sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

E a reforma do Estado? (1):: Sérgio C. Buarque

Parece haver um consenso nos meios políticos brasileiros de que a reforma política é, como dizem, “a reforma das reformas”, embora o entendimento termine quando se discute o conteúdo das mudanças que corrigiria os vícios e as distorções do atual sistema político brasileiro. No entanto, por mais que seja importante, a reforma política é apenas um componente de uma transformação mais ampla e profunda do Estado brasileiro, quase ausente da agenda política, embora seja a base primária do desperdício dos recursos, da ineficiência e da corrupção que dominam no Brasil.

Entre vários aspectos que pedem uma reforma do Estado, merece atenção especial a combinação esdrúxula do sistema federativo: alta concentração da União e grande fragmentação municipal. A excessiva e irracional centralização da estrutura federativa se manifesta com a apropriação pela União de cerca de 60% da receita final disponível dos governos, tornando Estados e municípios dependentes e reféns do governo federal (os 27 Estados ficam com algo em torno de 25% e os 5.565 municípios dividem o restante). O resultado é a patética revoada de governantes para busca de recursos em Brasília para médios e pequenos projetos locais, provocando uma grande ineficiência, a dependência e as adesões políticas espúrias, e as malfadadas emendas parlamentares. A esmagadora maioria dos investimentos públicos no Brasil passa e é decidida pela União, da construção de uma grande rodovia às ações emergenciais nas enchentes ou a implantação de uma quadra esportiva em um pequeno município do interior.

A reforma do Estado deve, portanto, promover uma forte redistribuição dos recursos públicos entre os entes federativos e, como consequência, a redefinição dos papéis com o aumento dos recursos e das responsabilidades dos Estados e dos municípios. A União deve se concentrar nas questões nacionais e nos grandes projetos estratégicos e de larga abrangência territorial. As ações localizadas e os projetos de médio e pequeno porte devem ser de responsabilidade dos Estados e municípios. Esta descentralização contribui para uma redução significativa dos custos, aumenta a eficiência e favorece os resultados pela proximidade dos problemas e da sociedade, e elimina a dependência política e a troca de favores com as instâncias superiores de governo. A reforma deve rever também a excessiva fragmentação municipal em unidades territoriais inviáveis e insustentáveis (este aspecto será analisado no próximo artigo).

Outro aspecto crítico da gestão pública do Estado brasileiro reside no loteamento político das funções gratificadas nos diversos níveis e instâncias governamentais, fonte de favores e transações políticas, instabilidade gerencial e politização das atividades técnico-gerenciais, esta farra de nomeações compromete sua qualidade e eficácia da gestão, gera instabilidade e permite a formação de rede de operadores de desvio de recursos públicos. A resposta a esta distorção do sistema público de gestão é uma ampla profissionalização dos cargos públicos de direção, limitando a nomeação dos governantes ao primeiro escalão do governo e seus assessores imediatos, todos os cargos comissionados a partir do segundo escalão devem ser ocupados por servidores de carreira com mérito e competência comprovada na área e, como tal, com compromisso com a função pública e independência dos poderosos de plantão.

Sérgio C. Buarque é economista e consultor

FONTE: JORNAL DO COMMERCIO (PE)

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