segunda-feira, 5 de março de 2012

Brasil ajusta política externa para enfrentar mundo pós-crise

Com Primavera Árabe e recessão europeia, país busca oportunidades

Diante da Primavera Árabe e da crise europeia, o Brasil decidiu discutir seu novo papel no cenário internacional. Por determinação da presidente Dilma Rousseff, que chegou ontem a Hannover, na Alemanha, onde se encontra hoje com a chanceler Angela Merkel, um grupo de ministros está mapeando as oportunidades para marcar a presença brasileira na agenda mundial. A ideia é manter a "âncora regional", aprofundando a atenção dos países vizinhos, mas também projetar o Brasil diante dos países desenvolvidos. Especialistas avaliam que a reaproximação com os Estados Unidos e um foco maior nos direitos humanos diferenciam a política externa de Dilma da do ex-presidente Lula.

Ajuste na política externa

Determinação é aproveitar o bom momento do Brasil no cenário internacional

Eliane Oliveira, Helena Celestino

A presidente Dilma Rousseff determinou ao primeiro escalão da área internacional do governo que repense a política externa brasileira para ajustá-la ao cenário mundial pós-Primavera Árabe e crise europeia. A hora é de aproveitar o bom momento brasileiro para aumentar a influência do país no cenário internacional. A frase, que já virou um mantra repetido por ministros, assessores e diplomatas, é a inspiração básica para todos os envolvidos na discussão das mudanças na política externa brasileira.

- Houve fortes mudanças no mundo no último ano. Por isso, vamos redefinir um projeto de diversificação do Brasil no mundo - resume o assessor para assuntos internacionais da Presidência da República, Marco Aurélio Garcia.

Grupo discute novo papel do país

Desde o início do ano, um seleto grupo de ministros e assessores especiais da área externa está discutindo formas de o Brasil aproveitar o entusiasmo com o país para amplificar a sua voz nos grandes temas da atualidade. A equipe é comandada pelos ministros das Relações Exteriores, Antonio Patriota, da Fazenda, Guido Mantega, e do Meio Ambiente, Izabella Teixeira. Cada um na sua área, eles mapearão as oportunidades para reforçar a presença brasileira na agenda mundial.

- Relações internacionais não são uma ciência exata. Tentamos buscar caminhos através de uma postura de coerência que dê credibilidade ao país - explica Patriota.

Numa linguagem mais simples, diplomatas menos estrelados contam que já estão sentindo o gostinho de participar das grandes decisões do mundo, e são muitos os indícios de que o Brasil está entrando para o grupo dos países dominantes.

- É esta experiência que precisamos sistematizar e transformar em política - diz um embaixador.

Segundo Patriota, o governo manterá o que chamou de "âncora regional" em sua política externa, focada na preservação da paz e da democracia na América do Sul. Na vertente econômica, o chanceler diz que as perspectivas para os países da região são as mais promissoras das últimas décadas.

- Isso permite que nos concentremos em uma agenda positiva e em um engajamento pleno nas grandes questões internacionais - observa o ministro.

Marco Aurélio concorda, mas acredita que os países da região necessitam de mais atenção do Brasil:

- Os vizinhos reclamam nossa atenção. Estão carentes.

Tanto ele como Patriota destacam que o mundo agora é multipolar, o que permite um número maior de protagonistas. Ambos citam a China como exemplo e ressaltaram as divergências de opiniões surgidas no Conselho de Segurança da ONU em relação à Síria: chineses e russos de um lado e americanos de outro.

- Parece a volta da Guerra Fria - diz Marco Aurélio

- O Brasil se mantém firme em suas posições e leva muito em conta a opinião dos países da região - enfatiza Patriota.

Encontro para discutir crise

Os dois, no entanto, rejeitam a ideia de que o Brasil está menos falante desde que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva passou a faixa para Dilma. A presidente, dizem todos, gosta de fazer política externa, conhece o assunto e dedica ao tema o mesmo interesse que seu antecessor. Claro que cada um com seu estilo: Dilma lê para se informar, Lula era intuitivo.

- Lula sempre se moveu a partir de suas intuições. As reuniões de cúpula da América do Sul com os países árabes e com a África, assim como a tentativa de mediação de um acordo com o Irã, foram ideias dele. Agora, o momento é de colher frutos, olhar de forma mais minuciosa as mudanças que houve no mundo - diz Marco Aurélio, assessor internacional da Presidência desde o primeiro mandato de Lula.

Na semana passada, a presidente fez críticas aos países ricos, ao dizer que a Europa provocou um "tsunami monetário" com suas medidas adotadas para enfrentar a crise. Hoje, Dilma deverá tratar do tema com a chanceler da Alemanha, Angela Merkel. A presidente chegou na noite de ontem a Hannover, por volta das 20h30m, duas horas após o previsto. Uma escala técnica no Porto, em Portugal, provocou o atraso. O encontro com Merkel será hoje, na abertura da maior feira de tecnologia do mundo, a CeBit.

Ao ser perguntado, em Hannover, sobre a conversa que Dilma terá com a chanceler da Alemanha, Marco Aurélio diz que a presidente vai repetir em público e na reunião privada com a chanceler alemã a crítica que fez aos países ricos.

Colaborou: Deborah Berlinck

FONTE: O GLOBO

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