quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Mentalidades, surtos e manias:: Vinicius Torres Freire

Salário mínimo não causou informalidade, dívida bruta não explodiu e inflação não ficou descontrolada no país

Vez e outra, há preocupação em espinafrar economistas que erraram tanto ou quanto nas previsões de desempenho econômico. Os economistas em geral são vítimas de "Schadenfreude" (alegria com a desgraça alheia) bem mesquinha.

Não se pode dizer que sejam vítimas inocentes, pois não raro fazem alaridos de arrogância juvenil quando seus modelos botam ovos econométricos que indicariam o destino inelutável da humanidade.

Menos comentados são os surtos e manias de ideias temporariamente fixas (sic) que dominam o debate econômico mais comum, em geral alarmismos ideológicos.

Quem acompanha essa conversa deve se lembrar, por exemplo, de quando se dizia que o aumento do salário mínimo causaria elevação do desemprego e da informalidade (uma conversa recorrente até por volta de 2006, mais ou menos).

Não aconteceu nada disso no Brasil, claro, embora seja bom observar que, em certas condições, a teoria acerta ao prever que tabelamentos de salários resultam em degradações do mercado de trabalho.

Mais recentemente, ano passado, ouvia-se que os sindicatos conseguiriam tanto reajuste de salários que haveria uma explosão inflacionária. Não aconteceu, claro, embora a oferta em geral escassa de trabalho (desemprego baixo) segure a inflação em nível mais alto. O alarmismo, porém, era miopia ou coisa pior.

A categorias mais organizadas, afora bancários e petroleiros, estão na indústria. Faz anos, uns quatro, que a indústria não consegue repassar custos para preços (na média). E quem fez o alarido da espiral preços-salários em 2011 se esqueceu de observar que o número de pessoas ocupadas crescia mais devagar, assim como a massa salarial etc.

Outro surto foi o dos alertas sobre a "explosão da dívida bruta" do governo, em 2009. O governo fez muita dívida para emprestar dinheiro para o BNDES. Mas, na dívida líquida (a mais publicada e debatida), esse endividamento adicional não aparecia: o empréstimo para um banco público também é um dos haveres do governo.

A dívida líquida do governo é a bruta afora haveres como, pela ordem, reservas internacionais, empréstimos ao BNDES (que passaram de 0,2% do PIB em 2007 para 7,3% em 2011) e dinheiro do FAT.

Dizia-se que o governo começaria a perder o crédito, dado o aumento da dívida bruta etc. Bem, a dívida bruta cai desde 2009.

Claro que o governo fazer dívida para financiar os empréstimos subsidiados do BNDES é um problema. Primeiro, trata-se de um dinheiro que não é discutido no Orçamento. Segundo, essa dívida é cara (o governo paga juros altos, o BNDES empresta a juros menores).

Isto posto, a dívida brasileira é um caso sério, por qualquer critério (afora a comparação com os governos superendividados do mundo rico): é das mais caras do mundo e é quase inteira rolada a cada três anos, entre outras aberrações custosas e potencialmente perigosas.

O resumo da ópera é que tais conversas e desconversas são politizadas de modo rasteiro, servem a propaganda barata e carecem do básico de prudência analítica.

Pior ainda, distorcem a compreensão de problemas que, em si sérios, são esquecidos depois que passa o período da marola ideológica que distorce toda a discussão.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

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