacional, o governo deve gastar a cada ano o equivalente ao valor empenhado (contratado) do Orçamento do ano anterior, mais a variação nominal do Produto Interno Bruto (PIB). Como não pode contingenciar os recursos do setor, o governo tem usado a caneta para transferir despesas de outras áreas para o Ministério da Saúde.

Esse é o caso das despesas com os hospitais universitários, vinculados ao Ministério da Educação e que já recebem recursos para o atendimento de pacientes do SUS em procedimentos de média e alta complexidade.

Entretanto, em 2010, decreto presidencial assinado pelo então presidente Lula determinou que as despesas desses hospitais passassem a ser divididas, meio a meio, entre os ministérios da Educação e da Saúde, para custear o programa de Reestruturação dos Hospitais Universitários. Com isso, entre 2010 e 2012 (proposta orçamentária), os recursos destinados a esse programa pelo SUS cresceram 500%, passando de R$99 milhões para R$600 milhões.

O curioso é que o próprio Lula já proibiu essa prática: em setembro de 2005, vetou artigo da Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2006 que permitia o financiamento de despesas dos hospitais universitários com recursos do SUS, alegando que isso acarretaria "diminuição dos recursos destinados ao Ministério da Saúde, colocando em risco a continuidade de ações estratégicas de atendimento à população, como o Programa de Saúde da Família".

Lula destacou no veto que a redução de recursos para a Saúde contraria o espírito norteador da emenda 29, "que prevê anualmente aumentos gradativos de recursos para as ações e serviços públicos de saúde".

O médico Gilson Carvalho destaca que o SUS já paga aos hospitais universitários pelos serviços:

- Não discuto se os hospitais universitários precisam ou não de mais recursos. Provavelmente precisam. O que sou contra, e denuncio há vários anos, é que a União tire dinheiro da Saúde para destiná-lo aos hospitais universitários como um plus.

FONTE: O GLOBO

Greve dos Correios continua sem conciliação; TST julga dissídio hoje

Paralisação dos bancários entra na terceira semana sem sinal de acordo

Geralda Doca, Wagner Gomes e Henrique Gomes Batista

BRASÍLIA, SÃO PAULO e RIO. Terminou sem acordo a terceira tentativa de conciliação do Tribunal Superior do Trabalho (TST) para acabar com a paralisação dos funcionários dos Correios. O ponto da discórdia continua sendo o abono dos dias parados, defendido ontem pelo comando de greve e recusado pela estatal. Diante do impasse, o dissídio coletivo será julgado hoje.

Já a greve dos bancários entra na terceira semana sem sinal de retomada de negociação entre sindicatos e a Federação Nacional dos Bancos (Fenaban). O comando nacional dos bancários vai se reunir hoje em São Paulo.

Segundo interlocutores, a Federação Nacional dos Trabalhadores dos Correios (Fentect) tentava ontem um acordo de última hora para evitar o julgamento do TST - que pode frustrar os anseios dos trabalhadores.

Representantes dos Correios disseram que a empresa já tinha aceitado as duas propostas feitas pelo TST e que fracassaram. A primeira foi aprovada pela Fentect, mas rejeitada pelos 35 sindicatos da categoria. A segunda foi recusada pelo comando de greve na sexta-feira.

Ontem, as assembleias de trabalhadores em Rio, São Paulo e Brasília recusaram as tentativas de acordo apresentadas. No entanto, representantes dos Correios e do comando de greve, além do ministro relator do processo, Maurício Delgado, disseram que estão prontos para entendimento até as 16h, quando começa o julgamento.

A proposta recusada pela Fentect na sexta-feira prevê desconto de seis dias parados entre janeiro e dezembro de 2012 e compensação dos demais aos sábados e domingos até maio; reposição da inflação de 6,87%, reajuste linear de R$60 a partir de janeiro e abono de R$800.

A greve completa 28 dias hoje e provocou o atraso na entrega de 173 milhões de correspondências e encomendas. Em nota, a estatal garantiu novamente que tudo dará certo para o Enem.

Já a paralisação dos bancários entra hoje em sua terceira semana. Segundo a Confederação dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf), pararam ontem 9.090 agências e vários centros administrativos de bancos públicos e privados.

Petrobras apresentará proposta a petroleiros dia 17

O comando nacional dos bancários vai se reunir hoje em São Paulo para definir o rumo da greve. Segundo a Contraf, essa já é a maior da categoria nos últimos 20 anos e caminha para se tornar a mais longa - a de 2010 durou 15 dias. Os trabalhadores reivindicam reajuste de 12,8% (aumento real de 5%).

E embora os representantes dos petroleiros afirmem que vão esperar a proposta da Petrobras no dia 17, sindicatos da categoria começam a planejar uma greve do setor, que deve ser deflagrada depois do dia 21. Líderes sindicais não estão esperançosos: eles pendem reajuste de 17,23% -- IPCA mais 10% de aumento real -, mas a Petrobras e o governo sinalizam que vão apenas repor a inflação, o que já está no contracheque da categoria.

A Federação Única dos Petroleiros (FUP) afirmou por meio de sua assessoria que a maior parte dos 12 sindicatos que a integram já aprovaram indicativos de estado de greve. Por causa disso, a entidade organiza hoje, no Rio, seminário nacional de preparação de greve. O objetivo é discutir formas mais modernas de paralisação, para que sejam efetivas. Nas últimas greves, por causa de ações da Petrobras contra o movimento e de regras para garantir o abastecimento mínimo da população, elas foram pouco sentidas.

FONTE: O GLOBO

Direito de greve

Hélio Schwartsman

SÃO PAULO - Numa sociedade aberta, o direito de greve é assegurado. Pelo menos desde a abolição da escravatura, nenhuma lei ou juiz pode legitimamente obrigar uma pessoa a comparecer ao trabalho se ela não estiver disposta a fazê-lo.

Relativizar o direito de greve é difícil do ponto de vista institucional, pois exige bater de uma vez só contra três garantias fundamentais, que são as liberdades de ir e vir, de se associar e de trocar ideias e opiniões.

É claro que, dependendo do serviço paralisado, pode haver sérios inconvenientes para a população. Saber suportá-los, porém, é parte do preço de viver numa democracia.

Reconhecer essa obviedade não implica que o poder público (ou qualquer outro patrão) não tenha também o direito de tentar minorar o impacto das greves. Descontar dias parados, improvisar trabalhadores substitutos ou recorrer a empresas prestadoras de serviço são alternativas racional e moralmente válidas.

Parte das dificuldades que experimentamos com as paralisações se deve ao fato de que uma combinação de tutelas jurídicas em excesso com os usos e costumes da política conspirou para banalizar e esvaziar as greves. Do lado dos trabalhadores, ficou confortável lançar-se num movimento paredista. Sem maiores consequências sobre os empregos ou contracheques, paralisações prolongadas se tornaram uma extensão das férias. A comparação tem origem insuspeita: Luiz Inácio Lula da Silva.

Do lado do governo, a situação também é capciosa. Se uma parte dos serviços essenciais é mantida, o poder público já não tem necessidade de tratar as negociações com tanta urgência. Assim, não precisa jogar tão duro, evitando uma guerra sem tréguas com os sindicalistas, tradicional base de apoio do PT.

