domingo, 19 de fevereiro de 2012

G20 vive sua primeira crise:: Clóvis Rossi

Rússia e China vetam reunião de chanceleres, o que obriga anfitrião a diluir o encontro

O G20, o clubão das maiores economias globais, está vivendo sua primeira crise, que, na prática, é reflexo de uma crise mais abrangente, a da governança global.

A crise instalou-se a partir do instante em que o México, presidente do grupo este ano, resolveu convocar uma reunião de ministros de Relações Exteriores, a realizar-se hoje e amanhã. A Rússia protestou ruidosamente, alegando que não cabia um encontro de chanceleres porque o G20 só deveria tratar de assuntos econômico-financeiros e correlatos. A China acompanhou a posição russa, com a discrição que é habitual na sua diplomacia.

Nem Rússia nem China chegaram ao ponto de anunciar a ausência na reunião mexicana, mas rebaixaram o nível da representação que pretendem enviar. Os russos mandarão apenas o vice-chanceler. Os chineses radicalizaram ao indicar o embaixador no México para representá-los. O chanceler brasileiro, Antonio Patriota, também não deve ir, mas porque a presidente Dilma Rousseff pediu que ele ficasse em Brasília no fim de semana.

Consequência: o México se viu forçado a descaracterizar a reunião, fazendo convites a países que não são membros do G20. Alguns, como a Espanha, têm sido regularmente chamados a outros encontros, mas desta vez foram convidadas nações (Azerbaijão, por exemplo), cuja presença não tem qualquer explicação, a não ser a necessidade de diluir a reunião para parecer que não é G20.

O argumento russo/chinês contra a reunião é só parcialmente verdadeiro. De fato, o G20 foi originalmente concebido, em 1999, como um fórum de ministros de Economia/presidentes de bancos centrais. Mas a crise de 2008/09 provocou um "upgrade" do grupo para fórum de chefes de governo. Por definição, chefes de governo discutem tudo, economia e política, finanças e segurança internacional, meio ambiente e moedas.

Na verdade, a reação da Rússia reflete o receio de ficar isolada também no G20, assim como ficou quinta-feira na Assembleia Geral da ONU, quando se votou a resolução de condenação à Síria proposta pela Liga Árabe.

É óbvio que a questão teria que entrar na pauta de uma reunião de ministros do Exterior dos países mais relevantes do mundo. É provável até que se discutisse o apoio do G20 à figura do enviado especial para a Síria, aprovada na ONU, contra o voto de russos e chineses.

Acontece que no G20 não há o direito de veto, ao contrário do que acontece no Conselho de Segurança, paralisado por esse poder que russos e chineses exerceram no caso sírio. O isolamento russo/chinês ficaria mais escancarado.

A crise político-institucional no G20 vem apenas três meses após o fracasso da cúpula de Cannes, provocado pelos europeus. Os parceiros da Europa, Brasil inclusive, ficaram esperando que os europeus definissem o tamanho de um fundo de prevenção contra o alastramento da crise, o que não ocorreu. O G20 nada decidiu de relevante.

Agora é obrigado a maquiar uma reunião de seus chanceleres, o que não é de bom augúrio para um clube autodefinido como principal fórum de coordenação econômica global, com nova cúpula marcada para junho.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

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