quinta-feira, 8 de março de 2012

Sob pressão, BC corta juros além do previsto

Um dia após a divulgação de que a economia brasileira cresceu só 2,7% em 2011, o Comitê de Política Monetária (Copom) aprovou uma redução de 0,75 ponto percentual na taxa básica de juros, que ficou agora em 9,75%. Mas a decisão não foi unânime. A medida foi aprovada por cinco votos a dois. Os dissidentes queriam cortar apenas 0,5 ponto, como apostava a maior parte dos analistas econômicos. Apesar do anúncio – importante para impulsionar a retomada econômica em 2012 -, o Brasil continua com o maior juro real (descontada a inflação) do mundo. Além do corte nos juros, o governo prepara medidas para estimular a indústria a conter a valorização do real, considerada um empecilho para elevar as exportações do país. Ontem, o IBGE divulgou retração de 2,1% na indústria em janeiro. Foi o maior tombo desde dezembro de 2008

BC aperta o passo

Dividida, diretoria do Banco Central reduz juros a 9,75% para estimular a economia

Gabriela Valente

DO PIBÃO AO PIBINHO

Um dia após a divulgação do resultado do Produto Interno Bruto (PIB) de 2011 - que cresceu apenas 2,7% - o Comitê de Política Monetária (Copom) cortou em 0,75 ponto percentual a taxa básica de juros (Selic), que caiu de 10,5% para 9,75% ao ano, mudando o plano de voo que mantinha desde meados do ano passado, com cortes seguidos de 0,5 ponto. A decisão tem o objetivo claro de estimular um crescimento mais robusto da economia. A queda dos juros barateia o crédito e amplia o consumo das famílias.

Com o corte anunciado ontem, o BC antecipou o cumprimento da promessa, feita em janeiro, de que o país teria taxa de um dígito. Mas a decisão não foi unânime. Cinco diretores da instituição defenderam um corte mais agressivo, enquanto os dois com votos vencidos pela maioria queriam manter um ritmo de corte de 0,5 ponto. Com a redução, a Selic atinge o menor percentual desde junho de 2010.

A reunião foi um pouco mais demorada do que o usual. No entanto, foi o comunicado que mais chamou a atenção: foi o mais seco da gestão do presidente Alexandre Tombini e não deu dicas dos próximos passos.

"Dando seguimento ao processo de ajuste das condições monetárias, o Copom decidiu reduzir a Taxa Selic para 9,75% ao ano, sem viés, por cinco votos a favor e dois votos pela redução da Taxa Selic em 0,5 ponto percentual", diz a nota divulgada após o encontro.

De acordo com economista do Banco Votorantim, Leonardo Sapienza, isso foi uma estratégia para não gerar ruídos no mercado, que vai demorar para digerir a decisão.

Nos últimos dias cresceram as apostas no mercado financeiro de um corte maior na taxa. Alguns analistas falavam em até em um ponto percentual. No mercado de juros futuros, porém, os contratos mais importantes foram sendo negociados com uma aposta de corte de 0,75 ponto percentual. Essas perspectivas de corte mais agressivo ganharam força nas últimas semanas.

Inflação ainda gera temor

Os argumentos a favor de uma "radicalização" imediata surgiram por causa do apelidado "tsunami monetária", ou seja, a vultosa quantia de dólares que sobra no mundo e vem para o Brasil lucrar com os juros mais altos do planeta. Mesmo com a redução de ontem, o Brasil se mantém no topo do ranking mundial de juros reais (descontada a inflação). À frente de Rússia, Indonésia, China e Colômbia, com 4,2% anuais, o país só deixaria a primeira colocação se o corte tivesse sido de 1,75 ponto. Reforçou o discurso dos defensores de um corte maior o crescimento aquém do que previa o governo em 2011.

A rapidez no cumprimento da promessa de juros de um dígito surpreendeu, embora os sinais emitidos pelo BC nos últimos dias tenham sido nessa linha. Uma pesquisa da autarquia mostrou que os diretores enxergavam espaço para uma queda da taxa, sem afetar a inflação. Na semana passada, Tombini afirmou que neste momento de crise vários países trabalham com juros num patamar menor do que o recomendado para estimular suas economias e sair da crise.

- Com certeza, o maior motivo da decisão é a entrada de dólares no país - diz Sapienza.

No entanto, vários economistas dizem que, mesmo com tantas razões para o Copom apertar o passo, o BC errou, porque começam a surgir sinais de que a inflação poderá sair do controle no ano que vem.

Os economistas do banco Santander lembram que o trabalho do BC de controlar a inflação ainda tem uma ajuda com a mudança do cálculo do índice. Com novos pesos para os gastos, a tendência é que o IPCA fique menor.

Já o economista da NGO Corretorra, Sidney Nehme, apostava em um corte mais audacioso, de até um ponto percentual, por ser a melhor forma de desestimular o ingresso de capitais estrangeiros especulativos, combater a crise - que em sua opinião deve se agravar - e estimular a economia.

- Os efeitos da crise internacional, acreditamos, repercutirão na nossa economia de forma efetiva neste ano de 2012, quando não há muito espaço para reerguermos a indústria no campo das exportações. O fato é que o Brasil precisará mais do que substantivo corte na taxa de juros para construir um PIB melhor em 2012 - diz.

Para o analista da Cruzeiro do Sul Corretora, Jason Vieira, autor do trabalho, ainda é cedo para comemorar o corte de ontem, já que a economia mal começa a sentir os efeitos dos primeiros cortes iniciados em agosto do ano passado.

- Ainda não dá para comemorar. É preciso ponderar e esperar o que vai acontecer no futuro próximo, quando esses cortes forem assimilados pela economia - afirmou.

A Confederação Nacional da Indústria (CNI) divulgou nota após o anúncio da decisão considerando o corte indispensável para enfrentar o baixo desempenho da economia e o enfraquecimento da indústria. Já a Fiesp, que reúne as indústrias paulistas, considerou o corte "tardio e insuficiente" e, também em nota, cobrou "um conjunto de medidas que seja capaz de mudar a situação de competitividade do Brasil".

Colaborou Lino Rodrigues

O GLOBO

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