A democracia tem virtudes, mas elas não incluem o dom de eliminar o conflito da sociedade. E, às vezes, a melhor forma de superar um impasse é explicitar esse conflito.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Ministros do STF condenam tribunal de exceção da Fifa

Ministros do STF contra tribunal da Fifa

Proposta de uma câmara temporária de Justiça para tratar dos casos ocorridos durante o Mundial é criticada por integrantes do Supremo Tribunal Federal. Estrutura paralela ao Judiciário está prevista na lei geral do evento, em discussão no Congresso

Vinicius Sassine

"Vai ver eles até pensam em criar um segundo STF, um segundo STJ. É preciso respeitar as instituições pátrias." A opinião do ministro Marco Aurélio Mello reflete um posicionamento corrente no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre os chamados tribunais de exceção, estruturas paralelas de Justiça que a Federação Internacional de Futebol (Fifa) pretende fazer funcionar no Brasil durante a Copa do Mundo de 2014. A proposta, que despertou polêmica na África do Sul durante a Copa de 2010, deverá se repetir no Brasil, a julgar pelo lobby da Fifa e pela disposição do governo federal em ceder à pressão. Na avaliação de Marco Aurélio, os tribunais de exceção não fazem qualquer sentido jurídico. O ministro do STF Gilmar Mendes também sinaliza ser contrário ao projeto: "Poderá ser necessária uma emenda constitucional para a instalação desses tribunais."

O Correio mostrou no último domingo que a Lei Geral da Copa, em tramitação na Câmara, abre brecha para a instalação de juizados especiais, varas, turmas ou câmaras especializadas em atender demandas judiciais decorrentes do evento esportivo. Seria uma estrutura paralela ao Judiciário tradicional, com funcionamento nas 12 cidades sedes da Copa. Assim, litígios decorrentes do evento — de uma simples ocorrência de furto a uma disputa comercial — seriam submetidos a regras diferenciadas. Na África do Sul, a Fifa impôs o modelo, que gerou controvérsias. Um exemplo foi o tratamento jurídico discrepante, dispensado pelos tribunais de exceção instalados em 2010, a turistas brancos e negros.

"Na área administrativa, tudo bem. Mas, no Judiciário, não há como pensar nisso. É uma coisa complicadíssima", afirma o ministro Marco Aurélio. Para ele, é "impossível" imaginar na estrutura do Judiciário brasileiro a instalação de tribunais de exceção durante a Copa do Mundo de 2014. "Como julgador e cidadão, vejo isso como impossível. Já temos uma organização judiciária. Cidadãos já têm seus direitos garantidos na Constituição."

Para o ministro Gilmar Mendes, os tribunais de exceção concorreriam com os juizados especiais já instalados, muitos deles voltados para as questões desportivas. Alguns passaram a funcionar dentro de estádios de futebol, para resolver, por exemplo, conflitos entre torcidas. "Em parte, as demandas da Copa já poderiam ser resolvidas com os juizados especiais. Seriam usados os existentes e outros seriam criados para atender determinadas demandas."

"Republiqueta"

A proposta dos tribunais de exceção é polêmica e, por essa razão, a Advocacia-Geral da União (AGU) não se posiciona sobre o assunto. "A AGU não irá se manifestar neste momento porque o assunto está em debate no Congresso Nacional", diz a assessoria de imprensa do órgão, em resposta ao Correio.

Para o ex-ministro do STF Carlos Veloso, a criação dos tribunais é inconstitucional. "Se o país se submeter ao pedido da Fifa, vamos passar o atestado de republiqueta de banana. Eles não pediriam isso aos Estados Unidos, à França ou à Inglaterra." Uma alternativa para solucionar o volume das demandas durante os jogos, segundo o ex-ministro, seriam as decisões de arbitragem. "É quando as duas partes elegem pessoas que vão formar uma comissão responsável por fazer o julgamento."

A comissão especial que vai analisar o projeto da Lei Geral da Copa será instalada hoje na Câmara

O deputado Otávio Leite (PSDB-RJ) será o representante dos tucanos na comissão. "Os tribunais de exceção são um privilégio jurídico sem exceção na nossa história", diz o deputado, que pediu um levantamento sobre a experiência dos tribunais na África do Sul e sobre a posição da Alemanha — que sediou a Copa em 2006 — em relação à proposta da Fifa.

FONTE: CORREIO BRAZILIENSE

Democracia digital:: Merval Pereira

A democracia digital entrou definitivamente no foco da sociedade brasileira, e nos últimos dias tenho participado de diversos debates sobre o tema, seja pelo lado da transparência e acesso a documentos públicos como parte fundamental desse processo, seja pela utilização das novas tecnologias na difusão de informações e pelas consequências dessa ampliação do debate como geradora de fatos políticos como a Primavera Árabe ou mobilizações populares nos Estados Unidos e no Brasil.

O III Seminário de Comunicação dos Tribunais de Contas do Brasil, que tinha como tema central a divulgação das sessões plenárias, foi marcado pelo apelo dos próprios membros dos Tribunais de Contas dos estados para que a legislação que cria o controle externo dos tribunais seja aprovada pelo Congresso, num momento em que a função do Conselho Nacional de Justiça é questionada pela Associação dos Magistrados do Brasil.

Pressionados pelas dificuldades políticas que traz a fiscalização das obras para a Copa do Mundo e as Olimpíadas do Rio, e certamente prevendo que elas aumentarão à medida que se aproximarem as datas fatais dos eventos, os membros dos tribunais querem o apoio da sociedade para exercer essa fiscalização.

O presidente do Tribunal de Contas do Estado do Rio, Jonas Lopes, disse: "Como órgãos orientadores e fiscalizadores da boa governança, devemos lançar mão das novas tecnologias para tornar mais claro o nosso trabalho e permitir que a população compreenda nosso papel e possa participar conosco dessa tarefa."

O seminário mostrou ainda experiências em vários estados, com destaque para o Mato Grosso, cujo Tribunal de Contas transmite desde 2006, uma vez por semana, suas sessões plenárias, por meio da TV da Assembleia Legislativa.

O conselheiro Antonio Joaquim destacou que a transmissão ao vivo, também pela internet, é uma documentação: como as notas taquigráficas são eletrônicas, os advogados entram na internet e na TV e pegam as informações.

Em São Paulo, foi a vez de debater acesso a documentos públicos na Câmara de Vereadores sob o sugestivo nome de "A era dos dados abertos". O mediador do debate, jornalista Carlos Marchi, chamou a atenção para a importância da abertura dos dados, com informações completas de gastos, salários - este ainda é um ponto delicado nesse processo de transparência - expostas no portal da Câmara de Vereadores, à disposição não apenas dos jornalistas, como também do cidadão comum.

A partir dessas informações, o presidente da Câmara, vereador José Police Neto, afirmou que o objetivo é "produzir conhecimento" e planejar "políticas públicas para beneficiar a sociedade".

Os vereadores Floriano Pesaro e Tião Farias, ambos do PSDB, idealizadores do projeto, veem o uso das novas tecnologias para dar transparência às ações dos vereadores como "uma forma de consolidar a democracia".

Ontem, participei de um almoço no Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri), que se define como um think tank independente e apartidário, criado por um grupo de intelectuais, empresários, autoridades governamentais e acadêmicos, com o objetivo de promover estudos e debates sobre temas prioritários da política externa brasileira e das relações internacionais em geral, presidido atualmente pelo ex-embaixador do Brasil na China Luiz Augusto Castro Neves.

A moderna democracia digital e a mudança de parâmetros que ela trouxe tanto para o cidadão quanto para os governantes foram o centro dos debates no Cebri, tendo destaque o papel dessas ferramentas em episódios como a "Primavera Árabe" e suas implicações políticas.

Sobretudo agora, diante do enfrentamento da polícia no Egito com os cristãos coptas, que traz à tona de novo receios de que grupos radicais possam ganhar espaço na transição democrática. E a possibilidade de que manifestações espontâneas pelo Facebook e pelo Twitter possam ser manipuladas por radicais.

