quinta-feira, 19 de abril de 2012

Próximo passo:: Míriam Leitão

A dúvida é o que acontecerá a partir de agora com a taxa Selic. Que ontem os juros seriam reduzidos, todos sabiam. A pergunta que continua sendo feita é até que ponto as taxas poderão continuar caindo. O ponto mais baixo que os juros básicos do Brasil chegaram foi 8,75%, um pouco antes da crise de 2008. Os termos da nota divulgada ontem pelo Banco Central voltaram a abrir as portas para novas reduções.

Na ata da reunião de março, o BC deu a entender que levaria os juros a 9%, ao dizer que havia alta probabilidade de a Selic chegar a "patamares ligeiramente acima dos mínimos históricos, e nesses patamares se estabilizando". Pois ontem o Copom levou os juros a 9% e disse que estava "dando seguimento ao processo". Ou seja, não demonstrou já ter atingido o objetivo. A leitura feita pelo mercado, logo após a nota, é de que novos cortes podem acontecer.

O Brasil tem um problema que não é de solução fácil. Economistas do governo, e de fora do governo, já fizeram avaliações tentando projetar uma fórmula para que a Selic possa cair mais. O piso acaba sendo a remuneração da caderneta de poupança.

- A poupança é corrigida em TR mais 6% ao ano, o que dá entre 7% e 7,5% ao ano. Quando a gente fala de Selic a 9%, estamos falando, na verdade, da taxa bruta, mas é preciso descontar o Imposto de Renda, que varia de 15% a 22,5% sobre o rendimento, e a taxa de administração. O Imposto de Renda não incide sobre a poupança. Quando se tira essas taxas, a rentabilidade dos fundos cai para níveis próximos da poupança - diz Miguel de Oliveira, da Anefac.

As aplicações de renda fixa são lastreadas pelos títulos do Tesouro. Se houver corrida para a poupança, isso desequilibraria o financiamento dos títulos da dívida pública.

O grande debate é este: a partir de que ponto da taxa Selic haverá competição entre fundos de renda fixa e cadernetas? Há também o peso das chamadas "exigibilidades": 65% do que é captado via caderneta de poupança têm obrigatoriamente que ir para o mercado imobiliário. A ligação entre poupança e mercado imobiliário criou uma teia de ativos e passivos que poderiam ficar descasados caso houvesse uma mudança na fórmula de remuneração da caderneta.

Em termos jurídicos, dificilmente se sustentaria uma mudança retroativa, o que significa que contas já abertas não podem ter agora uma mudança na regra de remuneração. Se algo for alterado terá que ser para as novas contas. O poupador brasileiro sofreu a violência do governo Collor. E esse trauma pode reaparecer só de falar em qualquer mudança na fórmula de cálculo da caderneta. Esse produto financeiro é o preferido de quem tem pouco para poupar e tem um perfil bem conservador. Portanto, toda vez que a Fazenda falou em mudanças na poupança teve que voltar atrás e negar que estivesse pensando no assunto tabu. Em ano eleitoral, então, mais proibido ainda fica esse tema.

A Anefac (Associação Nacional dos Executivos de Finanças Administração e Contabilidade) divulga hoje cálculos que fez para medir a atratividade da poupança em relação aos fundos de investimento, num contexto de Selic a 9%. Os dados, que foram antecipados à coluna, mostram que a poupança vence em 16 das 20 simulações, que variaram em prazos de resgate e taxas de administração cobradas pelos bancos. Continuar nos fundos só seria melhor negócio com as menores taxas e os maiores prazos de resgate.

"A poupança já ganha dos fundos na maioria das situações (com a Selic a 9%), sendo que quanto menor o prazo de resgate da aplicação, bem como maior for a taxa de administração cobrada pelo banco, maior vai ser a vantagem da poupança frente aos fundos", explicou a Anefac.

Desde setembro, o IPCA está em queda forte, mas o total acumulado nos últimos 12 meses está acima do centro da meta. Os economistas especializados no tema acham que a inflação pode subir no final do ano com a entrada da entressafra, que este ano deve ser mais forte que nos anteriores. A Petrobras tem dado sinais de que os preços da gasolina vão subir. O produto tem um alto peso no índice.

E, por fim, alguns economistas acreditam que pode haver uma onda inflacionária no mundo em consequência do excesso de liquidez no mercado financeiro internacional. A política monetária excessivamente expansionista pode alimentar um aumento de preços assim que a economia retomar um ritmo normal de atividade. Tudo isso terá que ser pesado pelos integrantes do Copom na próxima reunião. Por isso, a ata da próxima quinta-feira deve ser lida com lupa atrás de sinais dos passos seguintes do BC.

O nível de atividade deve melhorar nos próximos meses. Uma das fontes do estímulo será a Selic, mas outra, mais forte ainda, é a redução que está havendo nas taxas bancárias. Ontem, Itaú e o Bradesco deram o braço a torcer e seguiram Banco do Brasil e Caixa Econômica, derrubando os juros que cobram das empresas e dos clientes pessoa física. O movimento que o governo iniciou está dando certo. O resultado será um reforço a mais no estímulo econômico, o que é bom para uma economia que está estagnada, no momento. Mas o ritmo mais aquecido pode aumentar a probabilidade de um cenário de elevação de preços do final de ano.

Por tudo isso, a próxima reunião será difícil. Até aqui, a derrubada da Selic foi mais fácil de decidir do que os próximos movimentos a serem feitos pelo Copom. O que a presidente Dilma está avisando é que quer juros nos patamares internacionais. Hoje, no mundo, se pratica juros negativos. Quanto mais poderá cair a Selic? Não percam as próximas reuniões do Copom.

FONTE: O GLOBO

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