quarta-feira, 25 de abril de 2012

Mundo mudado:: Míriam Leitão


A crise já mudou o mundo. De 2007 para cá, a China aumentou de 10,9% para 14,3% a participação no PIB mundial, enquanto os EUA encolheram. Eram 21%, hoje são 19%. Os números também provam que a China segurou o crescimento mundial, com aumento de 78% nas importações no período, de US$ 955 bi para US$ 1,7 tri. Os EUA, os maiores compradores, foram de US$ 2 tri a US$ 2,2 tri.

A crise ainda não acabou, mas já fez alterações de pesos e medidas pelo seu chacoalhar da economia. Para se ter uma ideia, o G7, que sempre foi o grupo de comando da economia do mundo, perdeu quatro pontos de participação no PIB. Saiu de 42,6% do produto global, em 2007, para 38,4%, em 2011.

Quem governará a crise e ajudará os países mais encrencados a achar a porta da saída? Não se sabe. O colapso bancário produziu uma crise fiscal que afetou a política e emagreceu lideranças.

O mundo ainda vive o tremor que teve seu epicentro em setembro de 2008, quando o Lehman Brothers quebrou. Dez governos europeus já caíram só nos últimos dois anos. Neste ano de 2012, o quinto da crise, os Estados Unidos estão neutralizados por causa das eleições, período em que não se propõe mudanças estruturais, nem medidas amargas. Na Europa, até meados do ano, persistirá a dúvida sobre o rumo da França, que vinha dividindo o comando da solução com a Alemanha.

A primeira pesquisa confirma o favoritismo de François Hollande na França. Ele, em campanha, já criticou o pacto fiscal Sarkozy-Merkel. Em maio será escolhido o presidente; em junho haverá as eleições legislativas. Só então se saberá o caminho da política francesa.

As vítimas dos eleitores zangados podem estar à esquerda ou à direita. O eleitor europeu quer punir quem está no poder e a expectativa que tem é em relação ao novo. José Luiz Zapatero era de esquerda e foi substituído pelo direitista Mariano Rajoy, na Espanha; Nicolas Sarkozy é de direita e pode ser substituído pelos socialistas. O que embala eleitores franceses é o mesmo que embalou espanhóis, portugueses, ingleses, irlandeses, entre outros: a ideia de que a oposição tem uma resposta que o governo não conseguiu dar desde o começo do abalo financeiro.

Não haverá milagres. Apesar das diferenças de país para país, o problema europeu tem semelhanças. Os governos sempre gastaram demais nos benefícios do estado do bem-estar social e para financiar isso elevaram os impostos. Hoje eles propõem ao eleitor que pague mais impostos e tenha menos benefícios, num momento em que ele se sente mais ameaçado pelo desemprego. Ninguém quer, e a equação não fecha.

Por outro lado, com o aumento da expectativa de vida, as previdências necessariamente terão que ser revistas: aqui, lá, e acolá. É regra universal. Na Alemanha, já houve aumento da idade para 67 anos; na França, houve passeata contra a elevação de 60 anos para 62.

Desde o começo da crise aumentou a dívida pública de todos os países, subiu a taxa de desemprego, diminuiu o crescimento, foram gastos trilhões de dólares/euros para resgatar os bancos e assim manter o sistema financeiro saudável. O contribuinte entendeu isso como uma transferência de dinheiro público para os banqueiros - o que em grande parte foi mesmo - e aumentou a raiva contra o governo.

Na primeira pesquisa que saiu ontem de intenção de voto no segundo turno, deu 55% para François Hollande e 45% para Nicolas Sarkozy. Dos eleitores consultados, 83% disseram ter certeza do voto e só 21% disseram que Sarkozy deve ganhar. Em todas as perguntas, seja de intenção de voto ou prognóstico das eleições, o socialista está em melhor posição. O atual presidente francês precisa desesperadamente do seu desempenho no debate. Ele costuma ser bom nisso, mas está neste momento numa situação de clara desvantagem.

A queda em dominó de governos europeus não têm trazido alívio para o ambiente do continente. As crises fiscais são sempre de longa duração. É preciso digerir o déficit e reduzi-lo ao longo do tempo. Soluções de redução de gastos podem provocar um esfriamento da economia, agravando o problema. Soluções de ampliação de gasto para reativar a economia exigem que o financiador das dívidas dos governos aceite continuar financiando mesmo que o endividamento cresça.

No ano passado foram registradas pequenas melhoras. Em 2011, o déficit dos 17 países da Zona do Euro caiu de 6,2% para 4,1%. Mas a dívida subiu um pouco, de 85,3%, em média, para 87,2%. O esforço foi grande, mas tem que continuar. A Alemanha continua surpreendendo, conseguiu diminuir o déficit de 4,3% para apenas 1%. O déficit da Irlanda atingiu o pico de 31% em 2010 e no ano passado fechou em 13%. Enorme, mas melhorou. Na Espanha, o resultado negativo nas contas caiu de 9,3% para 8,3%, mas não convenceu o mercado, que está cobrando juros mais caros do país. A França teve um déficit de 5,2% no ano passado e de 7,1% em 2010.

Melhora houve mas não acendeu ainda a luz no fim do túnel. A crise continua fazendo suas vítimas em todos os níveis e mudando o equilíbrio de forças do mundo.

FONTE: O GLOBO

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