Ela permite que a sociedade acompanhe passo a passo a atuação dos funcionários públicos e, por conseguinte, dos governos como um todo, mas precisa de uma legislação de acesso à informação que defina regras e procedimentos.

Assunto que mobiliza todos os governos, a legislação de acesso à informação pública que deve ser um marco no desenvolvimento da democracia brasileira pode permitir que passemos de uma situação secundária em termos de governos eletrônicos e transparência de dados para uma situação de vanguarda.

O projeto, que já foi aprovado na Câmara e está neste momento preso na Comissão de Relações Exteriores do Senado, é muito avançado.

Apesar de ter iniciativas importantes na área, o Brasil ainda está atrasado. Levantamento feito pela consultoria Macroplan, em parceria com pesquisadores do Instituto Universitário Europeu, mostra o país na 55ª posição no ranking mundial dos governos eletrônicos, com Índia e China.

Publicado pelo Centro Global de Tecnologia da Informação e Comunicação em Parlamentos, das Nações Unidas, o estudo identifica que o Brasil ainda tem um longo caminho pela frente na construção da democracia eletrônica.

O livre acesso à informação pública pressupõe que os sites tenham informações sobre as despesas da instituição apresentadas da maneira mais detalhada e acessível possível.

Os jornalistas são os que menos usam essas informações nos Estados Unidos, porque o que interessa mesmo é o dia a dia dos cidadãos, que começam a se utilizar da legislação para defender seus direitos, os advogados começam a usar, os lobistas começam a usar, enfim, "uma questão de exercício de cidadania".

Essa definição é do professor brasileiro Rosental Calmon Alves, da Universidade do Texas, em Austin, um dos maiores especialistas nas novas tecnologias digitais.

Ele me mandou um recado, a propósito das novas ferramentas tecnológicas e da interação dos cidadãos, a nova sociedade civil global, na definição de outro especialista, Manuel Castells: vai ficar tão fácil votar através dessas novas tecnologias que a pressão pela democracia direta será muito forte nos próximos anos, talvez irresistível.

FONTE: O GLOBO

A quem de direito :: Dora Kramer

O vice-presidente Michel Temer defendeu a ideia na semana passada e o deputado Miro Teixeira, que trabalha nela há alguns meses, começa a recolher hoje na Câmara assinaturas de apoio a um projeto estabelecendo que dois pontos essenciais da reforma política serão decididos em plebiscito: sistema eleitoral e financiamento público de campanhas.

Os dois divergem apenas quanto à data da consulta: Miro acha que tem de ser em 2012 e Temer sugere o plebiscito para 2014. O deputado pretende conversar com o vice-presidente o quanto antes para discutir esse ponto.

Na visão de Miro, a eleição municipal se presta melhor à consulta por se tratar de um pleito mais simples, com dois votos: um para prefeito e outro para vereador.

Na mesma urna, o eleitor seria consultado sobre o sistema que considera o mais adequado: proporcional, proporcional misto, distrital puro, distrital misto ou o chamado "distritão".

Temer chegou ao plebiscito por considerar "muito difícil" que os partidos construam consenso sobre o tema, porque se trata de uma questão "individual, não partidária".

Já Miro vai mais fundo no problema: "É o tipo da coisa que deve ser decidida pelo poder originário. Qualquer sistema que sair do poder delegado, ou seja, o Congresso, será alvo da desconfiança do povo, pois inevitavelmente de alguma forma lhe retira poder".

Um exemplo, na opinião dele, é a proposta de voto em lista, já derrubada pela Câmara na legislatura passada, que mexe no princípio, "inamovível", do voto direto, pois a prerrogativa de escolher os eleitos é transferida para os partidos.

"Não faz sentido os representantes escolherem de que forma votarão os representados. Estes é que devem decidir a maneira mais adequada de se organizar o sistema representativo", argumenta o deputado.

Miro Teixeira fará dois movimentos: nesta semana, começa a recolher as 171 assinaturas necessárias para apresentar o projeto de decreto legislativo diretamente no plenário e, na próxima, apresenta na comissão especial que discute a reforma política na Câmara uma emenda ao relatório do petista Henrique Fontana propondo a consulta popular.

E por que não incluir também no plebiscito outras questões como o voto obrigatório?

Por dois motivos, sendo o primeiro deles tático, para não ampliar demais o universo do debate e aumentar o campo de resistências.

O segundo motivo é que a mudança (ou não) do sistema eleitoral é a base, o ponto de partida, para se estabelecer qual a forma de escolha de representantes parlamentares assegura a melhora do desempenho da política.

"E para isso não há como importar fórmulas. Não há sistema infalível nem regra universal de sucesso. Cada país tem a sua e o povo bem informado sabe perfeitamente decidir. Quando o Collor pediu às pessoas que fossem às ruas de amarelo não precisou de muita explicação nem campanha para que elas saíssem de preto, porque estavam informadas de que o momento era de se manifestar contra a impunidade", diz Miro.

Sobre a outra pergunta do plebiscito (financiamento público ou privado), o deputado vê boa oportunidade de informar o País e levar ao terreno da transparência um aspecto pouquíssimo discutido: a quantidade de dinheiro público já em circulação nos partidos, "um dos melhores negócios da República e que alimenta o surgimento de novas legendas e transações de toda sorte, a maioria escusa".

É na impossibilidade de os políticos explicitarem desconfiança na capacidade popular de resolver essas questões que o deputado aposta para levar adiante o projeto.

Aderir ao plebiscito, Miro não acha que a Câmara aderirá pura e simplesmente, sem boa dose de pressão. Assim como em princípio o Congresso não gostou da Lei da Ficha Limpa, que acabou aprovada por unanimidade.

A solução, na concepção dele, estará na capacidade dos que apoiam a proposta, dentro e fora do Parlamento, de "expor" os políticos a se manifestarem sobre o assunto. "Podem escolher: ou reconhecem a legitimidade do poder originário de decidir ou defendem a ideia de que o cidadão não sabe decidir. Ou seja, não sabe votar".

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

O PMDB de Kassab :: Eliane Cantanhêde

O PT nasceu em 1980 para unir sindicalistas, intelectuais, igrejeiros e militantes de partidos clandestinos na luta contra a ditadura militar e pela justiça social.

O PFL, depois rebatizado DEM, surgiu em 1985 para tentar reaglutinar a direita não corrupta que defendera as Diretas-Já e se opusera à candidatura Maluf à Presidência. O projeto era dar a volta por cima do apoio ao regime militar e representar os interesses do capital (grande, médio e pequeno) nos novos tempos de redemocratização.

O PSDB foi a união de intelectuais com alguns dos melhores nomes do cenário político brasileiro: Franco Montoro, Mário Covas, José Richa... Era a turma cansada do PMDB e contra a potencial candidatura Quércia ao Planalto (que, afinal, só se materializaria em 1994).

E o PSD de Kassab? Surge agora, num momento de política em baixa e políticos sendo execrados, para unir sabe-se lá quem com quem, acomodar descontentes de DEM, PMDB, PTB, PR... sem representar interesses de segmento algum e sem grandes nomes políticos nacionais. Por quê? Não se sabe. Para quê? Suspeita-se.

Lula foi a síntese do PT na sua origem. Jorge Bornhausen, do PFL/DEM. Fernando Henrique, dos tucanos. Talvez a síntese do PSD seja Henrique Meirelles, que tinha jeitão de PFL, elegeu-se pelo PSDB, filiou-se ao PMDB e tornou-se presidente do Banco Central no governo do PT. Qualquer partido serve.

