quarta-feira, 28 de março de 2012

Brasil, nada a declarar:: Vinicius Torres Freire

Atropelo de providências oficiais na economia serve apenas para deixar o país onde ele está, se tanto

Parece que tem acontecido tanta coisa no governo econômico do Brasil. Há um atropelo de providências, algumas delas anunciadas até com ares meio dramáticos.

O governo promete atirar uma medida por dia no dólar barato. Promete amparar as indústrias caídas, os desamparados cambiais, remediar as chagas do "custo Brasil", lancetar o dragão do capital externo. Anuncia que vai combater o estrangeiro usurpador do nosso mercado nas praias, nas ruas, nas casas e nos mictórios. Mas não está acontecendo lá muita coisa.

Sim, decerto a situação de algumas indústrias é meio dramática mesmo. Deixar como está para ver como é que fica pode arruinar algumas delas. Não obstante, algumas delas irão mesmo à ruína, pois, como se disse, não está acontecendo lá muita coisa. Provavelmente algumas iriam à breca mesmo se acontecesse alguma coisa.

Por um tempo, não haverá nada de novo a dizer sobre a economia brasileira e alguns de seus dilemas. O essencial está meio esquadrinhado. Mudanças dependem de escolhas políticas difíceis, perdas e ganhos, cortes duros de gastos, contenções temporárias de consumo.

Os salários estão altos. Para ser mais preciso, o custo de empregar alguém para produzir uma unidade de produto no Brasil sobe mais, e cada vez mais, que o de nossos parceiros comerciais importantes, em especial daqueles que costumavam comprar nossos bens produzidos em indústrias (EUA, por exemplo).

As soluções disponíveis são desvalorizar a moeda (difícil, mas achata salários), reduzir impostos sobre salários e limitar as intervenções estatais que induzem o aumento de salários (como reajustes do mínimo e de benefícios sociais). Não se trata de achatar os salários "para sempre". Mas de "dar um tempo".

Vai acontecer? Uhm.

Impostos aumentam custos por vias várias. Bidu. A fim de baixar impostos de modo responsável, o governo tem de reduzir gastos (e/ou tributar mais a renda dos mais ricos). O gasto maior, afora o da inépcia, é o relativo a juros, salários, aposentadorias e benefícios sociais.

Vai acontecer tal coisa tão cedo, corte de impostos de modo responsável? Uhm.

Há mais problemas, claro.

Falta mão de obra treinada, o que encarece o salário e o treinamento, reduz a eficiência das empresas etc. Isso não vai ser resolvido tão cedo, mesmo que houvesse empenho. Aliás, vai ficando para mais tarde, pois não há sentimento de emergência algum a respeito do assunto.

As empresas brasileiras parecem meio lerdas para inovar. Não é também coisa que se resolva tão cedo, se é que em algum dia. De resto, no Brasil, inovação em geral dependeu de algum modo de iniciativas inovadoras do Estado, que bancou custos de pesquisa, universidades, inventou estatais mais "de ponta" etc. Mas também do lado estatal tem faltado inspiração nessa área.

Há ainda os juros altos. Que aí ficarão enquanto a inflação não for menor, o que exige alguma repressão de consumo, privado e do governo. Juros altos ajudam a encarecer o real. E o círculo se fecha.

Os esparadrapos oficiais são lenitivos, dão um jeito ali, outro aqui, transferem renda de modo a cobrir um santo e descobrir outro. Nada além. O resto é mais ou menos detalhe. Melhor mudar de assunto.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

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