sexta-feira, 30 de março de 2012

Ministério da Pesca contrata empresa e depois pede verba para campanha do PT

TCU apontou indícios de superfaturamento e licitação dirigida na compra de lanchas

Marta Salomon

BRASÍLIA - Após ser contratada para construir lanchas-patrulha de mais de R$ 1 milhão cada para o Ministério da Pesca - que não tinha competência para usar tais embarcações -, a empresa Intech Boating foi procurada para doar ao comitê financeiro do PT de Santa Catarina R$ 150 mil. O comitê financeiro do PT catarinense bancou 81% dos custos da campanha a governador, cuja candidata foi a atual coordenadora política do governo, ministra Ideli Salvatti, em 2010.

Ex-militante do PT, o dono da empresa, José Antônio Galízio Neto, afirmou em entrevista ao Estado nesta quinta-feira, 29, que a doação não foi feita por afinidade política, embora se defina como filiado da época de fundação do partido em São Bernardo do Campo (SP).

"O partido era o partido do governo. A solicitação de doação veio pelo Ministério da Pesca, é óbvio. E eu não achei nada demais. Eu estava faturando R$ 23 milhões, 24 milhões, não havia nenhum tipo de irregularidade. E acho até hoje que, se precisasse fazer novamente, eu faria", disse o ex-publicitário paulista. Logo em seguida, na entrevista, ele passou a atribuir o pedido de doação a um político local.

Derrotada na eleição, Ideli preencheu a cota do PT de Santa Catarina no ministério de Dilma Rousseff, justamente na pasta da Pesca. Em cinco meses no cargo, antes de mudar de gabinete para o Planalto, a ministra pagou o restante R$ 5,2 milhões que a empresa doadora à campanha petista ainda tinha a receber dos cofres públicos.

Nesta quinta-feira, a assessoria da ministra negou "qualquer ligação" entre Ideli e a Intech Boating, alegando que a doação não foi feita diretamente à campanha, mas ao comitê financeiro do PT. Em nota, a assessoria da ministra destaca que as contas da campanha foram aprovadas pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Ideli teve reiterados recentemente os poderes de articulação política do governo, em meio a sinais de rebelião da base de apoio de Dilma no Congresso.

Na quarta-feira, 28, o Tribunal de Contas da União (TCU) apontou irregularidades na compra das lanchas-patrulha, em contratos com a Intech Boating, que somaram R$ 31 milhões. O prejuízo ao contribuinte, que autoridades e a empresa serão cobrados a devolver, ainda não foi calculado. O TCU critica sobretudo o fato de o ministério ter comprado lanchas sem ter o que fazer com elas. O relatório diz que 22 das 28 lanchas ficaram guardadas na própria fabricante, pois não tinham onde ser entregues.

José Antônio Galízio Neto afirmou que ainda restavam na empresa quatro das embarcações encomendadas. Uma delas seguiria ainda nesta quinta-feira para a Marinha, destino definido no início deste ano, quando a auditoria do TCU processava as conclusões.

As encomendas do ministério foram feitas entre 2009 e 2010, em licitações supostamente dirigidas, diz o TCU. No último dia de mandato, o então ministro Altemir Gregolin contratou mais cinco lanchas, quando 14 delas já estavam prontas e sem uso no estaleiro em Santa Catarina.

Ministra não tem ligação com a empresa, diz nota

A ministra Ideli Salvatti negou que sua campanha ao governo de Santa Catarina, em 2010, tenha se beneficiado de recursos doados pela empresa Intech Boating, fabricante das 28 lanchas compradas pelo Ministério da Pesca, sem uso previsto pela pasta.

"Não há nenhuma ligação entre a ministra Ideli Salvatti e a empresa Intech Boating, pois a doação questionada não foi feita para a candidatura de Ideli ao governo do Estado", diz nota divulgada pela Secretaria de Relações Institucionais.

De acordo com registros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a Intech doou R$ 150 mil ao comitê financeiro do PT de Santa Catarina. O comitê financeiro bancou 81% do custo declarado da campanha de Ideli, cuja receita total foi de R$ 3,6 milhões.

A ministra foi titular da Pesca entre janeiro e junho de 2011. Na época, a Intech recebeu R$ 5,2 milhões que faltavam pela compra das 28 lanchas encomendadas nos dois anos anteriores, na gestão de Altemir Gregolin.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

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