A ambição de Meirelles era, ou continua sendo, ser presidente da República. Ele, porém, topa ser governador, aceita o Senado, contenta-se com a Câmara e acaba de trocar o domicílio eleitoral de Goiás para São Paulo -será para disputar a prefeitura? Qualquer coisa serve.

Inchado, o novo partido tem adesões a mais e ideologia e programa de menos. Está pronto para pular no governo Dilma ou em qualquer outro. O PSD de Kassab começa, assim, exatamente por onde o PMDB acaba.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

PSD vira fiel da balança na Câmara:: Raymundo Costa

O fato relevante da política, na primeira semana de outubro, é a consolidação do PSD como a terceira força congressual. A filiação de Henrique Meirelles, ex-presidente do Banco Central, deu maior estatura à nova sigla, que deixa de ser um agrupamento de deputados pouco conhecidos do baixo clero. Perde o PMDB, porque o PSD zera o jogo político na Câmara, duramente costurado pelo deputado Henrique Eduardo Alves com vistas à eleição da Mesa, em fevereiro de 2013. O vice-presidente da República, Michel Temer, também botou as barbas de molho: o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), mostra que entra com apetite na disputa de 2014. Ele pode ser candidato a presidente ou a vice de Lula ou Dilma.

A semana que passou poderia ser apropriada politicamente pelo senador Aécio Neves (MG), mas o tucano desperdiçou uma longa entrevista ao jornal "O Estado de S. Paulo" com bravatas do tipo que será candidato a presidente, em 2014, independentemente de quem for o nome do PT: Lula ou Dilma. Aécio poderia ter se apresentado como um projeto alternativo de poder, mas ele se limitou a falar do legado de Fernando Henrique Cardoso, coisas de nove anos atrás. A propósito, quem "limou" FHC e o PSDB foi Lula, quando pregou no tucano a pecha da "herança maldita". O PSDB no máximo pode ser acusado de ter se omitido em relação aos ataques de Lula. É possível que Aécio tenha falado para tentar conter o esvaziamento do PSDB - o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, o mentor do PSD, fez uma razia nas bases dos tucanos. Mas já se começa a perder a conta dos "lançamentos" da candidatura presidencial de Aécio Neves.

Partido de Kassab estabelece nova correlação de forças

Com a chegada do PSD, o que muda é a relação de forças estabelecida na Câmara. Durante o primeiro mandato de Lula, o presidente e o PT sempre trabalharam com os partidos menores, inclusive o PSB de Eduardo Campos. Já no final do segundo mandato, Lula - e agora Dilma - permitiu que o líder do PMDB, Henrique Eduardo Alves, comandasse o show na Câmara dos Deputados. É dessa época o acordo entre os dois partidos, PT e PMDB, de revezamento na presidência da Casa. Nesse contexto é que Henrique Eduardo, durante a formação do ministério Dilma, sugeriu que os partidos ficassem com os ministérios de que já dispunham no governo passado. O desenho do novo governo ficou inteiramente desproporcional em relação às forças partidárias no Congresso - o PMDB, na realidade, perdeu espaço. É algo de que Dilma já se deu conta e "pode" se refletir numa anunciada reforma do ministério no fim do ano. Pode porque nem o próprio PMDB acredita.

Reforma, aliás, é modo de dizer, pois na prática ela já foi feita com a substituição de sete ministros, sendo que cinco deixaram o governo (Casa Civil, Transportes, Agricultura, Defesa e Turismo) e outros dois trocaram de posição - Ideli Salvatti deixou a Pesca e foi para o Ministério das Relações Institucionais, antes ocupado pelo deputado Luiz Sérgio (PT-RJ), atual titular da Pesca.

É nesse quadro que entra o PSD como terceira força, "casadinho" com o PSB de Eduardo Campos. Se os dois partidos fizerem um bloco parlamentar, se transformarão, de fato, na segunda potência. Os dirigentes pessedistas afirmam não querer formalizar um bloco, pois isso significaria adesão ao governo, e a legenda planeja uma atuação "independente". O cubo mágico que Henrique Alves montou com certa sofreguidão e às custas do PMDB está novamente com as cores misturadas: o PSD se tornou o "fiel da balança" na Câmara dos Deputados. Pode ser bom também para Dilma, que passa a depender menos das pequenas siglas e das chantagens de setores conhecidos do PMDB. E ela tem boa interlocução com Kassab.

Há um novo quadro político-parlamentar na Câmara e "a tábua está limpa", como avalia-se na cúpula de partidos aliados de Dilma. Além de Kassab, ganha Eduardo Campos, que apostou no empreendimento do prefeito de São Paulo ainda na planta. A sinalização de uma aliança com o PSB, feita pelo governador de Pernambuco, encorajou quem mais tinha a perder ao trocar de legenda, como o governador de Santa Catarina, Raimundo Colombo, que estava no DEM, uma sigla decadente mas tradicional e com tempo de televisão assegurado. E Campos deu uma demonstração recente do que é capaz de fazer para concretizar seus planos na gigantesca operação que desencadeou para eleger a mãe, a deputada Ana Arraes, ministra do Tribunal de Contas da União.

O outro nome que emerge é o do ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles. Como se filiou no prazo final para quem quer concorrer a prefeito, no próximo ano, é possível que tenha recebido alguma garantia de Kassab. O objeto do desejo do PSD é o vice-governador de São Paulo, Guilherme Afif Domingos, mas ele insiste que não é e nem será candidato à cadeira do prefeito. Mas também não é tão simples assim, segundo os bons entendedores da cabeça de Kassab: uma aliança com o PSDB é onde o prefeito mais quer chegar e isso talvez somente seja possível com o nome de Afif Domingos (José Serra também não é candidato à prefeitura). Faz parte do jogo líderes tucanos reivindicarem a cabeça de chapa, para ganhar força quando os dois partidos sentarem para conversar.

Meirelles é uma carta a mais na manga de Kassab. É um nome de peso que junto com o prefeito e Afif dão uma aura liberal ao PSD, o que o partido não tinha quando era apenas uma massa disforme do baixo clero. Antes da escolha de Dilma como candidata, Meirelles foi sondado pelo PIB paulista, em mais de uma conversa ou jantar, para ser candidato a presidente da República. Quando Dilma se consolidou e foi ungida candidata, mudou o foco para a Vice-Presidência da República.

Nesse trajeto foi sondado por pelo menos duas outras siglas interessadas em que ele se candidatasse por elas a presidente - PP e, mais efusivamente, o PTB de Roberto Jefferson. A conselho de Lula, filiou-se ao PMDB. Depois concluiria que havia cometido um erro - quando o PMDB impôs o nome de Michel Temer, o ex-presidente do Banco Central ficou sem muitas alternativas (Iris Rezende o convidou para ser candidato ao governo de Goiás, mas Meirelles ficou reticente - disputaria contra um amigo, o atual governador Marconi Perillo (PSDB).

Resta saber como efetivamente o pêndulo PSD se moverá no Congresso, o que só a prática parlamentar vai revelar.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

A inflação passada e os juros altos :: Yoshiaki Nakano

Toda decisão do Banco Central de aumentar ou reduzir a taxa de juros envolve interesses setoriais. Não é a toa que a decisão da última reunião gerou uma controvérsia maior do que a usual, pois significou uma ruptura com o comportamento passado. Aqueles que fizeram análise defendendo a redução na taxa de juros foram taxados, pelos "sábios" consultores e economistas de bancos, como se eles não tivessem fundamentos em teoria econômica e nos fatos empíricos. Nada mais longe da verdade. Aqui neste espaço o que apontei no mês passado foi uma mudança, na direção correta, no comportamento do Banco Central, baseado na boa teoria e prática das metas de inflação.

