quarta-feira, 4 de abril de 2012

O cartório eleitoral do tempo de TV:: Rosângela Bittar

Há um momento em que, não se trata nem de tentar a volta por cima vez que condições para isso inexistem, mas é preciso levantar-se e avaliar se há mesmo luz suficiente para um recomeço planejado. Esses dois estágios básicos do revigoramento são exigidos de qualquer partido que se encontre na situação do Democratas. Abatida de forma múltipla e por todos os lados, no mínimo a sociedade política que atende pela sigla de DEM tem que extrair de si rasgos de humildade para pensar em emergir. A soberba, em contraponto e ao contrário dos partidos que estão dominando o processo político, deve hibernar.

Humildade para reconstruir a legenda, abalada por tantas e tão sucessivas vicissitudes. Humildade para buscar uma lógica para suas decisões. Humildade para admitir que o Democratas foi sangrado até a alma. Humildade para fazer a autocrítica necessária e refazer seu processo político.

Em vez disso, o que faz o DEM, novamente no epicentro do terremoto de novo escândalo de corrupção, no Congresso? Acuado, encostado às cordas, tentando salvar a pele do que lhe restou, o partido ataca e exige. Protagoniza uma pantomima. Leva à Justiça os que não quiseram mais a sua companhia e saíram em busca do poder que não quis dividir. Faz de conta que é grande, e exige. Postos, comandos, primazias.

Liquidação do capital indica mudança de rumo

Seus movimentos são, porém, erráticos. Se é oposição, deveria se entender com o PSDB, por mais restrições que tenha ao partido. Se não for por aí, por onde irá? Regionalmente está fraco, mas ainda lhe resta espaço de barganha no jogo nacional. O partido, porém, se mostra sem condições de pensar o futuro, de ver adiante da agonia do momento. São dois ou três que comandam desde as decisões sobre expulsão de quem ainda pode contaminá-los eleitoralmente, até a quem entregarão o cacife que lhe restou.

O DEM reagiu com o fígado à aliança com o PSDB, em 2010, na campanha presidencial, quando já estava abalado em seus alicerces com o mensalão do governo de Brasília mas ainda não tão reduzido pela criação do PSD. O então presidente, Rodrigo Maia, do Rio de Janeiro, onde o partido ainda tinha uma presença notada, quis influir na escolha do candidato a presidente do PSDB, lutou contra José Serra mas acabou batido.

Depois de uma superação difícil na última campanha, a legenda está novamente agora, na disputa municipal, às voltas com decisões do PSDB que lhe desagradam, como novamente a candidatura Serra à prefeitura de São Paulo.

O DEM tem menos vantagens a oferecer do que tinha há dois anos, mas ainda lhe resta algo fundamental às campanhas: o tempo de TV para propaganda eleitoral gratuita. É com isso que negocia, agora, especialmente em São Paulo. Exige, por exemplo, que o PSDB detenha a candidatura de Antonio Imbassahy a prefeito de Salvador, deixando caminho livre ao líder demista ACM Neto. O PSDB reluta, marca o passo, porque tem duas necessidades claras para continuar existindo em dois dos maiores colégios eleitorais do país: lançar candidatos e abrir perspectivas eleitorais no Rio e na Bahia. Em nome de uma circunstância que pode durar pouco, pois não se sabe até quando o DEM existirá como tal, o PSDB congela seus planos e atrasa sua própria recuperação?

O DEM exige também o cargo de vice na chapa de São Paulo, ameaçando, se não levar, conceder seu tempo de TV para a campanha de Gabriel Chalita, do PMDB. Partido que, como o PSDB, constitui opção futura ao DEM, até pela fusão cogitada já tantas vezes depois de sua drástica redução política.

Enquanto ameaça optar pelo adversário, o partido negocia claramente com o prefeito Gilberto Kassab, com quem estava rompido, e com o próprio governador Geraldo Alckmin, de quem voltou a ser aliado, o lugar de vice do Serra para Rodrigo Garcia.

Quer definições antes que a Justiça Eleitoral reconheça ao PSD o direito a tempo de TV e verba partidária. Claro, pode perder toda a sua bagagem.

O que chama a atenção é a forma como o DEM se apresenta, a brandir o único argumento que possui para pedir ou impedir. O partido, com menos truculência, e se tivesse mesmo decisão de permanecer no quadro político, não estaria agora jogando um mata-mata. Poderia promover um acordo de segundo turno na Bahia, tal como o PT e PMDB fizeram em São Paulo. Poderia aguardar a Justiça eleitoral para discutir São Paulo.

Ao contrário, seu negócio é negociar o cartório do tempo de TV. As primeiras estimativas feitas sobre o caso da eleição municipal de São Paulo, considerando que a Justiça Eleitoral vai decidir contra o PSD e a favor do DEM, o Democratas teria 1min40seg; para o PSDB, que tem apenas 2min04seg, é uma preciosidade. O PT tem 3min25seg e o PMDB 3min04seg. Levando-se em conta que o PSB, com 1min19seg, deve, no fim das tratativas de Lula com Eduardo Campos, apoiar o PT, tem-se que são muitos minutos para o ataque ao PSDB e poucos para a defesa. Não chega a ser um equilíbrio o que representa o DEM, mas faz o PSDB chegar mais perto de seus contendores. Quem vê o DEM gastar seu capital de maneira perdulária, no tudo ou nada, avalia que é uma liquidação para mudança de ramo após as eleições municipais.

P; olíticos aliados ao governo que acompanharam o lançamento do pacote de estímulo à indústria, ontem, lamentaram a ausência do senso marqueteiro do ex-presidente Lula no comando das plataformas de lançamento do Palácio do Planalto.

Pelo menos para três das dezenas de medidas divulgadas, haveria um carnaval particular e intenso em dias e públicos diferentes: o pacote de oncologia, uma espécie de lei Rouanet para associações de combate ao câncer; o pacote da banda larga e o regime automotivo. Com direito à bolsa-carro compensatória à bolsa-montadora.

Mas os mesmos analistas não deixaram de reconhecer que, depois de um primeiro ano desastroso, a presidente quis demonstrar que 2012 começou e está governando.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

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