segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

D. Dilma, que tal partirmos agora para o jogo sério? :: Marco Antonio Rocha

O primeiro ano da presidente Dilma foi, ainda, um ano-Lula. Ela herdou, na política e na economia, o que Lula implantou em oito anos. Este ano terá de ser o primeiro ano-Dilma - de afirmação e consolidação do seu próprio projeto.

E o que sabemos dele?

Até agora, quase nada. Temos alguns sinais, mas não em profundidade. Nos discursos que ela fez, desde a posse e nas entrevistas, há a enunciação de alguns propósitos, porém sem um roteiro do qual se possa fazer um juízo de como chegar a eles.

Não há nenhuma crítica nisso. O Brasil é mesmo assim. A maior parte dos nossos governantes é mais de tocar as coisas em cima do joelho do que de elucidar as mentes e corações dos brasileiros sobre como chegar ao glorioso destino que eles, governantes, vivem proclamando ser o nosso.

Algumas vezes tivemos procedimentos menos rudimentares dos governantes. Getúlio Vargas, por exemplo, elaborou planos e roteiros de execução. Verdade é que implantou uma ditadura bastante fechada, o que lhe facilitou a vida como político e o andamento do que queria fazer.

Houve, depois, Juscelino Kubitschek, JK, que, mais do que mudar a capital do País para Brasília, montou o famoso Plano de Metas, com metas para a indústria pesada, para a indústria leve, para a infraestrutura, para a energia elétrica - para o Brasil, enfim. Só não estabeleceu metas para a consolidação da democracia, e com isso - mas não por isso - seu governo desaguou no desastre janista-janguista que ensejou nova ditadura, desta vez militar.

Nos governos militares, e até porque os militares são, em geral, aficionados por planejamentos e definições de estratégias, tivemos logo no início - creio que já em 1964 - o 1.º Plano de Ação Econômica do Governo (Paeg): Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e Banco Nacional da Habitação (BNH) são dois filhotes dele, que sobrevivem. Tivemos também as Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional (ORTNs), um expediente criado para tornar vendáveis os títulos de médio e de longo prazos do Tesouro, que, com a inflação da época, ninguém comprava. Nasceu com isso a correção monetária, uma praga que ainda hoje desafia as equipes econômicas dos governos. À continuidade, ainda vieram o 1.º e o 2.º Planos Nacionais de Desenvolvimento (PNDs), o último já no governo do general Ernesto Geisel, sob a batuta do seu ministro do Planejamento, João Paulo dos Reis Velloso, um brasileiro que sabe pensar (não são muitos) e que continua a exercer o ofício de pensar o Brasil.

De qualquer forma, hoje, mais do que no passado, os governos precisam de um roteiro claro de como conduzir um país num caminho que seja menos cheio de entulhos e mais rentável para sua população. Para a escolha desse caminho e a definição das tarefas e prazos, é bom que haja uma liderança com a noção, também clara, de quais são os passos mais seguros e promissores a serem dados na boa direção. Seria, mal comparando, como um ótimo time de futebol, um Barcelona, cujo objetivo estratégico não é vencer a partida do próximo domingo, mas vencer o maior número de partidas ao longo de anos e manter-se no cenário internacional como um player de respeito. Precisa criar, treinar e cuidar dos seus jogadores desde crianças, incutindo-lhes a noção de qual é o objetivo, por que persegui-lo e para quê. E precisa também de consenso e disciplina entre eles. O Brasil deveria querer ser um player de respeito.

Lula, com ideias antimercado - as suas e as inflamadas pelo esquerdismo infantil do seu partido -, soube logo que tinha de se livrar disso. Discurso não adiantaria. Deu mão forte a uma ala ortodoxa da economia, para frustração de muitos seguidores. Mas, assim, arou o terreno para a plantação das benesses sociais de mais adiante.

Dilma encara, neste ano, o desafio político de montar um time de craques de verdade, no lugar do bando de enganadores que herdou. E nesse time cada um terá de ter disciplina e concatenação para jogar a favor do futuro do Brasil, e não a favor apenas da sua carreira política.

Não vai ser fácil, como estamos vendo no noticiário sobre a reforma ministerial, que, aliás, tem de ser feita mesmo - a questão é saber com que qualidade será feita.

Mas, na economia, não ficou claro no primeiro ano qual o jogo que o time irá jogar. Isso depende de um bem bolado - e mais bem articulado - programa econômico de governo, que responda, basicamente, à indagação de como o País pode ser competitivo internacionalmente e estar na frente em educação, pesquisa e qualificação profissional.

Na semana passada, num encontro com o governador Geraldo Alckmin, Dilma disse que sua meta é criar "um país de classe média". É uma boa meta. Só precisa de um bom roteiro para ser alcançada. Um primeiro passo é tirar o peso do governo das costas da classe média. E a meta não será alcançada "enquanto prevalecer a ausência (sic) de uma agenda que esmiúce as políticas de sustentação do crescimento brasileiro" - como diz a economista Mônica Bolle.

Jornalista

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

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