Os críticos da decisão do Banco Central apontam que a taxa de inflação medida pelo IPCA estaria aumentando e estão fazendo um estardalhaço com o índice que atingiu 7,31% em setembro e que as previsões para 2011 ultrapassarão o teto. Mas antes de mais nada é preciso lembrar que a redução na taxa de juros, na última reunião do Copom, terá efeitos sobre o nível de demanda agregada e os preços somente nos próximos meses; seus efeitos mais fortes serão sentidos daqui a seis a doze meses.

Portanto, a boa teoria e boa prática recomendam que a taxa de inflação de referência como meta deve sempre ser a inflação prevista para os próximos doze meses, a partir da data da tomada de decisão. Logo, o pré-requisito para implantar um modelo formal de meta de inflação é a existência de algum modelo econométrico transparente e confiável. O que a boa teoria nos diz é que, na ausência desse modelo, é melhor não adotar um modelo formal e rígido de metas - é o que recomenda um dos maiores estudiosos do tema, Lars Svensson, do banco central sueco. Por essas e outras razões, Greenspan também rejeitava a política de metas de inflação.

Utilizar a taxa de inflação dos últimos doze meses é um erro grosseiro do nosso sistema vigente

Assim, utilizar a taxa de inflação dos últimos doze meses é um erro grosseiro do nosso sistema vigente, desde a sua implantação. Quando a inflação está em queda, a inflação passada gera uma inércia longa na taxa de juros, desnecessária e de elevados custos sociais. Quando a inflação sobe, provoca uma reação tardia do banco central, levando na maioria dos casos, a uma elevação da taxa de juros acima do necessário. Pior ainda, inexplicavelmente no nosso sistema, a inflação refere-se ao ano calendário. Levando estritamente ao pé da letra, é como se o Banco Central, nesta próxima reunião de outubro, tivesse que fixar uma taxa de juros capaz ou de reduzir a inflação nos meses de novembro e dezembro, de tal forma a atingir a meta no final de dezembro ou teríamos que fazer a "mágica" da taxa de juros ter efeitos retroativos a janeiro, reescrevendo a trajetória dos preços. Evidentemente, ambas alternativas são inviáveis ou absurdas.

Deixando de lado esse rigor teórico e na ausência de um modelo econométrico confiável de previsão da inflação, para pelo menos os próximos 12 meses, é inevitável que pragmaticamente se utilize a inflação passada para formar a previsão da inflação futura, mas aí existem pelo menos dois critérios alternativos: 1) a taxa média mensal anualizada do período mais recente (por exemplo, ultimo trimestre 4,1% a.a.); e 2) a taxa acumulada da inflação passada (acumulado de 12 meses 7,31%). Qual melhor critério? Quais as implicações de cada critério? No primeiro, temos maior flexibilidade de detectar se existem ou não pressões inflacionarias persistentes; mudanças de patamar; se elas desapareceram e, de tornar a inércia nas taxas de juros menores. No segundo caso, a inércia é mais longa e acelerações desaparecidas, há mais de três trimestres, podem estar afetando a taxa de juros que, de fato, terá efeitos no futuro.

Vamos aos fatos. Analisando a trajetória da inflação medida pelo IPCA nos últimos 12 meses verificamos que até setembro de 2010, a inflação estava sob controle, dentro da meta. A inflação acelerou a partir de outubro de 2010, quando aumentou 0,75%, em relação ao mês anterior, permanecendo nesse patamar até abril de 2010. Nesse período, a taxa media mensal alcançou 0,77% ao mês, o que nos dá uma taxa anualizada de 9,65%, estourando a meta. O que esses dados mostram é que houve uma pressão inflacionária que se manifestou nos índices entre outubro de 2010 e abril de 2011 que levou a taxa de inflação anualizada para um patamar fora da meta. A função do Banco Central é exatamente antecipar essas pressões e tomar medidas para que a inflação fique dentro da meta. É importante lembrar que, em dezembro de 2010, o Banco Central, com defasagem de pelo menos três meses, pois a taxa de inflação de 12 meses tem forte componente inercial, tomou medidas macro-prudenciais restringindo o crédito. O que já sinalizava também mudanças técnicas, com utilização de novos instrumentos que equivalem a uma elevação na taxa de juros.

Em seguida, a taxa de inflação sofreu uma queda de 0,77% em abril, para 0,47% em maio, tendo ficado em junho e julho em 0,15% e 0,16%, voltando a acelerar um pouco em agosto e setembro, sempre em relação ao mês anterior. De qualquer forma, a taxa média mensal de maio a setembro de 2011 passou para 0,34%, o que anualizada nos dá 4,1%, portanto por esse critério de taxa anualizada dentro da meta.

Nada mais correto que o Banco Central reduzir a taxa de inflação no final do mês de agosto, pois desde o mês de maio a inflação passada mais recente já dava sinais de que as pressões de aceleração da inflação haviam desaparecido. Mais justificado ainda se havia já indicadores confiáveis de que o crescimento da economia estava caminhando para um nível abaixo do potencial.

Yoshiaki Nakano, ex-secretário da Fazenda do governo Mário Covas (SP), professor e diretor da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas - FGV/EESP

FONTE: VALOR ECONÔMICO

Aecistas e serristas discordam sobre política de juros

Marcos de Moura e Souza e Vandson Lima

Belo Horizonte e São Paulo - A política econômica do governo federal divide aecistas e serristas. O presidente do PSDB de Minas, o deputado federal Marcus Pestana, disse ontem que o partido vê risco iminente de recrudescimento da inflação. "Defendemos juros mais baixos, mas tem jeito de se fazer isso e não com a demonstração explícita de interferência do BC", disse.

Depois de o ex-candidato à Presidência José Serra já ter exposto seu apoio à mudança na política de juros no governo Dilma Rousseff, ontem foi a vez de o ex-governador Alberto Goldman, aliado de Serra, engrossar o coro. No Twitter, Goldman disse que o principal motivo por que o PSDB não poderia apoiar uma eventual candidatura do ex-presidente do Banco Central e atual Autoridade Olímpica Henrique Meirelles à Prefeitura de São Paulo é a "ortodoxia" de sua política monetária no governo Luiz Inácio Lula da Silva. "Ele, durante oito anos, representou uma política econômica ortodoxa que combatemos sistematicamente", afirmou o tucano.

Às vésperas de nova reunião do Copom, em que se espera nova redução dos juros, o presidente do PSDB de Minas coincide com a avaliação já explicitada pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso ao Valor de que a mudança na política de juros ponha em risco a estabilidade da economia alcançada pelo Plano Real.

Ele diz que na visão de muitos economistas e do PSDB, o governo petista falha ao não evitar o que consideram ser um processo de desindustrialização no Brasil, ao não lidar bem com a concorrência chinesa, ao abandonar fundamentos econômicos que, segundo o deputado, tiveram êxito sob FHC e Lula.

A forma como o governo Dilma elevou o IOF nas operações com derivativos aponta uma mudança arriscada para a imagem de "credibilidade que o país construiu" nos mercados internacionais. "Esse tipo de mudança nas regras do jogo", disse o deputado, faz com quem muitos agentes de mercado comecem a se perguntar "Será que o Brasil está voltando a ser o velho Brasil?"

O partido organiza palco para condensar as críticas à gestão econômica de Dilma. Será um seminário no Rio, em 7 de novembro, que reunirá, segundo Pestana, a inteligência tucana - muitos integrantes da equipe econômica de FHC - como Armínio Fraga, Gustavo Franco e Edmar Bacha.

