segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Poder quase absoluto do Executivo

Legisla quem pode, aprova quem tem juízo

Os três níveis do Executivo - governos federal, estadual e Prefeitura de BH - emplacaram quase todos os projetos de lei em 2011. Relação de dependência começou no regime militar

Isabella Souto e Juliana Cipriani

A despeito de polêmicas e crises com a oposição, o Executivo não tem como se queixar de 2011. Pelo menos em relação ao Legislativo, que aprovou quase tudo que a Presidência da República ou o governo de Minas Gerais enviaram para o Congresso Nacional e Assembleia Legislativa (ALMG), respectivamente. Em Brasília, 51 dos 68 projetos encaminhados ao longo do ano passado para aprovação dos 513 deputados federais e 81 senadores já viraram lei. O mineiro Antonio Anastasia (PSDB) enfrentou um pouco mais de resistência, mas conta com o balanço positivo de 66 leis aprovadas entre as 95 apresentadas na ALMG.

A regulamentação da Emenda 29 – que estabelece critérios para aplicação de recursos na saúde – e a prorrogação da Desvinculação das Receitas da União (DRU) até 2015 esquentaram o plenário na Câmara dos Deputados e Senado no fim do ano passado, mas acabaram aprovadas como o governo queria. A DRU garantiu ao Planalto usar livremente 20% de suas receitas, regra que seria extinta em 31 de dezembro de 2011. Para ver o texto aprovado, o governo federal atuou fortemente junto ao Congresso, negociação que envolveu indicações para cargos de segundo escalão, liberação de emendas orçamentárias apresentadas pelos parlamentares e de pendências estaduais.

Por 70 votos a 1, os senadores autorizaram um gasto menor pelo governo federal na saúde. O texto aprovado manteve a regra, definida pela Emenda 29, de aplicação do montante do ano anterior acrescido da variação nominal do Produto Interno Bruto (PIB). A oposição bem que tentou, mas não conseguiu aprovar emenda fixando em no mínimo 10% das receitas federais o gasto da União com o setor. A legislação determina ainda que os estados apliquem 12% do que arrecadam anualmente em impostos. Os municípios precisam investir 15% de sua receita.

Na Assembleia Legislativa, a polêmica ficou por conta de dois projetos envolvendo o funcionalismo público: o da política remuneratória dos servidores e o do piso salarial dos profissionais da educação. Para aprovar o último foram necessários pelo menos dois substitutivos do próprio Executivo e várias reuniões para negociações entre a categoria, deputados estaduais e governo. No final da novela, a matéria foi aprovada em 24 horas mantendo as regras estabelecidas pelo Palácio da Liberdade. A chiadeira da oposição também não foi suficiente para derrotar as normas salariais e reajustes propostos pelo Executivo.

Ditadura Na avaliação do professor de ciência política da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Bruno Reis, pelo menos dois fatores podem explicar a predominância do Executivo sobre o Legislativo nas leis aprovadas. O primeiro deles remonta ao período da ditadura, iniciado com o golpe militar de 1964. Até então, a história revela um Legislativo bem mais forte e atuante. Com a ocupação do poder pelos militares, os papéis se inverteram e o Congresso passou a servir aos interesses dos presidentes da República.

"Mesmo com a transição para a democracia, nos anos 80, essa prevalência se manteve intacta. Houve uma cautela por parte da Assembleia Constituinte, talvez por medo de crises ou impasses entre os dois poderes. O constituinte escolheu preservar algumas garantias para o Executivo", ponderou o professor. Outra razão para a prática brasileira seria a falta de uma estrutura partidária forte. "O Brasil optou por uma eleição descentralizada, com candidatos individuais, o que resulta em uma pluralidade partidária no Congresso e fortes prerrogativas para o Executivo para compensar isso", disse. Para ele, uma forma de resolver a questão seria a eleição para o Legislativo na modalidade lista fechada.

Veto O diretor de processo legislativo da Assembleia, Sabino José Fortes Fleury, tem discurso semelhante e aponta a Constituição Federal como a razão para a prática legislativa dos governantes. Segundo ele, a esfera de competência para atuação dos deputados estaduais é limitada. "Tudo que gera despesas ou mexe na estrutura governamental é de iniciativa exclusiva do governador. O deputado não tem muito o que fazer nessa área. Eles até apresentam projetos, mas são considerados inconstitucionais", explicou.

De acordo com Sabino Fleury, os deputados podem até tratar de temas como saúde, educação e meio ambiente, "desde que não se metam a dizer o que o Executivo tem que fazer". No entanto, o diretor pondera que praticamente todos os projetos enviados pelo governador saem com alguma alteração proposta pelos deputados estaduais, seja para correção ou novo direcionamento. Ainda cabe ao parlamentar a palavra final, pois, caso uma legislação receba veto integral ou parcial, os deputados podem derrubá-lo em plenário. Prerrogativa que eles raramente usam.

NA PAUTA
Congresso Nacional
Projetos apresentados 4.118
Leis sancionadas 555
Propostas de deputados e senadores 4.021
Leis 504
Matérias do Executivo 68
Leis 51
Assembleia Legislativa
Projetos apresentados 2.830
Leis sancionadas 527
Propostas de deputados 2.712
Leis 448
Matérias do Executivo 95
Leis 66
Câmara Municipal de Belo Horizonte
Projetos apresentados 672
Leis sancionadas 157
Propostas de vereadores 635
Leis 136
Matérias do Executivo 37
Leis 21

Fonte: Assembleia Legislativa, Câmara Municipal de Belo Horizonte e Congresso Nacional

FONTE: ESTADO DE MINAS

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