Para Pestana a disposição de Aécio em concorrer, seja contra Dilma ou Lula, revelada em entrevista ao jornal "O Estado de S.Paulo" significa que o PSDB não pretende mais correr o risco de atrasar o lançamento de seu candidato presidencial, a exemplo do que ocorreu em 2010.

"Há um consenso no PSDB hoje que retardamos muito o lançamento da candidatura em 2010", disse Pestana em Belo Horizonte. O então candidato tucano José Serra formalizou sua candidatura em abril de 2010 - seis meses antes do primeiro turno das eleições.

"O que o Aécio está dizendo é que é mais efetivo trabalhar 2014 no segundo trimestre de 2013", disse o deputado.

A mensagem que Aécio tem enviado ao partido, segundo Pestana, é "confiem no meu taco, confiem no meu timing".

Embora o próprio Aécio diga que o partido tem muitos nomes com potencial para concorrer nas eleições presidenciais, entre eles o próprio Serra e os governadores Geraldo Alckmin (SP), Marconi Perillo (GO) e Beto Richa (PR), Pestana diz que na verdade só há um nome na cabeça dos tucanos.

"Hoje no subconsciente coletivo do PSDB, a esmagadora maioria dos tucanos olha o futuro e vê Aécio", disse Pestana.

PPS pode abrir porta para Serra

Em reação ao isolamento de Serra no PSDB, o presidente do PPS, o deputado federal Roberto Freire (SP) ofereceu legenda ao ex-governador paulista.

Em entrevista ao portal "IG", Freire afirmou que, dada a propensão do PSDB em optar, desde já, pela candidatura do senador Aécio Neves (PSDB-MG) à Presidência da República em 2014, Serra e seu grupo seriam "empurrados para fora da legenda" e poderiam encontrar espaço em seu partido. "Se o PSDB continuar tratando-o [Serra] tão mal, nada impede que ele também venha para o PPS. Estaremos de braços abertos", observou o deputado.

A ex-senadora Marina Silva, que deixou o PV, também é considerada bem-vinda pelo PPS. Aliados seus filiaram-se à sigla para concorrer em 2012. "Conversamos no sentido de abrir o PPS para que os marineiros possam se candidatar pela legenda, onde quiserem, no Brasil inteiro. Depois, tanto eles como nós decidiremos o que fazer. Podemos inclusive ficar definitivamente juntos".

As dificuldades encontradas por Marina e Serra para alocar seus grupos políticos fazem Freire até vislumbrar tais lideranças unidas, sob o guarda-chuva do PPS. "Isso poderia dar até numa via alternativa ao que está aí colocado [para 2014]: Dilma versus Aécio. Quem sabe uma via alternativa, de esquerda e com respeito ao meio ambiente?", avaliou.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

Há almoço grátis. Para a banca :: Clóvis Rossi

O banco Dexia errou duas vezes, mas nem por isso os governos deixam de socorrê-lo com novo pacote

E lá vem de novo o sétimo de cavalaria para salvar não os mocinhos, mas os bandidos, digo os banqueiros. No caso, é o Dexia, o conglomerado franco-belga-luxemburguês, a ser socorrido -pela segunda vez- pelos governos dos três países.

Na prática, é o exato inverso do slogan "Ocupe Wall Street" que ganha adeptos nos EUA. O que os governos estão fazendo é financiar Wall Street ou, no caso específico do Dexia, a Place Rougier de Bruxelas, onde fica a sede central do banco.

É um claro desafio à regra básica do capitalismo, a de que "não há almoço grátis". Para a banca, não há apenas almoço grátis, mas também janta.

Afinal, o Dexia já havia sido socorrido em 2008, com imponentes € 6 bilhões. É um pouco menos do que os € 8 bilhões que a Grécia é obrigada a mendigar para poder pagar os salários de outubro de seus funcionários, entre outras contas, e que compõem a última fatia do crédito concedido por União Europeia/FMI para resgatar o país.

Diferença fundamental: o crédito à Grécia está amarrado a duríssimas condições que, entre outras tragédias, levaram a um aumento de 40% no número de suicídios nos cinco primeiros meses de 2011, na comparação com 2010. Uma linha telefônica para desesperados dispostos ao suicídio passou a receber mais de 100 chamadas por dia, quando a média normal era de 10.

Não consta que algum banqueiro tenha tentado o suicídio. Já estou até ouvindo o resmungar dos economistas de bancos e de seus amigos na mídia me acusando de demagogo por fazer esse tipo de comparação. 

Sacarão do coldre, como é de praxe, o argumento maroto de que banco não pode quebrar porque seria um prejuízo para todo o mundo, inclusive para suicidas em potencial.

Não se trata de pregar a estatização do sistema financeiro global, até porque banqueiros a soldo do Estado não pecam menos -nem mais- que os banqueiros privados. O problema está na recorrente estatização dos prejuízos, como ocorre agora no caso do Dexia, e na privatização do lucro. Assim até eu quero ser capitalista.

Não faz sentido o Estado ajudar a banca e não assumir o controle da gestão. Acaba sendo um convite para que os erros que levaram ao primeiro auxílio governamental se repitam e obriguem a um segundo pacote, como acontece com o Dexia.

Tampouco faz sentido permitir que bancos que só não quebraram porque entrou dinheiro público, na crise de 2008, continuem pagando salários e bônus obscenamente altos para os executivos que os arruinaram. Deveriam responder com o seu patrimônio pelos prejuízos.

Menos mal que duas figuras políticas relevantes estejam cobrando algo parecido. A presidente Dilma Rousseff, que quer que o G20 adote regulação estrita para o "descontrolado" sistema financeiro, e o presidente do Partido Social Democrata alemão, Sigmar Gabriel, para quem a palavra de ordem deve ser: 

"Nenhum centavo do Estado para salvar um único banco, a menos que aplique reformas profundas em seu modo de operar". Para Gabriel, a crise bancária está colocando para o mundo uma escolha entre "democracia ou o domínio das finanças". O que você escolhe?

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Presidente do PMDB apoia corte de dez ministérios

BRASÍLIA - Em meio às especulações sobre uma futura reforma ministerial do governo Dilma, o presidente do PMDB, senador Valdir Raupp (RO), defendeu ontem um corte no número de ministérios.

Segundo sua avaliação, pelo menos dez pastas poderiam ser excluídas ou integradas.

Atualmente, o primeiro escalão conta com 38 ministros e há a intenção do Palácio do Planalto de criar uma pasta para Micro e Pequena Empresa.

Uma das fusões, de acordo com o senador, poderia ocorrer entre Previdência e Trabalho.

"É sempre bom enxugar os ministérios. Eu sou favorável a enxugamento de uns dez ministérios", disse.

Sobre apoio político para fazer a reforma ministerial, Raupp diz que a medida é necessária e a saída é reduzir os aliados no primeiro escalão pela metade.

Principal aliado do governo, o PMDB tem hoje cinco ministérios: Minas e Energia, Turismo, Agricultura, Secretaria de Assuntos Estratégicos e Previdência.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Brasil teve ritmo de desaceleração mais forte, diz OCDE

A ameaça de recessão em W continua a pesar sobre a economia mundial. A advertência de que a atividade segue se desacelerando foi feita ontem pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), em Paris. Segundo o relatório Indicadores Compostos, 38 dos 39 países analisados vão verificar desaceleração econômica no horizonte de seis a oito meses. A exceção é o Japão, que se recupera do terremoto, do tsunami e do acidente nuclear de Fukushima no início do ano.

"Os Indicadores Compostos Avançados para os EUA, a Alemanha e a Rússia indicam forte desaceleração em relação ao estudo do mês passado", diz a OCDE.

O atual momento da economia dos três países, porém, seguem acima dos 100 pontos, o que indica que estão acima de sua tendência de longo termo. Já países como Canadá, Itália, Índia e Brasil estão em desaceleração, mas no atual momento estão abaixo de 100 pontos, ou seja, abaixo de sua tendência de longo termo.

O índice do Brasil, 94,8 pontos, perdeu 6,7% em um ano e é o mais baixo entre os 11 países do G-7 e dos BRIC. Na prática, indica que o ritmo de desaceleração nos últimos 12 meses foi o mais forte dentre estes países.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Os rumos da terceirização :: José Pastore

Na audiência pública promovida pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST) foram apresentadas visões contrárias e favoráveis ao processo de terceirização.

Os que são contra enfatizaram a precarização que, apesar de existir, não pode ser generalizada. Afinal, trabalho precário existe tanto nas atividades terceirizadas quanto nas não terceirizadas. Os que são a favor enfatizaram a necessidade de viabilizar os negócios. Imaginem uma construtora que, em vez de terceirizar a terraplenagem dos alicerces de um edifício residencial, fosse obrigada a comprar todo o maquinário - caríssimo - que seria usado uma vez a cada dois ou três anos. Isso é impensável!

A terceirização é um processo complexo porque coloca nas mesmas atividades empresas e profissionais em diferentes condições contratuais.

Há contratos que entregam produtos. Outros entregam serviços. Há os que entregam produtos e serviços.

Existem atividades que são realizadas no local da empresa contratante. Outras são executadas no local da contratada ou a distância.

Há casos em que uma contratada serve apenas uma contratante. Em outros, a mesma contratada serve várias contratantes.

Há situações em que as tarefas são executadas exclusivamente por funcionários da contratada. Há outras em que elas são realizadas em íntima parceria com os funcionários da contratante.

Há contratos em que a profissão dos funcionários da contratada é diferente da profissão dos empregados da contratante. Há outros em que a profissão é a mesma, mas com nível de qualificação diferente.

Há tarefas que se realizam de uma só vez. Outras são recorrentes, mas de curta duração. Há as que se estendem por longo prazo.

Há contratos realizados entre empresas do mesmo setor e com integrantes das mesmas categorias profissionais. Outros envolvem setores e categorias diferentes, cada uma com sua convenção coletiva.

Há atividades em que a subordinação técnica da contratada em relação à contratante é mínima. Há outras em que a dependência técnica é tão grande que gera confusão com a subordinação jurídica.

Não há lei capaz de garantir proteções únicas para situações tão diversas. A lei pode formular as proteções básicas. As proteções complementares devem ser definidas pelos atores do processo e ajustadas aos diferentes tipos de contratos e ramos de atividade.

Entre as proteções básicas está o cumprimento rigoroso da legislação trabalhista e previdenciária, assim como a comprovação da reputação técnica da contratada e a obrigatoriedade da contratante de garantir ambientes adequados e livre acesso dos empregados da contratada às instalações existentes nos campos da higiene, alimentação e atendimento ambulatorial.

Para chegar às proteções complementares por ramo de atividade, sugeri a criação de um Conselho Nacional para a Regulação da Terceirização com base em câmaras setoriais. Isso porque as proteções que servem à construção civil são diferentes das que servem a hospitais, bancos ou à indústria do petróleo. Essas normas seriam negociadas e atualizadas por representantes das partes.

No seu conjunto, as normas básicas e as complementares formariam nichos de proteção para todos os trabalhadores envolvidos no processo. Isso não implica isonomia de salário, jornada, PLR e outros benefícios que continuariam a ser fixados nos acordos e convenções coletivos. Afinal, eles se referem a profissionais de categorias diferentes.

Para operar esse modelo, é imperioso aprovar com urgência o Projeto de Lei n.º 4.330, ora em discussão na Câmara dos Deputados, que, no meu entender, chegou ao limite do que pode ser protegido por lei. Dali para a frente entra a negociação. A urgência decorre do fato de que de nada adiantará discutir as proteções complementares sem garantir as proteções básicas.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Em defesa a governo da Síria, clérigo sunita prega atentados contra o Ocidente

DAMASCO. Um dia depois de ativistas denunciarem a morte de pelo menos 31 civis em confronto com as forças de segurança do presidente Bashar al-Assad, o mais alto clérigo sunita da Síria, o grande mufti Ahmad Badreddine Hassoun, ameaçou retaliar os países ocidentais com ataques de homens-bomba contra Estados Unidos e Europa caso haja uma intervenção militar contra seu país.

- Eu digo a vocês todos na Europa, eu digo à América, nós enviaremos homens-bomba que estão nos seus países, se vocês bombardearem a Síria ou o Líbano. A partir de agora, será olho por olho e dente por dente - declarou Badreddine, forte aliado da elite alauíta encabeçada por Assad.

As declarações se seguiram a outra advertência, feita pelo ministro do Exterior da Síria, Walid al-Muallem, que acenou com "medidas duras" a quem reconhecer o recém-criado Conselho Nacional Sírio - visando à deposição do governo de Damasco.

- Não estamos interessados no que buscam e vamos adotar medidas duras contra qualquer país que reconheça esse conselho ilegítimo. Será que pode haver diálogo nacional com grupos armados matando por dinheiro? Será que é reforma mesmo o que querem? - questionou al-Muallem.

O tom hostil refletiu um dia de reveses diplomáticos ao governo Assad. O Conselho Nacional de Transição (CNT) da Líbia ousou ao reconhecer a entidade opositora síria e a fechar a embaixada síria na Líbia. Em Luxemburgo, os ministros do Exterior da União Europeia elogiaram a criação do órgão como "um passo positivo".

Em Brasília, o chanceler Antonio Patriota destacou que os países do Conselho de Segurança das Nações Unidas ainda buscam um rumo.

- A colocação e o voto na semana passada não foram uma decisão sábia porque expuseram fraturas entre os membros do conselho em um momento em que é necessário se promover a convergência - disse Patriota, justificando a abstenção do Brasil na votação tentou condenar o país como uma manobra para evitar a polarização.

Segundo o Observatório Sírio dos Direitos Humanos, 31 pessoas morreram em confrontos no domingo. Mas, entre as vítimas, havia 14 civis e 17 membros das forças de segurança - um indicativo de que o poder da oposição pode estar aumentando.

Colaborou: Mônica Tavares, de Brasília

FONTE: O GLOBO

Terrorismo e segurança nacional :: Rubens Barbosa

Em artigo recente procurei mostrar que o mundo não mudou em decorrência dos ataques terroristas de 11 de setembro de 2001, mas a sociedade norte-americana, sim. Os EUA nunca haviam sido atacados em seu território continental desde 1814, quando, na guerra anglo-francesa, depois da independência, a Casa Branca foi incendiada pelos ingleses. A alma americana foi profundamente afetada, o que explica a mudança rápida no comportamento do seu povo e do seu governo.

Uma das consequências da transformação da sociedade norte-americana foi a obsessiva preocupação com a possibilidade de novos atos terroristas. Em conversa com o então presidente eleito Lula, em dezembro de 2002, o presidente George W. Bush disse enfaticamente que "todos os dias, sentado a mesa onde trabalharam Kennedy e Johnson, recebia do CIA mais de 40 alertas de possíveis ataques terroristas".

A guerra global contra o terrorismo passou a ser a primeira prioridade do governo de Washington. Impedir novos ataques ao território norte-americano e capturar, vivo ou morto, Osama bin Laden e outros líderes da Al-Qaeda foram objetivos perseguidos tenazmente nos últimos dez anos.

Depois do 11 de Setembro, um tentacular aparato de segurança nacional foi criado. Integrada por agências governamentais, companhias privadas e comandos militares, formou-se uma rede sigilosa dentro do governo norte-americano (Pentágono, CIA, Departamento da Segurança Interna), que se tornou um braço autônomo e autossustentável do governo e pouco conhecido pela opinião pública dos EUA.

Desde os ataques terroristas, o número de pessoas contratadas para trabalhar em programas ultrassecretos subiu a mais de 250 mil. Mais de 1.200 organizações do governo e cerca de 2 mil empresas privadas foram criadas e trabalham em programas sigilosos relacionados com a luta global contra o terrorismo, defesa interna e inteligência em mais de 10 mil edifícios espalhados por todo o país. Somente na região de Washington, nos últimos dez anos foram construídos ou estão em construção 33 conjuntos de prédios para tratar desses temas, um deles verdadeira cidade secreta. Mais de 850 mil funcionários e não funcionários do governo dispõem de acesso a informações ultrassecretas. Analistas, que tentam interpretar documentos e conversações, obtidas por espionagem doméstica ou externa, compartilham suas ideias por meio de mais de 50 mil relatórios de inteligência todos os anos, um volume tão grande que os faz ser rotineiramente ignorados.

Ninguém no governo sabe exatamente qual o montante dos custos envolvidos, que programas são realmente relevantes e mereceriam ser mantidos ou quantas agências estariam duplicando o mesmo trabalho. A polícia, sob a justificativa de combater o terrorismo, está usando instrumentos de alta tecnologia, utilizados nas Guerras do Afeganistão e do Iraque, para investigar ativistas políticos ou mesmo cidadãos comuns.

Apesar de todo esse aparato, ninguém é claramente responsável pela coordenação das ações contra o terrorismo. Os civis e os militares que trabalham em tal engrenagem têm um conhecimento limitado do que os demais membros dessa comunidade estão fazendo. Seu funcionamento se assemelha muito às células dos movimentos armados de contestação ao regime militar no Brasil, com poucos vasos comunicantes e informação parcial entre todos.

Tudo isso foi mostrado agora com a publicação do livro Top Secret America (A America Ultrassecreta), dos jornalistas Dana Priest e de William M. Arkin. Exemplo de jornalismo investigativo, o livro revela aspectos desconhecidos do crescimento dos órgãos de segurança e da comunidade de informações e seu impacto nas ações do governo, na política interna e na externa.

A cultura do medo justificou o gasto para enfrentar a ameaça do terrorismo. Isso levou à crença de que o governo deve fazer tudo para evitar o risco de ataque, antes que ele ocorra, sem diferenciar uma rede de terroristas de uma ação isolada de pessoa desequilibrada.

Ao assumir, o presidente Barack Obama herdou dois governos: um administrado de maneira mais ou menos aberta e outro, paralelo, ultrassecreto, que, em uma década, se expandiu sem controle e, no dizer do chefe da inteligência do Pentágono, só é conhecido, na sua totalidade, por Deus.

Essa máquina de combate ao terrorismo desenvolve meios próprios para alcançar seus objetivos. Significativos e sofisticados avanços tecnológicos foram desenvolvidos visando à busca de pistas para descobrir possíveis ameaças e mesmo para a eliminação física de lideres de organizações terroristas. Dos muitos exemplos citados no livro, ressalto os veículos aéreos não tripulados (Vants ou drones) e a guerra cibernética. Os Vants são responsáveis pela coleta de informações e pelo assassinato de indivíduos marcados para morrer por sua atuação em atividades consideradas como ameaça para os EUA. Com autorização presidencial (memorando secreto), estão sendo utilizados no Afeganistão e no Iraque, foram empregados para identificar os passos de Bin Laden no Paquistão e, mais recentemente, estão sendo usados na Líbia e no Iêmen.

Grupos libertários, acadêmicos e cientistas começam a questionar o governo dos EUA por essa autoconcedida licença para matar, em qualquer país, o que põe em causa questões legais, éticas e mesmo leis internacionais. Os meios sofisticados de quebra de sigilo na internet e de defesa e ataque na guerra cibernética tornam os desenvolvimentos nessa área um dos meios mais avançados de que dispõe a comunidade de segurança para interferir, com precisão e discrição, na vida privada e em assuntos internos de outros países, como se viu recentemente no ataque aos computadores do Irã visando a atrasar o programa nuclear desse país.

Ex-embaixador do Brasil nos EUA (1999-2004)

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Evocação do Recife::Manuel Bandeira

Recife
Não a Veneza americana
Não a Mauritsstad dos armadores das Índias Ocidentais
Não o Recife dos Mascates
Nem mesmo o Recife que aprendi a amar depois
— Recife das revoluções libertárias
Mas o Recife sem história nem literatura
Recife sem mais nada
Recife da minha infância
A rua da União onde eu brincava de chicote-queimado
e partia as vidraças da casa de dona Aninha Viegas
Totônio Rodrigues era muito velho e botava o pincenê
na ponta do nariz
Depois do jantar as famílias tomavam a calçada com cadeiras
mexericos namoros risadas
A gente brincava no meio da rua
Os meninos gritavam:
Coelho sai!
Não sai!

A distância as vozes macias das meninas politonavam:
Roseira dá-me uma rosa
Craveiro dá-me um botão

(Dessas rosas muita rosa
Terá morrido em botão...)
De repente
nos longos da noite
um sino
Uma pessoa grande dizia:
Fogo em Santo Antônio!
Outra contrariava: São José!
Totônio Rodrigues achava sempre que era são José.
Os homens punham o chapéu saíam fumando
E eu tinha raiva de ser menino porque não podia ir ver o fogo.

Rua da União...
Como eram lindos os montes das ruas da minha infância
Rua do Sol
(Tenho medo que hoje se chame de dr. Fulano de Tal)
Atrás de casa ficava a Rua da Saudade...
...onde se ia fumar escondido
Do lado de lá era o cais da Rua da Aurora...
...onde se ia pescar escondido
Capiberibe

— Capiberibe
Lá longe o sertãozinho de Caxangá
Banheiros de palha
Um dia eu vi uma moça nuinha no banho
Fiquei parado o coração batendo
Ela se riu
Foi o meu primeiro alumbramento
Cheia! As cheias! Barro boi morto árvores destroços redemoinho sumiu
E nos pegões da ponte do trem de ferro
os caboclos destemidos em jangadas de bananeiras

Novenas
Cavalhadas
E eu me deitei no colo da menina e ela começou
a passar a mão nos meus cabelos
Capiberibe
— Capiberibe
Rua da União onde todas as tardes passava a preta das bananas
Com o xale vistoso de pano da Costa
E o vendedor de roletes de cana
O de amendoim
que se chamava midubim e não era torrado era cozido
Me lembro de todos os pregões:
Ovos frescos e baratos
Dez ovos por uma pataca
Foi há muito tempo...
A vida não me chegava pelos jornais nem pelos livros
Vinha da boca do povo na língua errada do povo
Língua certa do povo
Porque ele é que fala gostoso o português do Brasil
Ao passo que nós
O que fazemos
É macaquear
A sintaxe lusíada
A vida com uma porção de coisas que eu não entendia bem
Terras que não sabia onde ficavam
Recife...
Rua da União...
A casa de meu avô...
Nunca pensei que ela acabasse!
Tudo lá parecia impregnado de eternidade
Recife...
Meu avô morto.
Recife morto, Recife bom, Recife brasileiro
como a casa de meu avô.